IX Latin American IRPA Regional Congress on Radiation Protection and Safety - IRPA 2013 Rio de Janeiro, RJ, Brazil, April 15-19, 2013 SOCIEDADE BRASILEIRA DE PROTEÇÃO RADIOLÓGICA - SBPR METODOLOGIA PARA CALIBRAÇÃO DE DETECTOR DE NaI(Tl) 3 X3 PARA MEDIÇÕES IN VIVO EM PACIENTES PORTADORES DE HIPERTIREOIDISMO SUBMETIDOS À RADIOIODOTERAPIA Carlaine B. Carvalho 1,2, Isabelle. V.B.Lacerda 1,2, Mercia.L.Oliveira 1,2,Clovis A.Hazin 1,2,Fabiana.F.Lima 2 1 Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Departamento de Energia Nuclear (DEN) Av. Professor Moraes Rego, nº 1235 - CDU 50670-901 Recife, PE carlaine.carvalho@gmail.com bellelacerda@hotmail.com 2 Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste (CRCN-NE) Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) Av. Professor Luiz Freire, nº 200 - CDU 50740-540 Recife, PE mercial@cnen.gov.br chazin@cnen.gov.br fflima@cnen.gov.br RESUMO O hipertireoidismo é uma patologia resultante do excesso de produção de hormônios tireoidianos. Um dos seus principais tratamentos é com o radioisótopo iodo-131. Atualmente, esta terapia envolve duas abordagens: a administração de atividades fixas e a administração de uma atividade calculada, prescrita de acordo com a dose absorvida na tireoide. Em aplicações terapêuticas, o médico deve realizar uma avaliação específica da dose de radiação para o tecido comprometido de cada paciente, levando em consideração suas especificidades biocinéticas. Para tanto, é importante o desenvolvimento de um protocolo individualizado para cálculo de dose em pacientes hipertireoideos. O objetivo desse trabalho é estabelecer a metodologia de calibração do sistema de detecção a ser utilizado na determinação da atividade terapêutica do 131 I necessária para liberar a dose absorvida desejada na tireoide. Essa etapa é fundamental para o desenvolvimento de um protocolo de doses individualizadas. O sistema utilizado consiste em um detector de NaI(Tl) 3 x3 acoplado ao software Genie 2000. Foram utilizadas as fontes de calibração de 60 Co, 137 Cs e 133 Ba. Obteve-se a reta de calibração do sistema, com as fontes 60 Co e 137 Cs. Posteriormente, o detector foi calibrado utilizando-se um simulador de pescoçotireoide desenhado e produzido pelo IRD/CNEN com atividade conhecida de solução padrão de 133 Ba contendo 18661,62Bq (em 24.09.12) uniformemente distribuída. A fonte de 133 Ba foi utilizada por ser uma emissora de fótons com energia semelhante ao 131 I e por possuir um tempo de meia vida maior comparado ao 131 I. Utilizouse um colimador de 20cm entre o fantoma e o detector. Foram realizadas 5 medições de 2 minutos com o fantoma e sem fontes radioativas para obtenção do background. O valor obtido para o fator de calibração foi 0,12cpm/Bq e para Atividade Mínima Detectável (AMD), 59,44Bq. A técnica é adequada para avaliação de atividades de 131 I incorporadas por pacientes hipertireoideos.
1. INTRODUÇÃO Inicialmente o uso da Medicina Nuclear era voltado para o diagnóstico, ou seja para o estudo das estruturas e processos para diagnosticar doenças e nortear o médico para identificar possíveis problemas de saúde. Hoje, a maioria das práticas na Medicina Nuclear continua a envolver procedimentos diagnósticos, porém a utilização de radiofármacos em aplicações terapêuticas deve também ser levada em consideração e ser cada vez mais aplicada [1]. O primeiro radiofármaco comercialmente disponível foi o Iodo-131 ( 131 I) e sua comercialização só iniciou em 1950 [2]. O 131 I é um dos radiofármacos mais utilizados de forma terapêutica, a sua utilização é considerada de fácil administração, efeito rápido, de baixo custo e indolor [3,4]. O 131 I vem sendo utilizado há muito tempo para o tratamento de pacientes portadores de Hipertireoidismo. A tireoide é uma glândula localizada na região anterior do pescoço e secreta hormônios lançando-os diretamente na corrente sanguínea, sendo transportados para todos os outros tecidos do corpo. Os hormônios tireoidianos são de extrema importância, pois auxiliam o organismo em todos os processos relacionados ao metabolismo. O hipertireoidismo caracteriza-se por acelerar o metabolismo corporal e sua causa mais comum ocorre quando a tireoide encontra-se extremamente ativa, e produz uma excessiva quantidade de hormônios. Essa condição é conhecida como bócio difuso tóxico ou Doença de Graves [5]. Há três principais métodos para tratar o hipertireoidismo: terapia com radioiodo, drogas antitireoidianas e cirurgia. A escolha de cada uma dessas modalidades terapêuticas depende de vários fatores entre eles: idade do paciente, gravidade do hipertiroidismo, presença de comorbidades, situações especiais, como é o caso da mulher na gravidez ou que deseja engravidar, treinamento e experiência do médico assistente e a própria preferência do paciente. [6] O resultado ideal para o tratamento de hipertireoidismo é o eutireoidismo. Ou seja, uma condição na qual o paciente não necessite reposição hormonal e também não fique hipotireoideo. Esta condição, entretanto, é muito rara tendo em vista as inúmeras variáveis que afetam o resultado, incluindo as características do paciente (idade, sexo e tamanho da glândula); a radiação fornecida à glândula (fração de absorção do 131 I, homogeneidade da distibuição, tempo de meia vida efetiva); e o uso de drogas antitireoidianas (se tionamidas foram utilizadas e a diferença de tempo entre a suspensão do medicamento e o tratamento com o 131 I). Ainda com relação aos resultados esperados da terapia com 131 I, dois fatos são evidentes. Primeiro, quanto maior a dose prescrita, maiores são as porcentagens de pacientes curados e que desenvolvem hipotireoidismo pós-ablação. O segundo fato diz respeito aos pacientes que se tornam hipotireoideos após o tratamento com doses pequenas de 131 I. Doses com atividades ótimas desse radionuclídeo podem ser determinadas com dosimetria baseado em alguns dados como: a dose de radiação absorvida na tireoide; a massa da glândula tireoide; tempo de meia-vida efetiva; e distribuição do 131 I dentro da glâdula [6]. Apesar de sua ampla utilização, ainda há muitas controvérsias em torno do uso do 131 I, no que diz respeito à forma como os médicos determinam a atividade ótima para o paciente. Há três abordagens gerais: a prescrição de uma atividade fixa para todos os pacientes; uma atividade corrigida para o tamanho da glândula tireoide e sua capacidade de concentrar o 131 I; e a outra forma é prescrever uma quantidade calculada de 131 I para fornecer uma dose de radiação específica para a tireóide [7]. A segurança e a eficácia das atividades individualizadas realizadas com aproximações dosimétricas para terapia com o 131 I na doença de Graves, comparado com o tratamento com a administração de atividades fixas ainda gera muitas discussões. Parece razoável que a
eficácia de cada terapia depende do fornecimento adequado de dose de radiação à tireoide. As abordagens tradicionais para o cálculo da dose trapêutica na tireóide utilizando o 131 I para o tratamento da Doença de Graves incluem o método de Marinelli-Quimby e o algoritmo MIRD [8]. Em aplicações terapêuticas, o médico deve realizar uma avaliação específica da dose de radiação para o tecido comprometido de cada paciente. Ele deve fazer de forma a maximizar a dose no tecido doente e manter doses nos tecidos saudáveis em níveis aceitáveis (ou seja, dentro dos limiares de efeitos nocivos aos tecidos). Porém, na maioria das clínicas isso não acontece e os pacientes são geralmente todos tratados com o mesmo ou com semelhantes protocolos sem levar em consideração suas especificidades biocinéticas [1]. Um dos maiores desafios para o uso de doses individualizadas no tratamento de hipertireoidismo da Doença de Graves é o desenvolvimento de um método razoavelmente rápido, simples e rentável para medir a cinética do 131 I na tireoide dos pacientes. Para desenvolver um protocolo de doses individualizadas é de fundamental importancia a devida calibração do detector a ser utilizado. Portanto, o objetivo do presente trabalho é estabelecer a metodologia de calibração do sistema de detecção a ser utilizado na determinação da atividade terapêutica do 131 I em pacientes hipertireoideos. 2. MATERIAIS E MÉTODO A presente calibração foi realizada no Serviço de Medicina Nuclear do Hospital das Clínicas de Pernambuco. Os equipamentos utilizados no desenvolvimento desse trabalho pertencem ao Centro Regional de Ciências Nucleares (CRCN-NE). 2.1 Materiais O detector de NaI(Tl) 3 x3 foi conectado a um módulo compacto (Unispec) e controlado pelo sistema de aquisição de dados (Software Genie 2000). Na realização da calibração foram utilizadas as fontes de calibração de Césio-137, Bário-133e Cobalto-60 ( 137 Cs, 133 Ba e 60 Co), elas são mostradas na Figura 1 e o detector é apresentado na Figura 2.
Figura 1: Imagem das fontes de 137 Cs, 133 Ba,, 60 Co Figura 2: Detector de NaI(Tl) 3 x3 2.2 Método Primeiramente, foi obtida a reta de calibração do sistema de detecção, obtendo-se espectros para 60 Co e 137 Cs.
Posteriormente, o detector foi calibrado utilizando-se um simulador de pescoço-tireoide desenhado e produzido pelo IRD/CNEN [9]. Ele contém a atividade conhecida de solução padrão de 133 Ba (simulador do 131 I) de 20.320Bq (0,55 Ci), que foi uniformemente distribuída na superfície de um papel filtro previamente cortado nas dimensões e formato da tireoide. Na Figura 3 é mostrado o simulador pescoço-tireoide. Figura 3: Imagens do simulador Pescoço-tireoide. A fonte de 133 Ba foi utilizada por ser uma emissora de fótons com energia semelhante a do 131 I, e também por possuir um tempo de meia vida maior comparado ao 131 I. A atividade equivalente do 131 I foi convertida por meio das intensidades de emissão gama de ambos os radionuclídeos, de acordo com a Equação 1. A A 133 Ba I 131 133 I Ba 131 onde A é a atividade e Σ é o somatório das intensidades de emissão gama dos respectivos radionuclídeos. A calibração consistiu na determinação da razão entre a taxa de contagem registrada na janela do 131 I e a atividade do simulador. Para tal, o simulador de pescoço-tireoide foi posicionado a 20cm do detector instalado com um colimador de chumbo. Foram realizadas cinco medições sucessivas de 2 minutos cada com o simulador e com a sala vazia para obtenção da radiação de fundo. Na Figura 4 é mostrado o posicionamento do simulador de pescoço-tireoide em relação ao detector. (1)
Figura 4: Imagem do posicionamento do simulador de pescoço-tireoide em relação ao detector. O fator de calibração foi obtido por meio da Equação 2 e é expresso em cpm Bq -1., C CBG Fc (2) A onde, C é a taxa de contagem do simulador, C BG é a taxa de contagem da radiação de fundo e A é a atividade conhecida do simulador. A atividade Mínima Detectável (AMD) para o 131 I na geometria de tireoide foi obtida por meio da Equação 3 [10, 11]. Foram utilizados espectros de 2 indivíduos não expostos medidos na região de interesse por 2 minutos. (3) Onde, AMD = Atividade mínima detectável, em Bq; B = Desvio-padrão da contagem total das medições realizadas em indivíduos não expostos na geometria de interesse; T c = Tempo de contagem, em minutos; F c = Fator de calibração, em cpm/bq.
A técnica de calibração deve ser validada por meio da comparação entre a AMD pelo sistema de detecção e da atividade correspondente ao nível de registro de 1mSv. Uma vez que a AMD seja menor que a atividade correspondente ao nível de registro no compartimento específico monitorado, a metodologia é considerada válida para monitoração interna do radionuclídeo [12]. Para o cálculo da atividade correspondente ao nível de registro de 1mSv são consideradas as frações de retenção/excreção de atividade após a incorporação no órgão em análise e os coeficientes de doses apropriados para cada cenário de exposição, de acordo com a Equação 4 [13]. (4) Onde: A NR = Atividade correspondente ao Nível de Registro, em Bq; m(t) = Fração da incorporação retida ou excretada em um tempo após a incorporação no compartimento avaliado, em Bq/Bq; e(g) j = Coeficiente de conversão de dose apropriado para inalação ou ingestão de um determinado radionuclídeo, em Sv/Bq. Os resultados de atividade correspondente ao nível de registro para o compartimento tireoide após a incorporação de 131 I obtidos no cenário ingestão são mostrados na Tabela 1 [13]. Tabela 1. Atividade em função do tempo após incorporação para o cenário de exposição de 131 I via ingestão Tempo (d) Tireoide m(t) (Bq/Bq) A NR (Bq) 1 2,52x10-1 1,15x10 5 7 1,54x10-1 7,00x10 3 14 7,96x10-2 3,62x10 3 A partir dos valores de atividade incorporada correspondente ao nível de registro é possível conhecer o valor da atividade no compartimento avaliado em função do tempo decorrido após a incorporação, e assim, avaliar a sensibilidade das técnicas de monitoração interna de indivíduos para órgãos específicos.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na tabela 1 são mostrados os valores encontrados para a relação canal e energia. Tabela 2. Relação Energia/Canal para as fontes de 137 Cs e 60 Co FONTE ENERGIA CANAL 137 Cs 663 KeV 349 60 Co 1173,3 KeV 609 60 Co 1333 KeV 687 Na Tabela 3 são mostradas as contagens obtidas por meio das medições com o simulador pescoço-tireoide e sala vazia (background). Tabela 3. Contagens obtidas do simulador pescoço-tireoide e Background durante 2 minutos Fantoma contagens por segundo( cps) Background contagens por segundo (cps) 22472 17268 22376 17826 22766 17674 22448 17686 22756 18024 Com a utilização da Equação 2 e os dados da Tabela 3 foi possível calcular o fator de calibração. O resultado encontrado foi 0,12cpm/Bq. Com relação à Atividade Mínima Detectável, o cálculo foi realizado utilizando-se a Equação 3 e o valor foi 59,44Bq. Esse valor foi comparado às atividades correspondente aos níveis de registro de 1mSv no compartimento tireoide. Em todos os cenários avaliados, apresentou-se menor que a atividade correspondente ao nível de registro em 1, 7 e 14 dias após a incorporação. De forma que esse método de calibração para o radionúclideo 131 I no compartimento tireoide é válido para monitoração interna nesses períodos.
4. CONCLUSÕES A técnica utilizada mostrou-se adequada para avaliação de atividades de 131 I incorporadas por pacientes hipertireoideos. A calibração realizada nesse trabalho é parte fundamental do desenvolvimento de um protocolo de doses individualizadas para o tratamento de pacientes portadores de Hipertireoidismo. Esse protocolo permitirá que as doses fornecidas aos pacientes em tratamento possam ser otimizadas do ponto de vista da proteção radiológica. Pretende-se dar continuidade aos estudos utilizando também medições com outro tipo de equipamento de detecção para futuras comparações. REFERÊNCIAS 1. STABIN, M.G. Fundamentals of Nuclear Medicine Dosimetry. Springer Science+ Business Media, Nashville,2008. 2. OLIVEIRA, R.S. História da Radiofarmácia e as Implicações da Emenda Constitucional N.49. Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas. v.44,n.3,pp378-379 jul/set.,2008. 3. ARAUJO, F. MELO. R.C. REBELO, A.M.O., DANTAS, B.M, LUCENA.E.A.Proposta de Metodologia para tratamento Individualizado com Iodo-131 em pacientes portadores de Hipertireoidismo da Doença de Graves.Radiologia Brasileira,40(6): pp.389-395,2007. 4. ANDRADE V.A., GROSS J.L., MAIA A.N. Tratamento do Hipertireoidismo da Doença de Graves.Arquivo Brasileiro de endocrinologia, v. 45. Dezembro 2001. 5. A Fisiologia da Glândula Tireoide www.jorgebastosgarcia.com.br/endocrino1.html (2012). 6. LOPES, M.H.C.Terapia com 131 I para a resolução do hipertiroidismo doença de Graves: seleção da dose. Arq Bras Endocrinol Metab,v.51,n.7,pp.1031-1033,2007. 7. KALINVAK,J.E;MCDOUGALL,R. How Should the Dose of Iodine-131 Be Determined in the Treatment of Graves Hyperthyroidism? JCEM-The Journal of Clinical Endocrinological and Metabolism, DOI: 101210, pp.975-976, 2002. 8. TRAINO, A.C.; DI MARTINO, F; LAZZERI, M. A dosimetric approach to patientspecific radiodine treatment of Graves disease with incorporation of treatment-induced changes in thyroid mass. Medical Physics, v. 31, No. 7, July 2004. 9. DANTAS, B. M., DANTAS, A. L. A., SANTOS, D. S., CRUZ-SUAREZ, R. IAEA Regional Intercomparison of in vivo Measurements of 131I in the thyroid: The Latin American and Caribbean Experience. Radiation Protection Dosimetry, v. 144, n. 1-4, pp. 291-294, 2011. 10. HEALTH PHYSICS SOCIETY. Performance Criteria for Radiobioassay. HPS N13.30. McLean (1996). 11. GILMORE, G. Practical Gamma-ray Spectometry. 1. Ed. Wiley: London & England (2008) 12. ATOMIC ENERGY AGENCY. Occupational Radiation Protection. Safety Guide N. RS-G-1.1. Vienna (1999a). 13. INTERNATIONAL ATOMIC ENERGY AGENCY. Assessment of Occupational Exposure Due to Intakes of Radionuclides. Safety Guide Nº. RS-G-1.2. Vienna (1999b).