CARACTERIZAÇÃO DE SENSOR ULTRASSÔNICO PARA SISTEMA DE GUIAGEM E NAVEGAÇÃO DE VEÍCULO AGRÍCOLA AUTÔNOMO RAFAEL VIEIRA DE SOUSA 1 DANIEL CESAR BRAZ 2 GIOVANA TRIPOLONI TANGERINO 3 ARTHUR JOSÉ VIEIRA PORTO 4 RESUMO Sensores ultassônicos são comumente utilizados em sistemas de navegação de veículos autônomos e de robôs móveis em ambientes fechados e estruturados como escritórios ou fábricas. A utilização desse tipo de sensor em ambientes abertos e menos estruturados, como o ambiente agrícola, necessita de avaliação. Diante disso, apresenta-se a caracterização e a avaliação do comportamento de sensor ultrassônico para medidas de distância de obstáculos típicos do ambiente agrícola em relação a medidas de referência realizadas em laboratório. Os resultados obtidos permitem estabelecer condições para aplicação desse tipo de sensor em sistemas de guiagem e navegação de veículos autônomos e robôs agrícolas. PALAVRAS-CHAVE: sensor ultrassônico, automação de máquinas agrícolas, sistemas agrícolas autônomos CARACTERIZATION OF ULTRASSONIC SENSOR FOR GUIDANCE AND NAVIGATION SYSTEM OF AUTONOMOUS AGRICULTURAL VEHICLE ABSTRACT Ultrasonic sensors are frequently used in the guidance and navigation system of autonomous vehicles and mobile robots in door applications. Appling those sensors on agricultural machines demands researches for defining the boundaries conditions. It is present the characterization and evaluation of the Polaroid 6500 ultrasonic sensor for measurements in the agricultural environment. The experimental measurements are compared to referential measurements performed under supervised conditions on a laboratory. The results allow establishing operational conditions for its using in agricultural autonomous vehicles (AAV). KEYWORDS: ultrasonic sensor, machinery agricultural automation, agricultural autonomous system. 1 MSc. Eng.a Mecânica, Bolsista de Doutorado Fapesp, Escola de Engenharia de São Carlos-USP Dpto. Eng. Mecânica, Laboratório de Simulação e Controle, Av. Trabalhador São-carlense,400, CEP 13566-590, São Carlos, SP, (16) 273.9432, email: rafael@cnpdia.embrapa.br. 2 Engenheiro Físico, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos-SP 3 Engenheira Eletricista, Escola de Engenharia de São Carlos-USP, São Carlos-SP 4 Dr. Engenharia Mecânica, Professor Titular da Escola de Engenharia de São Carlos-USP.
1. INTRODUÇÃO Novas práticas agrícolas como o Plantio Direto, a Agricultura de Precisão e as práticas que tomam em conta a proteção do meio ambiente trouxeram com as suas evoluções uma série de desafios para a pesquisa. Junto a essa realidade relativamente recente, outros fatores, como o altíssimo custo de mão de obra, o envelhecimento da população rural sem perspectivas de renovação, a necessidade de minimizar a exposição dos operadores a atividades insalubres e a redução dos custos da eletrônica necessária para construção sistemas embarcados, têm incentivado e justificado pesquisas em VAA s e RAM s por empresas como AGCO, John Deer, CNH e Yanmar, e por grupos como os apresentados em Keicher e Seufert (2000), Reid et al (2000) e Torii (2000). Trabalhos como Hague, Southall e Tillett (2002), Southall et al (2002), Åstrand e Baerveldt (2002), Darr et al (2004) e Bak e Jakobsen (2004) têm apresentado soluções viáveis para o desenvolvimento de máquinas agrícolas semi-autônomas ou autônomas que possibilitam operações mais precisas para reduzir custos e minimizar o impacto ambiental de tarefas agrícolas. Sistemas de controle para VAA s e RAM s podem ser divididos em três sub-sistema: percepção, computação e atuação. Constitui um grande desafio para pesquisa desenvolver metodologias e tecnologias para cada um desses estágios pela dificuldade que o ambiente agrícola oferece por suas características topográficas, climáticas e das próprias culturas realizadas (ex. café, milho, laranja). Sensores ultrassônicos são muitos utilizados no sub-sistema de veículos autônomos e robôs móveis em outras áreas. Características como baixo custo, robustez e simplicidade de implementação tornam a sua utilização atrativa para a detecção de objetos e determinação de distâncias em relação a esses objetos. Trabalhos recentes buscam determinar condições para aplicação de sensores ultrassônicos para o sistema de guiagem e navegação de máquinas agrícolas autônomas. Iida & Burks (2002) utilizaram arranjos laterais de sensores ultrassônicos para medir a distância de máquina agrícola em relação às árvores de um pomar, combinando os dados do sensor e de um receptor DGPS, possibilitando a navegação segura entre as árvores. Em Guo et al. (2002) é descrito o desenvolvimento de um sistema baseado em dois sensores ultrassônicos para detectar objetos em movimento e permitir a navegação segura de máquinas agrícolas no campo.
Sob esse contexto, o objetivo deste trabalho é caracterização e avaliação do comportamento de sensor ultrassônico para medidas de distância em relação a obstáculos típicos do ambiente agrícola através da comparação com medidas de referência realizadas em laboratório. Pretende-se com isso estabelecer os parâmetros de operação desse sensor em tais condições e avaliar a possibilidade de sua utilização no VAA que está sendo desenvolvido em projeto de pesquisa cooperativo entre o Departamento de Engenharia Mecânica da EESC-USP e a Embrapa Instrumentação Agropecuária (Porto, 2003). 2. MATERIAIS E MÉTODOS O sistema de guiagem e navegação do VAA em desenvolvimento é composto de vários dispositivos sensores, atuadores e sistemas computacionais que são integrados através de uma rede CAN. A integração desses dispositivos, incluindo o sensor ultrassônico, é efetuada através da Interface CAN Padrão (ICAN). Essa interface é circuito eletrônico microcontrolado que realiza, entre outras funções, a integração dos dispositivos com a rede CAN (Braz et al, 2004). Foi utilizado na caracterização o sensor ultrassônico modelo 6500 da Polaroid (Polaroid, 2004) que permite medir distâncias de 6 (~ 0,15 m) a 35ft (~10,00 m) com um erro absoluto de ± 1%. Esse sensor é composto de uma pastilha cerâmica (elemento sensor) que é conectada a um circuito transdutor que disponibiliza seus diversos sinais de controle e de transmissão de dados ao circuito controlador, nesse caso a ICAN, que os repassa ao pela rede CAN a um PC (Personal Computer) conectado a outra ICAN. O funcionamento do sensor é baseado na reflexão de ondas sonoras sendo que no modo de operação Single-Echo o emissor envia (INIT) 16 pulsos sonoros a uma freqüência de 49,40 khz (ultrassom) que viajam pelo ar a uma velocidade de 0,3048 m a cada 0,90 ms (milisegundos). O sinal de retorno (ECHO) é recebido pelo receptor e condicionado eletricamente pelo circuito transdutor. O tempo ( t) entre a emissão do primeiro pulso e o recebimento do sinal de eco (ECHO) é proporcional à distância do objeto. Para o controle e transmissão das medidas foi desenvolvida uma rotina de programa para o microcontrolador da ICAN (PICF258) e um programa para PC para solicitação, recebimento e armazenamento de dados. A figura 1 mostra um fluxograma geral do programa do microcontrolador e a interface gráfica do programa para PC.
Início Recebe do PC: número de medições e período do BINH (T_BINH) Configuração da interface CAN Recebe dado do PC Sinal INIT e BINH Recepção do ECHO Calculo da distância Envia dado para o PC Fim das medições? Envia para o PC: conjunto de medições realizadas. Fim Figura 1 Fluxograma do programa de controle do transdutor do sensor Polaroid 6500 e interface gráfica do programa para PC para controle das medições. Através de uma sub-rotina do programa do microcontrolador é possível controlar o sensor ultrassônico, efetuando as medições e transmitindo-as ao PC depois de processadas. Para possibilitar medições de distância inferiores a 0,40 m foi implementada a função BINH (Blanking Inhibit), disponibilizada pelo circuito transdutor, para o controle do tempo de atraso entre o sinal INIT e o sinal BINH. A metodologia adotada para avaliação da viabilidade do sensor baseia-se na comparação de alguns parâmetros estatísticos calculados sobre dois conjuntos de medidas. O primeiro conjunto de medições foi realizado em laboratório em relação a um anteparo plano de madeira com dimensões adequadas para uma boa reflexão das ondas ultrassônicas emitidas pelo sensor. O segundo conjunto de medições foi realizado em relação a um anteparo vegetal (planta), simulando condições físicas de superfícies encontradas em uma plantação. As medições foram realizadas, inicialmente, com a planta estática, e posteriormente, em movimento sendo rotacionada em pequenos ângulos de um lado para o outro.em ambos os casos, foram efetuados medições de distância entre o sensor e o anteparo plano para cada
posição diferente. Em cada uma dessas situações foi variado o tempo de atraso do sinal BINH (T_BINH) entre alguns os valores de 0.6 ms a 1.2 ms. A figura 2 mostra a configuração da instrumentação para o segundo conjunto de medidas realizado em relação ao anteparo vegetal. (1) PC (2) Sensor ultrassônico (3) Planta (Anteparo Vegetal) (4) Ponto de referência (3) (1) (2) (4) * Figura 2 Medições de distância com o sensor ultrassônico em relação a um anteparo vegetal d As distâncias foram determinadas previamente com o uso de uma trena. As distâncias foram escolhidas para avaliar o sensor nas distâncias mais comuns em que ele será futuramente empregado. Para a estimativa prévia das distâncias no segundo conjunto de medidas foi adotado como referência um ponto na parte frontal da planta,. 3. RESULTADOS E DISCUSSÕES Conforme descrito na seção anterior, as medições foram processadas antes de serem transmitidas ao PC. Esse processamento consistia no cálculo da distância do sensor ao anteparo a partir da equação (1). D = (UT x V) / (2 x 3,2 x 10-6 ) (1) Onde: D: é a distância do sensor ao anteparo expressa em metros; UT: total de unidades de tempo contadas pelo microcontrolador; V: velocidade do som no ar (338,6667 m/s); 2x3,2 x 10-6 : constante divisora para o valor correspondente da UT em segundos. A figura 3 apresenta a média e o erro relativo (Vuolo, 1991) das 30 medições restantes após a filtragem dos valores discrepantes, efetuadas para cada distância e para cada T_BINH adotado.
Médias (m) 3,00 2,70 2,40 2,10 1,80 1,50 1,20 0,90 0,60 0,30 0,00 valor real 0,6 0,7 0,8 0,9 1,2 3,00 2,00 1,00 0,50 0,30 0,20 0,15 Distâncias (m) Erros relativos (%) 20,00 16,00 12,00 8,00 4,00 0,00 0,6 0,7 0,8 0,9 1,2 3,00 2,00 1,00 0,50 0,30 0,20 0,15 Distâncias (m) Figura 3 Média e erros relativos das medições realizadas para referência Como pode ser observada na figura 3, as medições efetuadas pelo sensor apresentam pequeno erro relativo para medidas superiores a 0,25 m. O valor de T_BINH influencia o comportamento do erro, sendo mais notada essa influência para medidas inferiores a 0,50 m. Para essas distâncias o erro aumenta com o aumento de T_BINH. Observa-se que as melhores medições foram efetuadas com T_BINH de 0,7 ms (valor de T_BINH que obteve um número maior de medidas com baixo erro relativo). As medidas obtidas no segundo conjunto sofreram os mesmos tratamentos para a determinação dos parâmetros estatísticos utilizados na caracterização anterior. A figura 4 apresenta a média das medições realizadas com a planta estática e em movimento, em função da distância e para cada T_BINH. Médias (m) 1,500 1,250 1,000 0,750 0,500 0,7 0,8 0,9 Médias (m) 1,500 1,250 1,000 0,750 0,500 0,7 0,8 0,9 0,250 0,250 0,000 1,50 1,00 0,50 0,20 Distâncias (m) 0,000 1,50 1,00 0,50 0,20 Distancias (m) (a) (b) Figura 4 Média das medições em relação ao anteparo vegetal: (a) anteparo parado e (b) anteparo em movimento. A figura 5 apresenta os valores do erro relativo das medidas em função da distância e para cada T_BINH das medições com o anteparo em movimento.
Erros relativos ( % ) 100,00 80,00 60,00 40,00 20,00 0,00 0,7 0,8 0,9 1,50 1,00 0,50 0,20 Distâncias (m) Figura 5 Erro relativo para as medidas relação ao anteparo vegetal em movimento. De forma geral, os valores tiveram um aumento significativo em relação aos encontrados na caracterização de referência, principalmente para distâncias pequenas (abaixo de 0,50 m). Isso mostra a influência da forma da superfície do anteparo. As medidas de grandes distâncias (0,15 e 0,10 m) possuem pequeno erro considerando-se as condições às quais o sensor foi submetido. Para essas distâncias, o pulso ultrassônico é refletido com maior eficiência, mesmo considerando a concentração de folhas, que é baixa, e o tipo das folhas da planta. O aumento da distância do sensor à planta causa um aumento da área de seção de choque, isto é, da área de incidência, do pulso ultrassônico. Esse fato se deve ao formato do pulso do sensor, que segundo o manual do fabricante, é emitido com uma angulação de ± 15º formando um cone e não um cilindro de base circular. Isso torna maior a probabilidade de um pulso ser refletido por alguma folha da parte frontal para distanciais maiores. Por outro lado, a elevação do erro apresentado pelas medições de pequenas distâncias é causada, provavelmente, pela reflexão do pulso ultrassônico ter acontecido em folhas mais internas ou externas em relação ao ponto de referência de medida na planta. Para melhoria do desempenho do sensor em toda a faixa medida, sugere-se a aplicação do sensor em um arranjo com várias unidades. Isso permitiria a aquisição de medidas em vários pontos da planta, as quais seriam processadas e um valor mais apurado seria fornecido como resultado. Esse fato necessita de testes para sua comprovação.
4. CONCLUSÕES A caracterização do sensor ultrassônico permitiu definir condições para sua aplicação em VAA s. Embora a validação final dependa de implementação prática, os resultados obtidos podem orientar a implementação de um sub-módulo para determinar distâncias em relação a objetos para um sistema de guiagem e navegação de um VAA. Para um melhor aproveitamento desse sensor em um sistema de guiagem e navegação, é proposta a utilização de mais de um elemento sensor compondo um arranjo de sensores ultrassônicos. A integração com outros tipos de sensores (identificação de linhas e objetos por visão com câmera e receptor GPS e odômetros para seguir mapas), também pode trazer benefícios e constituí tema para trabalhos futuros. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAK, T. AND JAKOBSEN, H. (2004). Agricultural robotic platform with four wheel steering for weed detection. Biosystems Engineering, v. 87, n. 2, p.125-136. ÅSTRAND B., BAERVELDT A.-J. (2002). An agricultural mobile robot with vision-based perception for mechanical weed control. Autonomous Robots, v.13, p. 21-35. BENSON, E.; STOMBAUGH, T.; NOGUCHI, N.; WILL, J.;REID, J.F. (1998). An evaluation of a geomagnetic direction sensor for vehicle guidance in precision agriculture applications. ASAE Paper 983203. ASAE. St. Joseph, MI. BRAZ, D.C., SOUSA, R.V., INAMASU, R.Y., A.J.V. PORTO. (2004). Desenvolvimento de uma interface CAN para integração de dispositivos embarcados em máquinas agrícolas. (CD ROM) In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA AGRÍCOLA, 33, São Pedro, 2004. Anais. São Pedro, Sociedade Brasileira de Engenharia Agrícola. DARR, M.J, T.S. STOMBAUGH, S.A. SHEARER AND J.P. FULTON (2004). CAN-based distributed control for autonomous vehicles. Proc.of the 2004 ASAE Annual Meeting. Ottawa, Ontario, Canada. GUO, L., Q. ZHANG, AND S. HAN. (2001). Agricultural machinery safety alert system using ultrasonic sensors. Journal of Agricultural Safety and Health, v. 8, n. 4, p. 385-396. HAGUE,T., SOUTHALL, B. AND TILLETT, N.D. (2002). An autonomous crop treatment robot: part II - real time implementation. International Journal Robotics Research. v. 21, n. 1, p. 75-85. IIDA, M., BURKS, T.F. (2002). Ultrasonic Sensor Development for Automatic Steering Control of Orchard Tractor. In: AMERICAN SOCIETY OF AGRICULTURAL ENGINEERS (ASAE), AUTOMATION TECHNOLOGY FOR OFF-ROAD EQUIPMENTE (ATOE), Chicago, Illinois, USA, 2002.
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