DIVERSIDADE E FREQUÊNCIA DA FAUNA FLEBOTOMÍNEA (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM ÁREAS COM TRANSMISSÃO DE LEISHMANIOSE, NO ESTADO DE GOIÁS

Documentos relacionados
Revista Eletrônica de Biologia

FLEBOTOMÍNEOS DE MUNICÍPIOS DO NORTE DO ESTADO DO PARANÁ, SUL DO BRASIL. Abstract

CONTRIBUIÇÃO AO CONHECIMENTO DA FAUNA FLEBOTOMÍNICA DO ESTADO DE GOIÁS E DISTRITO FEDERAL. II *.

IDENTIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DE FLEBOTOMÍNEOS CAPTURADOS EM ÁREA URBANA MORPHOLOGIC IDENTIFICATION OF PHLEBOTOMINE SANDFLIES CAPTURED IN URBAN AREA

FAUNA FLEBOTOMINEA DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA NA REGIÃO DE SÃO JOÃO DA BOA VISTA - SP

Descritores: Psychodidae. Ecologia de vetores. Leishmaniose mucocutânea, transmissão. Introdução

FLEBOTOMÍNEOS (DIPTERA, PSYCHODIDAE) DE ÁREA DE CERRADO NO MUNICÍPIO DE CORUMBATAÍ, CENTRO-LESTE DO ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL

Flebotomíneos em área de transmissão de leishmaniose tegumentar na região norte do Estado do Paraná - Brasil: Variação Sazonal e Atividade Noturna*

Heloísa Aparecida Machado Naves* Maria Elisa Santos Dourado Carvalho" RESUMO

Avaliação de medidas de controle de flebotomíneos no Município de Lobato, Estado do Paraná, Sul do Brasil

Leishmaniose Tegumentar Americana no Estado de São Paulo: Situação Epidemiológica

FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA - UNIR PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA EXPERIMENTAL - PGBIOEXP. [Autor] [Título]

Flebotomíneos de localidades rurais no noroeste do Estado do Paraná, Brasil. Sandflies in rural localities in northwest Paraná State, Brazil.

Luz e galinhas como fatores de atração de Nyssomyia whitmani em ambiente rural, Paraná, Brasil

Samuel do Carmo Lima Prof. Dr. do Instituto de Geografia - UFU

UNITERMOS: Flebotomíneos. Lutzomyia whitmani. Lutzomyia neivai. Leishmaniose. Ecologia de vetores.

Anexo Parecer IEC

Flebotomíneos do Estado de Tocantins, Brasil (Diptera: Psychodidae)

Study of the sand flies in American cutaneous leishmaniasis area, in the municipality of Alto Caparaó and Caparaó, Minas Gerais State ARTIGO/ARTICLE

SAZONALIDADE DE FLEBOTOMÍNEOS EM ÁREA ENDÊMICA DE LEISHMANIOSE VISCERAL NO MUNICÍPIO DE SOBRAL, CEARÁ, BRASIL

The Sand Fly Fauna (Diptera: Psychodidae: Phlebotominae) of a Focus of Cutaneous Leishmaniasis in Ilhéus, State of Bahia, Brazil

Flebotomíneos (Diptera, Psychodidae) de área endêmica de leishmaniose na região dos cerrados, Estado do Maranhão, Brasil

Magnitude e tendência da Leishmaniose Tegumentar Americana no Estado de São Paulo, Brasil, 1975 a 2008

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE PATOLOGIA TROPICAL E SAÚDE PÚBLICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA TROPICAL ULISSES GOMES DOS SANTOS

ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE. Palavras-Chave: Phlebotominae. Ocorrência. Registro.

HYGEIA, ISSN: Revista Brasileira de Geografia Médica e da Saúde -

FLEBOTOMÍNEOS (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM CUITÉ-PB

Estudo de flebotomíneos (Diptera, Psychodidae, Phlebotominae) na zona urbana da Cidade de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, Brasil,

Rev Saúde Pública 2003;37(5):

Universidade Estadual de Dourados, Rod. Dourados Itaum, km 12, Cidade Universitária, Dourados-MS, Brasil. 3

Fauna de flebotomíneos (Diptera: Psychodidae) em área endêmica de leishmaniose visceral canina na região metropolitana de São Luís MA, Brasil

Contribution to the Knowledge of the Phlebotomine Sand Flies Fauna (Diptera: Psychodidae) of Timóteo Municipality, Minas Gerais, Brazil

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia.

ARTIGO. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 31(4): , jul-ago, 1998.

Semi-Árido (UFERSA). 2 Farmacêutico bioquímico, Mestre em Ciência Animal. UFERSA 3

DESCRITORES: Leishmaniose Tegumentar Americana. Flebotomíneos. Nyssomyia neivai. Nyssomyia whitmani.

Levantamento de dípteros vetores de leishmaniose no Instituto Federal de Minas Gerais Campus Bambuí

Nota Técnica nº 13 LEISHIMANIOSE VICERAL

Epidemiologia da Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA) no Estado de São Paulo. III. Influência da ação antrópica na sucessão vetorial da LTA

Almério de Castro Gomes** Eunice Aparecida Bianchi Galati**

Leishmaniose tegumentar americana: flebotomíneos de área de transmissão, no município de Pedro de Toledo, região sul do Estado de São Paulo, Brasil

Flebótomos (Diptera, Phlebotominae) da Ilha de São Luis, zona do Golfão Maranhense, Brasil

SURVEY OF SANDFLY FAUNA (DIPTERA: PSYCHODIDAE) IN UBERLÂNDIA, MINAS GERAIS STATE, BRAZIL,

do Vale do Araguaia UNIVAR - LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA HUMANA NO MUNICÍPIO DE GENERAL CARNEIRO MATO GROSSO

LEVANTAMENTO DE DÍPTEROS VETORES DE LEISHMANIOSE NO INSTITUTO FEDERAL DE MINAS GERAIS CAMPUS BAMBUÍ

Estudo dos hábitos alimentares de flebotomíneos em área rural no sul do Brasil

Data on sand fly fauna (Diptera, Psychodidae, Phlebotominae) in Itatiaia National Park, Rio de Janeiro State, Brazil

Phlebotominae (Diptera: Psychodidae) em área de transmissão de leishmaniose tegumentar americana no litoral norte do Estado de São Paulo, Brasil

Aspectos ecológicos de flebotomíneos (Diptera: Psychodidae) em área urbana do município de Ponta Porã, Estado de Mato Grosso do Sul

MINISTÉRIO DA SAÚDE FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ INSTITUTO OSWALDO CRUZ. Programa de Pós-Graduação em Medicina Tropical

ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO DOS CASOS DE LEISHMANIOSE EM HUMANOS E CÃES NO MUNICÍPIO DE MINEIROS GOIÁS

Ceclie M.B. BIANCARDI*, Eloy Guillermo CASTELLÓN*

PUBVET, Publicações em Medicina Veterinária e Zootecnia. Incidência de Leishmaniose Tegumentar Americana no Município de Timon/MA

OFICIO CIRCULAR DCV 43/2015. São Paulo, 24 de setembro de Prezados (as) Diretores (as)

Frequency and diversity of phlebotomine sand flies (Diptera: Psychodidae) in Sinop, State of Mato Grosso, Brazil

Descritores: Psychodidae. Leishmaniose mucocutânea, epidemiologia. Ecologia de vetores.

Uso do SIG para o estudo da leishmaniose em Santarém, Pará, Brasil

Carlos Frederico Loiola/ +, Delano Anibal da Silva, Eunice Aparecida Bianchi Galati *

FLEBOTOMÍNEOS (DIPTERA, PSYCHODIDAE) EM FOCOS URBANOS DE LEISHMANIOSE VISCERAL NO ESTADO DO MARANHÃO, BRASIL

Marlisson Augusto Costa FEITOSA ¹, Eloy Guillermo CASTELLÓN ²

THE OCCURRENCE OF PHLEBOTOMINES (Diptera psychodidae) IN A LEISHMANIASIS- ENDEMIC AREA 1

Flebotomíneos (Diptera, Psychodidae) na área de influência da Usina Hidrelétrica (UHE) Serra do Facão, Goiás, Brasil

Caracterização de flebotomíneos em bairros de Sobral, Ceará Phlebotomine sand flies characterization in Sobral s neighborhoods, State of Ceará

Flebotomíneos (Diptera: Psychodidae) coletados em um assentamento rural no Estado do Amapá, Brasil

Study of Phlebotomine Sand Flies (Diptera: Psychodidae) Collected in a Leishmania-Endemic Area of the Metropolitan Region of Belo Horizonte, Brazil

Rev. Colombiana cienc. Anim. 1(2).2009

Flebotomíneos (Diptera, Psychodidae) em reservas florestais da área metropolitana de São Luís, Maranhão, Brasil

Species structure of sand fly (Diptera: Psychodidae) fauna in the Brazilian western Amazon

RESUMO. Palavras-chave: cão, flebotomíneo, enfermidade emergente, zoonose, Leishmania.

11 a 14 de dezembro de 2012 Campus de Palmas

Seasonal variation of Lutzomyia longipalpis in Belo Horizonte, State of Minas Gerais

was positive in 37 (55.2%) of 67 dogs. The results showed that human and canine ACL occur simultaneously

Key words: Phlebotominae - Lutzomyia longipalpis - visceral leishmaniasis - Mato Grosso do Sul - Brazil MATERIALS AND METHODS

artigo original Eduardo Rydan Manoel, 1 e 2 Heloísa Helena Garcia da Silva 1 e 3 e Ionizete Garcia da Silva 1 e 3 RESUMO

Utilização de ferramentas de análise espacial na vigilância epidemiológica de leishmaniose visceral americana Araçatuba, São Paulo, Brasil,

Helena H. TANIGUCHI 1* José Eduardo TOLEZANO 1 Rui LAROSA 1 Carlos R. ELIAS 1 Eunice A. B. GALATI 2

artigo original Francinaldo Soares Silva, Luis Paulo Costa de Carvalho e Janderson Mesquita Souza 1 RESUMO ABSTRACT

Vigilância da Leishmaniose Tegumentar Americana no estado do Rio de Janeiro 01/01/2007 a 07/11/2017

Diversidade e Abundância de Flebotomíneos do Gênero Lutzomyia (Diptera: Psychodidae) em Áreas de Mata do Nordeste de Manacapuru, AM

Fauna flebotomínica (Diptera: Psychodidae) da Serra do Tepequém, Município de Amajarí, Estado de Roraima, Brasil

LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA: ASPECTOS AMBIENTAIS EM ÁREAS DE TRANSMISSÃO NO MUNICÍPIO DE UBERLÂNDIA, MINAS GERAIS, BRASIL

Sand Flies (Diptera: Psychodidae) in the Urban Area of the Municipality of Cianorte, Paraná State, Brazil

VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA DAS LEISHMANIOSES NO MUNICÍPIO DE MONTE MOR, ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL RESUMO

The Phlebotominae Sand Fly (Diptera: Psychodidae) Fauna of Two Atlantic Rain Forest Reserves in the State of Rio de Janeiro, Brazil

Espécies de flebotomíneos (Diptera, Psychodidae) em matas ciliares na transição entre a Amazônia úmida e o Nordeste semi-árido do Brasil

Introduction. Abstract ARTIGO ARTICLE

ARTIGO. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 33(1):11-19, jan-fev, 2000.

de Aguiar 2 1-FUNASA / 2- FIOCRUZ / 3-MNRJ RESUMO

Ocorrência de Flebotomíneos (Diptera: Psychodidae) em Matas de Galeria no Distrito Federal, Brasil

AVALIAÇÃO EPIDEMIOLOGICA DA LEISHMANIOSE VISCERAL NA CIDADE DE IMPERATRIZ, MARANHÃO. Natã Silva dos Santos 1 Graduando em Enfermagem

Marlisson Augusto Costa FEITOSA 1, Eloy Guillermo CASTELLÓN 1

MONITORAMENTO DE MOSQUITOS DE IMPORTÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA EM ÁREAS DE APROVEITAMENTO HIDRELÉTRICO

LENÇÓIS MARANHENSES, NORDESTE, BRASIL. EMERGING FOCUS OF TEGUMENTARY LEISHMANIASIS AROUND PARQUE NACIONAL DOS LENÇÓIS MARANHENSES, NORTHEAST BRAZIL

Palavras-chaves: Doença cutânea, mosquito-palha, doenças tropicais, Leishmania.

Adelson Luiz Ferreira +, Paulo Augusto Sessa, José Benedito Malta Varejão, Aloísio Falqueto

Phlebotomine sandfly species from an American visceral leishmaniasis area in the Northern Rainforest region of Pernambuco State, Brazil

Guia de Serviços Atualizado em 30/04/2019

DISTRIBUIÇÃO DE FLEBOTOMÍNEOS (DIPTERA: PSYCHODIDEA) NA AMAZÔNIA LEGAL ATRAVÉS DE TÉCNICAS DE INFORMATICA E GEOPROCESSAMENTO 1

Transcrição:

ARTIGO DIVERSIDADE E FREQUÊNCIA DA FAUNA FLEBOTOMÍNEA (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM ÁREAS COM TRANSMISSÃO DE LEISHMANIOSE, NO ESTADO DE GOIÁS Flávia Martins l/2, lonizete Garcia da Silva *, Waldomir Alves Bezerra 3, Ivan José Maciel4, Heloísa Helena Garcia da Silva ', Cleverton Garcia Lima ", Perdi Bispo Cantuâria 3, Odilon Silva Ramos 3, João Batisía Ribeiro 3 e Adaguimilson Soares Santos ' RESUMO Apresentamse pela primeira vez a diversidade e frequência de flebotomíneos no Estado de Goiás, capturados em municípios onde ocorreram casos de leishmaniose tegumentar americana (LTA) e visceral (LV) As capturas foram realizadas em quatro dias consecutivos, em cada um dos 38 municípios, no período de outubro de 1999 a abril de 20 Foram utilizadas armadilhas luminosas do tipo CDC, instaladas às 18 horas no peridomícílio, com raio de no máximo 15 metros, aí permanecendo até às 6 horas do dia seguinte, momento em que eram recolhidas Os flebotomineos eram então separados em frascos de vidro e encaminhados ao laboratório de Entomologia para identificação das espécies Foram capturados 7789 flebotomíneos e identificadas 19 espécies, que são apresentadas na ordem decrescente de suas frequências: Lutzomia longipalpis (38,54%), L whitmani (21,83%), L intermédia (19,82%), L leníi (14,29%), L evandroi (2,00%), L sallesi (0,48%), L termitophila (0,42%), L shannoni (0,10%), L migonei (0,%), L davisi (0,%), L goiana (0,09%), L lutziana (0,08%), L lainsoni (0,%), L punctigeniculaía (0,%), L sordetlii (0,%), L monstruosa (0,%), L aragaoi (0,%), L pessoai (0,%), L saulensis (0,%), Lutzomia sp (1,65%) e Brumptomia sp (0,23%) Nos municípios onde ocorreram casos de leishmaniose visceral (LV), a análise de regressão linear mostrou uma associação significativa dos casos de LV e a presença da L longipalpis; nos locais onde se registraram casos de leishmaniose tegumentar americana (LTA), houve uma associação significativa entre esses casos e a distribuição e frequência predominantes de L intermédia L lenti e L whitmani 1 Chefe da Seção de Entomologia do Laboratório Central (LACEN) Secretaria Estadual de Saúde de Goiás Av Contorno 3556, Jardim Bela Vista CEP: 748530 GoiâniaGO 2 Laboratório de Biologia, Fisiologia de Insetos e Xenodiagnóstico, Departamento de Microbiologia, Imunologia, Parasitologia e Patologia do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP) da Universidade Federal de Goiás (UFG) 3 Fundação Nacional de Saúde/Goiânia Rua 82 n 9, Setor Sul, CEP 740830 4 Departamento de Medicina Tropical, Saúde Coletiva e Dermatologia IPTSP/UFG Endereço para correspondência: Rua Delenda Rezende de Melo esq com a l' Avenida, Setor Universitário Caixa Postal 131, CEP 7460, Goiânia, GO Email: ionizete@iptspufgbr Recebido para publicação em /10/20 Revisto em 30/11/20 Aceito em //20 Vol 31 (2V 211224 jul dez 20

DESCRITORES: Phlebotominae Lutzomia longipalpis, Lutzomia intermédia Lutzomia whitmani Lutzomia lerti Leishmanioses INTRODUÇÃO No Estado de Goiás, embora as leishmanioses tegumentar e visceral sejam endémicas (6), pouco se conhece sobre a fauna flebotomínica As informações a esse respeito geralmente são de natureza taxonômica e citam o Estado como local de origem das espécies (4, 8, 10) Inexistem estudos que vinculem as espécies vetoras àquelas parasitoses Com o propósito de ampliar o conhecimento nesse contexto, procurouse, através do estudo da distribuição, diversidade e frequência da fauna flebotomínica em áreas endémicas nesse Estado, obter informações para uma compreensão epidemiológica mais ampla das leishmanioses, com o objetivo de fornecer subsídios ao planejamento das ações de controle de flebotomíneos, principalmente aquelas com controle químico, nas quais os estudos de suscetibilidade das espécies, em relação ao produto a ser utilizado, se fazem necessárias Neste artigo são apresentados estudos iniciais sobre a distribuição e frequência de flebotomíneos, capturados logo após o aparecimento de casos das leishmanioses tegumentar e visceral Essas capturas foram portanto posteriores a descrição dos casos ocorridos MATERIAL E MÉTODOS As capturas foram realizadas em quatro dias consecutivos, em cada um dos 38 municípios goianos, representados na Figura l, no período de outubro de 1999 a abril de 20, obedecendo à origem e à emergência dos casos de leishmaniose As capturas foram feitas com armadilhas luminosas do tipo CDC, instaladas às 18 horas no peridomicílio, com raio de no máximo 15 metros do domicílio, ali permanecendo até as 6horas do dia seguinte No momento em que eram recolhidos, os flebotomíneos eram separados em frascos de vidro e encaminhados ao laboratório de Entomologia Os espécimes capturados foram mortos em acetato de etila e acondicionados em álcool a 70% Posteriormente, eram montados em Berlese, entre lâmina e lamínula, para identificação das espécies Após a identificação taxonômica, de acordo com Young & Dunean (11), os flebotomíneos foram acondicionados em caixas entomológicas, mantidas no museu do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás 2 REVISTA DB PATOLOGIA TROPICAL

^ms ^ SF~~^^1"'l f\ú<!~h^l" Rí J! vf*m*^m Municípios com liansmissio de leishmaniose Mimcipios não estudados figura I Municípios com transmissão de leishmaniose tegumentar e/ou visceral, no Estado de Goiás, nos quais foram realizadas as coletas de flebotomíneos, entre as latitudes 13 13' " e 18 ' 50", e as longitudes 46* 21' 22" e 50 53' 8" Usouse o teste quiquadrado, a 5%, para analisar as diferenças de frequências entre machos e fêmeas de flebotomíneos A análise de regressão linear simples foi feita entre a incidência de leishmaniose em cada município e a frequência das espécies determinadas de flebotomíneos RESULTADOS No período de 1999 a 20 foram notificados 969 casos de leishmaniose tegumentar americana (LTA) e confirmados 53 casos de leishmaniose visceral (LV) (Tabela l e Figura 2) Nas mesmas localidades foram capturados 7789 espécimes de flebotomíneos, dos quais 30 eram de L longipalpis As 15 espécies identificadas são apresentadas na ordem decrescente de suas frequências: Lutzomia longipalpis (38,54%), L whitmani (21,83%), L intermédia (19,82%), L lenti (14,29%), L evandroi (2,00%), L sallesi (0,48%), L termitophila (0,42%), L shannoni (0,10%), L migonei (0,%), L davisi (0,%), L goiana (0,09%), L lutziana (0,08%), L lainsoni (0,%), L punctigeniculata (0,%), L sordellii (0,%), L monstruosa (0,%), L aragaoi (0,%), L pessoai (0,%), L saulemis (0,%), Lutzomia sp (1,65%) e Brumptomia sp (0,23%) (Figuras 3, 4, 5, 6 e 7) Vol 31 (l); 211224 juldez 20 213

Tabela 1 Frequência das espécies de flebotomíneos capturados em áreas de transmissão de leishmanioses no Estado de Goiás, no período de 1999 a 20 L Lutzomia Í OR 09 to II 13 14 15 16 18 Município Aragarfas Aranuapaz Bela Vista Bom Jardim Campestre Campos Verdes Carmo do Rio Verde Catalão Colmas do Sul Criicás Cumarí Davinópolís Doverlflndia Flores de Goiás Goiás Goiatuba Guapo Itumbiara 20 Mambaí 21 Maurilíndia 22 Minaçu 23 Montividiu do Norte 24 Morro AKudo 25 Mundo Novo 26 Mutunòpolis 27 Niquelãndia 28 Nova Crixás 29 Porangalu 30 Posse 31 Qirinópolis 32 Rio Verde J3 São Domingos 14 São João D1 Aliança 35 S Miguel do Araguaia 36 S i Ivan ia 37 Uriapum 38 Uru açu N de casos LTA LV 16 jg 10 25 [6 3S 34 41 23 26 38 49 II 32 25 23 165 75 13 26 53 24 46 40 28 37 08 11 LI d1 1«158 6 36 340 310 57 41 H 1 1 1 479 33 09 13 58 32 281 100 08 26 08 38 23 191 53 U d1 20 10 72 09 185 4 22 67 42 08 39 08 87 28 09 08 L! L longipalpif L3 L intermédia L5 L evunilroi L7 L termilophila L9 L mígonci L! 1 L goiiuui L2 L whitmani L4 L lentí L6 L snllesi LS L shannoni LIO L ilavisi V 111 09 19 231 139 139 26 11 16 48 58 08 4 13 U d1 98 108 2 84 20 237 31 20 32 19 0? 162 35S U 2 29 ÍA 2 1 60 230 ID 15 27 52 0 V 09 15 43 50 14 97 43 22 li g 33 1 10 37 16 (f L? d1 v 08 LS d" '±ra T" d1 19, LIO 3! LU d1 0! _ T*

n? m os Município Bela Vista N" de casos LTA 16 10 25 16 L Â 2 V i 2 < v ^ / 4 V / Í d V L o1 (> V L o1 7 ' 2 <8 V Lil L '0 <S 9 J v i i L 3!, / os 09 11 13 IS 16 18 19 20 21 23 24 25 26 28 29 30 31 33 34 35 36 37 Catalio Colinas do Sul Cumari Doverlàndia Goiás Goiatuba Guapo liumbiara Jataí Mambai Montividiu do Norte Mutunópolis Niquelindia Porangatu Posse Qirinópolis Rio Verde São Domingos Sio Joio PAliança S Miguel do Araguaia Silvinia 3Uniaçu 34 23 26 38 49 54 11 25 23 75 13 26 53 24 46 40 28 37! 28 ; : í 1 : L ' p : ^í^ L LI3 L lutziana L lainsoni LU LIS L pancligeniculala L sordellil 116 LI7 L monstruosa L aragaioi US L/9 L [ressoai L siiuleiisis L20 L2I Lnt:oai\a s/> Brumptonmi

Nte Elbdodli [ Sflfn Cava Dl l «SCoi«DiòoH 10 Oura SÓ Cosoi (B) N4o Fnuitoclo Dr 4 ai i Com SmCoM EZ D» ' o* ' Com fclcob D> ai> > fasri D l D i» 11 Cmn Figura 2 Distribuição e frequência de casos de leishmaniose no Estado de Goiás, nos municípios com transmissão (A) Tegumentar Americana; (B) Visceral 216 REVISTA DE PATOLOGIA TROPICAL

1 «J70[iMo D? imxietfctai iinminbpmb Oe 11 o» ÍO E«*o i Dl 3Í1 o» '70 Eiffcirne (0 NõcEshiòodo H[> íl ou líoewkim ieoen M!5ÍDil7l«!70Eipfcini t* l omoeipfciinb blln*70e!mriliwl B De]7 am70essseit Figura 3 Distribuição e frequência de flebotomíneos no Estado de Goiás, nos municípios com transmissão de leishmaniose (A) Lutzomia longipalpis; B) Lutzomia sallesi; (C) Lutzomia termitophila; (D) Lutzomia lenti Vol 31 (1) 211224juldex 20 2

Figura 4 Distribuição e frequência de flebotomíneos no Estado de Goiás, nos municípios com transmissão de leishmaniose (AJ Lutzomia evandroi; B) Lutzomia sallesi; (C) Lutzomia termitophila; (D) Lutzomia shannoni 218 REVISTA DE PATOLOGIA TROPICAL

" Nóo Esbdodo ] Não Encontrado M De l até 3 Espécimes De 4 oié 6 Espécimes ID] Não Estudado Del sle 3 Eipecirrfí H Ete 4 até 6 bpéames Figura 5 Distribuição e frequência de flebotomineos no Estado de Goiás, nos municípios com transmissão de leishmaniose (A) Lutzomia migonei; B) Lutzomia davisi; (C) Lutzomia goiana; (D) Lutzomia lutziana Vol 31(1); 211224 juldez 20 219

(B) Não Estudado Nõo Encontrado até 3 :s5í; es De 4 ai* 6 Espkims Figura 6 Distribuição e frequência de flebotomíneos no Estado de Goiás, nos municípios com transmissão de leishmaniose (A) Lutzomia puctigeniculata; B) Lutzomia sordellii; (C) Lutzomia monstruosa; (D) Lutzomia aragaoi 220 REVISTA DE PATOLOGIA TROPICAL

(BI Não Esludndo De l ali 3 Espécime! De 4 olé 6 Espécimes Mão [siudodo Não Encontrado ' De l olé 3 Espécimes IDe 4 ale 6 Espfcimes Figura 7 Distribuição e frequência de flebotomíneos no Estado de Goiás, nos municípios com transmissão de leishmaniose (A) Lutzomia pessoai; B) Lutzomia saulensis; (C) Lutzomia lainsoni Vol 31 (l) 211224 juldez 20 221

A espécie que apresentou a maior distribuição geográfica em Goiás, nas áreas com transmissão de LTA, foi L whitmani, que foi registrada em 36 dos 38 municípios com casos notificados, o que significa que essa espécie apresenta uma distribuição correspondente a 94,7% dos municípios estudados Na sequência, as espécies de flebotomíneos são apresentadas na ordem decrescente de suas distribuições: L lenti (71,1%), L intermédia (63,2%), L sallesi (36,8%), L termitophila (34,2%), L evandroi (28,9%), L shannoni (21,1%), L migonei (10,5%), L davisi (10,5%), L goiana (7,9%), L lutziana (10,5%), L lainsoni (0,%), L punctigeniculaía (2,6%), L sordellii (5,3%), L monstruosa (5,3%), L aragaoi (2,6%), L, pessoai (5,3%), L saulensis (5,3%) Nos municípios onde ocorreram casos de leishmaniose visceral, houve uma correlação positiva com a frequência predominante de L longipalpis (Tabela l e Figura 3) Naqueles municípios onde ocorreram os casos de leishmaniose tegumentar americana houve correlação com a distribuição e frequência de L whitmani, L lenti e L intermédia (Tabela l e Figura 3) A frequência dessas espécies corresponde a 54,9% de todos flebotomíneos capturados A quantidade capturada de machos foi significativamente maior do que a das fêmeas Naquelas espécie com frequências muito baixas, como L aragaoi, L lainsoni L lutziana, L monstruosa, L pessoai, L punctigeniculaía, L saulensis, L sordellii, L shannoni e L termitophila, foram capturadas apenas fêmeas (Tabela 1) DISCUSSÃO Os casos de leishmaniose tegumentar americana (LTA) eram quase que exclusivamente originários de ambiente rural (4), mas com as modificações do meio ambiente para introdução de diversos cultivares, muitas espécies de flebotomineos se adaptaram às áreas modificadas pelas atividades anrrópicas, gerando características diferentes à transmissão dessa doença Neste estudo, 48,8% dos casos de LTA ocorreram em ambiente rural, circundado por vegetação típica de cerrado; 41,5%, em áreas modificadas para a agricultura; 9,8%, em áreas urbanas Pelas características de execução deste trabalho, não foi possível a comprovação dos vetores, no entanto, as espécies L whitmani, L intermédia e L lenti mostraram uma associação significativa com a ocorrência dos casos Estudos mostram uma correlação dos fatores ambientais associados à distribuição e frequência de L whitmani, L intermédia, L pessoai, L migonei, que apresentam importância epidemiológica em locais onde já se registraram casos de leishmaniose (3) Nas áreas onde ocorrem os casos de LTA no Brasil, o papel vetorial tem sido atribuído às espécies L intermédia L, whitmani, L migonei, L pessoai e L fischeri (l, 2, 3, 4 e 5) Embora não se atribua a transmissão da 222 REVISTA DE PATOLOGIA TROPICAL

LTA a uma única espécie de flebotomineo, existe, no entanto, uma preponderância vetorial da primeira espécie no ambiente antrópico e das outras no ambiente extradomiciliar (l, 2, 3, 4 e 5) Neste trabalho, todas as coletas foram realizadas no ambiente domiciliar, contudo as quatro primeiras espécies supracitadas ocorreram em diferentes combinações de simpatria Apenas L fischeri não foi encontrada nas áreas com transmissão, no entanto, L lenti aparece no ambiente antrópico, apresentando a segunda maior distribuição entre as espécies identificadas As citações dessa espécie referemse ao ambiente extradomiciliar, sendo considerada sem valor epidemiológico para a LTA Neste trabalho, os dados da distribuição e frequência de flebotomíneos foram obtidos logo após a notificação de casos das leishmanioses Mesmo sendo circunstancial, os dados mostraram uma associação significativa da distribuição e frequência de L lenti com os casos de LTA Isso sinaliza a necessidade de se realizarem estudos complementares para comprovação dessa espécie através da infecção natural (1,2, 7) Nesse sentido, estudos subsequentes estão sendo realizados para demonstrar a participação dessa espécie na cadeia de transmissão de LTA ABSTRACT Diversit and frequenc of the phlebotomine fauna in transmission áreas of leishmaniasis, in the state of Goiás, Brazil In this stud diversit and frequenc of the phlebotomines in the state of Goiás is presented for the first time Captures were performed in those districts where human american cutaneous and visceral leishmaniasis (ACL and VL) cases were described previousl Captures were carried out in four consecutive das in each of the 38 districts, from October 1999 to April 20 Light CDC kind traps were used for captures, installed at 6 pm around the houses, at maximutn distance of 15 meters, remaining there until 6 am, on the following da, when the were removed Phlebotomines were then separated in small glass containers and sent to the laborator of Entomolog for identification A total of 7,680 phlebotomines were captured and 19 species were identified The following species were found, in decreasing order of their frequenc: Lutzomia longipalpis (3854%), L whilmani (2183%), L intermédia (1982%), L lenti (1429%), L evandroi (200%), L sallesi (8%), L termitophila (2%), L shannoni (0%), L migonei (2%), L davisi (0%), L goiana (009%), L lutziana (008%), L lainsoni (0%), L punctigeniculata (0%), L sordellii (0%), L monstruosa (0%), L aragaoi (0%), L pessoai (0%), L saulensis (0%), Lutzomia sp (165%) and Brumptomia sp (3%) In the counties where cases of visceral leishmaniasis were registered, the linear regression analsis showed a significant association between the cases of VL and the Vol 31(1) 211224juldez 20 223

presence of L longipalpis On those with cases of ACL, a significant association between them and lhe predominant frequenc of L intermédia, L leníi and L whitmaniwas established KEYWORDS: Phlebotominae Lutzomia longipalpis Lutzomia intermédia, Luízomia whitmani Lutzomia lenti Leishmaniases REFERÊNCIAS 1 Azevedo ACR, Rangel LF, Costa EM, David J, Vasconcelos, AW, Lopes UG Natural infection of Luízomia (Nssomin) whitmani (Antunes & Coutinho, 1939) b Leishmania of the Braziliensis complex in Baturité, Ceará Slate, Northeastem Brazil Mem Inst Oswaldo Cru284(supiIV):l%, 1989 2 Azevedo ACR, Rangel EF, Queiroz RG Lutzomia migonei (França, 1920) naturall infected with peripiarian flagellates in Batutité, a focus of leishmaniasis in Ceará State, Brasil Mem Inst Oswaldo Cruz 85: 479, 1990 3 CamargoNeves VLF, Gomes AC, Antunes JLF Correlação da presença de espécies de flebotomineos (Diptera, Pschodidae) com registros de casos da leishmaniose tegumentar americana no Estado de São Paulo, Brasil Rev Soe Brás Meei Trop 35: 29'93, 20 4 Forattini OP Entomologia Médica 4 volume Ed Edgard Blucher Ltda São Paulo 1973 658 p 5 Forattini OP, Patolli DGB, Rabello EX, Ferreira AO Infecção natural de flebotomineos em foco enzoólico de leishmaniose tegumentar no Estado de São Paulo, Brasil Rev Saúde Pública 6:41\435, 1972 6 FUNASA Vigilância Epidemiológica Casos confirmados segundo o período de diagnóstico e local de residência, por unidade federada, Brasil, 198020 http://wwwfunasagovbr, 20 7 Luz E, Membrive N, Castro EA, Dereure J, Pratlong J, Dedet A, Pande A, ThomazSoccol V Luízomia whilmani (Diptera: Pschodidae) as vector of Leishmania (V) braziliensis in Paraná State, southem Brazil Anu Trop Med Parasitai 94:623631, 2000 8 Martins AV, Williams P, Falcão AL American Sand Flies (Diptera Pschodidae, Phlebotominae) Academia Brasileira de Ciências, Rio de Janeiro, 1978 195 p 9 Teodoro U, Silveira TGV, Santos DR, Santos ES, Santos AR, Oliveira O, Hiihl JB Frequência da fauna flebotómica no domicilio e em abrigos de animais domésticos no peridomicílio, nos municípios de Cianorte e Doutor Camargo Estado do Paraná Brasil Rev Paiol Trop 50:209223, 20 10 Young DG, Duncan MA Guide to the identification and geographic distribution of Lutzomia sand flies in México, the west Indies Central and South America (Diptera, Pschodidae) Associated Publishers, Gainesville, 1994 REVISTA DE PATOLOGIA TROPICAL