PARÂMETROS DA CINÉTICA DE PRECIPITAÇÃO DE FASE INTERMETÁLICA EM UM AÇO INOXIDÁVEL SUPERDUPLEX UNS S32750 C. R. D. Trapani *, F. T. Marques, José Francisco Moreira Pessanha, H. M. Kohler e M. G. Diniz Rua Fonseca Telles 121, São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ, 20940-240, Brasil * * claratrapani@hotmail.com Universidade do Estado do Rio de Janeiro. RESUMO As propriedades dos aços inoxidáveis superduplex podem ser prejudicadas pelo surgimento de fases deletérias em sua microestrutura. Entre elas existe a fase sigma, que surge a partir da ferrita na interface ferrita/austenita quando o aço é exposto à faixa de temperatura entre 650ºC e 900ºC, reduzindo sua tenacidade e sua resistência à corrosão. Os ciclos térmicos ao qual o aço é submetido é um dos fatores que ditam a quantidade desta fase intermetálica que irá se precipitar. O objetivo deste trabalho foi determinar os parâmetros da cinética de precipitação da fase sigma em um aço inoxidável superduplex SAF 2507 submetido a tratamentos térmicos a 600 C, 650ºC, 700ºC, 750 C, 800 C e 850 C. Foram utilizadas a ferritoscopia e a equação de Johnson-Mehl-Avrami-Kolmogorov (JMAK). Foi determinada a energia de ativação do processo (Q) que está associada à transformação da fase ferrita em fase sigma. Palavras-chave: Aço superduplex, fase sigma, Johnson-Mehl-Avrami-Kolmogorov, energia de ativação. 4124
INTRODUÇÃO Os aços inoxidáveis duplex e superduplex são ligas Fe-Cr-Ni-Mo-N, contendo até 0,3% de nitrogênio na forma atômica, que apresentam uma resistência à corrosão similar a das ligas de cobre e com uma resistência mecânica superior. As boas propriedades destes aços são atribuídas à sua microestrutura de proporções praticamente iguais de ferrita e austenita, e à presença dos elementos de liga Cr, Mo e N. Tais características os fazem ser mais indicados em determinadas aplicações do que os aços inoxidáveis convencionais (1-4). Há um consenso que o estudo da cinética de precipitação de fases deletérias nos aços duplex e superduplex se faz necessário, uma vez que tais fases sempre podem aparecer, dependendo da história termo-mecânica do mesmo, a fim de avaliar parâmetros e mecanismos que controlam este processo e que irão estabelecer as melhores condições para sua aplicação. A fase sigma é considerada a mais prejudicial para estes aços (3,5). O objetivo foi estudar a cinética de precipitação da fase sigma a partir da fase ferrita, em um aço superduplex SAF 2507(designação UNS S32750), através de medidas experimentais com ferritoscópio e modelagem matemática baseada na equação de Johnson-Mehl-Avrami-Kolmogorov (JMAK), quando submetido a tratamentos térmicos entre 600 e 850 ⁰C. Foram analisados os mecanismos de precipitação e determinados os parâmetros da equação JMAK, incluindo a determinação da energia de ativação do processo que está associada à transformação da fase ferrita em fase sigma (2,5,6). MATERIAIS E MÉTODOS Foram utilizadas 84 amostras com 20 mm de altura obtidas a partir de um tubo de aço superduplex SAF 2507 com 20 mm de diâmetro externo e 2 mm de espessura, sem emendas, cujas especificações atendem a ASTM A-789 (7). Foram gerados 6 grupos conforme a Tabela 1. 4125
Tabela 1- Grupos de amostras STT (sem tratamento térmico 12 amostras); de 1 até 6 (tratadas termicamente nos tempos de 5, 15, 20, 30, 40 e 60 minutos; 2 amostras para cada tempo total de 12 amostras por grupo). Grupo Temperatura ( C) Tempos (min) STT STT N/A 1 600 5, 15, 20, 30, 40 e 60 2 650 5, 15, 20, 30, 40 e 60 3 700 5, 15, 20, 30, 40 e 60 4 750 5, 15, 20, 30, 40 e 60 5 800 5, 15, 20, 30, 40 e 60 6 850 5, 15, 20, 30, 40 e 60 Os tratamentos térmicos foram conduzidos em um forno tipo mufla EDG 1800-3P com termopar no interior e atmosfera ambiente e quantificação da fase magnética ferrita de cada corpo de prova foi realizada através do FERITSCOPE FMP30 (Bivolt, 50-60 Hz, 150 ma). Foi obtido o valor percentual médio da fase ferrita para 12 amostras sem tratamento térmico (STT), o que permitiu quantificar a fase austenita (γ) inicial nas amostras STT, conforme a equação. O valor médio inicial de austenita encontrado foi de 42,9%. A quantidade de fase γ foi considerada constante para todos os testes, uma vez que a transformação era de ferrita em fase sigma (2,5,8). As frações transformadas da fase ferrita em fase sigma foram estimadas a partir do percentual original em relação ao percentual residual da ferrita após cada tratamento térmico conforme a Equação (A). Para estudo da cinética de transformação da fase sigma foi avaliado o comportamento da fração volumétrica (f) ao longo do tempo de exposição em cada temperatura testada através da Equação JMAK linearizada (B). Foram determinados, a partir da obtenção do parâmetro de JMAK e da equação de Arrhenius, o valor da energia de ativação Q (J/Mol K) e o da constante k 0, características da cinética de transformação da fase sigma no aço estudado. Arrhenius descreve a cinética de processos termicamente ativados conforme a Equação (C) (2,5,6). 4126
RESULTADOS E DISCUSSÃO Observou-se que a ferrita diminuiu ao longo do tempo e para todos os tratamentos térmicos realizados. A Figura 1 apresenta a variação da fração volumétrica de ferrita ao longo do tempo para os grupos submetidos a tratamentos térmicos de 1 até 6. Figura 1- Variação da fração volumétrica de ferrita ao longo do tempo para todas as temperaturas testadas: Grupo 1-600ºC; Grupo 2-650ºC; Grupo 3-700ºC C; Grupo 4-750ºC; Grupo 5-800ºC e Grupo 6-850ºC. O aumento da fração volumétrica f da fase sigma ao longo do tempo, a partir do consumo de fase ferrita, pôde ser quantificado. A Fig. 2 apresenta os resultados obtidos para os grupos de 1 até 6. Figura 2 - Variação da fração volumétrica de sigma ao longo do tempo para todas as temperaturas testadas: Grupo 1-600ºC; Grupo 2-650ºC; Grupo 3-700ºC C; Grupo 4-750ºC; Grupo 5-800ºC e Grupo 6-850ºC. O surgimento da fase sigma foi exponencialmente acelerado em temperaturas mais altas. A Figura 3 apresenta os resultados obtidos para a equação JMAK para todas as temperaturas testadas através dos valores de f correlacionados. 4127
Figura 3 Cinética de precipitação da fase sigma com dados experimentais correlacionados segundo equação JMAK. Os valores de n (coeficiente angular das retas JMAK), conhecido como expoente de Avrami, e k - taxa de transformação da fase sigma numa dada temperatura - da equação JMAK puderam ser obtidos (Tabela 2). Tabela 2 - Expoente n e fator k experimentais da equação JMAK para a formação da fase sigma a partir da ferrita para o UNS S32750. Temperatura (ºC) 600 650 700 750 800 850 n 0,327 0,274 0,243 0,339 0,669 0,652 k 0,0119 0,0378 0,0741 0,0457 0,0092 0,0185 O valor do expoente de Avrami (n) indica aspectos relacionados à fase precipitada. Por exemplo, valores de n entre 0,5 e 2,5 indicam que o crescimento do grão ocorreu por difusão controlada e que a fase gerada precipita em forma de agulhas e plaquetas longas distantes entre si (5,9). Os valores de n encontrados mostraram uma significativa variação entre dois grupos distintos, um com valores de n variando entre 0,243 e 0,327, uma situação de transição com n = 0,339, e outro com n entre 0,652 e 0,669. Sendo assim, foi aplicado um tratamento matemático bimodal aos resultados obtidos, conforme Tabela 3. Tabela 3 - Expoente n e fator k experimentais da equação JMAK recalculados considerando comportamento bimodal com transição. Temperatura 600 650 700 750 800 850 (ºC) n 0,281 0,339 0,661 k 0,0166 0,0321 0,0542 0,0457 0,0092 0,0185 4128
Os parâmetros da Tabela 3 passaram a definir a equação JMAK. A Figura 4 resulta das equações recalculadas e dos valores n e k recalculados. Figura 4: Cinética de precipitação considerando três valores distintos de n (comportamento bimodal, com uma transição à 750 C ou 1023K). t/t é o tempo adimensional ou tempo/tempo. A energia de ativação determinada para ambas as faixas foi a mesma (antes e após 750⁰C): Q = 96,97 kj/mol. Associados a este comportamento bimodal, dois valores para a constante k 0 foram determinados. Para as temperaturas de 600 ⁰C, 650 ⁰C e 700⁰C, k 0 = 9491,50 e para as temperaturas de 800⁰C e 850 ⁰C, k 0 = 539,50. A taxa de surgimento da fase sigma obedeceu, então, às Equações (D) e (E). (D) (E) CONCLUSÃO Pôde-se concluir que a cinética de precipitação de sigma tem sua taxa aumentada à medida que os tempos e temperaturas se tornam maiores e com mecanismos distintos abaixo e acima de 750 ⁰C. Isto indicou que temperaturas mais elevadas oferecem condições mais favoráveis à formação de sigma. A partir da equação JMAK, na faixa entre 600 ⁰C a 850 ⁰C, a melhor análise realizada está associada a 4129
três valores de n relacionados às faixas de temperatura de 600 ⁰C a 700 ⁰C e de 800 ⁰C a 850 ⁰C e uma faixa de transição a 750 ⁰C. Assim, de 600 ⁰C a 700 ⁰C o valor de n é 0,281, a 750 ⁰C n=0,339 e por fim, entre 800 ⁰C e 850 ⁰C n=0,661. Estes valores de n indicam que o crescimento do grão ocorreu por difusão controlada, sendo que a morfologia desta precipitação provavelmente muda de estruturas lamelares da fase sigma (entre 600 e 700 C) para morfologias maciças (formadas a 800 C e 850 C), e estes resultados justificariam a adoção do comportamento bimodal como uma abordagem mais precisa do problema. REFERÊNCIAS 1. MARTINS, M.; CASTELETTI, L.C.; HARA, P.L.T. Caracterização Microestrutural e Comportamento à Corrosão do Aço Inox Super Duplex ASTM A890 GR6A. In: 59 Congresso anual da ABM. São Paulo: [s.n.]. 2004. 2. MARTINS, M.; CASTELETTI, L.C. Aços Inoxidáveis Duplex e Super Duplex Obtenção e Caracterização. Applied Surface Science, São Carlos, 15 de Janeiro de 2009. Materials Characterization, Volume 60, 792-795 3. MARTINS, M.; CASTELETTI, L.C. Caracterização Microestrutural do Aço Inoxidável Super Duplex ASTM A890 Grau 6A. In: 12 CONAF - Congresso de fundição. São Paulo: [s.n.]. 2005. 4. CERVO, R.; FERRO, P; TIZIANI A. Annealing temperature effects on super duplex stainless steel UNS s32750 welded joints. I: microstructure and partitioning of elements. Journal of Materials Science, Vicenza, 19 de fevereiro de 2010. Volume 45, 4369-4377. 5. VIANNA, L.; CAROLINA, R. Estudo da Cinética de Formação da Fase Sigma em um Aço Inoxidável Duplex 2205. Dissertação (Mestrado em Engenharia Metalúrgica) Universidade Federal Fluminense, Volta Redonda, 2013 6. CALLISTER, W.D; RETHWISCH, D.G. Fundamental of Materials Science and Engeneering, LTC; 2007. 721 p. 7. ASTM A 789 / A 789M 01a. Standard Specification for Seamless and Welded Ferritic / Austenitic Stainless Steel Tubing for General Service. ASTM American Society for Testing and Materials. Philadelphia, USA, 2001. 4130
8. BRAVO, I.M.; ZEPEDA, C.M.; RODRÍGUEZ, J.S.; HERNÁNDEZ, A.A. Evolución Microestructural de un Acero Inoxidable Superdúplex Bajo Ciclos Térmicos de Corta Duración. Soldagem e Inspeção, 10 de setembro de 2010. Volume 15, 242-249. 9. MAGNOBOSCO, R. Kinetics of Sigma Phase Formation In a Duplex Stainless Steel. Materials Research, 14 de janeiro de 2009. Volume 12, No. 3, 321-327. KINETIC PARAMETERS OF INTERMETALLIC PHASE PRECIPITATION IN A SUPER DUPLEX STAINLESS STEEL UNS S32750 ABSTRACT The properties of super duplex stainless steels can be damaged by the appearance of deleterious phases in their microstructure. Among them there is the sigma phase, which arises from the ferrite in ferrite / austenite interface when the steel is exposed to the temperature range between 650 C and 900 C, reducing their toughness and resistance to corrosion. The thermal cycle to which the steel is subjected is one of the factors that dictate the amount of this intermetallic phase that will precipitate. The aim of this study was to determine the kinetic parameters of the sigma phase precipitation on a SAF 2507 super duplex stainless steel subjected to heat to 600 C, 650 C, 700 C, 750 C, 800 C and 850 C treatments. The equation of Johnson-Mehl- Avrami-Kolmogorov (JMAK) and the feritscope were used. The activation energy of the process that is associated with the transformation of ferrite phase into sigma phase was determined. Keywords: super duplex steel, sigma phase, Johnson-Mehl-Avrami- Kolmogorov, activation energy. 4131