AVALIAÇÃO AMBIENTAL ESTRATÉGICA COMO INSTRUMENTO PARA A PROTEÇÃO AMBIENTAL E ORDENAMENTO TERRITORIAL

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Transcrição:

AVALIAÇÃO AMBIENTAL ESTRATÉGICA COMO INSTRUMENTO PARA A PROTEÇÃO AMBIENTAL E ORDENAMENTO TERRITORIAL Strategic environmental assessment as an instrument for environmental protection and territorial ordinance Nelci Gadêlha de Almeida 1 Francisco Leorne de Sousa Cavalcante 2 Luana Karla Bezerra Ferreira 3 Renata do Nascimento Martins 4 Carla de Freitas Passos Vasconcellos 5 Hermógenes Henrique Oliveira Nascimento 6 RESUMO: O presente trabalho trata de um tema que vem ganhando grande proporção no cenário das Políticas Públicas: a Avaliação Ambiental Estratégica. A AAE tem aplicabilidade interdisciplinar, tornando-se um importante instrumento de política pública de proteção ao meio ambiente, em virtude de proporcionar análise e avaliação de impacto de ações e consequências ambientais nos níveis mais estratégicos de decisão das Políticas, Planos e Programas PPP s de intervenção estatal. A ideia do artigo é demonstrar como a AAE pode auxiliar, antecipadamente, os tomadores de decisão na identificação, avaliação e controle dos efeitos positivos e negativos, que as decisões estratégicas que envolvem o fortalecimento da gestão pública e integrada de um conjunto de políticas, podem desencadear no meio ambiente e na sustentabilidade do uso dos recursos naturais, com foco na proteção ambiental e no ordenamento territorial. Palavras-chave: Avaliação Ambiental Estratégica; Proteção Ambiental e Ordenamento Territorial; Políticas Públicas ABSTRACT: The present work deals with a topic that has been gaining great importance in the scenario of Public Policies: the Strategic Environmental Assessment. The SEA has interdisciplinary applicability, becoming an important instrument of public policy for the protection of the environment, by providing analysis and evaluation of the impact of actions and environmental consequences in the most strategic levels of decision of the Policies, Plans and Programs - PPP s - Intervention. The idea of the article is to demonstrate how the SEA can help decision-makers in the identification, evaluation and control of positive and negative effects in advance, that strategic decisions that involve strengthening the public and integrated management of a set of policies can Environmental and sustainable use of natural resources, focusing on environmental protection and land use planning. Keywords: Strategic Environmental Assessment; Environmental Protection and Land use Planning; Public Policy 1 Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará. nelci.gadelha@sema.ce.gov.br 2 Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará. leorne.sousa@sema.ce.gov.br 3 Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará. luana.bezerra@sema.ce.gov.br 4 Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará. renata.martins@sema.ce.gov.br 5 Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará. carla.freitas@sema.ce.gov.br 6 Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará. henrique.sampa@gmail.com 62

1. INTRODUÇÃO A Avaliação Ambiental Estratégica AAE é o termo usado para descrever o processo de avaliação dos impactos ambientais de ações estratégicas que ocorrem em todos os níveis decisórios governamentais que precedem a fase de projetos específicos. Ou seja, é uma forma de análise e avaliação de impacto de ações e consequências ambientais nos níveis mais estratégicos de decisão das Políticas, Planos e Programas PPP s de intervenção estatal, sejam setoriais, regionais, ou em áreas programáticas. Em relação ao nível estratégico em que a AAE tem sido utilizada, destacam-se os programas (majoritariamente aqueles associados a solicitações de financiamento) e aquilo que no Brasil tem sido referido como projetos estruturantes no contexto do PAC (Figura 1). Definidos como intervenções que provocam alterações em cadeia numa dada situação econômica, ambiental, social levando a um estágio superior de sua evolução (MMA, 2002, p. 44), a utilização da AAE para estes objetos têm sido apontada como controversa por tratar de um momento do planejamento em que as principais decisões já estão tomadas, chegando-se ao detalhe de projetos e restando pouco espaço para a atuação de uma avaliação estratégica dos efeitos ambientais (Oliveira; Montaño; Souza, 2009). Gráfico 1: Porcentagem de AAEs brasileiras aplicadas a planos, programas e projetos estruturantes, com relação ao total de AAEs elaboradas até 2012 e identificados pelos autores (36 AAEs). Fonte: Elaborado pelos autores. A AAE seria, então, um instrumento de política ambiental sistemático, público, participativo e democrático, que objetiva promover o desenvolvimento sustentável através da incorporação da variável ambiental no processo de planejamento estratégico das políticas públicas (Figura 1). Diante do cenário exposto que se insere a presente Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), como instrumento de cautela e subsídio à tomada de decisão para o planejamento de ações no Estado do Ceará, aptas a garantir, no presente e no futuro, atendimento à demanda por recursos naturais de qualidade, a partir de um ordenamento e disciplinamento do uso das atividades em um determinado território, enquanto instrumento de planejamento para viabilizar a ocupação racional do espaço, consoante às potencialidades e fragilidades do meio ambiente. Figura 1: Objeto da AAE. Fonte: Elaborada pelos autores. 63

Define-se como objeto desta AAE, o conjunto de políticas públicas estaduais com influência direta sobre a proteção ambiental e o ordenamento territorial: o fato de existir no Ceará uma Política intitulada Política Estadual do Meio Ambiente e da presente AAE ter como objetivo maior a sua operacionalização estratégica, define-se por OBJETO um conjunto de políticas, cujo esforço conjunto deve almejar a salubridade ambiental, tendo como motivação um melhor disciplinamento e ordenamento territorial do espaço. 2. PLANEJAMENTO AMBIENTAL E ORDENAMENTO TERRITORIAL COMO FIO CONDUTOR DA DISCUSSÃO 2.1. Justificativa No contexto em que se insere esta AAE, definiu-se que o fio condutor da discussão da Política Ambiental do Ceará é a Proteção Ambiental e Ordenamento Territorial. Sendo o Objeto da AAE a Política Ambiental do Ceará e o contexto dessa demanda a necessidade de proteção ambiental e ordenamento territorial, entende-se que o principal aspecto do ambiente a ser discutido (a ser saneado) seja o controle ambiental e o disciplinamento e ordenamento do espaço. Nessa perspectiva, o Ordenamento Territorial corresponde ao planejamento da ocupação do território, com aproveitamento das infraestruturas existentes e considerando as potencialidades e os limites dos recursos. É a gestão da interatividade do homem e o espaço natural, não se restringindo, contudo, à gestão do espaço, mas buscando proporcionar um desenvolvimento que preserve o presente e potencie o futuro. Um dos instrumentos de ordenamento territorial é o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) importante para o planejamento estratégico que permite orientar diversos níveis decisórios de políticas convergentes com as diretrizes de desenvolvimento sustentável (como é o caso do ZEE Caatinga e Áreas Úmidas do Ceará). O ZEE Estado do Ceará foi realizado considerando essas premissas, enquanto instrumento para viabilizar a ocupação racional do espaço e o redirecionamento de suas atividades, compatibilizando a produção econômica com a conservação dos recursos naturais. O adequado manejo dos recursos naturais e ordenamento das atividades em um dado território, consoante as suas potencialidades e fragilidades, são de crucial importância para a manutenção das funções dos ecossistemas que se traduzem em serviços ambientais, entre os quais a manutenção das características qualitativas e quantitativas das águas das coleções hídricas. Em que pesem os esforços para este ordenamento e disciplinamento do uso das terras, as práticas de supressão de vegetação e as constantes queimadas figuram entre os vários fatores de pressão sobre os ecossistemas no Estado do Ceará. As dificuldades de controle dessas ações associam-se o precário conhecimento de grande parte dos produtores sobre a legislação afeta a estas questões, as dificuldades burocráticas e os custos relativamente elevados para estes produtores para regularizar as práticas de desmatamento, conforme identificado nos estudos para o ZEE (Ceará, 2007). 3. METODOLOGIA Para a análise deste tema foram consultados documentos oficiais relativos ao ordenamento do território cearense, notadamente os relatórios que compõem o ZEE do Bioma Caatinga e Serras Úmidas (Ceará, 2007) e dados oficiais de Área Protegidas na forma de Unidades de Conservação (UC), bem como de Área Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade (APCB), apresentados de forma espacializada para evidenciar quais trechos do território cearense estão sob alguma forma de proteção ou proposta de proteção. Após esta análise da forma de ordenamento territorial, foram analisados os processos de supressão de vegetação e o histórico de ocorrência de focos de calor (indicativos de possíveis queimadas), dois fatores de pressão sobre os ecossistemas terrestres cujos reflexos nos recursos hídricos são inequívocos, uma vez que propiciam a exposição dos solos e, por consequência, processos de erosão e assoreamento. 64

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os Fatores Críticos á Decisão (FCD) são as questões mais importantes e urgentes a serem consideradas e avaliadas frente à operacionalização do Planejamento Ambiental e Ordenamento Territorial. São os aspectos críticos, que sensibilizam a realidade e a análise de futuro, que deve ser estratégica e focada na tomada de decisão. O Ceará apresenta 93% de seu território na região denominada Polígono das Secas com clima predominantemente Tropical Quente Semiárido e com baixa pluviosidade (entre 250 e 800 mm anuais). Há duas estações distintas durante o ano: a estação chuvosa (chamada inverno) com três a cinco meses, com chuvas irregulares, torrenciais, locais, de pouca duração, e a época seca (chamada verão), de sete a nove meses, quase sem chuvas. O início da época de chuvas varia bastante entre as diferentes regiões e oscila também dentro de uma região de um ano para outro (Ceará, 2007). Este clima abrange cerca de 68% do Estado, alcançando o território de 98 dos 184 municípios. (Medeiros et al., 2012). Devido à irregularidade anual e interanual das chuvas, o território cearense fica sujeito aos períodos eventuais de secas calamitosas ou de chuvas excepcionais, convertendo-se em problemas sociais e econômicos. Os recursos hídricos de superfície e de subsuperfície dependem dos condicionantes climáticos já referidos e dos condicionantes morfoestruturais. Nos sertões deprimidos semiáridos com rochas cristalinas, há grande frequência e densidade de rios e riachos com escoamento intermitente sazonal. Nas áreas sedimentares litorâneas e dos planaltos, a escassez de cursos d água é compensada pela maior potencialidade de recursos hídricos subsuperficiais (Ceará, 2007). Elaborado de acordo com as Diretrizes Metodológicas para o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil (Brasil, 2001), o ZEE resultou em 21 zonas ecológico-econômicas, criando um modelo territorial que distribui as atividades em função das limitações, vulnerabilidades e fragilidades naturais, bem como dos riscos e potencialidades de uso, sempre considerando a sustentabilidade. As zonas estão enquadradas nos seguintes tipos descritos na Figura 2 a seguir: 65

Figura 2: Zoneamento Ecológico Econômico do Bioma Caatingas e Serras Úmidas do Estado do Ceará. Fonte: Ceará, 2007. Zona de Preservação Ambiental visa à preservação dos sistemas ambientais, em especial dos ambientes naturais associados a cursos d água e suas planícies, encostas e rebordos de serras e chapadas, de maneira a garantir a manutenção das funções ecológicas que se traduzem entre outras, na manutenção dos recursos hídricos. Presente em encostas íngremes de serras e rebordos das Chapadas do Araripe que circunscrevem trechos das cabeceiras das bacias do Alto Jaguaribe e do Salgado, e no limite cuestiforme de Ibiapaba, na franja oeste do Estado do Ceará, nos divisores das bacias hidrográficas Sertões de Crateús, no divisor de Ibiapaba e Acaraú e Coreaú. Em menor escala, ocorre ainda a leste, na bacia hidrográfica Baixo Jaguaribe, na Chapada do Apodi (Figura 3). 66

Figura 3: Zonas de Preservação Ambiental das Serras e vertentes de Chapadas (ZEE). Fonte: Ceará, 2007. Zona de Proteção Paisagística e cultural, de pequena expressão espacial na escala do zoneamento, objetiva preservar remanescentes de vegetação e elementos significativos das paisagens serranas e sertanejas. Zona de Recuperação Ambiental apresenta áreas em estado de degradação moderada a forte, requerendo a adoção de medidas capazes de levá-las a recuperar suas condições de equilíbrio. Associa-se, entre outros, a inselbergs e a maciços residuais interiores (serras secas e úmidas), dispersos nas várias bacias hidrográficas, de modo geral com pequenas extensões territoriais, considerando a escala dos mapeamentos do ZEE. Zona de Degradação Ambiental Configurada e de Recuperação Ambiental abarca áreas degradadas, importando na recuperação ou restauração do ambiente e da capacidade produtiva dos recursos naturais. Refe- 67

re-se a expressivas áreas de desertificação nos Sertões Meridionais dos Inhamuns, na bacia hidrográfica do Alto Jaguaribe e em parte das cabeceiras da bacia hidrográfica Sertões do Crateús Sertão de Cratéus; em grande parte dos térreos drenados rios pelo Médio Jaguaribe, e; nos Sertões do Centro-Norte, que inclui parcelas das bacias do Acaraú, Coreaú e parcialmente da bacia denominada Litoral, conforme Figura 4 a seguir. Figura 4: Zonas de Preservação Ambiental das Serras e vertentes de Chapadas (ZEE). Fonte: Ceará, 2007. Zonas de Uso Sustentável abrangem áreas onde as atividades humanas devem se desenvolver com o devido controle, e que têm ambientes em diversos estádios de antropização. Esta Zona foi proposta em vários setores do Estado do Ceará, de forma dispersa e pontual, porém destacam-se pela extensão as regiões dos rebordos úmidos e dos reversos secos delimitadas pela bacia hidrográfica denominada Serra da Ibiapaba, a oeste do Ceará; os Sertões Setentrionais Pré-litorâneos das bacias Metropolitanas e ao sudoeste, os Sertões do Salgado e do Cariri, parte da bacia do Salgado e do Alto Jaguaribe (Figura 5). 68

Figura 5: Zonas de uso sustentável com maiores extensões territoriais (ZEE). Fonte: Ceará, 2007. 69

Zonas de Urbanização abrange diversos tipos de uso de natureza industrial, residencial e de uso comercial básico. O objetivo de gestão é controlar a expansão urbana em zonas ambientalmente frágeis e vulneráveis ao uso e ocupação, a exemplo das Zonas de Preservação Ambiental e de Proteção Paisagística. Unidades de Conservação e Áreas Prioritárias para Conservação. Conforme apresentado no ZEE da Caatinga e Serras Úmidas, há duas unidades de conservação federais para proteção de ecossistemas do semiárido cearense, a saber, Estação Ecológica (EE) de Aiuaba, na região dos Inhamuns, bacia do Alto Jaguaribe; o Parque Nacional de Ubajara, na Serra da Ibiapaba; e, a Estação Ecológica (EE) do Açude Castanhão, na bacia do Médio Jaguaribe, categorias de unidades de conservação de proteção integral (UCPI). Ainda no plano federal, trechos de serras úmidas encontram-se sob proteção legal na forma de unidades de conservação de uso sustentável (UCUS). São elas: a) Floresta Nacional do Araripe, situada na Chapada do Araripe, bacia do Salgado; b) Área de Proteção Ambiental da Serra da Ibiapaba, localizada na Biorregião do Complexo da Ibiapaba e abrangendo, no Estado do Ceará, parte das bacias Serra de Ibiapaba e Coreaú; c) Área de Proteção Ambiental da Chapada do Araripe situada na Biorregião do Complexo do Araripe, e que abrange parcelas dos territórios de bacias do Alto Jaguaribe e Salgado; d) Floresta Nacional de Sobral, no Município do mesmo nome, na bacia do Acaraú, tendo como ecossistema específico o verificado na bacia hidrográfica do açude Aires de Souza. Acerca das unidades de conservação instituídas pelo próprio Estado do Ceará no bioma caatinga, cita-se o Monumento Natural dos Monólitos de Quixadá, criado pelo Decreto Estadual nº 26.805/2002, no Município de Quixadá. Quanto às unidades de conservação estaduais que protegem ecossistemas de serras úmidas, tem-se: a) Área de Proteção Ambiental da Serra de Baturité, abrangendo os Municípios de Aratuba, Baturité, Capistrano, Guaramiranga, Mulungu, Pacoti, Palmácia e Redenção; b) Área de Proteção Ambiental da Serra da Aratanha, instituída pelo Decreto Estadual nº 24.959/98, abarcando áreas de Maranguape, Pacatuba e Guaiúba, nas bacias Metropolitanas e; c) Área de Proteção Ambiental da Bica do Ipu, no Município homônimo, na bacia do Acaraú. À parte destas áreas sob proteção, algumas de grandes extensões e sob orientação de manejo sustentável, as Áreas Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade (APCB) abrangem grandes áreas do Estado do Ceará, conforme se evidencia na figura a seguir. Um total de 56 APCB estão delineadas para o Estado do Ceará, abrangendo cerca de 61.000 km2 de área, ou cerca de 40% de seu território, o que dá uma medida da urgência em se desenvolver ações conservacionistas em escala de paisagem. As APCB situadas na faixa litorânea das BHs do Coreaú, Acaraú e Curú são consideradas de prioridade extremamente alta, assim como as situadas nas Chapadas a oeste, sul e a leste na BH Serra de Ibiapaba, Salgado, Médio Jaguaribe, no limite leste do Estado do Ceará. Finalmente, ressalta-se a faixa litorânea e a região de Fortaleza, sob grande pressão antrópica e onde remanescem trechos da vegetação original de transição do litoral para o semiárido, bem como as pressões dos centros urbanos litorâneos e de população turista flutuante nos períodos de alta estação e férias escolares. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em que pesem os esforços para a proteção de ecossistemas e ordenamento das atividades antrópicas, evidencia-se tendência à manutenção ou mesmo expansão de práticas de desmatamentos e queimadas, presentes de forma difusa em praticamente todo o território do estado cearense, propiciando exposição de solos e carreamento de material particulado e nutrientes para cursos d água por ocasião de chuvas ocasionais intensas que caracterizam esta região. Associa-se a isso a suscetibilidade de algumas regiões à desertificação, caso de trechos das bacias hidrográficas do Acaraú, Alto e Médio Jaguaribe e Serão de Crateús. 70

Especial atenção deve ser dada às regiões mais interiores dos altos cursos de rios que atravessam grande parte do território, como: Jaguaribe, Salgado, Banabuiú, Acaraú e Coreaú, assim como ao Médio Jaguaribe que, embora encontrem-se inseridos em zonas de uso sustentável, de acordo com o proposto no ZEE do Estado (Ceará, 2007), tiveram intensificação de desmatamentos mais recentes. A proteção ambiental pressupõe não apenas medidas de preservação na forma de UC. Implica a manutenção da estrutura da paisagem de maneira a propiciar conectividade, em termos estruturais e funcionais, entre estas áreas protegidas e demais remanescentes naturais. Ainda que a caatinga esteja presente na maior parte do território, os constantes desmatamentos e queimadas, associados ao constante pisoteio por caprinos, equinos e bovinos, contribuem para uma constante degradação dos ambientes naturais. A intensificação do uso do solo, ao invés da manutenção de praticas extensivas usualmente utilizadas, com a adoção de medidas de recuperação e manejo dos solos, visando aumento de produtividade agrícola e pecuária, são medidas fundamentais para reverter o quadro atual. No que se refere ao ZEE, a delimitação de Zonas de Preservação em correspondência às Chapadas existentes a oeste e a leste do território cearense vai ao encontro do previsto para as APCB, reforçando a importância de adoção de medidas preservacionistas nestes setores. De forma similar, as Zonas de Recuperação coincidem em certa medida com áreas mais críticas em termos de suscetibilidade à desertificação. Finalmente, Zonas de Uso Sustentável concentram-se, principalmente, nas BHs da Serra de Ibiapaba, Salgado e Alto Jaguaribe, bem como no entorno da Região Metropolitana de Fortaleza, na BH Metropolitanas. 71

REFERÊNCIAS BRASIL, Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável. Programa Zoneamento Ecológico-Econômico, 2001. Ceará. Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura. Zoneamento Ecológico-Econômico do Bioma Caatinga e Serras Úmidas do Estado do Ceará / Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura - FCPC Fortaleza: PETRO- BRAS / FCPC / SEMACE / UFC, 2007. Medeiros, C. N.; Gomes, D. D. M.; Albuquerque E. L. S. Monitoramento dos Focos de Calor no Estado do Ceará: Configuração dos Cenários no Contexto das Unidades Fitogeográficas e das Macrorregiões de Planejamento. IV Simpósio Brasileiro de Ciências Geodésicas e Tecnologias da Geoinformação. Recife PE, 2012. Ministério do Meio Ambiente - MMA. Avaliação Ambiental Estratégica. Brasília: MMA/SQA, 2002. Oliveira, I. S. D., Montaño, M., Souza, M. P. Avaliação Ambiental Estratégica. São Carlos: Suprema, 2009. 72