MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO

Transcrição

1 PROCESSO PGT/CCR/PP/Nº 10355/2013 ORIGEM: PRT 1ª REGIÃO PROCURADOR OFICIANTE: DR. JOÃO CARLOS TEIXEIRA INTERESSADO 1: UNIÃO FEDERAL INTERESSADO 2: ARPOADOR DE HOTÉIS E TURISMO LTDA. SINDICATO DOS TRABALHADORES NO COMÉRCIO HOTELEIRO E SIMILARES DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO ASSUNTO: Liberdade e Organização Sindical (08.) SINDICATO. ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. TAXA DE SERVIÇO. LEGALIDADE. A cláusula relativa à cobrança da taxa de serviço, prevista no acordo coletivo de trabalho objeto de investigação, apresenta-se ilegal por prever repasse de parte do valor arrecadado para a empresa e para o Sindicato. Trata-se de percentual cobrado sobre os serviços prestados pelos empregados aos hóspedes do hotel, não se justificando o rateio do seu valor para este, com a finalidade de custear encargos sociais, devidos em razão da atividade econômica desenvolvida e da sua condição de empregador, assim como para o Sindicato, para obras sociais, quando já dispõe dos recursos da contribuição sindical e das contribuições de seus associados. Promoção de arquivamento não homologada. 1

2 I RELATÓRIO Trata-se de procedimento instaurado em razão de denúncia encaminhada pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Estado do Rio de Janeiro sobre irregularidade constante do acordo coletivo de trabalho firmado pelo Sindicato dos Trabalhadores do Comércio Hoteleiro e Similares do Município do Rio de Janeiro e Arpoador de Hotéis e Turismo Ltda. relativamente à taxa de serviço nele prevista (fl. 5). O Órgão oficiante indeferiu liminarmente a representação, por não vislumbrar qualquer irregularidade no seu conteúdo (fls. 13/14). É, em síntese, o relatório. II VOTO De início, observo que se trata de indeferimento liminar de representação no prazo previsto no art. 5, caput, da Resolução nº 69/2007 da CSMPT, o que torna desnecessária a remessa dos autos à apreciação desta Câmara de Coordenação e Revisão. No entanto, ante a remessa, passo à apreciação das razões de indeferimento. Sem dúvida, a negociação coletiva deve ser privilegiada, não cabendo a este órgão ministerial o seu monitoramento. Todavia, ante o encaminhamento de 2

3 denúncia de ilegalidade do negociado, considerando a necessidade da preservação dos direitos sociais dos trabalhadores, a atuação ministerial se impõe. Sem dúvida, a Constituição Federal prevê no art. 7º possibilidades de flexibilização de direitos dos trabalhadores, por intermédio da negociação coletiva. Nessas condições, alça o Sindicato ao patamar de administrador de conflitos entre a categoria profissional que representa e a empresa ou setor econômico a que estão vinculados, solucionando, assim, situações de dificuldades, de crise financeira. Não é o caso, todavia. O instrumento coletivo objeto do presente trata da taxa de serviço a ser cobrada dos clientes do Hotel signatário do mesmo, percentuais de repasse, cálculo do valor devido a cada empregado, distribuição, entre outros. Com relação às cláusulas que o compõem, chama a atenção a cláusula segunda, do seguinte teor, verbis: O valor da taxa de serviço será equivalente a 10% (dez por cento) sobre todas as despesas efetuadas por hóspedes e não hóspedes do hotel no período de apuração para distribuição entre os seus empregados atendendo os critérios e os percentuais abaixo discriminados: diárias (apartamentos e salões), restaurantes, bares, serviços de apartamentos, garagem, telefone (fax), lavanderia/rouparia e outros serviços: a) 60,5% (sessenta e meio por cento) do montante arrecadados (sic) serão destinados aos empregados; b) 38% (trinta e oito por cento) do montante arrecadado serão retidos pela empresa para custeio de encargos sociais, quebra de material, de uso tanto do hotel como do hóspede; c) 1,5% (um e meio por cento) do mesmo montante serão destinados mensalmente para obras sociais do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Hoteleiros e Similares do Município do Rio de Janeiro; 3

4 d) O valor arrecadado constante do item c da presente cláusula, será recolhido até o 10º (décimo) dia do mês seguinte, diretamente ao Sindicato, em recibo próprio e específico pelo mesmo fornecido. Observe-se, inicialmente, que a taxa negociada é cobrada sobre todos os serviços prestados aos clientes, que são realizados pelos empregados do Hotel signatário do acordo coletivo. Nessas condições, uma vez prevista em instrumento coletivo da categoria, deveria reverter totalmente aos trabalhadores. Sem dúvida, é a instituição obrigatória da gorjeta, dada por liberalidade pelo cliente em razão dos serviços prestados, beneficiando diretamente apenas um empregado, sendo, portanto, aleatória. Logicamente, ao se tornar obrigatória, passa a beneficiar o conjunto dos empregados, o que, certamente, é próprio da negociação coletiva que, exitosa, obteve esse resultado. A empresa, ao negociar a taxa, não deveria dela usufruir, ainda mais para custear encargos sociais, ônus decorrente do desenvolvimento de sua atividade econômica e da sua condição de empregador, assim como quebra de material de uso do hotel e do hóspede. Assim, um benefício, a princípio, do trabalhador, passa também a ser da empresa, o que certamente relativiza os resultados do acordo firmado, uma vez que será o empregado, e não o empregador, o responsável pelos ônus decorrentes do que foi negociado, sendo, ainda, penalizado de antemão por eventual quebra de material. Por outro lado, ainda que o Sindicato tenha envidado esforços para firmar o acordo, não há de partilhar do direito negociado para realizar obras sociais. Isto, considerando que já recebe a contribuição sindical de todo o trabalhador integrante da categoria, bem como as contribuições devidas por seus associados. De toda a sorte, seria viável previsão semelhante, desde que devidamente 4

5 autorizada pelos empregados beneficiados pelo acordo, e com destinação específica. E, a respeito, não há qualquer comprovação nos autos. Assim sendo, embora as observações feitas pelo Órgão oficiante em sua deliberação sejam pertinentes, entendo que a previsão de antemão de percentual do valor arrecadado como taxa de serviço para a empresa se apresenta ilegal, por caracterizar um ganho com o benefício previsto para o trabalhador. Em consequência, não homologo o arquivamento do feito. III CONCLUSÃO Isto posto, não homologo a promoção de arquivamento encaminhada. Brasília, 15 de agosto de Eliane Araque dos Santos Relatora 5