Em silêncio, abandona-te ao Senhor, põe tua esperança nele (Sl 36, 7)

Transcrição

1 Silêncio: o caminho para Deus Em silêncio, abandona-te ao Senhor, põe tua esperança nele (Sl 36, 7) 1 / 5

2 Não há dúvidas: nascemos para Deus e apenas nele podemos encontrar o repouso para nossas almas cansadas do labor de cada dia e das fadigas e sofrimentos que a vida prepara a cada um. Tal consciência estimula ao encontro pessoal com o Senhor, delineando em nosso interior a experiência real que se pode fazer com Deus, isto é, saber e conhecer que ele vive, que está mais íntimo de nós do que pensamos e concebemos e que nada pode impedir o seu amor por nós, mesmo nossos mais absurdos pecados, ainda que estes últimos sejam capazes de me impedir de acolher e viver este amor infinito e incondicional. Existem muitas e variadas formas de entrar em contato com o Criador, mas nenhuma é tão eficaz quanto a oração. Rezar é permitir que a alma manifeste o anseio mais profundo que se conserva em seu interior, bramando a presença de Deus e a união íntima com ele. Como canta o salmista A minh alma tem sede de Deus e deseja o Deus vivo (Sl 42, 2). Tal sede é o motor que move o homem na direção de Deus, insaciável nesta busca que almeja o infinito que apenas o Eterno pode satisfazer. Entre as formas variadas de oração uma em especial tem um efeito garantido para o encontro com o Senhor: o silêncio. Mas não um silêncio identificado apenas com a ausência de palavras e quietude da voz, mas um silêncio orante, que silencie o que não dá espaço à voz que se deseja ouvir, ou seja, à voz de Deus, que sempre deseja falar ao coração do homem. Santa Teresa d Avila, falando da última morada do castelo interior, aquela em que a alma se encontra a sós com Jesus, depois de muita luta e abandono na misericórdia divina, diz que, no silêncio profundo, se conhece a Deus e se experienta toda alegria de poder fazê-lo. Ela escreve: Passa-se com tanta quietude e tão sem ruído tudo quanto o Senhor aqui faz e ensina para aproveitamento da alma, que me parece a mim que é como na edificação do templo de 2 / 5

3 Salomão, onde não se havia de ouvir nenhum ruído; assim neste templo de Deus, nesta Sua morada, só Ele e a alma se gozam com grandíssimo silêncio. Não tem que bulir nem buscar nada o entendimento; o Senhor que o criou, o quer sossegar aqui, e que por uma pequena fresta veja o que se passa (Castelo Interior ou Moradas, VII, cap. 3, 11). O silêncio, portanto, permite que nosso encontro com o Senhor seja mais íntimo e profundo, desligado de estímulos puramente sensíveis e voltado apenas para a algria e a gratificação que o Senhor tem em estar conosco e a nossa em estar com ele. Silenciar não é deixar de falar, mas sim falar quando necessário. Assim sendo, quando nos colocamos diante de Deus em silêncio, dizemos com nossa postura que queremos ouvi-lo, saber sua vontade, conhecer seus desejos, com um anseio grandioso de cumpri-los; e logo após conhecer tão sábia vontade, cabe a nós a palavra, que seja sempre um sim, forte e determinado, cheio de amor e de vida, como o sim que a Virgem Maria deu ao anjo, após ter silenciado diante da grandeza de Deus e de ter com ele, respeitosamente e silenciosamente, falado. Vivemos em uma realidade mundial em que o silêncio não é mais apreciado, onde as relações com os demais seres humanos homens e mulheres que se comunicam e falam é substituída por um relacionamento com máquinas e dispositivos mudos que apenas acolhem o que seus usuários dizem ou escrevem sem questionar, transformando a comunicação interpessoal em algo distante no tempo e ultrapassada. Ainda que saibamos que a comunicação via internet é hoje o grande veículo para quem deseja se fazer ouvir ou ouvir outros, isso não pode ser visto como diálogo. Para que existe verdadeiro diálogo é necessário que exista também silêncio, um silêncio sereno e autêntico, um silêncio em que o calar tem apenas o objetivo de ouvir o outro, sem pretensões de anulá-lo ou sobrepujá-lo. Apenas com a vivência do silêncio diante de Deus pode-se aprender o que é silenciar diante dos homens. Só com um coraçõe silencioso para ouvir a voz de Deus se consegue a quietude interior indispensável para um autêntico diálogo fraterno com as pessoas. Quando palavra e silêncio se excluem mutuamente, a comunicação deteriora-se, porque provoca um certo aturdimento ou, no caso contrário, cria um clima de indiferença; quando, porém se integram reciprocamente, a comunicação ganha valor e significado. O silêncio é parte integrante da comunicação e, sem ele, não há palavras densas de conteúdo. No silêncio, escutamo-nos e conhecemo-nos melhor a nós mesmos, nasce e aprofunda-se o pensamento, compreendemos com maior clareza o que queremos dizer ou aquilo que ouvimos do outro, discernimos como 3 / 5

4 exprimir-nos. Calando, permite-se à outra pessoa que fale e se exprima a si mesma, e permite-nos a nós não ficarmos presos, por falta da adequada confrontação, às nossas palavras e ideias (Bento XVI, Mensagem para o XLVI Dia Mundial da Comunicações Sociais). Silenciar. Eis o grande trunfo dos que se encontram com Deus, pois aprendem que não falar não significa não dizer nada, mas sim ouvir para dizer o que é bom. Pe. Everton Vicente Barros 4 / 5

5 Comunidade Católica Palavra Viva 5 / 5