Igualdade, Liberdade e Sororidade. 2ª edição

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1 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição

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3 Daniela Lima de Andrade Borges Ana Paula Zomer (Organizadoras) Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Artigos selecionados no Edital de Chamada de Artigos para a III Conferência Nacional da Mulher Advogada 2020, promovido pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e a Comissão Nacional da Mulher Advogada. Brasília DF, 2020

4 Ordem dos Advogados do Brasil Conselho Federal, 2020 Setor de Autarquias Sul - Quadra 5, Lote 1, Bloco M Brasília DF CEP: Distribuição: Conselho Federal da OAB GRE oabeditora@oab.org.br I24 FICHA CATALOGRÁFICA Igualdade, liberdade e sororidade / organizador: Daniela Lima de Andrade Borges, Ana Paula Zomer 2. ed. Brasília: OAB, Conselho Federal, ix, 187 p. ISBN: Direito da mulher, Brasil, coletânea. 2. Violência contra a mulher, Brasil. 3. Assédio moral, Brasil. 4. Igualdade de gênero. 5. Mulher, condições sociais. I. Borges, Daniela Lima de Andrade, org. II. Zomer, Ana Paula, org. III. Título. CDD: CDU: (81) Elaborada por: CRB

5 Gestão 2019/2022 Diretoria Felipe Santa Cruz Luiz Viana Queiroz José Alberto Simonetti Ary Raghiant Neto José Augusto Araújo de Noronha Presidente Vice-Presidente Secretário-Geral Secretário-Geral Adjunto Diretor-Tesoureiro Conselheiros Federais AC: Cláudia Maria da Fontoura Messias Sabino; AL: Fernanda Marinela de Sousa Santos, Fernando Carlos Araújo de Paiva e Roberto Tavares Mendes Filho; AP: Alessandro de Jesus Uchôa de Brito, Felipe Sarmento Cordeiro e Helder José Freitas de Lima Ferreira; AM: Aniello Miranda Aufiero, Cláudia Alves Lopes Bernardino e José Alberto Ribeiro Simonetti Cabral; BA: Carlos Alberto Medauar Reis, Daniela Lima de Andrade Borges e Luiz Viana Queiroz; CE: André Luiz de Souza Costa; Hélio das Chagas Leitão Neto e Marcelo Mota Gurgel do Amaral; DF: Daniela Rodrigues Teixeira, Francisco Queiroz Caputo Neto e Vilson Marcelo Malchow Vedana; ES: Jedson Marchesi Maioli, Luciana Mattar Vilela Nemer e Luiz Cláudio Silva Allemand; GO: Marcello Terto e Silva, Marisvaldo Cortez Amado e Valentina Jugmann Cintra; MA: Ana Karolina Sousa de Carvalho Nunes, Charles Henrique Miguez Dias e Daniel Blume Pereira de Almeida; MT: Felipe Matheus de França Guerra, Joaquim Felipe Spadoni e Ulisses Rabaneda dos Santos; MS: Ary Raghiant Neto, Luís Cláudio Alves Pereira e Wander Medeiros Arena da Costa; MG: Antônio Fabrício de Matos Gonçalves, Bruno Reis de Figueiredo e Luciana Diniz Nepomuceno; PA: Afonso Marcius Vaz Lobato, Bruno Menezes Coelho de Souza e Jader Kahwage David; PB: Harrison Alexandre Targino, Odon Bezerra Cavalcanti Sobrinho e Rogério Magnus Varela Gonçalves; PR: Airton Martins Molina, José Augusto Araújo de Noronha e Juliano José Breda; PE: Leonardo Accioly da Silva, Ronnie Preuss Duarte e Silvia Márcia Nogueira; PI: Andreya Lorena Santos Macêdo, Chico Couto de Noronha Pessoa e Geórgia Ferreira Martins Nunes; RJ: Carlos Roberto de Siqueira Castro, Luiz Gustavo Antônio Silva Bichara e Marcelo Fontes Cesar de Oliveira; RN: Ana Beatriz Ferreira Rebello Presgrave, Artêmio Jorge de Araújo Azevedo e Francisco Canindé Maia; RS: Cléa Anna Maria Carpi da Rocha, Rafael Braude Canterji e Renato da Costa Figueira; RO: Alex Souza de Moraes Sarkis, Andrey Cavalcante de Carvalho e Franciany D Alessandra Dias de Paula; RR: Emerson Luis Delgado Gomes e Rodolpho César Maia de Morais; SC: Fábio Jeremias de Souza, Paulo Marcondes Brincas e Sandra Krieger Gonçalves; SP: Alexandre Ogusuku, Guilherme Octávio Batochio e Gustavo Henrique RighiIvahy Badaró; SE: Adélia Moreira Pessoa, Maurício Gentil Monteiro e Paulo Raimundo Lima Ralin; TO: Antonio Pimentel Neto, Denise Rosa Santana Fonseca e Kellen Crystian Soares Pedreira do Vale. Conselheiros Federais Suplentes AC: Luiz Saraiva Correia, João Tota Soares de Figueiredo Filho e Odilardo José Brito Marques; AL: Ana Kilza Santos Patriota, João Luís Lôbo Silva e Sergio Ludmer; AP: Emmanuel Dante Soares Pereira, Maurício Silva Pereira e Paola Julien Oliveira dos Santos; AM: Márcia Maria Costa do Álamo e Sergio Rodrigo Russo Vieira; BA: Antonio Adonias Aguiar Bastos, Ilana Kátia Vieira Campos e Ubirajara Gondim de Brito Ávila; CE: Alcimor Aguiar Rocha Neto, André Rodrigues Parente e Leonardo Roberto Oliveira de Vasconcelos; DF: Raquel Bezerra Cândico, Rodrigo Badaró Almeida de Castro e Ticiano Figueiredo de Oliveira; ES: Carlos Magno Gonzaga Cardoso, Luiz Henrique Antunes Alochio e Ricardo Álvares da Silva Campos Júnior; GO: Dalmo Jacob do Amaral Júnior, Fernando de Paula Gomes Ferreira e Rafael Lara Martins; MA: Deborah Porto Cartágenes, João Batista Ericeira e Yuri Brito Corrêa; MT: Ana Carolina Naves Dias Barchet, Duilio Piato Junior e José Carlos de Oliveira Guimarães Junior; MS: Afeife Mohamad Hajj, Luíz Renê Gonçalves do Amaral e Vinícius Careiro Monteiro Paiva; MG: Felipe Martins Pinto, Joel Gomes Moreira Filho e Róbison Divino Alves; PA: Luiz Sergio Pinheiro Filho e Olavo Câmara de Oliveira Junior; PB: Marina Motta Benevides Gadelha, Rodrigo Azevedo Toscano de Brito e Wilson Sales Belchior; PR: Artur Humberto Piancastelli, Flavio Pansieri e Graciela Iurk Martins; PE: Ademar Rigueira Neto, Carlos Antônio Harten Filho e Gracieli Pinheiro Lins Lima; PI: Raimundo de Araújo Silva Júnior, Shaymmon Emanoel Rodrigues de Moura Sousa e Thiago Anastácio Carcará; RJ: Eurico de Jesus Teles Neto; Flavio Diz Zveiter e Gabriel Francisco Leonardos; RN: Fernando Pinto de Araújo Neto e Olavo Hamilton Ayres Freire de Andrade; RS: Beatriz Maria Luchese Peruffo,

6 Greice Fonseca Stocker e Maria Cristina Carrion Vidal de Oliveira; RO: Jeverson Leandro Costa, Juacy dos Santos Loura Júnior e Veralice Gonçalves de Souza Veris; RR: Bernardino Dias de Souza Cruz Neto, Dalva Maria Machado e Stélio Dener de Souza Cruz; SC: José Sérgio da Silva Cristóvam, Sabine Mara Müller Souto e Tullo Cavallazzi Filho; SP: Alice Bianchini, Daniela Campos Liborio e Fernando Calza de Salles Freire; SE: Glícia Thaís Salmeron de Miranda, Tatiane Gonçalves Miranda Goldhar e Vitor Lisboa Oliveira; TO: Alessandro de Paula Canedo, Cabral Santos Gonçalves e Luiz Tadeu Guardiero Azevedo. Ex-Presidentes 1. Levi Carneiro (1933/1938) 2. Fernando de Melo Viana (1938/1944) 3. Raul Fernandes (1944/1948) 4. Augusto Pinto Lima (1948) 5. Odilon de Andrade (1948/1950) 6. Haroldo Valladão (1950/1952) 7. Attílio Viváqua (1952/1954) 8. Miguel Seabra Fagundes (1954/1956) 9. Nehemias Gueiros (1956/1958) 10. Alcino de Paula Salazar (1958/1960) 11. José Eduardo do P. Kelly (1960/1962) 12. Carlos Povina Cavalcanti (1962/1965) 13. Themístocles M. Ferreira (1965) 14. Alberto Barreto de Melo (1965/1967) 15. Samuel Vital Duarte (1967/1969) 16. Laudo de Almeida Camargo (1969/1971) 17. Membro Honorário Vitalício José Cavalcanti Neves (1971/1973) 18. José Ribeiro de Castro Filho (1973/1975) 19. Caio Mário da Silva Pereira (1975/1977) 20. Raymundo Faoro (1977/1979) 21. Eduardo Seabra Fagundes (1979/1981) 22. Membro Honorário Vitalício J. Bernardo Cabral (1981/1983) 23. Membro Honorário Vitalício Mário Sérgio Duarte Garcia (1983/1985) 24. Hermann Assis Baeta (1985/1987) 25. Márcio Thomaz Bastos (1987/1989) 26. Ophir Filgueiras Cavalcante (1989/1991) 27. Membro Honorário Vitalício Marcello Lavenère Machado (1991/1993) 28. Membro Honorário Vitalício José Roberto Batochio (1993/1995) 29. Membro Honorário Vitalício Ernando Uchoa Lima (1995/1998) 30. Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro (1998/2001) 31. Rubens Approbato Machado (2001/2004) 32. Membro Honorário Vitalício Roberto Antonio Busato (2004/2007) 33. Membro Honorário Vitalício Raimundo Cezar Britto Aragão (2007/2010) 34. Membro Honorário Vitalício Ophir Cavalcante Junior (2010/2013) 35. Membro Honorário Vitalício Marcus Vinicius Furtado Coêlho (2013/2016) 36. Membro Honorário Vitalício Claudio Pacheco Prates Lamachia (2016/2019). Presidentes Seccionais AC: Erick Venancio Lima do Nascimento; AL: Nivaldo Barbosa da Silva Junior; AP: Auriney Uchôa de Brito; AM: Marco Aurélio de Lima Choy; BA: Fabrício de Castro Oliveira; CE: José Erinaldo Dantas Filho; DF: Delio Fortes Lins e Silva Junior; ES: Jose Carlos Rizk Filho; GO: Lúcio Flávio Siqueira de Paiva; MA: Thiago Roberto Morais Diaz; MT: Leonardo Pio da Silva Campos; MS: Mansour Elias Karmouche; MG: Raimundo Candido Junior; PA: Alberto Antonio de Albuquerque Campos; PB: Paulo Antonio Maia e Silva; PR: Cassio Lisandro Telles; PE: Bruno de Albuquerque Baptista; PI: Celso Barros Coelho Neto; RJ: Luciano Bandeira Arantes; RN: Aldo de Medeiros Lima Filho; RS: Ricardo Ferreira Breier; RO: Elton Jose Assis; RR: Ednaldo Gomes Vidal; SC: Rafael de Assis Horn; SP: Caio Augusto Silva dos Santos; SE: Inácio José Krauss de Menezes; TO: Gedeon Batista Pitaluga Júnior. Coordenação Nacional das Caixas de Assistências dos Advogados CONCAD Pedro Zanete Alfonsin Coordenador Nacional Aldenize Magalhães Aufiero Coordenadora CONCAD Norte Andreia de Araújo Silva Coordenadora CONCAD Nordeste Itallo Gustavo de Almeida Leite Coordenadora CONCAD Centro-Oeste Luis Ricardo Vasques Davanzo Coordenador CONCAD Sudeste Presidentes Caixas de Assistência dos Advogados AC: Thiago Vinícius Gwozdz Poerch; AL: Ednaldo Maiorano de Lima; AP: Jorge José Anaice da Silva; AM: Aldenize Magalhães Aufiero; BA: Luiz Augusto R. de Azevedo Coutinho; CE: Luiz Sávio Aguiar Lima; DF: Eduardo Uchôa Athayde; ES: Aloisio Lira; GO: Rodolfo Otávio da Mota Oliveira; MA: Diego Carlos Sá dos Santos; MT: Itallo Gustavo de Almeida Leite; MS: José Armando Cerqueira Amado; MG: Luís Cláudio da Silva Chaves; PA: Francisco Rodrigues de Freitas; PB: Francisco de Assis Almeida e Silva; PR: Fabiano Augusto Piazza Baracat; PE: Fernando Jardim Ribeiro Lins; PI: Andreia de Araújo Silva; RJ: Ricardo Oliveira de Menezes; RN: Monalissa Dantas Alves da Silva; RS: Pedro Zanete Alfonsin; RO: Elton Sadi Fulber; RR: Ronald Rossi Ferreira; SC: Claudia Prudencio; SP: Luis Ricardo Vasques Davanzo; SE: Hermosa Maria Soares França; TO: Sergio Rodrigo do Vale.

7 Fundo de Integração e Desenvolvimento Assistencial dos Advogados FIDA Felipe Sarmento Cordeiro Presidente Gedeon Batista Pitaluga Júnior Vice-Presidente Andreia Araújo Silva Secretária Geral José Augusto Araújo de Noronha Representante da Diretoria Membros Alberto Antonio Albuquerque Campos Aldenize Magalhães Aufiero Itallo Gustavo de Almeida Leite Luciana Mattar Vilela Nemer Luis Ricardo Vasques Davanzo Paulo Marcondes Brincas Pedro Zanette Alfonsin Silvia Marcia Nogueira Thiago Roberto Morais Diaz Afeife Mohamad Hajj Lucio Flávio Siqueira de Paiva Monalissa Dantas Alves da Silva Nivaldo Barbosa da Silva Junior Raquel Bezerra Cândido ESA Nacional Ronnie Preuss Duarte Luis Cláudio Alves Pereira Diretor-Geral Vice-Diretor Conselho Consultivo: Alcimor Aguiar Rocha Neto Auriney Uchôa de Brito Carlos Enrique Arrais Caputo Bastos Cristina Silvia Alves Lourenço Delmiro Dantas Campos Neto Graciela Iurk Marins Henrique de Almeida Ávila Luciana Christina Guimarães Lóssio Igor Clem Souza Soares Paulo Raimundo Lima Ralin Thais Bandeira Oliveira Passos Diretores (as) das Escolas Superiores de Advocacia da OAB AC: Renato Augusto Fernandes Cabral Ferreira; AL: Henrique Correia Vasconcellos; AM: Ida Marcia Benayon de Carvalho; AP: Verena Lúcia Corecha da Costa; BA: Thais Bandeira Oliveira Passos; CE: Andrei Barbosa Aguiar; DF: Fabiano Jantalia Barbosa; ES: Alexandre Zamprogno; GO: Rafael Lara Martins; MA: Antonio de Moraes Rêgo Gaspar; MT: Bruno Devesa Cintra; MS: Ricardo Souza Pereira; MG: Silvana Lourenco Lobo; PA: Luciana Neves Gluck Paul; PB: Diego Cabral Miranda; PR: Adriana D'Avila Oliveira; PE: Mario Bandeira Guimarães Neto; PI: Aurelio Lobao Lopes; RJ: Sergio Coelho e Silva Pereira; RN: Daniel Ramos Dantas; RS: Rosângela Maria Herzer dos Santos; RO: Jose Vitor Costa Junior; RR: Caroline Coelho Cattaneo; SC: Marcus Vinícius Motter Borges; SP: Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho; SE: Kleidson Nascimento dos Santos; TO: Guilherme Augusto Martins Santos. Presidente Executivo da OAB Editora José Roberto de Castro Neves

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9 Comissão Nacional da Mulher Advogada Daniela Lima de Andrade Borges Alice Bianchini Claudia Maria da Fontoura Messias Sabino Marisa Chaves Gaudio Adelia Moreira Pessoa Beatriz Maria Luchese Peruffo Bruna Saback Santos Machado Daniela Ballao Ernlund Izabel Cristina de Almeida Braga Luciane Regina Mortari Zechini Marcela Marina de Araújo Marcela Martins de Vasconcelos Márcia Maria Cota do Álamo Maria Dalva Fernandes Monteiro Suale Sussuarana Abdon de Brito Alair Larranhaga Tebar Ana Paula Zomer Ana Vládia Martins Feitosa Antonia Algarina de Sousa Ariana Garcia do Nascimento Teles Christiane do Vale Leitão Clarissa Lopes Dias Maluf Pereira Claudia Sobreiro de Oliveira Cristiane Romano Farhat Ferraz Cristina Alves Tubino Fernanda Mello Cordeiro Maria Gláucia Barbosa Soares Mariana Lopes da Silva Bonfim Renata Cristina Barbosa Deiró Vanessa Pereira Ranunci Ferreira Veruska Maciel Cavalcante Presidente Vice-Presidente Secretária Secretária-Adjunta Membro Membro Membro Membro Membro Membro Membro Membro Membro Membro Membro Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora Membro Consultora

10 Comissão Organizadora da Chamada de Artigos Ana Paula Zomer Ana Paula Araújo de Holanda Amanda Silva Madureira Amarílis Regina Costa da Silva Anna Lyvia Roberto Custódio Ribeiro Claudia Cristina Barrilari Claudia Roberta de Araújo Sampaio Claudia Sobreiro de Oliveira Edith Maria Barbosa Ramos Juliane de Lima Barros Jussara Maria Rosin Delphino Maíra Santana Vida Mariana Lopes da Silva Bonfim Patricia Ulson Pizarro Werner Paula Nunes dos Santos Raquel Andrade dos Santos Silvia Regina Correa de Castro Sílvia Carlos da Silva Pimentel Simone Henrique Valentina Jungmann Cintra Presidente

11 APRESENTAÇÃO * É com enorme satisfação que apresento a presente obra com o tema Igualdade, Liberdade e Sororidade, resultado da III Conferência Nacional da Mulher Advogada, espaço essencial para toda a Advocacia brasileira, em especial para cerca de 600 mil advogadas que integram nossos quadros, totalizando quase 50% dos profissionais inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil. Apesar dos inúmeros avanços obtidos nos últimos anos, ainda temos que superar a desigualdade de gênero no cotidiano dessas profissionais. Nesse sentido, a Conferência Nacional da Mulher Advogada, realizada a cada três anos, tem a função de promover a consciência de gênero em nossos espaços institucionais. Trata-se de uma importante ocasião na qual as mulheres advogadas refletem e vocalizam suas pautas democráticas, cujos avanços têm efeitos para além de nossa Entidade. O tema dos direitos das mulheres é o termômetro da Democracia de um País. Sabiamente, Simone de Beavouir nos alerta que basta uma crise política ou econômica para que os direitos das mulheres sejam atingidos 1. O crescimento global dos ataques às pautas das mulheres e o aprofundamento da crise econômica atingem fortemente as advogadas. A crise sanitária que vivemos hoje, em virtude da pandemia provocada pela COVID-19, afeta desproporcionalmente as mulheres, pois elas estão na linha de frente nas funções de cuidado fora e dentro de casa. Desse modo, a mulher advogada é duramente atingida por todos esses contextos. Por isso, afirmo seguramente que a OAB não irá se omitir. Temos consciência de que a preocupação com a igualdade de gênero está intrinsecamente ligada à consolidação de uma sociedade mais justa, fraterna * Advogado e Presidente Nacional da OAB. 1 BEAUVOIR, S. de. O segundo sexo. 2. ed. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

12 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição e humana. O respeito aos direitos das mulheres e a garantia de sua representatividade em todos os espaços de poder valorizam e fortalecem a própria advocacia. Portanto, o nosso papel é lutar incansavelmente para que as mulheres sejam respeitadas em sua integralidade. As advogadas desempenham papel fundamental na desconstrução de uma cultura opressora que pesa sobre todas as mulheres. Nesse sentido, por meio de nossa Comissão Nacional da Mulher Advogada, o Conselho Federal da OAB tem se empenhado para garantir a defesa das prerrogativas das mulheres advogadas. Como sabemos, as profissionais da advocacia têm demandas específicas que não podem ser negligenciadas. Confiamos que, para conquistarmos um mundo mais democrático e diverso, a promoção da igualdade de gênero é indispensável, pois representa uma vitória incontestável de toda a sociedade. O diálogo e a pluralidade são elementos importantes nesse processo de luta pela dignidade humana. Diante disso, acreditamos na potência da produção de conhecimento para que avancemos, em diversas campos, por meio da reflexão feminista sobre a Igualdade, Liberdade e Sororidade, tema que inspirou o conjunto de autoras reunidas nesta obra, cuja profundidade assegura sua referência dentro da literatura jurídica. Os temas aqui abordados são de extrema importância para a valorização e o fortalecimento da classe como um todo. Assim, ao reafirmar o compromisso da OAB com a luta das mulheres, com os devidos recortes de raça, classe, orientação sexual, dentre outros, os artigos aqui reunidos contribuem para o aprimoramento do Estado Democrático de Direito e reafirmam a esperança na conformação de um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres, como nos ensina a ilustre Rosa Luxemburgo. ii

13 PREFÁCIO * * É com enorme alegria que chegamos à conclusão deste segundo volume! Sim, por que ele descortina o número expressivo de valorosas mulheres que se uniram em prol da sua própria causa, da nossa causa. Sem a contribuição de cada uma delas, e de todas em conjunto, jamais teríamos atingido este, que foi um dos nortes da Comissão Nacional da Mulher Advogada durante sua última conferência. O título, igualdade, fraternidade e sororidade, bem se revelou no esforço das autoras, que, a despeito de seus inúmeros e importantes afazeres, dedicaram parcelas de seus dias para que esta meta fosse alcançada. Talvez, nos permitam, por que, entre outras coisas, cientes do quanto é caro a esta Comissão somar, agregar, produzir em prol das questões de gênero. Temas de toda ordem, redigidos de forma contundente, e que evidenciam o grau de maturidade que vimos galgando ao longo do tempo. Só temos a agradecer e reverenciar esta expressiva parcela da intelectualidade feminina, lembrando que juntas, e somente assim, alcançaremos aquilo que nos pertence por direito. Por mais livros como este, mais oportunidades e mais mulheres nos espaços de poder. * Conselheira Federal pela OAB/Bahia e Presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada. * Membro Consultora da Comissão Nacional da Mulher Advogada e Presidente da Comissão Avaliadora dos Artigos do livro Igualdade, Liberdade e Sororidade.

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15 SUMÁRIO PROTAGONISMO FEMININO NO CONTEXTO POLÍTICO: a força da sororidade... 1 UMA DESIGUALDADE DE GÊNERO QUE INIBE A MULHER POBRE DAS COTAS ELEITORAIS À PARIDADE: medidas normativas de promoção à participação política feminina na América Latina O DIREITO À EDUCAÇÃO COMO INSTRUMENTO GARANTIDOR DA IGUALDADE DE GÊNERO VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: A atuação das ciências forenses sob a perspectiva de gênero O PAPEL DO HOMEM NO ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DE GÊNERO: uma análise a partir da criação de grupos reflexivos no âmbito da Lei /2006 (Lei Maria da Penha) OS IMPACTOS DA REFORMA DA PREVIDÊNCIA NA CONCESSÃO DAS APOSENTADORIAS DAS MULHERES... 59

16 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DA MULHER NO MOMENTO DO PARTO OS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS DA MULHER: UMA BREVE ANÁLISE SOB A ÓTICA DO DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE E AUTONOMIA DA VONTADE VIOLÊNCIA DE GÊNERO EM DEBATE: entraves à aplicação da Lei Maria da Penha LEI MARIA DA PENHA E DIREITO DO TRABALHO: em defesa da manutenção do contrato de emprego da mulher vítima de violência doméstica VIÉS RACIAL COMO ENTRAVE AOS EFEITOS DA LEI MARIA DA PENHA ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO: os reflexos do patriarcado nas relações laborais femininas ALÉM DO GÊNERO NA ADVOCACIA BRASILEIRA vi

17 CADÊ A JURISTA NEGRA? A (não) representatividade de mulheres negras no espaço jurídico OS DESAFIOS SOCIAIS, PESSOAIS, FAMILIARES E JURÍDICOS DE SER MULHER REFLEXOS DA FRAGILIDADE DA REDE DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR COM RECORTE NO MUNICÍPIO DE SERRA TALHADA/PE A IMPRESCINDIBILIDADE DA REPRESENTAÇÃO DA MULHER ADVOGADA NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL OS PRINCIPAIS AVANÇOS NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DE GÊNERO CONTRA MULHERES EM TERESINA-PI DE 2011 A A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA ADVOCACIA: a desigualdade de gênero sistêmica e sua relação com a maternidade

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19 PROTAGONISMO FEMININO NO CONTEXTO POLÍTICO: a força da sororidade * RESUMO: A luta pela inclusão das mulheres tem crescido muito nos últimos anos, buscando uma maior representatividade no mercado de trabalho e também na política. A sororidade se mostra como uma ferramenta poderosa para que as mulheres ocupem mais espaço tanto no mercado de trabalho como também em cargos políticos. Entretanto, é preciso que essa sororidade, principalmente no contexto político, seja baseada na competência e propostas da candidata e não pelo simples fato de ela ser mulher. Portanto, é necessário um cuidado muito grande nesse aspecto. Diante disso, objetiva-se com esse trabalho abordar o protagonismo feminino no contexto político e a força da sororidade. A metodologia será descritiva e contará com um levantamento bibliográfico. Palavras-chave: Protagonismo feminino. Contexto Político. Força da Sororidade. ABSTRACT: The struggle for the inclusion of women has grown a lot in recent years, seeking greater representation in the labor market and also in politics. Sorority is a powerful tool for women to occupy more space both in the job market and in political positions. However, this sorority, especially in the political context, must be based on the candidate's competence and proposals rather than simply because she is a woman. Therefore, great care is required in this regard. Given this, the objective of this work is to address the female protagonism in the * Bacharel em Direito Conclusão do curso em dezembro de 1996, pela Universidade Gama Filho (Campus Piedade) e Pós-Graduação em Direito Civil e Processual Civil Conclusão do curso dezembro de

20 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição political context and the force of sorority. The methodology will be descriptive and will include a bibliographic survey. Keywords: Female protagonism. Political Context. Sorority Force. 1 INTRODUÇÃO Sororidade quer dizer a união e aliança firmada entre mulheres, baseada na fraternidade, empatia e companheirismo. Desta forma, a sororidade, enquanto sentimento aparece e se torna mais forte a partir da necessidade das mulheres de compartilharem vivências subjetivas e consequentemente formarem ligações positivas e saudáveis umas com as outras. A ideia da sororidade é que de as mulheres juntas são mais fortes. Do ponto de vista do feminismo, a sororidade consiste na solidariedade feminista no combate à ideia de que existe competição e concorrência entre as mulheres, ideia esta preconizada por uma sociedade machista. As mulheres nos últimos anos tem alcançado uma maior representatividade no mercado de trabalho e também na política. Nesse sentido, a sororidade se mostra como uma ferramenta poderosa para que as mulheres ocupem mais espaço tanto no mercado de trabalho como também em cargos políticos. Diante disso, objetiva-se com esse trabalho abordar o protagonismo feminino no contexto político e a força da sororidade. A metodologia utilizada será a descritiva e contará com um levantamento bibliográfico. 2 SORORIDADE E PROTAGONISMO FEMININO NO CONTEXTO POLÍTICO O patriarcado sempre alimentou a rivalidade feminina, seja sutilmente ou claramente. Tal ideia de competição demonstra o 2

21 machismo sistemático vigente em nosso meio social (BENARDES et al, 2017). Devido à permanência desses aspectos que alicerçam o sistema patriarcal, é indiscutível a necessidade da sororidade, estabelecida como a união e aliança entre mulheres, fundamentada na empatia e companheirismo, objetivando alcançar propósitos em comum (SOUZA, 2016). No entanto, a abordagem sobre a temática nos diversos meios de comunicação tem uma peculiaridade utópica, já que a discussão fomentada teria que ser por uma perspectiva homogênea. Para assegurar a eficácia da sororidade como um impulsionador da força do movimento feminista, é indispensável modificar o feitio da discussão sobre a agregação feminina, formando uma teia que insira várias nuances que distinguem as mulheres, segundo seus contextos. Para tal, esse ideal necessita ser disseminado de forma que leve em consideração às opressões de raça, gênero, classe e vínculos interpessoais entre as mulheres, existentes nos próprios movimentos feministas, assim como no âmbito social comum. Daí ser assertivo declarar que a sororidade não é amar todas as mulheres, porém, não odiálas por serem mulheres (SOUZA, 2016). Segundo Valoura (2011, p.11), "empoderamento pode ser visto como a noção freiriana da conquista da liberdade pelas pessoas que têm estado subordinadas a uma posição de dependência econômica ou física ou de qualquer outra natureza". Sororidade e empoderamento feminino se integram, ou seja, eles coincidem. Não há como desassociar um do outro, já que uma mulher que pleiteia por direitos iguais, da mesma forma, apoia, acolhe e dá estímulo àquela em situação de abuso, opressão, medo e discriminação. A diversidade é necessária para que a representação política democrática aconteça e essa busca tem se desenvolvido na sociedade contemporânea (YOUNG, 2006). Nessa perspectiva, a procura por uma maior representação feminina no âmbito político tem sido intensa (PHILLIPS, 2001). 3

22 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Como ressaltam Miguel e Biroli (2010), tal abordagem está relacionada a uma diferença presente entre homens e mulheres na sociedade, dentro do ambiente político. Para os autores, a política tem sido vista, até hoje, como um espaço masculino, propiciando aos homens maiores oportunidades (PHILLIPS, 2001). Outro aspecto essencial para a efetividade da representação é a ligação mais estreita entre o representante e seu eleitorado, como também afinidade entre as características do representante e de seus eleitores (YOUNG, 2006). Embora existam algumas posições de que, dentro dos grupos sociais, haja diferenças específicas entre seus membros, de acordo com Phillips (2001), uma mulher exercendo um cargo político, tem a habilidade de reivindicar várias demandas de diversas individualidades do grupamento ao qual pertence. É indiscutível a individualidade identificada nas mulheres, no entanto, existem aspectos nas sociedades que atingem todas as mulheres, tal como a lógica de que o homem se adequa melhor na política (SACCHET, 2011). Além disso, a estada da mulher na política é precedida de estereótipos, como, por exemplo, a carga de trabalho doméstico, já que é de sua competência o espaço doméstico, o que dificultaria sua participação em atividades políticas, entre outros preconceitos (MIGUEL; BIROLI, 2010). Nesse novo paradigma democrático é essencial, a participação das mulheres para a concretização de uma nova cidadania, mais inclusiva e humanitária, já que em todos os setores da sociedade se busca a participação feminina, particularmente nas tomadas de decisão relacionadas ao legislativo (GROSSMANN; NUNES, 2014). Importante se faz então entender que a representação e a participação feminina não significa um simples atendimento às leis, no sentido de estabilidade política, mas, admitir que a predominância de homens nos espaços decisórios é maléfica para a sociedade, já que a representação da sociedade é efetiva quando existe a pluralidade de grupos nesses espaços (YOUNG, 2006). 4

23 Uma das formas de se atingir esta pluralidade, são as cotas, sendo um dos interesses contemporâneos acerca de uma representação mais justa, já que são meios aceitáveis e desejáveis de promover a inclusão de perspectivas e interesses diversificados (YOUNG, 2006, p.183), sendo este o caso das mulheres. Especificamente sobre as cotas de gênero, a questão foi formalmente discutida na 1ª Conferência Ministerial Europeia, em No entanto, no Brasil, a discussão sobre igualdade entre homens e mulheres só aconteceu no momento que o país adotou as medidas discutidas durante a IV Conferência Mundial sobre a Mulher, ocorrida em Beijing, em 1995 (RANGEL, 2010). A primeira experiência em questão se deu com a definição de uma cota mínima de 20% para a candidatura de mulheres, nas eleições de Para as eleições do ano seguinte, em 1997, determinou-se, através do 3º do artigo 10 da lei nº 9.504/1997, que os partidos políticos tinham a obrigação de preencher as vagas para as candidaturas com no mínimo 30% e máximo 70% de cada sexo (BRASIL, 1997). Além desta determinação, a alteração do inciso V do artigo 44 da Lei 9.096/1995 feita pela Lei /2009 instituiu que, no máximo, 5% dos recursos do Fundo Partidário fossem empregados na criação e custeio de programas que objetivassem a promoção e disseminação da participação das mulheres na política (BRASIL, 2009). O sistema de cotas vigente no Brasil é o de legislação nacional de reservas de vagas partidárias, como mencionado anteriormente. No entanto, não há apenas um tipo de cotas para mulheres na política, podendo ser elencados outros dois: cotas por iniciativa dos partidos políticos e cotas como reserva de assentos parlamentares (ARAÚJO, 2001). Como o nome já prenuncia, o sistema de cotas como iniciativa dos partidos políticos é uma reserva de vagas pelos partidos destinadas para a candidatura de mulheres, isto é, cada partido político pode destinar uma quantidade de vagas para a candidatura de mulheres. Nesta circunstância, não se trata de uma lei, mas sim de uma iniciativa 5

24 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição voluntária. Assim sendo, os partidos não têm obrigação de reservarem essas vagas (ARAÚJO, 2001). Sobre o sistema de cotas como reserva de assentos parlamentares, tal reserva é direcionada para a eleição de mulheres, isto é, mesmo se homens forem mais votados, seriam eleitas mulheres, utilizando a porcentagem estabelecida para elas nas cadeiras parlamentares. Tal sistema está mais presente na Ásia, África e países do Leste Europeu (PAXTON; HUGHES, 2016). De acordo com as próprias mulheres eleitas deputadas, na época que iniciou a implantação de cotas na política, no Brasil, a necessidade dessa determinação vai além da eleição (GROSSI; MIGUEL, 2001). As cotas abarcam também a questão da representatividade dos interesses das mulheres, que ocorre efetiva e eficientemente no momento que tais interesses são defendidos pelas próprias mulheres, não sendo encontrado o mesmo respaldo dos representantes homens, ampliando, inclusive, o leque de interações com a sociedade (PAXTON; HUGHES, 2016). Nesse cenário, questões sobre o direcionamento de recursos governamentais e políticas públicas, como também a qualidade de decisões tomadas politicamente, são motivadas positivamente pela diversidade de gênero (LIMA, 2010). Para que esta representação se processe, há necessidade da garantia de meios e espaços para que as mulheres se organizem e se sistematizem em torno de temas que são de interesse comum (DIAS; SAMPAIO, 2011). É um desafio criar condições justas para disputar com os homens espaço na política, consistindo quase numa mudança conceitual de política para a população, havendo necessidade de desconstrução gradativa da denominação de papéis sociais, políticos e econômicos tanto dos homens, quanto das mulheres (PAXTON; HUGHES, 2016). Desta maneira, a competição partidária mais diversificada, combinada com o surgimento de novos partidos, tende a proporcionar mais 6

25 oportunidades de ingresso para as mulheres na esfera política (ARAÚJO, 2005, p. 5). No final do século XX começa a ficar mais visível a presença feminina na política, principalmente, em postos mais elevados. Os autores apresentam dados que anunciam que o número de mulheres que se candidataram ao cargo de deputada estadual subiu de 571, em 1994, para 3274, em 2010, bem como de 17 para 36, no mesmo período, para o Senado (DIAS E SAMPAIO, 2011). Na Câmara dos Deputados são 77 mulheres que compõem a bancada feminina, o que equivale a 15% das 513 vagas. Verifica-se um aumento na representatividade, já que nos quatro anos anteriores, havia somente 51 deputadas federais. Da mesma forma, no Senado, o percentual é de 15%, havendo 12 senadoras, num total de 81 vagas. Tal quadro constata, claramente, que ainda é pequena a representatividade da mulher na política (EBC, 2019). 3 CONCLUSÃO Diante do exposto, conclui-se que juízos de valor, preconceitos e ideologias precisam ser desenraizadas da sociedade, assim como da própria mulher. A sororidade é uma prática que pode auxiliar nesse caminho. É urgente mudar a ordem social vigente. E as mulheres, cada vez mais, tomam consciência dessa luta, se unindo em uma rede de afeto e empatia, (re)significando a irmandade, como um sentimento de força nessa luta árdua, sabendo que, embora haja a singularidade feminina, enfrentam o desafio enxergando o mundo sob uma nova perspectiva. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAÚJO, C. As cotas por sexo na competição legislativa: o caso brasileiro em comparação com as experiências internacionais. Dados, Rio de Janeiro, 2001, v. 44, n. 1, p

26 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição ARAÚJO, C. Partidos políticos e gênero: mediações nas rotas e ingresso das mulheres na representação política. Revista Sociologia Política, Curitiba, n. 24, p , ARAÚJO, C As mulheres e o poder político desafios para a democracia nas próximas décadas. In: BARSTED, L. L.; PITANGUY, J. O progresso das mulheres no Brasil Rio de Janeiro: Cepia, BENARDES, C. R. O. O que é Sororidade e por que precisamos falar sobre? In Carta Capital, jun BRASIL Lei nº 9.504, de 30 de setembro de Estabelece normas para as eleições. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 30 de setembro de Disponível em: Acesso em 23 de junho de BRASIL Lei nº , de 29 de setembro de Altera as Leis nos 9.096, de 19 de setembro de Lei dos Partidos Políticos, 9.504, de 30 de setembro de 1997, que estabelece normas para as eleições, e 4.737, de 15 de julho de Código Eleitoral. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 29 de setembro de Disponível em: Acesso em 23 de junho de DIAS, J. SAMPAIO, V. G. A inserção política da mulher no Brasil: uma retrospectiva histórica. Estudos Eleitorais, Brasília, 2011, v. 6, n. 3, p , set./dez. 8

27 EBC. Empresa Brasileira de Comunicação. Câmara dos Deputados terá 15% de mulheres. Disponível em: Acesso em: 2 de setembro de GROSSI, M. P. MIGUEL, S. M. Transformando a diferença: mulheres na política. Estudos Feministas, Florianópolis, 2001, vol. 9, n. 1, p , jul./dez. LIMA, F. F. P. A. Entre o diálogo e a (re)significação do sentido: um olhar sobre a identidade da mulher política. Bakhtiniana, São Paulo, 2010, v. 1, n. 3, p , jan./jun. MIGUEL, L. F.; BIROLI, F Práticas de gênero e carreiras políticas: vertentes explicativas. Estudos Feministas, Florianópolis, v. 18, n. 3, p , set./dez. PAXTON, P. HUGHES, M. M. Women, politics, and power: a global perspective. 3. ed. Washington: CQ Press, PHILLIPS, A. De uma política de ideias a uma política de presença? Estudos Feministas, Florianópolis, 2001, ano 9, p , jul./dez. RANGEL, P. Participação feminina na política institucional: análise do sistema eleitoral brasileiro e sugestões de mudança. In:. Relatório anual do Observatório Brasil de Igualdade de Gênero 2009/2010. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, SACCHET, T. Partidos políticos e (sub)representação feminina: um estudo sobre recrutamento legislativo e financiamento de campanhas. In: PAIVA, D. (Org.). Mulheres, política e poder. Goiânia: Cânone,

28 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição SOUZA, B. Vamos juntas? O guia da sororidade para todas. 1a Ed. Rio de Janeiro: Galera Record, VALOURA, Leila de C. Paulo Freire, o educador brasileiro autor do termo empoderamento, em seu sentido transformador. Campinas: Contexto, 2011 YOUNG, I. M. Representação política, identidade e minorias. Lua Nova, São Paulo, 2006, v. 67, p

29 UMA DESIGUALDADE DE GÊNERO QUE INIBE A MULHER POBRE * RESUMO: Em que medida a desigualdade de gênero pode incidir sobre a condição de pobreza e as formas de proteção das famílias? Essa é a questão norteadora deste texto. Trata-se de pensar qual o lugar da mulher nas famílias pobres. No espaço doméstico, essas mulheres, ao assumirem a identidade de mães, se tornam as principais responsáveis por prover e cuidar de sua família e, mesmo habitando espaços desiguais, criar alternativas constituindo redes de apoio e proteção para driblarem as inseguranças sociais. Palavras-chaves: Pobreza. Desigualdade. Gênero. Famílias. Proteção social. ABSTRACT: To what extent may gender inequality fall over the situation of poverty and the ways of protecting the family? This is the main question of this text. It discusses women's place in poor families. In the domestic sphere, these women, taking over the identity of mothers, become primarily responsible for providing and caring for their families, and even when they live in uneven spaces, they create alternatives to have support and to protect from social insecurities. Keywords: Poverty. Inequality. Gender. Family. Social protection. 1 INTRODUÇÃO * Mestre de Direito Civil Comparado /Puc-Sp. Especialista em Direito Público pela Universidade de Itajaí Sc. Especialista em Mediação e Conciliação pela Escola da Magistratura do Rio Grande do Norte. Especialista em Processo Civil e Contratos pela Uniderp, Advogada e consultora jurídica desde

30 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição O texto tem como proposta resumir e apontar o lugar da mulher na família e as relações de proteção social travadas nos espaços onde a pobreza. Enquanto figura central da vida doméstica, a mulher vem merecendo destaque na esfera pública como pessoa de referência para o recebimento de benefícios sociais devido ao fato de aplicar melhor dos recursos no âmbito familiar, apesar do reconhecimento quanto aos cuidados e proteção da família, as políticas não têm se voltado para a perspectiva de gênero e desse modo, as desigualdades e discriminações continuam incidindo sob formas injustas de oportunidades. No contexto da pobreza, e mais especificamente da vulnerabilidade acentuada, as mulheres, para driblarem as inseguranças sociais, acabam tecendo redes de apoio, em geral com outras mulheres, e por meio dessas relações sociais com os mais próximos ocupam o lugar onde o Estado e o mercado não chegam, prestando relevantes serviços no enfrentamento das condições de pobreza. 2 HABITANDO ESPAÇOS DESIGUAIS Se iniciarmos tomando a desigualdade do ponto de vista da "natureza" humana, podemos afirmar que os seres humanos são diferentes entre si. É nesse sentido que Arent chama atenção para "a pluralidade da condição humana pelo fato de sermos todos os mesmos, isto é, humanos, sem que ninguém seja exatamente igual a qualquer pessoa que tenha existido, exista ou venha existir" (2001, p. 36). Trata-se de processos dependentes, como é o caso da relação entre desigualdade e pobreza. É nesse sentido que Prates ressalta que um "aumento da desigualdade, implica aumento da pobreza. Mas a diminuição da desigualdade não garante uma melhora nos indicadores de pobreza." (1990, p. 61). É nessa mesma linha que Telles afirma que a pobreza se transformou em paisagem, um desenho de uma gente desumanizada e 12

31 abandonada, sem pai ou mãe, "um efeito indesejado de uma história sem autores e responsabilidades" (1994, p. 6). Para a referida autora, "o problema da igualdade parece se esgotar no acesso aos mínimos de sobrevivência" (1999, p. 9), fora do contrato social, os que encarnam a pobreza absoluta vivem sob os imperativos da sobrevivência. Por pobreza absoluta entende-se o não acesso a mínimos necessários a sobrevivência física, enquanto na pobreza relativa isso é garantido, porém em patamares insuficientes, inscrevendo os sujeitos, em condições de vulnerabilidade e riscos sociais. Hoje, várias são as abordagens em torno da pobreza, o discurso pautado na ótica da sobrevivência física vem cedendo espaço para concepções menos restritivas a partir da introdução de variáveis mais amplas, como é o caso do conceito desenvolvido por Amartya, que parte da premissa de que ser pobre não implica somente privação material. As privações sofridas determinarão a posição dos sujeitos nas outras esferas (2009, p. 73). Há que se perceber o caráter multidimensional da pobreza. Além de privações materiais, os pobres estão expostos a maiores vulnerabilidades e riscos sociais. Associa-se a essa ideia a falta de oportunidades de expressão e, consequentemente, de escuta sobre o que eles têm a dizer sobre sua condição, tomo emprestado de Crespo e Gurovitz uma definição de pobreza pelos pobres: Pobreza é fome, é falta de abrigo. Pobreza é estar doente e não poder ir ao médico. Pobreza é não poder ir à escola e não saber ler. Pobreza é não ter emprego, é temer o futuro, é viver um dia de cada vez. Pobreza é perder o seu filho para doença trazida pela água não tratada. Pobreza é falta de poder, falta de representação e liberdade. (2002, p. 11). Aqui nos interessa pensar as famílias regidas sob o signo da pobreza, tais famílias vivenciam a realidade do desemprego ou inserções precárias cujas consequências são os baixos rendimentos, a falta de 13

32 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição oportunidades educacionais, acesso limitado e baixa qualidade dos serviços de saúde e infraestrutura habitacional, segregação sócio espacial. Tudo isso conforma um conjunto de desvantagens sociais alimentadas pelo caráter limitado de seu patrimônio cultural. Desse modo, as identidades das famílias pobres vão se desenhando através de visíveis fronteiras territoriais. Por território entende-se o que Milton Santos (2007, p. 14) refere-se como território usado: "A identidade é o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é o fundamento do trabalho: o lugar da residência, das trocas materiais e espirituais e do exercício da vida". É necessário lembrar que o padrão dominante de família instituído nas sociedades industrializadas conferiu a mulher o espaço dos cuidados domésticos e afetivos. É nesse sentido que Vaitsman afirma que "a sociedade industrial moderna constituiu-se, entre outras coisas, pela separação do público e do privado e pela doutrina das esferas separadas por naturezas sexuais desiguais, expressas na ideologia, nas políticas e na legislação" (2016, p. 60). Apesar dos avanços obtidos em termos de igualdade jurídica para mulheres e homens, no plano social e político verifica-se que ainda prevalecem as desigualdades de oportunidade. Diante dessas questões Szmanski destaca que "o mundo familiar mostra-se numa vibrante variedade de formas de organização, com crenças, valores e práticas desenvolvidas na busca de soluções para as vicissitudes que a vida vai trazendo" (1995, p. 27). Isso nos remete ao fato de que a família deve ser pensada no plural. Vários são os modos de estabelecer suas relações, sintonizados com as mudanças sociais em curso. No entanto, se a família muda, o que se conserva é o seu lugar social. Esse "encontro" é também desencontro. Se tomarmos a família como espaço de ambiguidades e contradições perceberemos que ela não é só o ninho, mas também o nó. Lócus de pertencimento e de visíveis fronteiras aí. O fato é que, movidos por questões afetivas e socioeconômicas, os sujeitos se aproximam e desenham um modo de 14

33 viver e atender suas necessidades. Nesse sentido, a família é uma forma de organização social bem sucedida. Tais fronteiras reforçam a distância entre a vida pública e a privada e alimentam eixos que constroem a desigualdade no cotidiano das mulheres pobres pela falta de autonomia do corpo e da sexualidade e que também acabam por desaguar na falta de autonomia pessoal e econômica. Um dos marcadores mais importantes da identidade feminina é, sem dúvida, a maternidade. A condição de mulher, sempre associada ao papel de mãe, cuja responsabilidade no cuidado com os filhos parece uma imposição da ordem da natureza, limita as oportunidades de construção de outros marcadores identitários necessários à ordem civilizatória. Longe dos benefícios e vantagens que seu lugar social não pode proporcionar, essas mulheres acabam tecendo redes sociais e alternativas peculiares a partir do vivido. Apropriam-se do seu lugar e da sua condição, dos saberes e fazeres compartilhados, em busca de proteção. 3 REDES DE PROTEÇÃO: refúgio das inseguranças sociais É a partir de referências próximas ao nosso cotidiano que as redes de solidariedade são tecidas no cruzamento indissociável das esferas públicas e privadas. Nesse assunto, é importante também a contribuição sobre proteção próxima e sociabilidade primária enquanto "formas de pertença à família, vizinhança, grupo de trabalho, com suas redes de interdependências, sem mediação das instituições específicas; e a proteção secundária, definida como o lugar das instituições criadas para aqueles que se desatrelaram das redes de sociabilidade primária" (Castel, 1998b, p. 59). Para Bilac, a naturalização da relação mulher cuidado é um dos indicadores que fazem com que elas sejam responsáveis pelas redes de parentesco e de vizinhança, ao passo que os homens estando mais distantes dessas redes, desenvolvem laços em estruturas de oportunidades mais amplas como as redes de trabalho e de lazer, 15

34 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição sobretudo nos espaços dos bares (Bilac, 2006, p. 62). Ao assumir a centralidade com o cuidado e proteção de seus familiares, a mulher tem também importância garantida na transmissão de oportunidades e perspectivas de vida dos mesmos. Apesar de as políticas públicas e sociais terem um lugar específico no que se refere às formas de enfrentamento da pobreza, acredita-se que sua contribuição poderia ser maior na redução de seu impacto caso houvesse, de fato, uma articulação entre diversos setores sociais como educação, emprego e renda, saúde, habitação, saneamento e urbanização. Essa é, sem dúvida, uma questão polêmica, de modo que o conjunto da sociedade brasileira não tem demonstrado solidariedade com a pobreza e com os pobres. Até mesmo os profissionais que atuam na linha de frente das políticas e programas sociais carecem de recursos objetivos e subjetivos capazes de conciliar as demandas com a qualidade dos serviços prestados. É nesse contexto de pobreza e vulnerabilidade que as famílias centradas nas mulheres buscam formas alternativas de proteção associadas aos "mínimos" das políticas governamentais, como refúgio das inseguranças sociais. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Pensar desigualdade de gênero e associá-la ao fenômeno da pobreza implica questionamento de um contrato sexual truncado que, por sua vez, estabelece oportunidades desequilibradas e injustas, conferindo à mulher responsabilidades cada vez maiores, para cuidar e prover sua família.o caráter multidimensional da pobreza e a pluralidade dos modos de ser e viver das famílias afetam diretamente a mulher, enquanto figura central da esfera doméstica. Desse modo, a conciliação entre os afazeres domésticos e o trabalho fora do lar, impõe um duplo esforço na administração do tempo. Nesse sentido, a autonomia pessoal proporcionada pela "máquina de lavar" e pelo acesso a equipamentos sociais como creches, escolas e 16

35 atendimento à saúde reprodutiva, pode influir na autonomia econômica das mulheres. Quando essas mulheres são as únicas responsáveis pelo provimento de sua família, a condição de vulnerabilidade se acentua, aumentando os riscos sociais. Em busca de apoio, tendem a tecer redes de solidariedade em geral com outras mulheres, sejam parentes ou vizinhas. E no contexto dessas relações demonstram o poder de enfrentamento diante das privações vivenciadas. Trata-se de privações materiais e simbólicas acumuladas ao longo da vida e reproduzidas sob as formas de desigualdades e discriminações, inclusive por parte das políticas públicas, que mesmo tomando como alvo preferencial as mulheres, não tem se voltado para a perspectiva de gênero. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARENT, H. Condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, BILAC, E. D. Gênero, vulnerabilidade das famílias e capital social: algumas reflexões. In: CUNHA, J. M. P. (Org.). Novas metrópolis paulistas: população, vulnerabilidade e segregação. Campinas: Nepo/Unicamp, p CASTEL, R. Desigualdade e questão social. São Paulo: Educ; Petrópolis: Vozes, CASTEL, R. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Petrópolis: Vozes, PRATES, C. A. Mensuração da pobreza: o dedo na ferida. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 4, n. 2, p ,

36 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição REIS, E. P. Percepções da elite sobre a pobreza e desigualdade. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 15, n. 42, fev SOARES, V. Políticas Públicas para igualdade: papel do Estado e Diretrizes. In: GODINHO, T.; SILVEIRA, M. L. (Orgs.). São Paulo, p (Cadernos da Coordenadoria Especial da Mulher, n. 8. SZMANSKI, H. C. B. (Org.). A família contemporânea em debate. São Paulo: Cortez, TELLES, V. Pobreza e Cidadania: duas categorias antinômicas. Mínimos de cidadania: ações afirmativas de enfrentamento à exclusão. Cadernos do Núcleo Social Seguridade e Assistência Social, São Paulo, Direitos sociais: afinal do que se trata. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, VAITSMAN, J. Flexíveis e plurais: identidade, casamento e família em circunstância pós-moderna. Rio de Janeiro: Rocco,

37 DAS COTAS ELEITORAIS À PARIDADE: medidas normativas de promoção à participação política feminina na América Latina * 1 INTRODUÇÃO Em uma sociedade plural, mas caracterizada por ter fincado suas bases de estruturação em relações assimétricas de poder entre homens e mulheres, a necessidade de afirmação e reafirmação da presença feminina no espaço público tomam corpo também na representação eleitoral, sendo responsável por moldar a lentidão com a qual se deu a inserção da mulher na vida pública, principalmente nos espaços da política institucional. Como resultado, sobretudo, das reivindicações femininas no campo político, desde a Convenção de Pequim (1995), se discute cada vez mais na comunidade internacional a proteção à participação da mulher na arena eletiva, recebendo foco, nas últimas décadas, as ações a serem adotadas pelos Estados para propiciar a maior presença dela neste espaço. Dentre essas medidas, o estudo ora empreendido focaliza nos atuais modelos normativos que se destinam a garantia da presença feminina nos parlamentos e que vêm sendo adotados pelos Estados latino-americanos - as cotas de gênero e as normas orientadas pelo critério da paridade, questionando como a América Latina vem caminhando no campo das medidas institucionais normativas de promoção à representação política feminina. * Mestranda em Direito pela Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA). Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Regional do Cariri (URCA). Advogada. 19

38 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Objetiva-se, em âmbito geral, investigar o trajeto de evolução das medidas de inclusão das mulheres na política, na América Latina - das cotas à paridade -. Especificamente, busca-se entrelaçar a dinâmica das relações de gênero com os déficits da democracia para as mulheres; delinear a justificação social-jurídica para adoção de ações afirmativas na política, expondo o caso das cotas eleitorais e; ao fim, analisar a perspectiva da paridade como medida normativa de estímulo à inserção política feminina. A orientação metodológica que se segue inclui a utilização do método de abordagem dedutivo e dos métodos de procedimento histórico e comparativo. Realiza-se uma pesquisa de cunho exploratório e preponderantemente qualitativo, que adota como técnica de pesquisa, a pesquisa bibliográfica, de aporte em livros e artigos sobre o tema, e a pesquisa documental, que recai, sobretudo, sobre documentos legislativos e estatísticos. Com isso, pretende-se explorar as camadas do processo de evolução da adoção dessas medidas legais, norteando-se aqui pelo percurso histórico do desenvolvimento da principal das ações desta espécie, as cotas de gênero, e o guiando ao confronto com da perspectiva da paridade nos processos eleitorais. 2 GÊNERO, PODER E DEMOCRACIA Ao situar o elemento gênero como uma categoria edificante das relações sociais no que se refere à percepção das diferenças entre os sexos e como uma maneira inicial de dar sentido às relações de poder, evidenciam-se as interseções entre estas e a inscrição sociocultural em torno das distinções entre mulheres e homens, alcançando-se a necessidade de entendê-las mais de forma problematizante do que como uma simples oposição entre os sexos (SCOTT, 1990). É partindo desta premissa, que no aporte teórico do estudo está o dimensionamento do gênero como uma categoria socialmente construída e, como tal, fundamental para a análise de fenômenos 20

39 históricos e sociais, como também para formulações que acentuem as repercussões das estruturas de dominação sobre o processo de inferiorização feminina no campo político e suas repercussões na qualidade de uma democracia. Como lembra Beauvoir (1970), as fronteiras entre público e privado são inexistentes para os homens, mas, para as mulheres atuar fora do domínio privado está em constante contradição com a sua feminilidade. Impondo-se reconhecer que essa limitação não atinge todas as mulheres de um único modo, sendo imperioso frisar que há outras variáveis relacionadas às suas identidades sociais, como a raça, a orientação sexual e a classe social, que definem modos diversos de se vivenciar a discriminação de gênero e que são diferenças que fazem a diferença (CRENSHAW, 2002, p. 173). No paradigma do feminismo pós-colonial latino-americano e da construção das epistemologias do sul, tais observações se agregam à necessidade de descolonizar o pensamento eurocêntrico dominante, focando-se no caráter cumulativo das desigualdades que afligem as mulheres de formas diferenciadas e na busca por uma democracia não só de gênero, mas também racial e intercultural (SANTOS, 2014). Partindo-se, pois, dessa perspectiva teórico-prática, se chega ao campo político, onde tais disparidades podem ser visualizadas nitidamente, tanto em nível de acesso, como no de permanência, o que resulta em espaços formais de representação desiguais e pouco plurais. Para Bobbio (1986), uma democracia efetiva exige a participação ampla de todos os interessados no processo de tomada de decisão e necessita que haja, da mesma forma, reais opções de poder político. Se essa é tônica do conceito, pode-se presumir, como assinala Miguel (2018), que a exclusão de determinados grupos desse mecanismo de tomada de decisões coletivas - a exemplo do que ocorre com as mulheres - não é apenas um déficit, e sim algo que orienta um sistema dito democrático, mas que o é apenas formalmente. 21

40 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição 3 A JUSTIFICAÇÃO SOCIAL-JURÍDICA DAS AÇÕES AFIRMATIVAS DE GÊNERO NA POLÍTICA E AS COTAS ELEITORAIS O alcance dos direitos políticos foi um avanço inegável para a constituição da cidadania feminina. No entanto, o debate atual sobre o tema exige o necessário entendimento de que essa conquista não foi suficiente para a igualdade de gênero na política e de que, por trás da baixa taxa de mulheres ocupando cargos políticos, há outras circunstâncias definindo suas chances eleitorais. Fatores como a divisão sexual do trabalho, a institucionalização do cuidado na figura feminina e a própria dinâmica excludente do campo representativo operam como verdadeiras políticas de desvantagem em desfavor das mulheres, as quais ganham contornos ainda mais específicos quando analisadas em interação com recortes de classe e raça (BIROLI, 2018). Em linha de pensamento semelhante, Fraser (2007) trata da representação como uma terceira dimensão que se soma à redistribuição e ao reconhecimento na composição da justiça social, figurando como um dos focos principais das políticas feministas nas últimas décadas, ao buscarem por igualdade política tanto nos limites da política estatal, como nos intercâmbios transnacionais, fixando, assim, a justiça de gênero como um problema tridimensional. É dentro desse quadro que, como fruto de reinvindicações da população feminina nas últimas décadas, pautando a adoção de uma perspectiva de gênero na política, diversos países passaram a adotar medidas destinadas a incrementar os níveis de presença feminina nos parlamentos, comumente traduzidas na obrigação dos partidos políticos de reservarem proporção mínima de vagas para mulheres em suas listas de candidaturas (YOUNG, 2006). Foi nesse panorama que leis de cotas de gênero passaram a ser adotadas por todo o mundo. Tais medidas, sob o prisma do Direito 22

41 Internacional dos Direitos Humanos, podem ser vistas como fruto da influência do texto de importantes documentos. A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher prevê, em seu art.4º, que os Estados signatários devem adotar medidas especiais e temporárias objetivando a aceleração do processo até a igualdade de gênero; já a Conferência de Pequim, no texto da sua Declaração e Plataforma de Ação, recomenda a adesão a ações afirmativas em favor das mulheres em nível governamental (PRÁ, 2015; PEQUIM, 1995) almejando uma representação paritária. Em âmbito latino-americano, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, de 1994, compreende, em seu art. 4º, j, a proteção ao direito à igualdade de acesso a funções públicas e a participação em assuntos públicos, abrangendo, também, a tomada de decisões (BRASIL, 1996). Neste contexto, se situa a adoção de ações afirmativas (cotas de gênero), na política, na América Latina. Na região, Brasil, Argentina, México, Paraguai, Bolívia, Costa Rica, Equador, Panamá, Peru, República Dominicana, Venezuela, Colômbia, Honduras, Uruguai e El Salvador, adotaram, em algum momento, leis nesse sentido, tendo a maioria dessas adesões se dado entre os anos 1996 e 1998, por influência da Conferência de Pequim (SILVA; HARVEY, 2016). 4 APONTAMENTOS PARA NOVOS CAMINHOS: AS NORMAS DE PARIDADE NOS PROCESSOS EEITORAIS LATINOAMERICANOS Indo além, alguns países latino-americanos aderiram também ao critério da paridade política em medidas legais. Tratam-se de normas que vão além das políticas de cotas que obrigam a reserva de um percentual mínimo para cada sexo nas listas de candidatos e se expressam obrigando os partidos políticos a contemplarem em suas listas de candidaturas 50% de integrantes de cada sexo, tendo sido adotadas 23

42 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição por Argentina, Bolívia, Costa Rica, Equador, Honduras, México, Nicarágua, Panamá e Venezuela (ARCHENTI; ALBAINE, 2018). Scott (2001) explica que a demanda pela paridade traduz-se na exigência de uma igualdade completa na política, através de uma representação numericamente equitativa. Baseando-se neste objetivo, o movimento paritário ganhou notoriedade na França a partir da década de 1990 e também se aliou aos debates que vinham adentrando aos conselhos da União Europeia, resultando na Declaração de Atenas de 1992, documento publicado por mulheres políticas sustentando que uma real democracia imprescinde da paridade na representação (SCOTT, 2001). Os dados da Inter-parlamentary Union (IPU) revelam que na América, se registra apenas 29,9% de mulheres ocupando cargos em Parlamentos (IPU, 2019). Em uma análise ampla, um fator positivo determinante nesse cenário parece ser a transição das simples normas de cotas eleitorais para as normas orientadas pelo critério da paridade, o que também se alia ao conteúdo que irradia dessas normas e a forma como elas são executadas. Exemplificando, têm-se os casos da Bolívia, que ocupa a 3ª posição no ranking global da IPU, com 53,1% de mulheres parlamentares, e do Brasil, que ocupa a posição 131 no mesmo ranking, com 15% de representação feminina (IPU, 2019). Enquanto na Bolívia, o princípio da equivalência garante a alternância e a paridade nas listas de candidaturas e pune os partidos que não a observarem, no Brasil, a lei de cotas 1 obriga os partidos políticos a formarem suas listas de candidaturas observando apenas os limites de no mínimo de 30% e no máximo 70% de candidaturas de cada sexo, nos cargos preenchidos pelo sistema proporcional, não se prevendo sanção legal para o descumprimento (VENTURINI; VILLELA, 2016). 1 No Brasil, as cotas eleitorais de gênero encontram-se regulamentadas pelo art.10, 3º, da Lei nº 9.504/1997, com redação dada pela Lei nº /2009 (BRASIL, 1995). 24

43 Normas orientadas pela paridade indicam um maior potencial para promover a igualdade de gênero na política, pois [...] a paridade não é uma medida temporária, mas um conceito que poderia funcionar como um princípio orientador da democracia (MARTELOTTE, 2016, p. 95). Com isso, tem-se que o modelo orientador das normas de fomento à presença feminina nos cargos políticos pode ter peso significativo no seu desempenho. 5 CONCLUSÃO Viu-se que, nas últimas décadas, é crescente a implementação de ações afirmativas de gênero em processos eleitorais, sobretudo na forma de cotas. Embora tais medidas sejam importantes para estimular a inserção feminina nos espaços de poder, não vêm alcançando resultados tão satisfatórios e, dada sua interação outros fatores, como a divisão sexual do trabalho, ações mais assertivas tornam-se primordiais para estimular uma inclusão efetiva. Nesse sentido, o propósito da discussão sobre a paridade orientando processos eleitorais, e da recente adesão a essa perspectiva por alguns países na América Latina, é o de afastar-se da ideia de garantir apenas uma representação feminina mínima, para debater medidas para alcançar a equivalência na representação. As entrelinhas do potencial presente nesse trânsito de ideias, entre proporcionalidade e paridade, se sustenta aqui ser um dos fatores de peso, no leque das medidas institucionais, a estar por trás de um maior acesso feminino ao poder nos países da região, como exemplifica o caso da Bolívia. Trata-se de um debate que este trabalho não teve pretensão de esgotar, mas de instigar, a fim de contribuir para que se abra cada vez mais espaço, na academia, na prática profissional, e no seio social, sobre novas abordagens institucionais voltadas para o incremento da representação política feminina, que se afastam da noção pura de ação afirmativa e aproximam-se de princípios equitativos. 25

44 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição REFERÊNCIAS ARCHETI, Nélida; ALBAINE, Laura. O Feminismo na política. Paridade e violência política de gênero na América Latina. In: Cadernos Adenauer XIX (2018), nº1, Participação política feminina na América Latina. Rio de Janeiro: Fundação Konrad Adenauer, BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: fatos e mitos (Vol 1). 4 ed. São Paulo: Difusão Européia do Livro, BIROLI. Flávia. Gênero e Desigualdades: limites da democracia no Brasil. São Paulo: Boitempo, BOBBIO. Norberto. O futuro da democracia. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, BRASIL. Decreto nº1.973, de 1º de agosto de Promulga a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do Pará, em 9 de junho de Brasília, DF: Presidência da República, [1996]. Disponível em: Acesso em: 09 jan CRENSHAW, Kimberlé. Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Revista Estudos Feminista, Florianópolis, v. 10, n. 1, p , FRASER, Nancy. Mapeando a imaginação feminista: da redistribuição ao reconhecimento e à representação. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 15, n. 2, p ,

45 INTER-PARLIAMENTARY UNION. Women in National Parliaments. March Disponível em: Acesso em: 12 dez MARTELOTTE, Lúcia. 25 anos de Aplicação de Leis de Cotas na América Latina: Um balanço da participação política das mulheres. Sur- Revista Internacional de Direitos Humanos, São Paulo, v.13, n. 24, p , MIGUEL, Luis Felipe. Dominação e resistência: desafios para uma política emancipatória. São Paulo: Boitempo, PEQUIM. Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial Sobre a Mulher. Pequim, Disponível em: Acesso em: 08 jan PRÁ, Jussara Reis. Mulheres, direitos políticos, gênero e feminismo. Cadernos Pagu, [s.l], n. 43, p , dez SANTOS, Boaventura de Sousa. La refundación del Estado en América Latina. In: CORAGGIO, José Luis; LAVILLE, Jean-Louis (orgs.). Reinventar la izquierda em el siglo XXI: Hacia um diálogo Norte-Sur. Quito: Instituto de Altos Estudios Nacionales (IAEN), 2014, SCOTT, Joan W. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Tradução: Christiane Rufino Dabat e Maria Betânia Ávila, [s.l], Disponível em: Acesso em: 06 jan SCOTT, Joan W. La querelle des femmes no final do século XX. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 9, n. 2, p ,

46 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição SILVA, Ellen da; HARVEY, Isadora Lopes. A política de cotas na América Latina como impulsora da representação feminina na Câmara baixa. Revista Eletrônica de Ciência Política, [s.l.], v. 7, n. 1, p , jul VENTURINI, Anna Carolina; VILLELA, Renata Rocha. A inclusão de mulheres no parlamento como medida de justiça social: análise comparativa dos sistemas de cotas do Brasil e da Bolívia. Revista Eletrônica de Ciência Política, [s.l.], v.7, n.1, p , jul YOUNG, Iris Marion. Representação política, identidade e minorias. Tradução: Alexandre Morales. Lua Nova, São Paulo, n. 67, Disponível em: Acesso em: 05 jan

47 O DIREITO À EDUCAÇÃO COMO INSTRUMENTO GARANTIDOR DA IGUALDADE DE GÊNERO * * RESUMO: Atualmente, observa-se um interesse por parte do poder público e ONGs que possuem o objetivo de auxiliar mulheres a se empoderar. E um dos objetivos deste artigo, é demonstrar que uma das formas mais sólidas de empoderamento é perfectibilizando o acesso à educação, como direito e garantia constitucional, bem como proporcionando o direito à informação como instrumento de luta social. Palavras-Chave: Educação. Feminismo. Igualdade de gênero. ABSTRACT: A notable interest can be seen nowadays, on the part of public agencies and NGOs that focus on women's empowerement. One of the goals of this article is will be demonstrated that the best methods to empower a woman are by guaranteeing her constitucional right of quality education, as well as providing an access to information to be used as an instrument in the social struggle. Keywords: Education. Feminism. Gender equality. * Advogada (OAB/PA: 17585), Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal, Mestre em Direitos Fundamentais, Licenciada em Biologia e Professora. a.carol.lima3@gmail.com. * Advogada (OAB/PA: ), Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho, Pós-graduada em Direito Civil com Ênfase em Contratos e Direito do Consumidor, Pós-graduanda em Psicologia Jurídica, Pós-graduanda em Direito Penal e Processual Penal, Bacharel em Sistemas de Informação. erikamonteiro@hotmail.com.br. 29

48 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição 1 BREVE HISTÓRICO SOBRE O FEMINISMO NO BRASIL O feminismo no Brasil, teve origem no final do século XIX, em um contexto onde a condição da mulher acompanhava as desigualdades sociais e econômicas do país, as mesmas, viviam restritas ao ambiente doméstico e subalternas ao patriarcado, representado por uma figura masculina (pai, irmão ou marido). Nesta época, depois de várias lutas travadas por mais liberdade, o Império, reconheceu o direito à educação feminina, entretanto, tal direito não era dirigido a todas as mulheres, destinando-se quase que exclusivamente a elite. 1 No momento em questão, destaca-se a figura da educadora Dionísia Gonçalves Pinto, mais conhecida pelo pseudônimo de Nísia Floresta Brasileira Augusta, que até os dias atuais é considerada a precursora do feminismo no Brasil e fundadora da primeira escola para meninas do país, além de se dedicar a analisar outras temáticas, por exemplo, redigiu várias obras sobre abolicionismo e republicanismo, porém, sem apartar-se completamente das questões femininas. 2 O século XIX, trouxe ainda outras transformações sociais, como o direito ao voto ou movimento sufragista, assim chamado pela professora Céli Regina Jardim Pinto, segundo a autora, que divide o movimento feminista brasileiro em tendências, essa primeira etapa que vai do século XIX até meados do ano de 1932 e que recebeu a alcunha de feminismo bem comportado, teve como expoente Bertha Lutz. Bem comportado, deriva do caráter conservador do movimento, que pouco questionava a opressão ao qual as mulheres eram submetidas, segundo a autora: Nesse sentido, a luta para a inclusão das mulheres à cidadania não se caracterizava pelo desejo de alteração das 1 COSTA, Ana Alice Alcântara e SARDENBERG, Cecília Maria Bacellar. O feminismo no Brasil: uma (breve) retrospectiva. Salvador: UFBA, 2008, p Idem. 30

49 relações de gênero, mas como um complemento para o bom andamento da sociedade. 3 Importante destacar, que nessa gênese do movimento feminista brasileiro, buscava-se basicamente cidadania, sem questionar-se o papel subalterno e subjugado ao qual as mulheres ainda estavam relegadas. A Federação Brasileira para o Progresso Feminino (FBPF), liderada por Bertha Lutz, jamais questionou o sistema vigente como responsável também pela opressão feminina tal qual sua congênere nos Estados Unidos, sua atuação inspirou-se nos preceitos liberais e no reformismo como estratégia política. Assim, seu programa limitou-se ao combate às leis discriminatórias, preconceitos e tradições que impedem a igualdade entre homens e mulheres, no contexto das democracias burguesas. Para a FBPF, o problema maior estava no atraso do capitalismo brasileiro. 4 O tempo avançou e chegou-se ao século XX, e com ele a tendência do feminismo malcomportado, nas palavras de Céli Regina Jardim Pinto, composto por uma gama de mulheres mais heterogênea, que além da questão política, passaram a lutar contra a dominação masculina, trazendo discussões sobre sexualidade, divórcio e direito à educação. Há ainda, uma terceira vertente do movimento, batizado pela autora de o menos comportado dos feminismos, notando-se a forte combinação com o movimento anarquista e o Partido Comunista, nesse período, além das lutas anteriores, somam-se as questões relacionadas ao trabalho, como direitos trabalhistas e igualdade de direitos no ambiente laboral. Posteriormente, outros temas entraram na pauta, como liberdade sexual e maternidade (anos 50-60), prova disso é que durante a ditatura militar, os movimentos feministas associaram-se aos movimentos sociais e de resistência, passando a discutir a anistia e a 3 PINTO, Céli Regina Jardim. São Paulo: Fundação Perseu Abramo (Coleção História do Povo Brasileiro), p. 4 Idem. 31

50 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição questão das mulheres exiladas, além de racismo e homossexualidade, juntamente com o combate a violência contra a mulher. 5 Para Céli Regina Jardim Pinto, os anos 1980 e a redemocratização trouxeram desafios para os movimentos feministas brasileiros, especialmente no que tange a sua unidade após a reforma partidária e a polarização política, mas também foi nessa década que vieram importantes reforços em favor das mulheres, a criação, pelo Ministério da Saúde, de um programa que envolvia três temáticas delicadas e de relevância: planejamento familiar, sexualidade e aborto; denominado Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM) e a criação de delegacias especializadas, era o Estado reconhecendo a mulher como vítima de violência, foi um importante marco no combate a violência contra o gênero feminino. Já a partir dos anos 1990, destacam-se importantes modificações nos movimentos feministas, a dissociação entre pensamento feminista e movimento feminista, e o amadurecimento das ideias e do próprio movimento, tornando-se mais profissional, com a proliferação de diversas ONG s e associações, o que permitiu às mulheres uma participação e manifestação muito mais plural nos movimentos populares. 6 Atualmente, denomina-se de feminismo interseccional, que é o que agrega todos os tipos de mulheres, bem como suas múltiplas visões, modo de vida e questões pessoais específicas. 2 O DIREITO SOCIAL À EDUÇAÇÃO COMO ELEMENTO DA PROMOÇÃO DA IGUALDADE DE GÊNERO Um dos assuntos mais debatidos no atual cenário político/social brasileiro, é a educação, diferentes propostas e pontos de vista, emergem a 5 SILVA, Daniel Neves; SOUSA, Rainer Gonçalves. "Feminismo no Brasil"; Brasil Escola. Disponível em: Acesso em 05 de janeiro de PINTO, Céli Regina Jardim. Op. Cit. 32

51 todo momento, muitos carregados de subjetivismos e até mesmo preconceitos e ignorância, esta última no sentido lato sensu da palavra. No entanto, alguns assuntos não admitem discussão, o primeiro deles, baseado no exposto anteriormente, séculos de lutas das mulheres por seus direitos, dentre eles a educação e o segundo, a educação como um direito. Na atualidade, raros são os países, que não garantem em seus textos legais, o direito à educação e/ou a educação como um direito, pois este é uma dimensão fundante da cidadania. Assim documentos internacionais já reconhecem e preconizam, um dos maiores exemplos a serem citados são os artigos XXVI da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948 e o artigo 13 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de Norberto Bobbio, assim explanou sobre o tema: Não existe atualmente nenhuma carta de direitos que não reconheça o direito à instrução crescente, de resto, de sociedade para sociedade primeiro, elementar, depois secundária, e pouco a pouco, até mesmo, universitária. Não me consta que, nas mais conhecidas descrições do estado de natureza, esse direito fosse mencionado. A verdade é que esse direito não fora posto no estado de natureza porque não emergira na sociedade da época em que nasceram as doutrinas jusnaturalistas, quando as exigências fundamentais que partiam daquelas sociedades para chegarem aos poderosos da Terra eram principalmente exigências de liberdade em face das Igrejas e dos Estados, e não ainda de outros bens, como o da instrução, que somente uma sociedade mais evoluída econômica e socialmente poderia expressar. 7 No Brasil, foi somente a partir do final da década de 80, com a promulgação da Constituição de 1988, que a educação ganhou status de Direito Fundamental, constitucionalizado, fazendo parte do Capítulo II, título II, denominado Dos Direitos e Garantias Fundamentais, artigo 7 BOBBIO, Norberto. A Era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, p

52 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição 6º. Nesse contexto, impossível negar que a educação é um Direito Humano, que deve ser garantido a todos, pelo simples fato de sua condição humana, sem subjetivismos e/ou análises de valores. Importante ainda, destacar o papel das famílias no processo educacional, haja vista, que a Constituição garantiu não apenas a educação formal, dos livros, mas também aquela adquirida no meio social e familiar, haja vista, a importância e os deveres da família e da sociedade na questão educacional, neste diapasão, todos, em especial a escola tem o dever de não perpetuar uma educação sexista, ajudando na superação de uma condição histórica de desigualdade. Indo além, o papel da educação vista como um Direito Humano, fundamentalizado e constitucionalizado na Carta Magna de 1988, é de modificar a estrutura social e da mentalidade enraizada e engessada durante anos, retirando a mulher de uma situação de inferioridade e colocando-a em uma posição de igualdade dentro da sociedade, mas não apenas porque a lei assim determina, mas porque realmente ela se vê e é vista como igual, detentora de direitos e deveres, membro ativo e participativo do sistema social, em analogia a teoria de Niklas Luhmann. A partir do momento em que as mulheres se reconhecem como sujeito de direitos, elas são capazes de iniciar um processo de mudança e de luta em prol da igualdade, mas para isso, o pilar base é a educação, uma educação realmente libertadora, o mais livre possível de influências ideológicas e/ou religiosas, dogmáticas, promovendo o tão desejado empoderamento feminino. A Organização das Nações Unidas (ONU), em sua entidade denominada ONU Mulheres, estabeleceu sete princípios para o empoderamento feminino, são eles: 1. Estabelecer liderança corporativa sensível à igualdade de gênero, no mais alto nível; 34

53 2. Tratar todas as mulheres e homens de forma justa no trabalho, respeitando e apoiando os direitos humanos e a não-discriminação; 3. Garantir a saúde, segurança e bem-estar de todas as mulheres e homens que trabalham na empresa; 4. Promover educação, capacitação e desenvolvimento profissional para as mulheres; 5. Apoiar empreendedorismo de mulheres e promover políticas de empoderamento das mulheres através das cadeias de suprimentos e marketing; 6. Promover a igualdade de gênero através de iniciativas voltadas à comunidade e ao ativismo social; 7. Medir, documentar e publicar os progressos da empresa na promoção da igualdade de gênero. 8 Paulo Freire, também via a educação como um elemento de libertação para os oprimidos, o que comporta uma analogia com a condição feminina, quando analisada sob uma perspectiva de submissão, que felizmente vem se modificando através dos tempos. O importante, por isto mesmo, é que a luta dos oprimidos se faça para superar a contradição em que se acham. Que esta superação seja o surgimento do homem novo não mais opressor, não mais oprimido, mas homem libertando-se. Precisamente porque, se sua luta é no sentido de fazer-se Homem, que estavam sendo proibidos de ser, não o conseguirão se apenas invertem os termos da contradição. Isto é, se apenas mudam de lugar, nos polos da contradição. 9 Das palavras do autor, pode-se inferir que o papel da escola e da educação como um todo, vai além de trabalhar os oprimidos, desenvolvendo uma consciência de sujeito de direito, todavia, também deve atuar perante e para a modificação dos opressores, em resumo, agem de forma ampla, afim de modificar a estrutura dominante, enraizada e até naturalizada no imaginário popular, deste modo, 8 Disponível em: 9 FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, 17ª. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, p

54 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição imprescindível a defesa e ampliação desse direito, com o mínimo de interferência política/partidária ou dogmática/religiosa. Destaque-se ainda, que como Direito Fundamental, qualquer mácula no sentido de esvaziá-lo ou extingui-lo constitui grave violação aos Direitos Humanos e consequentemente atinge-se frontalmente a dignidade da pessoa humana, que é o princípio máximo do Estado Democrático de Direito, pois como ensina, Norberto Bobbio, o problema maior na atualidade, não é reconhecer ou fundamentalizar os Direitos Humanos, mas sim, garantir efetividade aos mesmos. Os direitos humanos constituem aspirações, [...] fins que merecem ser perseguidos, e de que, apesar de sua demanda, não foram ainda todos eles (por toda parte e em igual medida) reconhecidos. 10 Deve ser nesse sentido, a luta de toda sociedade, sejam homens ou mulheres, a luta pela igualdade e pela educação, como elemento transformador da mentalidade social, como Direito Humano e instrumento de garantia da dignidade da pessoa humana. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BOBBIO, Norberto. A Era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.16 ed. São Paulo: Rideel, CAMARANO, Alessandra; MESQUITA, Arlete; SOUZA, Karlla Patrícia de. (coord.). Feminismo, pluralismo e democracia. Belo Horizonte: RTM, BOBBIO, Norberto. Op. Cit. p

55 COSTA, Ana Alice Alcântara e SARDENBERG, Cecília Maria Bacellar. O feminismo no Brasil: uma (breve) retrospectiva. Salvador: UFBA, DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. Disponível: Acesso: 5 de dezembro de FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, 17ª. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, GONÇALVES, Marli. Feminismo no cotidiano: bom para mulheres e para homens também. São Paulo: Contexto, LUHMANN, Niklas. O conceito de sociedade. In: NEVES, C. B. ; SAMIOS, E. M. B. (Org.). Niklas Luhmann: a nova teoria dos sistemas. Porto Alegre: Ed. UFRGS, MCCANN. Hannah et. al. O livro do feminismo.; tradução Ana Rodrigues- 1 ed.: Rio de Janeiro: Globo Livros, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. ONU MULHERES. Disponível em: Acesso em: 15 de dezembro de PINTO, Céli Regina Jardim. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo: Fundação Perseu Abramo (Coleção História do Povo Brasileiro), SILVA, Daniel Neves; SOUSA, Rainer Gonçalves. "Feminismo no Brasil"; Brasil Escola. Disponível em: Acesso em 05 de janeiro de

56 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição TIBURI, Márcia. Feminismo em comum: para todas, todes e todos. 11ª ed.- Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, WOLFF, Naomi. O mito da beleza: como as imagens de beleza são usadas contra as mulheres; Tradução Waldéa Barcelos. 7. ed. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos,

57 VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: A atuação das ciências forenses sob a perspectiva de gênero * 1 INTRODUÇÃO A desigualdade entre os gêneros é ainda muito presente na sociedade, haja vista a influência do patriarcado que pode ser definido como a manifestação e a institucionalização do domínio masculino sobre as mulheres e crianças das famílias, domínio este capaz de ser estendido à sociedade em geral. Dessa forma, o patriarcado significa também uma tomada de poder histórica e cultural dos homens cujo agente ocasional foi a ordem biológica, elevada tanto à categoria política quanto à econômica (MENDES, 2014). A relação de gênero vivenciada por homens e mulheres é balizada pelas diferenças biológicas, geralmente transformadas em desigualdades que tornam o ser mulher suscentível à exclusão social. Essa exclusão se dá, simultaneamente, nas esferas do trabalho, da classe, da cultura, etnia, faixa etária e, assim sendo, torna difícil a atribuição de um aspecto específico a esse fenômeno (FISCHER, 2001). Diante dessa vulnerabilidade, algumas mulheres ainda vivenciam uma realidade de medo, dependência econômica e até de sentimento de inferioridade, o que as tornam vulneráveis aos agressores que dão início ao que Walker (1977) considera como ciclo da violência. Não obstante, na maioria dos casos, a mulher vítima sofre a violência de maneira silenciosa em seu próprio lar. Por essa razão, quando esta resolve quebrar o referido ciclo da violência, o conjunto probatório * Advogada, Pós-Graduada em Ciências Criminais, Mestranda em Perícias Forenses pela Universidade de Pernambuco (UPE), Membra das comissões de Perícias Forenses e da Mulher Advogada OAB/PE. brunacristina_veiga@hotmail.com. 39

58 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição apresentado ao processo é de grande relevância para a comprovação do fato ocorrido. Se as ciências forenses transitam na interdisciplinaridade, seu papel diante da violência de gênero torna-se abrangente e fundamental, tendo em vista os diversos ramos de investigação importantes no auxílio ao enfretamento da mesma. 2 A CULTURA DO PATRIARCADO E OS MECANISMOS DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER A violência de gênero pode ser compreendida como qualquer fato ou circunstância que submeta uma pessoa de forma física ou psicológica a sofrimento em função de seu sexo e, mais especificamente em se tratando do ser mulher, do ser feminino, a violência se expressa como qualquer ação ou omissão que leve à discriminação, agressão ou cause dano, morte, constrangimento de ordem física, moral, psicológica, econômica, patrimonial, dentre outros (NARVAZ, KOLLER, 2006). Dessa forma, a defesa dos direitos da mulher, com o consequente enfrentamento das formas de discriminação e violência, constitui compromisso dos Estados Democráticos de Direito. Um país que se autodeclara democrático e tem como primado básico promover o bem-estar de todos os cidadãos sem distinção não pode quedar-se alheio ao fenômeno da desigualdade histórica, social e jurídica de que foram alvo as mulheres (BARRETO, 2010). Assim, os tratamentos normativos diferenciados, de acordo com os critérios valorativos, razoáveis e justificáveis, são compatíveis com a Constituição Federal quando verificada a existência de uma finalidade razoavelmente proporcional ao objetivo visado (MORAES, 2008). Os casos de violência de gênero constituem um problema que não pode ser enfrentado fora do âmbito penal, pois isso só estabilizaria ainda mais as relações de poder (SMAUS, 2008). Por conta disso, as ciências criminais têm feito notável esforço no sentido de estabelecer mecanismos de enfrentamento à violência de gênero. 40

59 Apesar de todo o exposto, os avanços legislativos são de grande importância. Contudo, ainda persiste a sedutora ideologia de que a edição de leis penais, sentenças e o cumprimento de penas operam para atenuar mecanicamente as desigualdades entre os gêneros (ANDRADE, 2015). Nesse sentido, vale esclarecer que a tarefa não é apenas a de criar leis mais severas ou do agravamento da legislação em vigência, mas também de realizar uma contextualização social, vinculada ao conhecimento, com intuito de realizar a aplicação das normas (BARBIERI, 2009). 3 AS CIÊNCIAS FORENSES E A PERSPECTIVA DE GÊNERO As ciências forenses atuam no processo de criação e/ou de transferência de conhecimento científico e tecnológico em cada um dos ramos das ciências naturais, aplicando o referido conhecimento na análise de vestígios e na resposta a questões científicas de interesse da Justiça. Assim, qualquer ciência empregada para responder questionamentos jurídicos ou que seja passível de utilização para fins legais pode ser tida como um ramo das ciências forenses, pois estas constituem um campo em que diversas áreas, com seus respectivos métodos, convergem para um mesmo fim (VELHO, GEISER, ESPINDOLA, 2013). No que se refere aos crimes motivados pela questão do gênero, a procura de evidências deve considerar como e quais marcas da violência ficam registradas no corpo da vítima e no ambiente em que a violência foi praticada. Outro fator importante a ser observado é a motivação criminosa do agressor, associada às suas referências socioculturais, às características de autoria, para que se detecte o que ocasionou o sentimento de posse sobre a vítima e o exercício de controle sobre as suas manifestações de vontade (BRASIL, 2016). O Código de Processo Penal torna indispensável o exame de corpo de delito em crimes que deixem vestígios (BRASIL, 1941), tal 41

60 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição exame é feito com prioridade em casos de violência contra a mulher (BRASIL, 2018), bem como é, preferencialmente, realizado por profissional do sexo feminino (BRASIL, 2017). Um dos propósitos do exame pericial é apurar a ocorrência de relação de causa e efeito entre o dano verificado na vítima e o evento, o que se chama nexo causal, e a correlação entre o aspecto da lesão e a data alegada de ocorrência do trauma, o chamado nexo temporal (CINTRA, 2004). A atuação da perícia criminal com perspectiva de gênero é indispensável, por força de lei, e de grande relevância, sobretudo nos casos de feminicídio, devendo ser observado o uso de linguagem não discriminatória, sem reprodução de estereótipos de gênero. A formulação dos quesitos a serem respondidos pelos peritos deve ser revisada e, na medida do possível, modificada para a exclusão de expressões que constranjam a mulher, assim como que não carreguem sentido pejorativo e de todo inconveniente (BRASIL, 2016). Percebe-se que as mulheres em situação de violência tendem, espontaneamente, a procurar e usar mais os serviços de saúde (FERREIRA, 2004). Porém, ressalta-se que a mulher vítima de uma lesão leve, por diversas vezes, não será levada a procurar tal serviço, já que uma simples escoriação pode ser tratada em casa, sem consequências graves. Aquelas que procuram os Institutos Médicos Legais, nessas condições, não estão em busca de cura para suas lesões somáticas e, sim, à procura de solução para seus problemas jurídicos (FARIA, 2006). Os serviços de atenção primária em saúde precisam criar espaços para ouvir, entender e enfrentar a violência de gênero (KRONBAUER, MENEGHEL, 2005). Neste contexto, fica evidente que os profissionais dos serviços de saúde básicos possuem importante papel na detecção e identificação dos casos de violência doméstica e suas vítimas, já que são eles quem prestam os primeiros atendimentos. As mulheres vítimas de violência apresentam lesões com maior prevalência na região da cabeça e pescoço, área de atuação do cirurgião dentista (GARBIN et al., 2006). 42

61 A psicologia também ganha destaque nos conflitos que envolvem mulheres, tendo em vista que o trabalho dos profissionais dessa área contribui para o campo investigativo, nas avaliações e perícias (ROVINSKI, CRUZ, 2009). Assim, o profissional contribuirá para que as mulheres consigam promover transformações individuais e relacionais, ou seja, mudanças no âmbito pessoal e também no que diz respeito ao seu relacionamento conjugal (MACARINI, MIRANDA, 2018). A influência da informática forense também vem crescendo em crimes contra a mulher, principalmente naqueles praticados contra a honra. É importante ressaltar os aspectos sombrios, mórbidos e nefastos dessa violência quando exercida por intermédio dos meios digitais, ambiente no qual o agressor, favorecido pela anonimidade, consegue calar suas vítimas, causando-lhes danos diversos e levando-as, inclusive, à morte, em inúmeros casos por suicídio porque o temor e a sensação de culpa tomam proporções irremediáveis e, na maioria das oportunidades, irreversíveis (LIMA, 2016). Assim, percebe-se a grande importância das ciências forenses nos casos envolvendo violência contra a mulher, tendo em vista que o crime ocorre, por diversas vezes, no silêncio e "aconchego" dos seus lares. Nesse sentido, é fundamental a perícia para a avaliação de risco da mulher, responsabilização do agressor, combate ao feminicídio (ponto máximo da violência de gênero), bem como a identificação de múltiplas lesões e de diferentes cronologias, para verificação de possível caso de violência física reiterada. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A cultura machista ainda se encontra enraizada na sociedade. Por isso, é preciso desenvolver mecanismos de enfretamento à violência contra a mulher que devem ir além da criação de normas positivadas, já que tratase de uma questão de conscientização social muito maior do que de criações de meios punitivos mais severos ou de legislações sobre o tema. 43

62 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição As mulheres vítimas, em muitos casos, vivenciam as diversas formas de agressão entre quatro paredes, sem nenhuma visibilidade, sem auxílio, encobertas pelo manto do silêncio e acuadas pela necessidade de resguardar a moral e os bons costumes ou até por se culparem pelo que vivem. Diante da situação de violência, quando a mulher vítima busca ajuda para encerrar este ciclo, a sua palavra é de grande valia. De todo modo, existem maneiras científicas válidas e aceitáveis juridicamente que compõem o conjunto probatório e que integram o processo judicial no intuito de comprovar a verdade dos fatos, para embasar o livre convencimento do magistrado. Assim, utilizando-se da interdisciplinaridade das ciências forenses, é possível condenar ou inocentar um agressor em qualquer que seja o tipo penal. REFERÊNCIAS ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Soberania Patriarcal, Disponível em: Acesso em: 27 de maio de BABIERI, Ana Amélia. Ocorrência de lesões faciais com envolvimento dentário observada junto aos exames de corpo de delito realizados no IML-Taubaté, SP [dissertação]. Piracicaba: UNICAMP/FOP, BARRETO, Ana Cristina Teixeira. Carta de 1988 é um marco contra discriminação. 05 de novembro de 2010, às 12h15. Disponível em: Acesso em: 30 out BRASIL. Código de Processo Penal, de 03 de outubro de Disponível em: Acesso em: 14 de out. de

63 BRASIL. Diretrizes nacionais feminicídio. Investigar, processar e julgar com perspectiva de gênero as mortes violentas de mulheres. Brasília, Disponível em: Acesso em: 06 de out. de BRASIL. Lei nº , de 8 de novembro de Disponível em: Acesso em: 18 de out. de BRASIL. Lei nº , de 2 de outubro de Disponível em: Acesso em: 06 de out. de CINTRA, Jorge Alberto de Abreu. A importância da Odontologia Legal no exame de corpo de delito [dissertação]. Piracicaba: UNICAMP/FOP, FARIA, Carlos de. Estudo do aspecto odonto-legal das lesões corporais decorrentes de violência doméstica [dissertação]. Piracicaba: UNICAMP/FOP; Disponível em: osde_m.pdf. Acesso em: 14 de out. de FERREIRA, A. F. Mulheres em situação de violência: Magnitude e repercussões no uso de serviços em unidades básicas de saúde do setor público do município de São Paulo [dissertação]. Campinas: UNICAMP/FCM; FISCHER, Izaura Rufino; MARQUES, Fernanda. Gênero e Exclusão Social. Trabalhos para discussão n. 113/2001. Agosto Disponível 45

64 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição em: Acesso em: 16 de out. de GARBIN, Cléa Adas Saliba; GARBIN, Artênio José Isper; DOSSI, Ana Paula, DOSSI, Mário Orlando. Violência doméstica: análise das lesões em mulheres. Cad. Saúde Pública, Disponível em: Acesso em: 09 de maio KRONBAUER, José Fernando Dresch; MENEGHEL, Stela Nazareth. Violência de gênero pelo companheiro. Rev Saúde Pública, LIMA, Glaydson de Farias. Manual de direito digital: fundamentos, legislação e jurisprudência.1. ed Curitiba, Appris, MACARINI, Samira Mafioletti; MIRANDA, Karla Paris. Atuação da psicologia no âmbito da violência conjugal em uma delegacia de atendimento à mulher. Pensando fam. vol.22 no.1 Porto Alegre jan./jun, Disponível em: Acesso em: 14 de out MENDES, Soraia da Rosa. Criminologia feminista: novos paradigmas. São Paulo: Saraiva, MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 23. Ed. São Paulo: Atlas, NARVAZ, Martha Giudice; KOLLER, Sílvia Helena, Mulheres vítimas de violência doméstica: compreendendo subjetividades assujeitadas. Psico, 37(1),

65 ROVINSKI, Sônia Liana Reichert; CRUZ, Roberto Moraes. Psicologia Jurídica: perspectivas teóricas e processos de intervenção. São Paulo: Vetor, SMAUS, Gerlinda. Abolicionismo: elpunto de vista feminista. Trad. Mary Beloff. In: No wayderecho, Año III (7), Buenos Aires: Departamento de Publicaciones de lafacultad de Derecho de la UBA. Disponível em: < B1%5D._Smaus.pdf>. Acesso em: 17 jun VELHO, Jesus Antônio; GEISER, Gustavo Caminoto; ESPINDOLA, Alberi. Ciências Forenses: uma Introdução às principais áreas da criminalística moderna. Ed. Millennium, Campinas, SP. WALKER, Lenore. Who Are the Battered Women? Frontiers: A Journal of Women Studies,

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67 O PAPEL DO HOMEM NO ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DE GÊNERO: uma análise a partir da criação de grupos reflexivos no âmbito da Lei /2006 (Lei Maria da Penha) * * RESUMO: O objetivo deste artigo é enfatizar a importância da atuação com homens inseridos no contexto de violência contra a mulher, tomando por base especificamente a experiência dos grupos reflexivos previstos na Lei Maria da Penha. Em referidos grupos, é delineada a compreensão de que a ideologia da sociedade patriarcal legitima as desigualdades de gênero e possibilita a reprodução do fenômeno da violência de gênero. Palavras-chave: Violência doméstica. Violência de gênero. Grupo reflexivo. Ressocialização. Homem Autor de Violência (HAV). Lei Maria da Penha. ABSTRACT: The present article aims to emphasize the importance of the participation of men in the context of violence against women, specifically addressing the experience of the reflexive groups provided * Advogada, LL.M em International Human Rights Law (Queen Mary University of London); LL.M em Intellectual Property and Information Law (Kings College London), especialista em Direito Processual Civil pelo Instituto Romeu Felipe Bacellar Filho-PR, Pós-graduanda em Direitos Humanos (CEI); graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná UFPR. carol_bsoares@yahoo.com.br. * Advogada, especialista em Direito Processual Civil pelo Instituto Romeu Felipe Bacellar Filho-PR, mentorada no grupo Women in Law Mentoring Brazil, graduada em Direito pelo Centro Universitário Autônomo do Brasil UniBrasil. jacob_marilia@yahoo.com.br. 49

68 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição for by the Maria da Penha Law. In such groups, it is drawn the understanding that the ideology of the patriarchal society legitimizes gender inequalities and enables the reproduction of the phenomenon of gender violence. Keywords: Domestic violence. Gender violence. Reflection groups. Ressocialization. Perpetrators of Intimate Partner Violence. Maria da Penha law. 1 INTRODUÇÃO As causas e os efeitos da violência de gênero não são simples, mas complexos e diversificados. A violência contra mulheres é combatida por várias frentes em todo o mundo, tratando-se de uma violação dos direitos humanos, além de ser considerada um problema de saúde e de segurança pública 1. Neste cenário, nos perguntamos o que motiva essa violência, seja ela física ou psicológica, e como podemos contribuir para sua reversão, pensando além da punição do homem autor da violência (HAV), com a criação de estratégias que inibam a (re)produção desse quadro de violência sistemático-estrutural. Com base nessas premissas, o presente artigo fará uma breve abordagem acerca do papel do homem no enfrentamento da violência de gênero, na sua subespécie da violência doméstica, mediante uma análise dos grupos reflexivos criados no âmbito da Lei Maria da Penha, que passaram a ser expressamente previstos por meio das alterações recentes promovidas pela Lei /2020, que acrescentou os incisos VI e VII no artigo 22, que trata das medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor. 1 BEIRAS, Adriano; NASCIMENTO, Marcos; INCROCCI, Caio. Programas de atenção a homens autores de violência contra as mulheres: um panorama das intervenções no Brasil. Saúde Soc. São Paulo. v. 28, n. I, p , p

69 2 GRUPOS REFLEXIVOS PAUTADOS NA LEI MARIA DA PENHA Notícias sobre violência de gênero e seu enfrentamento são enfatizadas na mídia a todo tempo. No Brasil, em especial, notamos um aumento nesse tema principalmente após a promulgação da Lei Maria da Penha (Lei /2006) 2, que desde sua entrada em vigor já sofreu diversas mudanças, geralmente com enfoque no endurecimento da punição do agressor como forma de combate à violência. Com isso, muito se fala sobre o atendimento da mulher agredida e a punição do agressor, como meios de proteção da mulher. Manter a segurança, a integridade e o empoderamento da mulher que sofreu a violência deve ser o foco de qualquer ação que vise mudar esse contexto. Para além disso, não desmerecendo o papel simbólico da lei em questão para a proteção da mulher 3, a punição, por si só, não reabilita o homem autor da violência (HAV) e não empodera a mulher que sofreu a violência. Mesmo erigida a partir de uma lógica precipuamente punitivista, a Lei Maria da Penha determina a criação de iniciativas e políticas públicas de grupos com HAV, sendo necessária a ampliação do enfrentamento da violência com a inclusão do HAV e daqueles que compõem os conflitos, para que possam refletir e contribuir para o rompimento desse ciclo 4. 2 A Lei /2006 foi promulgada por recomendação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, como resultado da condenação do Estado Brasileiro na denúncia feita por Maria da Penha Maia Fernandes, que ficou paraplégica e com traumas psicológicos permanentes por agressões perpetradas por seu então marido (PAIVA, Caio; HEEMAN ARAGON, Thimotie. Jurisprudência Internacional dos Direitos Humanos. 2. ed. Belo Horizonte: CEI, p. 743/746). 3 BEIRAS, Adriano; MORAES, Maristela; ALENCAR RODRIGUES, Roberta; CANTARERA, Leonor. Políticas e leis sobre violência de gênero reflexões críticas. Psicologia & Sociedade. 24 (1), 36-45, p Assim, é necessário atentar para a complexidade da questão e apresentar medidas que contemplem todos os sujeitos envolvidos e suas especificidades, de forma a promover o amadurecimento social, o que não acontece quando a alternativa é simplesmente, ou apenas, punitiva ao agressor, ou seja, estritamente penal (BEIRAS, 51

70 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição O artigo 35, V da Lei Maria da Penha trouxe que a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover centros de educação e de reabilitação para os agressores. Ao seu turno, o artigo 45 acrescenta no art. 152 da LEP, o parágrafo único, que estabelece que nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação. Por sua vez, por meio da Lei /2020, foram incluídas no rol das medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor (medidas protetivas típicas), o comparecimento do agressor a programas de recuperação (art. 22, VI) e a reeducação e o acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio (art. 22, VII), disposições estas que passaram a expressamente prever os denominados grupos reflexivos 5. Os referidos grupos reflexivos consistem em um modelo de intervenção grupal que tem por objetivo provocar a desconstrução e a mudança dos padrões naturalizados de gênero, violência de gênero e masculinidade 6. Assim, em tais grupos, os homens são endereçados enquanto sujeitos implicados nas relações violentas 7 e não apenas como agressores, sendo reforçado o aspecto relacional da violência de Adriano; MORAES, Maristela; ALENCAR RODRIGUES, Roberta; CANTARERA, Leonor. op. cit. p. 43). 5 De se ressaltar que antes mesmo da previsão específica acerca dos denominados grupos reflexivos como medidas protetivas típicas, tais grupos já eram instituídos com base nas previsões mais genéricas sobre centros de educação e reabilitação para agressores, sendo, no entanto, importante a alteração legislativa, no sentido de explicitar a importância do papel dos referidos grupos no processo de combate à violência doméstica. 6 ANDRADE, Leandro Feitosa; BARBOSA, Sérgio; e PRATES, Paula Licursi. Projeto: Centro de Atenção à violência doméstica e de gênero e de formação em masculinidades no Município de São Paulo. São Paulo: Mimeo, In: PRATES, Paula Licursi; ANDRADE, Leandro Feitosa. Grupos reflexivos como medida judicial para homens autores de violência contra mulher: contexto sócio-histórico. Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, ISSN X. p PRATES, Paula Licursi; ANDRADE, Leandro Feitosa. op. cit. p

71 gênero, cujo combate necessariamente pressupõe um trabalho com a vítima (mulher) e o agressor (homem), com vistas a romper com o ciclo de violência em relacionamentos atuais e futuros 8. 3 GRUPOS REFLEXIVOS NA PRÁTICA 9 No contexto brasileiro de programas que atuam com HAV, podem ser encontradas tanto organizações governamentais 10, como não governamentais que realizam os grupos reflexivos 11. A principal via de acesso é a judicial 12, embora não seja restrito a isso, na medida em que podem ser ofertados por organizações não 8 Em um paralelo às três ondas do feminismo, podemos dizer que atualmente caminhamos para uma quarta onda do feminismo, que seria a necessidade de inclusão do homem também na construção do feminismo. Neste sentido: SOLNIT, Rebecca. A mãe de todas as perguntas: reflexões sobre os novos feminismos. Tradução Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das letras, p. 59 e As análises do presente artigo se pautaram nas conclusões do estudo qualitativo realizado de 2015 a 2016 com 41 programas de 5 regiões do Brasil, descrito no artigo de BEIRAS, Adriano; NASCIMENTO, Marcos; INCROCCI, Caio. Op. cit., bem como nas análises exemplificativas concretas dos projetos de grupos reflexivos do TJRJ (Grupo Reflexivo com Autores de Violência Doméstica. Disponível em: < Acesso em ) e o do MPRN (Projeto Grupo Reflexivo de Homens: Por uma atitude de paz. Disponível em: < Acesso em: ). 10 No âmbito governamental, a primeira iniciativa de grupo reflexivo se deu em 1999, no Rio de Janeiro, por meio do Centro Especial de Orientação à Mulher (CEOM) (LIMA, Daniel Costa; BUCHELE, Fátima. Revisão crítica sobre o atendimento a homens autores de violência doméstica e familiar contra as mulheres. Physis, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p , Disponível em: < Acesso em: 10 de jun p. 731). 11 São exemplos de iniciativas não governamentais: Instituto Albam de Belo Horizonte/MG; o ISER Instituto de Estudos da Religião e o Instituto NOOS do Rio de Janeiro, e da Pró-Mulher, Família e Cidadania de São Paulo. 12 BEIRAS, Adriano; NASCIMENTO, Marcos; INCROCCI, Caio. op. cit. p

72 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição governamentais ou mesmo serem instituídos enquanto política pública abrangente na área da família, assistência social e saúde mental. No tocante às diretrizes gerais para a instituição dos grupos reflexivos, temos que a Lei Maria da Penha é silente acerca dos requisitos e do modo de funcionamento dos grupos em questão. Apesar das diferenças de abordagem e suas especificidades de metodologia, os grupos analisados se pautam no trabalho gradual de educação dos participantes, sendo as reuniões desenvolvidas em etapas progressivas, que se iniciam pela explicação das regras dos grupo, passando-se à apresentação de conceitos básicos, para, por fim, culminar na reflexão de cada participante acerca da relação entre os temas expostos e a sua experiência pessoal 13. Dos grupos examinados, percebe-se que cada programa estabelece um período próprio de duração, sejam por quantidades de encontros ou por horas totais, mas todos estipulam debates com trocas mais duradouras entre as equipes e os participantes autores de violência 14. A técnica grupal é bastante utilizada e a mais recomendada 15, mas alguns programas apontam para a necessidade de encontros individuais, sendo isso possível de acordo com a previsão do art.22, VII, da Lei Maria da Penha. 13 Neste sentido, como ocorreu no caso do Grupo Reflexivo do RJ, foi adotada a pedagógica de Paulo FREIRE, que sugere que a pergunta seja um instrumento dialógico e gerador de novas perguntas e reflexões, propondo-se uma pedagogia da pergunta e do diálogo, em contraposição à pedagogia da resposta. (ACOSTA, Fernando; ANDRADE FILHO, Antônio; BRONZ, Alan. Conversas homem a homem: grupo reflexivo de gênero metodologia. Rio de Janeiro: Instituto Noos, p. 16). 14 BEIRAS, Adriano; NASCIMENTO, Marcos; INCROCCI, Caio. op. cit. p Idem. p

73 4 SUGESTÕES DE APRIMORAMENTOS DA PRÁTICA DOS GRUPOS REFLEXIVOS E, das experiências concretas dos grupos reflexivos analisados no presente artigo, salutar trazer alguns pontos em que se aponta a necessidade de aprimoramentos. Em primeiro lugar, destaca-se a falta de sistematização legal dos requisitos e modo de funcionamento dos grupos reflexivos, trazendo a Lei Maria da Penha apenas a possibilidade de instituição de tais grupos enquanto medida protetiva típica. Aqui, não se defende uma padronização estanque, que não levaria em consideração as peculiaridades locais, sendo aconselhável o estabelecimento de diretrizes gerais. Em segundo lugar, temos que os processos de monitoramento e avaliação dos programas são limitados, porque carecem de informações quanto ao alcance dos resultados obtidos e prestação de contas, além da escassez de recursos materiais e financeiros para manutenção e ampliação das redes de enfrentamento da violência contra as mulheres 16. Em terceiro lugar, observa-se a necessidade de incentivo ao aprimoramento dos facilitadores que trabalham nos grupos reflexivos 17, de modo a evitar que referidas pessoas reproduzam comportamentos sexistas ou eminentemente penalizadores. Em quarto lugar, sugere-se a ampliação do acesso aos grupos a todos os HAV, independentemente da gravidade do(s) crime(s) cometido(s), além de ser permitido o acesso voluntário, de modo a enfatizar o papel educativo dos grupos em questão. Por fim, constata-se que a vinculação com órgãos públicos da área de segurança e da justiça pode dificultar a operacionalização e manutenção dos grupos em questão por restringir a atuação das entidades que as propõem, já que se sujeitam às condições políticas e econômicas 16 BEIRAS, Adriano; NASCIMENTO, Marcos; INCROCCI, Caio. op. cit. p. 268 e Idem. p

74 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição vigentes 18, sendo recomendável o incentivo das organizações da sociedade civil para que também atuem. 5 CONCLUSÃO Considerando os estudos acadêmicos realizados, as experiências e aprendizagens a partir da promulgação da Lei Maria da Penha, entendemos que é essencial a inclusão do homem também na construção do feminismo e no enfrentamento da violência contra à mulher, por meio de políticas educativas que permitem o acesso à informação sobre igualdade de gênero e relações de poder. O homem autor de violência também está subordinado e sofre as consequências do sistema que fomenta o patriarcado. Papéis de gênero fixos, pautados em uma masculinidade que se baseia em ideias de poder, superioridade e virilidade, não permitem que os homens trabalhem os seus conflitos emocionais 19, muitas vezes descarregando a sua raiva e frustração em suas companheiras e filhos 20. Dentro desta perspectiva, temos que as duas partes agressor e agredida - precisam de auxílio para promover a transformação da ação violenta. Neste cenário, os grupos reflexivos se mostram justamente como um espaço para o diálogo e a reflexão. Somente a troca de experiências no contexto da violência doméstica e familiar poderá promover alternativas para um comportamento assertivo diante de situações de estresse, promovendo a internalização e promoção da igualdade de gênero, considerando a realidade vivenciada. 18 Ibidem. p. 268 e Como afirma Bell Hooks, o primeiro ato de violência que o patriarcado exige dos homens não é a violência contra as mulheres [mas que] todos os homens pratiquem atos de automutilação psíquica, que matem suas partes emocionais (...) In: SOLNIT, Rebecca. op. cit. p ACOSTA, Fernando; ANDRADE FILHO, Antônio; BRONZ, op. cit. p

75 Apesar dos pontos a serem melhorados, oportunamente apontados no presente artigo, observa-se que a iniciativa de instauração de grupos reflexivos é extremamente positiva, resultando não só na diminuição da taxa de reincidência dos HAV participantes, como também atuando enquanto mecanismo que possibilita a conscientização desse homem de forma ampla acerca dos padrões culturais que permeiam a violência de gênero. O homem e a mulher, neste contexto, assumem papéis de protagonistas em sua própria história, caminhando lado a lado na construção do feminismo, desmistificando a ideia de que o feminismo seria um trabalho exclusivo das mulheres, visto que é impossível diminuir o sexismo sem evolver os homens 21. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACOSTA, Fernando; ANDRADE FILHO, Antônio; BRONZ, Alan. Conversas homem a homem: grupo reflexivo de gênero metodologia. Rio de Janeiro: Instituto Noos, ANDRADE, Leandro Feitosa; PRATES, Paula Licursi. Grupos reflexivos como medida judicial para homens autores de violência contra mulher: contexto sócio-histórico. Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, ISSN X. BEIRAS, Adriano; MORAES, Maristela; ALENCAR RODRIGUES, Roberta; CANTARERA, Leonor. Políticas e leis sobre violência de gênero reflexões críticas. Psicologia & Sociedade. 24 (1), 36-45, BEIRAS, Adriano; NASCIMENTO, Marcos; INCROCCI, Caio. Programas de atenção a homens autores de violência contra as 21 SOLNIT, Rebecca. op. cit. p

76 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição mulheres: um panorama das intervenções no Brasil. Saúde Soc. São Paulo. v. 28, n. I, p , Grupo Reflexivo com Autores de Violência Doméstica. Tjrj.jus, Disponível em: < Acesso em LIMA, Daniel Costa; BUCHELE, Fátima. Revisão crítica sobre o atendimento a homens autores de violência doméstica e familiar contra as mulheres. Physis, Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, p , Disponível em: < Acesso em: 10 de jun PAIVA, Caio; HEEMAN ARAGON, Thimotie. Jurisprudência Internacional dos Direitos Humanos. 2. ed. Belo Horizonte: CEI, Projeto Grupo Reflexivo de Homens: Por uma atitude de paz. MPPR, Disponível em: < maatitudedepaz.pdf>. Acesso em SOLNIT, Rebecca. A mãe de todas as perguntas: reflexões sobre os novos feminismos. Tradução Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das letras,

77 OS IMPACTOS DA REFORMA DA PREVIDÊNCIA NA CONCESSÃO DAS APOSENTADORIAS DAS MULHERES * A Previdência Social é, em um grande número de famílias brasileiras, a principal fonte financeira do qual dispõem os seus membros, sustentando muitas vezes mais de uma geração dentro de um grupo familiar, sendo as mães e as avós a maioria das provedoras. A Carta de Conjuntura do IPEA (2019) relata que vem aumentando o número de domicílios que declararam não possuir renda do trabalho e dos domicílios de renda do trabalho muito baixa. Conforme demonstraremos a seguir, não bastasse as condições adversas no mercado de trabalho para a mulher, a Previdência Social, a partir da EC nº 103/2019, aprofundará as diferenças sociais entre homens e mulheres no Brasil, já que estamos tratando da principal política de transferência de renda do país. Especificamente no tocante às aposentadorias, a Emenda Constitucional nº 103/2019 tem três pontos cruciais: põe fim à aposentadoria por tempo de contribuição, aumenta a idade mínima da aposentadoria voluntária das mulheres de 60 (sessenta) anos para 62 (sessenta e dois) anos e o tempo de contribuição mínimo para a aposentadoria voluntária de quinze anos para vinte anos para os homens (para aqueles que se filiarão ao RGPS após doze de novembro de 2019, data da promulgação desta emenda à constituição). * Integrante do Núcleo de Estudos sobre Direitos Humanos (NEDH/UCSAL). Advogado. Analista do Seguro Social. Bacharel em Administração - UFBA, Bacharel em Direito - UniRuy Wyden, Bacharelando em Estudos de Gênero e Diversidade da UFBA. Mestrando em Políticas Sociais e Cidadania pela UCSAL. Professor de Direito Previdenciário da Pós-graduação em Direito e Prática Previdenciária do CERS e da Faculdade Baiana de Direito. Educador previdenciário do INSS. 59

78 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição O propósito deste artigo é mensurar o impacto da reforma da Previdência, notadamente na concessão das aposentadorias por idade para as trabalhadoras brasileiras, além de identificar, por sexo, quem será mais impactado. A fim de identificar quantas brasileiras deixarão de se aposentar, tomaremos como base os dados extraídos do Sistema Único de Informações de Benefícios em setembro/outubro de 2019, sistema de informação gerencial no âmbito do INSS, para ambos os sexos (OLIVEIRA, 2020). Este artigo visa responder os seguintes questionamentos. Quantas brasileiras deixarão de se aposentar? É possível definir quem será mais impactado com a Emenda Constitucional promulgada, as mulheres ou os homens? No Brasil, em 2016, o INSS concedeu aposentadorias por idade, sendo que de mulheres e foram de homens. Já em 2017, foram concedidas aposentadorias por idade, perfazendo do sexo feminino e do sexo masculino. Por fim, em 2018, foram concedidas aposentadorias para mulheres e aposentadorias por idade para homens, totalizando benefícios (OLIVEIRA, 2020). Observa-se que nos números supracitados estão sendo computados inclusive os benefícios oriundos de ordem judicial e a clientela urbana e rural. Conclui-se, assim, que são concedidas mais aposentadorias por idade para mulheres do que para os homens no Brasil, conforme este histórico. Em 2016, 2017 e 2018, a predominância feminina na aposentadoria por idade foi de respectivamente 59%, 69% e 68%, em relação ao número total de concessões (OLIVEIRA, 2020). À primeira vista, analisando apenas os números de concessão da aposentadoria por idade, a supremacia quantitativa de mulheres em relação aos homens poderia significar uma maior proteção previdenciária, se comparado aos homens brasileiros, contudo, os números das concessões de aposentadoria por tempo de contribuição demonstram outro cenário. Em 2016, foram concessões de aposentadorias por tempo de contribuição do sexo masculino, frente à 60

79 , do sexo feminino, contabilizando Já em 2017, foram do sexo masculino, enquanto do sexo feminino Por último, em 2018, foram aposentadorias por tempo de contribuição do sexo masculino, enquanto do sexo feminino. Comparando os anos de 2016, 2017 e 2018, respectivamente, foram concedidas em termos percentuais 36%, 32% e 37% de aposentadorias por tempo de contribuição para as mulheres (OLIVEIRA, 2020). Vale salientar, no entanto, que em face da existência de pujante clientela rural nas aposentadorias por idade, diferente do que ocorre com a aposentadoria por tempo de contribuição. Utilizando-se somente das aposentadorias urbanas, verifica-se que foram concedidas aposentadorias por idade, do sexo feminino e do sexo masculino em No ano seguinte foram concedidas do sexo feminino e do sexo masculino e (total de ) e por fim, em 2018, o INSS concedeu do sexo feminino e do sexo masculino ( no total; OLIVEIRA, 2020). Dos relatórios acima infere-se, analisando apenas os números dos trabalhadores urbanos por sexo, historicamente, uma predominância significativa das mulheres na aposentadoria por idade, enquanto na aposentadoria por tempo de contribuição a lógica se inverte. Infere-se, também, que não há diferença na quantidade das concessões (enquanto na aposentadoria por idade são concedidas a mais cerca de benefícios, na aposentadoria por tempo de contribuição, o resultado é inversamente proporcional). A quantidade de aposentadorias urbanas (por idade e tempo de contribuição) concedidas em 2018 para as trabalhadoras do sexo feminino foi de do e trabalhadores do sexo masculino foi de (OLIVEIRA, 2020). Assim, conclui-se que o número de aposentadorias no Brasil urbanas por sexo, ao ano, é semelhante, ressaltando que na aposentadoria por idade o domínio é feminino, enquanto por tempo de contribuição existe uma preponderância masculina. 61

80 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Todavia, a igualdade numérica traduzida no número entre aposentadorias urbanas concedidas pelo INSS por sexo, não permite concluir que a proteção social tem o mesmo alcance entre mulheres e homens no Brasil. Primeiro, consoante o Boletim Estatístico da Previdência Social (PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2019), o valor médio da aposentadoria por tempo de contribuição da clientela urbana em julho de 2019 foi de R$ 2.426,99, enquanto que da aposentadoria por idade foi de R$ 1.313,03. Observou-se que o valor médio da aposentadoria por tempo de contribuição urbana para o homem foi de R$ e para mulher foi de R$ 2.208,00, para o mês de julho de Assim, como cerca de 63% das aposentadorias por tempo de contribuição são do sexo masculino, verifica-se que os benefícios com maiores proventos em sua maioria se concentram nas mãos dos trabalhadores do sexo masculino (PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2019). Segundo, em que pese tenha havido uma leve queda na desigualdade salarial entre homens e mulheres entre 2012 a 2018, considerando apenas pessoas entre 25 e 49 anos, conforme pesquisa PNAD contínua do quarto trimestre de 2018, os rendimentos médios mensais (no mercado de trabalho) dos homens continuam superiores (PNAD, 2013; PNAD, 2018). Na pesquisa, o salário médio do homem foi de R$ e da mulher foi de R$ 2.050,00, em 2018, as mulheres ganhavam em média 20% menos dos que os homens. Pode-se concluir então, que em face dos maiores salários dos homens, em regra, são maiores os valores dos proventos na inatividade. Terceiro argumento, segundo dados fornecidos pela Secretaria de Previdência a pedido do Estadão/Broadcast, quem solicitou ao INSS aposentadoria por tempo de contribuição no ano passado tinha em média 54,6 anos, já os segurados que solicitaram o benefício por idade tinham em média 61 anos (OLIVEIRA, 2020). De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD, 2014), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2018), o número de aposentados que continua trabalhando chegou a 5,7 milhões de pessoas. Ou seja, em 2014, 28,14% dos 20,3 milhões de cidadãos já aposentados continuavam na 62

81 ativa. Por fim, as mulheres têm mais dificuldade em alocação no mercado de trabalho do que os homens, conforme dados da PNAD contínua, a taxa de desemprego entre as mulheres brasileiras foi de 14,1% no segundo trimestre do ano (2019), significativamente superior à taxa de desocupação de 10,3% dos homens. Taxas mais elevadas de desocupação foram observadas em todas as grandes regiões no que se refere à mulher. As mulheres também se mantiveram como a maior parte da população fora da força de trabalho, tanto no país (64,6%) quanto independentemente em todas as regiões brasileiros (OLIVEIRA, 2020). A mulher se aposenta mais tarde (e consequentemente goza menos da possibilidade de acúmulo entre proventos e salários) e ganha menores salários. Além de predominantes na aposentadoria por tempo de contribuição e gozando de valores médios superiores no tocante à aposentadoria, os homens se aposentam em média com 54 anos e 6 meses e permanecem (boa parcela deles) laborando (pesquisa, divulgada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL). Infere-se que os homens se aposentam mais cedo, ganham melhores salários e/ou proventos (na ativa e na aposentadoria) e aproveitam a aposentadoria mais jovens para aumentar seus rendimentos, acumulando aposentadoria e salários, no Brasil (OLIVEIRA, 2020). O sistema previdenciário brasileiro reflete o (machista) mercado de trabalho e alimenta as desigualdades de sexo no país. Apesar de possuírem taxa de proteção social superior à taxa dos homens, as mulheres são maioria entre os desprotegidos sem capacidade contributiva e a minoria entre os desprotegidos com capacidade contributiva, de acordo com a PNADC, em Além disso, a desagregação por sexo revela que, assim como verificado no trimestre anterior, a taxa de desocupação dos homens recuou de forma mais intensa que a das mulheres. Enquanto o desemprego masculino passou de 11,0%, no segundo trimestre de 2018, para 10,3% em 2019, o feminino manteve-se praticamente inalterado (14,1%). 63

82 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Analisando o impacto da reforma da previdência na aposentadoria por tempo de contribuição para as mulheres, podemos tecer as seguintes conclusões: primeiro, a quantidade média de aposentadorias por tempo de contribuição do sexo feminino é de Aproximadamente mulheres provavelmente deixarão de se aposentar por tempo de contribuição em média, ao ano (após mitigação das regras de transição). Serão algo em torno de 50% das mulheres que perderão o direito de se aposentar, por tempo de contribuição, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 103/2019. Em relação às mulheres, a EC nº 103/2019 altera a idade mínima para a aposentadoria por idade. A partir da vigência da referida EC a idade mínima para ter direito à aposentadoria será de 62 anos de idade e não mais 60 anos (salienta-se que na proposta inicial a idade estabelecida foi a mesma do homem, 65 anos). Utilizando como parâmetro os quantitativos de benefícios de aposentadorias por idade do sexo feminino, considerando apenas a clientela urbana, foram concedidos respectivamente entre 2016 a 2018, , e Em média, mulheres (2016 e 2017) com atividade laboral urbana se aposentam por idade, por ano, no Brasil (OLIVEIRA, 2020). Assim, revela-se, em um primeiro momento, que deixariam de se aposentar por idade, ao ano, cerca de mulheres fruto das alterações realizadas pela EC nº 103/2019. Existe uma regra de transição que vai mitigar os danos da elevação do requisito etário para as seguradas da Previdência Social. Há previsão que a partir de 1º de janeiro de 2020, a idade de 60 (sessenta) anos da mulher, será acrescida em 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade. Consoante relatórios dos sistemas gerenciais do INSS apenas mulheres, ao ano, se favorecerão desta regra de transição. Assim, revela-se, em um primeiro momento, que do montante de mulheres/por ano, deixarão de se aposentar por idade, ao ano, cerca de (71%) mulheres fruto das alterações 64

83 realizadas pela EC nº 103/2019, o aumento da idade mínima de 60 anos para 62 anos. Consoante relatórios extraídos do INSS, o somatório entre as aposentadorias urbanas (por tempo de contribuição e idade) demonstrou igualdade no tocante ao quantitativo total (o número é bem parecido, um pouco mais de para cada sexo), contudo com as alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 103/2019 haverá um desequilíbrio do montante total de aposentadorias, entre homens e mulheres. Somando as parcelas de aposentadorias por idade e tempo de contribuição, no tocante ao homem, a partir de 2020, cerca de aposentadorias deixarão de ser concedidas, ao ano. Em relação à mulher, aproximadamente aposentadorias deixarão de ser concedidas já a partir de A primeira conclusão a partir das projeções realizadas acima, é que serão as mulheres as maiores prejudicadas pelas mudanças produzidas pela EC nº 103/2019. Segundo, o reflexo do aumento da idade mínima (62 anos) impactará diretamente em cerca de 171 mil mulheres, pois deixarão de ser aposentáveis durante o próximo ano. As novas imposições trazidas pela EC nº 103/2019 afrontam com maior ênfase às mulheres comparativamente aos homens (OLIVEIRA, 2020). Conforme dados da PNAD contínua, a taxa de desemprego entre as mulheres brasileiras foi de 14,1% no segundo trimestre do ano (IBGE, 2019), significativamente superior à taxa de desocupação de 10,3% dos homens. Salienta-se também, consoante texto para discussão do IPEA de maio/2019, A questão de gênero na idade para a aposentadoria no Brasil: elementos para debate, a taxa de desemprego feminino é muito mais significativa no Brasil do que nas nações que impuseram a igualdade do requisito etário entre homens e mulheres para o direito à aposentadoria (IPEA, 2019). Enquanto no Brasil não houver igualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho, não é razoável falar em requisitos similares para a aposentadoria (igualdade de idade e tempo de contribuição para a aposentadoria). A agência de notícias do IBGE em 08/03/2019, revelou que, em 2018, o rendimento médio das mulheres 65

84 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição ocupadas entre 25 e 49 anos de idade (R$ 2.050) equivalia a 79,5% do recebido pelos homens (R$ 2.579) nesse mesmo grupo etário. Já não bastasse as condições adversas no mercado de trabalho para a mulher, a previdência social, a partir da EC nº 103/2019, aprofundará as diferenças sociais entre homens e mulheres no Brasil, já que estamos tratando da principal política de transferência de renda do país. O INSS concedeu nos anos 2016 e 2017, respectivamente, e aposentadorias por tempo de contribuição e por idade urbana, uma média de benefícios ao ano (OLIVEIRA, 2020). Com a promulgação da EC nº 103/2019, aproximadamente 407 mil benefícios ou metade das aposentadorias concedidas ao ano deixarão de existir, deste montante, mais de 60%(sessenta por cento) referente ao sexo feminino. Por fim, o acesso à Previdência Social será mais dificultado e o valor do benefício minorado, produzindo o crescimento da desproteção social (em maior escala entre as mulheres). REFERÊNCIAS IPEA. Carta de Conjuntura IPEA º trimestre. INSTITUTO DE PESQUISA APLICADA, Brasil, 11 jul Disponível em: article&id=34894:carta-de-conjuntura o-trimestre-no- 44&catid=146:dimac&directory=1. Acesso em: 11 ago OLIVEIRA, Fabrício. Os impactos da reforma da previdência na concessão das aposentadorias. In: AMADO, Frederico et al. ESTUDOS APROFUNDADOS SOBRE A REFORMA DA PREVIDÊNCIA: Conteúdo conforme a Reforma Constitucional da Previdência, EC 103/ a. ed. Salvador: JusPodivm, cap. 21, p ISBN

85 PREVIDÊNCIA SOCIAL. Relatório Parcial Julho de Boletim Estatístico da Previdência Social, [s. l.], v. 30, n. 7, 31 jul Disponível em: rtal.pdf. Acesso em: 1 ago PNAD. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A questão de gênero na idade para a aposentadoria no Brasil: elementos para o debate. Brasília: PNAD. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Notícias. Brasília: Disponível em ncia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/25700-pnadcontinua da-populacao. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de domicílios. Brasília: 2014 a Disponível em milhoes-de-aposentados-continuam-na-ativa.html. PNAD. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Brasília: Disponível em PREVIDÊNCIA SOCIAL. Ministério da Previdência Social. Boletim Estatístico da Previdência Social. Brasília: dezembro de Disponível em 67

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87 A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DA MULHER NO MOMENTO DO PARTO * RESUMO: A violência obstétrica é uma prática antiga proveniente da cultura de uma sociedade patriarcalista, onde a mulher passa a não dispor sobre a vontades do seu corpo no momento de colocar um filho no mundo, tornando-se o parto um objeto controlado por intervenções e padrões estabelecidos pelo saber médico e pela instituição hospitalar. O objetivo desta pesquisa qualitativa é verificar como ocorre a violência obstétrica nos hospitais brasileiros e quais as condutas praticadas pelos profissionais da saúde incorrem em violações dos direitos humanos da mulher. Neste artigo, utilizou-se a pesquisa bibliográfica e analítica visando compreender a prática desta conduta que aflige muitas mulheres no momento do parto e o como as vítimas podem lutar contra tais atos, uma vez que tais ações ainda não são tipificadas como crime em nosso ordenamento jurídico. Palavras-chave: Violência obstétrica. Parto. Direitos Humanos. Mulher. 1 INTRODUÇÃO A violência contra a mulher é todo ato ou conduta baseado no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento de ordem física, sexual ou psicológica à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada (Comitê Latino Americano e do Caribe para Defesa dos Direitos da * Advogada. Mestre em Segurança Pública, Cidadania e Direitos pela Universidade do Estado do Estado do Amazonas UEA. Especialista em Direito Penal e Processual Penal pelo Centro Universitário do Norte UNINORTE. Professora do curso de Direito do UNINORTE. goreth.rubim.adv@hotmail.com. 69

88 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Mulher, 1996). Desta forma, destaca-se que além dos casos de violência contra a mulher previstos na Lei nº /2006, conhecida popularmente como Lei Maria da Penha, existe também a figura da violência obstétrica. A violência obstétrica é um tipo violência silenciosa e institucionalizada, por se consumar através de atos de maus tratos às mulheres durante o trabalho do parto, ocasionando assim as vítimas sofrimento físico e psicológico, por meio de práticas naturalizadas e reproduzidas rotineiramente nos hospitais de todo o território brasileiro. 2 A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E O TRATAMENTO DESUMANIZADO DURANTE O PARTO A violência obstétrica é todo e qualquer ato exercido por profissionais da saúde relacionados à atenção desumanizada, com relação ao abuso de ações intervencionistas, medicalização e transformação patológica no processo do parto, atingindo o corpo e o processo reprodutivo da mulher (JUAREZ et al; 2012). Desde o final da década de 1980, a violência obstétrica já era tema de políticas de saúde pública no Brasil, como por exemplo, o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM), que reconhecia e buscava combater o tratamento impessoal, como falta de atenção e muitas vezes atos agressivos à saúde da mulher. Porém, o referido programa foi negligenciado como política pública, diante da resistência dos profissionais de saúde que não reconheciam a desumanização em tais atos. Ademais, o Movimento Feminista, no ano de 1993, passou a promover cursos no combate à violência contra a mulher, passando a surgir o Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, em parceria com o Departamento de Medicina Preventiva da USP. Importante ressaltar que a atenção humanizada dispendida a mulher no momento do parto envolve conhecimentos, práticas e atitudes que objetivam garantir a parturição e o nascimento como 70

89 momentos saudáveis, buscando a prevenção da morbimortalidade materna (BRASIL, 2001). Ressalta-se que para humanizar o atendimento a mulher em período reprodutivo se faz necessário buscar o reconhecimento de sua individualidade, das suas necessidades e capacidade para lidar com o processo do nascimento, bem como respeitar o contexto histórico e cultural vivenciado por ela. Com a entrada em cena dos médicos e de seus instrumentos no século XV, a figura das parteiras passou a ficar em segundo plano e consequentemente as mulheres deixaram de participar da realização do parto, sendo a participação das parteiras considerado com um ato marginal. Por isso, no século XX, passou a predominar o parto hospitalar, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, prevalecendo até os dias atuais. Para (BARBOZA, MOTA 2016; p.122) a influência da medicina na realização dos partos passou a ter a seguinte visão quanto à figura da mulher: Neste período tem início o desenvolvimento do modelo assistencial biomédico, no qual o paciente é considerado um sujeito passivo e carente de autonomia, não tendo a capacidade de opinar e tomar decisões. No contexto do parto a mulher é esquecida e tomada como objeto, um não sujeito, na medida em que tem a sua subjetividade desconsiderada nesta relação. Interessante observar que a figura da medicalização quanto ao processo do trabalho do parto e a sua consumação, tornaram o médico o ator principal nessa relação, retirando a mulher do protagonismo, tornando-a atriz coadjuvante, por este motivo a gravidez passou a ser tratada como doença, reforçando relações de desigualdade, que contribuíam para um grande número de intervenções desnecessárias, que por consequência ocasionavam a violência obstétrica e a de gênero (BRASIL, 2001). 71

90 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Os atos de violência obstétrica contribuem para o aumento da morbimortalidade materna das seguintes formas: I O risco adicional associado aos eventos adversos de manejo agressivo do parto vaginal, como por exemplo, o uso da ocitocina, o uso rotineiro da episiotomia (que consiste num corte na região do períneo), rotura precoce das membranas, manobra de Kristeller (consistente numa pressão no fundo do útero), dentro outras técnicas. II Manejo agressivo e constrangimento a realização do parto cesariano; III Negligência no atendimento a mulheres que expressam seu sofrimento (com choros, gritos e gemidos insistentes); IV Hostilidade contra profissionais e mulheres considerados dissidentes do modelo hegemônico de assistência; V Impedimento à presença de um acompanhante; VI Atos hostis, negligentes e de retardo ao atendimento às mulheres em situação de abortamento, os quais muitas vezes negam atendimento ou demoram a prestar o socorro necessário. Para evitar as práticas de violência obstétrica no Brasil é importante destacar o fornecimento de informações sobre a assistência ao parto para as usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS) na rotina do pré-natal, de maneira que este conteúdo e as dúvidas possam ser sanadas com calma nos meses em que a gravidez se desenvolve. Além de garantir as parturientes, o direito ao acompanhante no momento do parto, informando as mulheres desde o pré-natal quanto a este direito, que pode ser exercido desde a internação até a admissão da alta. Destaca-se que a Lei nº de 07 de abril de 2005, prevê a obrigação dos hospitais públicos e particulares em permitir que a parturiente tenha a presença de um acompanhante durante todo o trabalho do parto e após a prática deste, devendo o acompanhante ser a pessoa indicada pela gestante. Dentre os atos de violação ao direito do acompanhante garantidos a parturiente, destacam-se os seguintes, conforme o grupo Mulheres em Rede pela Maternidade Ativa: 72

91 a) impedimento da entrada do acompanhante escolhido pela gestante; b) restrição quanto à escolha do acompanhante; c) somente pode entrar se for mulher; d) só pode entrar se for o pai da criança; e) existência de restrição quanto ao tempo de acompanhamento; f) permissão para acompanhar somente no pós-parto; g) somente pode ter acompanhante no pré-parto; h) acompanhante só na hora no parto; i) acompanhante somente se for parto normal; j) acompanhante só se for realizado parto cesariano; l) acompanhante só durante o horário de visitas; m) acompanhante somente durante um período do dia; n) cobrança de taxa para permitir a entrada do acompanhante. Ressalta-se que quaisquer das atitudes acima expostas são consideradas como formas de descumprimento da Lei Federal nº de 07 de abril de 2005, que garante o direito a parturiente de ter uma pessoa da sua confiança como acompanhante antes, durante e após o parto, garantindo mais humanização neste momento tão delicado na vida de uma mulher. Por fim, ressalta-se que no caso que uma mulher venha a ser vítima de violência obstétrica, é extremamente importante que ela solicite a cópia do prontuário médico, documento que registra todos os procedimentos pelos quais a mulher foi submetida desde a sua chegada ao hospital até a sua alta. Tal documento pode ser solicitado no setor administrativo da maternidade, sendo este um direito de acesso a paciente. Com a cópia do prontuário médico em mãos, a mulher vítima de violência obstétrica pode comunicar por escrito o Ministério Público da sua cidade objetivando a investigação do caso e consequentemente a reparação do dano causado. Caso a violência obstétrica tenha ocasionado sequelas físicas ou psíquicas na mulher ou no bebê, estando a vítima munida de documentos e exames médicos, esta pode propor uma ação de reparação civil por 73

92 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição danos morais contra os médicos e o hospital, onde deu à luz ao seu filho, e em alguns casos pode mover a ação indenizatória até mesmo contra o estado e o munícipio, dependendo de quem era responsabilidade de gerência daquela maternidade. 3 CONCLUSÃO Diante do exposto, observa-se que existe um alto índice de violência obstétrica nas maternidades brasileiras, nas quais as vítimas são submetidas a violações da autonomia sobre seus corpos, tornando o momento do parto, um período de terror e sofrimento, não apenas pelas sequelas físicas e estéticas, mas principalmente pelos estigmas psicológicos e emocionais que nunca cicatrizarão. Em razão disso, os profissionais de saúde devem estar atentos aos atos de humanização no momento do parto, tais como as técnicas adequadas para o alívio da dor, com respeito à fisiologia natural de cada mulher, bem como desprender-se dos aspectos culturais, de forma a evitar procedimentos desnecessários, dolorosos e invasivos a intimidade da mulher. Por fim, ressalta-se que a comunicação entre parturiente e profissionais de saúde deve ser um dos elementos de competência técnica mais indispensável no momento em que a mulher estar a parir, buscando manter um diálogo aberto e acolhedor no momento de dor das pacientes, com a devida explicação de cada procedimento realizado, valorizando assim os cuidados maternais e neonatais, com o objetivo de transformar o momento do parto, numa experiência de crescimento para a mulher e a sua família. 74

93 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, Briena Padilha. AGGIO, Cristiane de Melo. Violência obstétrica: a dor que cala. Disponível em: ges/arquivos/gt3_briena%20padilha%20andrade.pdf. Acesso: 23 de agosto de BARBOZA, Luciana Pereira. MOTA, Alessivânia. Violência Obstétrica: vivências de sofrimento entre as gestantes do Brasil. Disponível em: le/download/847/598. Acesso: 23 de agosto de BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Área Técnica de Saúde da Mulher. Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher/ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, Área Técnica da Mulher. Brasília, Ministério da Saúde, Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd04_13.pdf. Acesso: 20 de maio de COMITÊ LATINO AMERICANO E DO CARIBE PARA A DEFESA DOS DIREITOS DA MULHER. Instituto para promoção da Equidade, Assessoria, Pesquisa e Estudos. Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher. Convenção de Belém do Pará. Disponível em: uese/treaties/a-61.htm. Acesso: 23 de agosto de DINIZ, Simone Grilo. SALGADO, Heloisa de Oliveira, et al. Violência Obstétrica como questão para a saúde pública no Brasil: Origens, definições, tipologia, impactos sobre a saúde materna, e propostas para sua prevenção. Disponível em: Acesso: 23 de agosto de

94 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição JUÁREZ, DIANA et al. Violencia sobre las mujeres: herramientas para el trabajo de los equipos comunitários. Disponível em: on-permanente-en-servicio/violencia_mujer_web.pdf. Acesso: 23 de agosto de MULHERES EM REDE PELA MATERNIDADE ATIVA. Parto do Princípio. Violência Obstétrica. Descumprimento a lei do acompanhante. Disponível em: escumprimento-lei-acompanhante. Acesso: 23 de setembro de

95 OS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS DA MULHER: UMA BREVE ANÁLISE SOB A ÓTICA DO DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE E AUTONOMIA DA VONTADE * * RESUMO: O presente trabalho objetiva tecer considerações sobre os direitos reprodutivos e sexuais da mulher sob a ótica do direito fundamental à liberdade e autonomia da vontade. o fato é que as mulheres, na grande maioria dos casos, são relegadas à própria sorte, quando se trata de direitos sexuais e reprodutivos. Necessário se faz uma ampla divulgação dos direitos sexuais das mulheres, não só pelas sociedade privada como tambem por intermédio do Estado, visando a aplicação dos direitos fundamentais da liberdade e autonomia da vontade, ocasião em que estarão libertas da vontade de qualquer desejo ou objeto de desejo e agirão de acordo com os seus próprios critérios de racionalidade. ABSTRACT: The present work aims to make considerations about the reproductive and sexual rights of women from the perspective of the fundamental right to freedom and autonomy of the will. the fact is that women, in the vast majority of cases, are relegated to their own fate when it comes to sexual and reproductive rights. It is necessary to make a wide dissemination of the sexual rights of women, not only by private societies but also through the State, aiming at the application of the fundamental rights of freedom and autonomy of the will, when they will * Mestre e doutora pela Pontificia Universidade Católica de São Paulo. Advogada na área Cível - Família e Sucessões; Professora Universitária. * Mestre e doutora pela Pontifica Universidade Católica de São Paulo. Advogada na área de Civil, Biodireito; Professora Universitária. 77

96 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição be freed from the will of any desire or object of desire and will act according to their own criteria of rationality. SUMÁRIO: 1 Considerações iniciais. 2 Dos direitos sexuais e reprodutivos. 3 Da liberdade e autonomia da vontade das mulheres. 4 Considerações Finais. Bibliografia. 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS O objetivo do trabalho é a realização de uma breve síntese acerca dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher sob a ótica do direito fundamental à liberdade e autonomia. Inicialmente, cabe uma breve consideração sobre os Direitos Reprodutivos, que compreendemos direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade de ter filhos/as e de ter a informação e os meios de assim o fazer, gozando do mais elevado padrão de saúde sexual e reprodutiva. Segundo Flávia Piovesan: Trata-se de direito de autodeterminação, privacidade, intimidade, liberdade e autonomia individual, em que se clama pela não interferência do Estado, pela não discriminação, pela não coerção e pela não violência. 1 Uma das grandes preocupações, senão a maior preocupação do homem enquanto ser humano é a sua imortalidade. Por isso, a humanidade transpôs a sua natural finitude com a possibilidade da geração de descendentes. Nesse contexto, é fundamental a presença da mulher, ora parte integrante da formação do núcleo familiar, mas de forma preponderante 1 PIOVESAN, Flávia. Direitos Reprodutivos como Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad. 78

97 como partícipe no processo de reprodução, diante da capacidade de gestar os descendentes. Cumpre ressaltar que no Novo Testamento, encontra-se a primeira e mais importante expressão do direito fundamental da liberdade e autonomia da vontade de uma mulher. Ora, Maria ao dizer SIM ao enviado de Deus, dispondo-se a conceber e gestar o Seu filho, mudou a história de parte da humanidade, conforme narra a Bíblia. Da anuência de Maria até os dias atuais, mais de dois séculos, em busca da plena eficácia dos direitos da mulher em todas as suas dimensões. Contudo, nesse momento é realizado um corte metodológico para analisar o direito fundamental da liberdade e autonomia da vontade referente aos direitos sexuais e reprodutivos da mulher. Trata-se de um direito à saúde, no qual se deve ter por escopo a autodeterminação das mulheres no exercício de sua sexualidade e de sua capacidade reprodutiva. 2 DOS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS O artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos Humanos expressa: Homens e mulheres em idade adequada ao casamento têm direito a casar e constituir família. Segundo a doutrina: Procriar é gerar um ser semelhante. Na natureza, ela pode ocorrer de forma sexuada ou assexuada. Algumas religiões justificam a sexualidade humana pela procriação, negando o sexo como forma de prazer e autorrealização. 2 Em 1994, na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, houve o reconhecimento inédito dos direitos sexuais e reprodutivos como direitos humanos. Essa concepção foi endossada pelas Conferências Internacionais de Copenhague (Cúpula Mundial de 2 SÉGUIN, Elida. Biodireito. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, p

98 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Desenvolvimento Social), em 1997, e Beijing (IV Conferência Mundial sobre a Mulher, Desenvolvimento e Paz), em Os direitos reprodutivos 4 correspondem ao conjunto dos direitos básicos relacionados com o livre exercício da sexualidade e da reprodução humana, circulando no universo dos direitos civis e políticos (quando se referem à liberdade, autonomia, integridade) e aos direitos econômicos, sociais e culturais (quando se referem às políticas do Estado). Os direitos sexuais e reprodutivos são um ramo do Direito no qual não há um tratamento legislativo in concreto, tanto no Brasil quanto em outros países. Por seu turno, ainda, são abordados sob a ótica da mulher de uma forma quase imperceptível. Impende ressaltar que em se tratando de direitos sexuais e reprodutivos os conceitos são amplos e multidisciplinares em relação às ciências da saúde, prescindindo de uma regulamentação eficaz. O artigo 226, 7º da Constituição Federal estabelece: Art Omissis 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. E o entendimento doutrinário, acentua que: 3 PIOVESAN, Flavia. Direitos sexuais e reprodutivos: aborto inseguro como violação aos direitos humanos. In: SARMENTO, Daniel; PIOVESAN, Flavia. Nos limites da vida. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p BRAUNER, Maria Claudia Crespo. Direito, sexualidade e reprodução humana. Rio de Janeiro: Renovar, p

99 O planejamento familiar, previsto no parágrafo 7º. do art. 226 da CRF, disciplinado pela Lei n. 9263, de 12/1/1996, é reconhecido como um direito de todo cidadão, considerando planejamento familiar o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal. 5 No planejamento familiar ocorre a regulação de nascimentos, da utilização ou não de métodos contraceptivos, da possibilidade de esterilização e de todos os outros meios que agem diretamente sobre as funções reprodutoras do homem e da mulher, com a finalidade precípua da preservação da saúde do homem e da mulher, ou seja, da preservação da saúde pública. 6 3 DA LIBERDADE E AUTONOMIA DA VONTADE DAS MULHERES Nesse desiderato, ressalta-se o fato de que sempre se busca a saúde tanto do homem quanto da mulher e nada mais do que isso, sem se preocupar com as diferenças socioculturais que refletem nos direitos atinentes a cada um dos gêneros. Assim, na literatura feminista, ao longo dos anos, tem-se realizado a separação das ideias de reprodução e procriação de sexo e sexualidade. Isso porque, não se pode impor a ideia da procriação como um dever natural dos humanos para com a espécie e a concepção da sexualidade como identidade das mulheres com a finalidade de procriar 7. 5 SÉGUIN, Op. cit. p PIROTTA, Wilson R. Buquetti; PIOVESAN, Flavia. Direitos Reprodutivos e poder judiciário no Brasil. In: OLIVEIRA, Maria Coleta; ROCHA, Maria Isabel Baltazar da. Saúde reprodutiva na esfera pública e política. Campinas: UNICAMP, p VILLELA, Wilza Vieira. Direitos sexuais e reprodutivos: afinal, do que falamos? In: COOK, Rebecca J. et alli. Reprodução e sexualidade: uma questão de Justiça. Porto Alegre:Sergio Antonio Fabris, p

100 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Impor à identidade das mulheres a finalidade precípua da procriação, estar-se-á contrariando diretamente as diretrizes da Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra Mulheres (Convenção das Mulheres). A Convenção das Mulheres trata de forma expressa como direitos os serviços de planejamento familiar, nutrição durante a gestação, informação e educação relativas à decisão sobre o número e espaçamento de filhos. Nesse sentido merece destaque a melhor doutrina no sentido de que, O empoderamento das mulheres no seio das suas famílias e comunidades é um elemento crucial nesta estratégia, juntamente com a proteção dos seus direitos humanos em particular aqueles relevantes para a saúde reprodutiva e sexual dos indivíduos 8. A eficácia das normas jurídicas para a implementação do empoderamento das mulheres no seio das suas famílias e comunidades quanto aos direitos sexuais e reprodutivos depende não só das políticas públicas voltadas ao planejamento familiar, mas em especial do direito fundamental da igualdade, o qual se manifesta pela liberdade e autonomia da vontade. Em conformidade com o Direito Norueguês a igualdade jurídica é um tipo especial de proibição de discriminação sexual, modelada com base na Lei da Igualdade 9. As mulheres, por si só ou por meio do Estado, deverão buscar a aplicação dos direitos fundamentais da liberdade e autonomia da vontade, quando então, de acordo com a teoria kantiana, estarão libertas da vontade de qualquer desejo ou objeto de desejo e agirão de acordo com os seus próprios critérios de racionalidade. 8 COOK, Rebecca J. Estimulando a efetivação dos direitos reprodutivos. In: COOK, Rebecca J. et alli. Reprodução e sexualidade: uma questão de Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, p DAHL, Tove Stang. O direito das mulheres: uma introdução à Teoria do Direito Feminista. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. 1993, p

101 Por decorrência, a liberdade estará impressa como possibilidade ou poder de escolha, sendo livre e a causa de si mesma, dependendo de suas próprias convicções. Em suma, a mulher deverá ser conhecida e reconhecida com igualdade de direitos na família, na comunidade, na sociedade e pelo Estado. 4 DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS A Constituição Federal de 1988, no mesmo diapasão das diretrizes internacionais, concedeu ao homem e à mulher a titularidade dos direitos sexuais e reprodutivos e ao Estado a competência supletiva. Nesse contexto, o direito reprodutivo possui uma conduta particular que pertence ao homem, a mulher e ao casal e outra conduta publicista, que é atribuída ao Estado, por meio das políticas públicas. Os direitos à reprodução e à sexualidade somente terão plena eficácia quando a sociedade obtiver junto ao Estado o acesso à formação e informação acerca dos direitos e deveres de cada um. No âmbito do gênero feminino necessária não só a formação ou informação acerca dos seus direitos, mas a efetiva implementação da igualdade jurídica. A mulher não terá a obrigação de gerar a descendência. Desvincula-se a ideia de reprodução e procriação de sexo e sexualidade. Será concedido o direito de liberdade e autonomia da vontade para não só preservar a sua saúde, bem como realizar um verdadeiro planejamento familiar, regulando a fecundidade, implementando direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, dentre outros. BIBLIOGRAFIA BRAUNER, Maria Claudia Crespo. Direito, sexualidade e reprodução humana. Rio de Janeiro: Renovar,

102 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição COOK, Rebecca J. Estimulando a efetivação dos direitos reprodutivos. In: COOK, Rebecca J. et alli. Reprodução e sexualidade: uma questão de Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, DAHL, Tove Stang. O direito das mulheres: uma introdução à Teoria do Direito Feminista. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, MORAES, Alexandre. Constituição do Brasil Interpretada. São Paulo: Atlas, VILLELA, Wilza Vieira. Direitos sexuais e reprodutivos: afinal, do que falamos? In: COOK, Rebecca J. et alli. Reprodução e sexualidade: uma questão de Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, PIOVESAN, Flávia. Direitos Reprodutivos como Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad. PIROTTA, Wilson R. Buquetti; PIOVESAN, Flavia. Direitos Reprodutivos e poder judiciário no Brasil. In: OLIVEIRA, Maria Coleta; ROCHA, Maria Isabel Baltazar da. Saúde reprodutiva na esfera pública e política. Campinas: UNICAMP, SÉGUIN, Elida. Biodireito. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris,

103 VIOLÊNCIA DE GÊNERO EM DEBATE: entraves à aplicação da Lei Maria da Penha * * Grande conquista dos movimentos sociais e do feminismo, a Lei Maria da Penha é um grande marco nacional de proteção às mulheres. O diploma inovou por configurar o reconhecimento institucional das violências e desigualdades sofridas, trazendo para o âmbito público um problema até então escondido pelas relações privadas e domésticas. Com treze anos de sua promulgação, entretanto, faz-se pertinente uma reflexão a respeito dos avanços obtidos, bem como o que ainda dificulta a aplicação e consequentemente a eficácia da Lei. Apesar da Lei Maria da Penha ser um dos diplomas legais mais reconhecidos em âmbito nacional, o fato é que a violência contra a mulher ainda atinge níveis preocupantes. Por estas e outras razões, em 2015 outra importante legislação foi aprovada para o combate à violência contra a mulher, a Lei /2015, a Lei do feminicídio, que prevê, em síntese, a criação de mais uma qualificadora ao crime de homicídio, quando este for cometido por razões da condição de sexo feminino. Verifica-se, assim, que há suficiente amparo legal quando tratamos de violência contra a mulher. Além disso, é importante ressaltar que a lei Maria da Penha tornou-se uma norma amplamente conhecida pela população, sendo inegável o alcance e repercussão desta no sistema * Advogada (OAB-DF nº ). Mestranda em Direitos Humanos e Cidadania pela Universidade de Brasília (UNB) com pesquisa intitulada: Educação em gênero: A inserção da temática de gênero nos planos estaduais de educação da Região Centro-Oeste. * Advogada (OAB-DF nº ). Fundadora do Escritório de Advocacia Kelly Araújo. Mediadora Judicial do Tribunal Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Membro das Comissões Especiais de Mediação e de Inovação da OAB/DF. 85

104 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição judiciário. Apenas em 2017, (quatrocentos e cinquenta e dois mil novecentos e oitenta e oito) casos de violência doméstica contra a mulher foram ajuizados, o que significa um aumento de 12% em relação ao ano anterior. No que se refere à analise por unidade da federação a partir do contingente populacional de mulheres, os dois estados com o maior número de demandas judiciais no ano de 2017 pertencem à região Centro-Oeste: Mato Grosso do Sul, com 13,2 casos novos a cada mil mulheres residentes, seguido pelo Distrito Federal, com 11,9 casos novos a cada mil mulheres residentes (CNJ, 2018). Entretanto, apesar da ampla judicialização em relação à casos de violência doméstica, verifica-se que, em verdade, esta não tem diminuído. Em recente pesquisa, o Instituto de Pesquisa e Economia Aplicada (IPEA) detectou um aumento de aproximadamente 30% nos homicídios perpetrados contra mulheres entre os anos de 2007 e 2017, somando-se, no último ano analisado, (quatro mil novecentos e trinta e seis) homicídios. Alinhando-se a estes índices, o Sistema de Informação de Agravo de notificação (SINAN), vinculado ao Ministério da saúde, também indicou o aumento nos registros de violência contra a mulher, em suas demais manifestações sexual, psicológica, física, entre outras (CUBAS; ZARENCIA, AMÂNCIO, 2019). Nestes casos, o agente de saúde que identifica a existência de violência, é obrigado a notificar à secretaria de saúde. Percebe-se, portanto, que ainda há muito a se desenvolver no que tange à efetividade da legislação pertinente, tendo em vista que, apesar da ampla proteção formal, a violência contra a mulher ainda faz, diariamente, dezenas de vítimas. Talvez uma das respostas à esta ausência de efetividade esteja na aplicabilidade da legislação pelo sistema de justiça, onde ainda há grande dificuldade na percepção da violência contra a mulher como violência de gênero, ou seja, uma violência decorrente de relações de poder ideologicamente justificáveis por uma hierarquia de gênero. 86

105 Nesta seara, um dos temas a serem destacados é a violência psicológica, que apesar de subestimada e pouco discutida, é peça chave para a compreensão da amplitude e gravidade da violência contra a mulher como um todo, vez que na maior parte das vezes permeia e antecede as demais formas de violência (física, patrimonial, moral, etc.). Na prática, contudo, é comum considerarmos violência apenas quando esta alcança consequências visíveis, como as agressões físicas. De fato, há o entendimento de que, se não há cicatrizes e marcas físicas, não houve efetivamente violência (WINCK, 2007). O que comumente não se aborda, entretanto, é que antes da agressão física propriamente dita, em grande parte dos casos há o desenvolvimento de um relacionamento abusivo, que paulatinamente vai deteriorando a autoestima e muitas vezes a saúde mental da mulher, o que lhe deixa em um estado extremamente vulnerável, dificultando sua capacidade de resistência. Medo, negação, depressão e transtornos de estresse pós-traumático (TEPT) são alguns dos exemplos das sequelas deixadas, muitas vezes de forma irreparável (MACHADO, 2013). Em verdade, as manifestações físicas, como as agressões e homicídios, refletem, de fato, uma falha na detecção, prevenção e coibição das demais formas de violência, como a violência psicológica. Um dos aspectos mais complexos desta forma específica de violência, é sua intrínseca relação com aspectos culturais de nossa sociedade. Muitas vezes a mulher tem grande dificuldade de sair de um relacionamento violento por culpa e pressão social que sofre, inclusive da própria família e da sociedade, para que continue tentando. Desistir de uma vida com violência significa assumir culpa pelo fracasso. Significa ter destruído o lar e o casamento, não ter compreendido as necessidades do parceiro, e não ter ajudado-o a melhorar, quando essa claramente era sua função: Nas situações de violência doméstica, há inversão da culpa. O agressor faz a vítima crer que ela é a responsável 87

106 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição pelo ato de agressão, porque descumpriu um dever ou falhou. E essa inversão marca a dominação psicológica que o homem estabelece prevalecendo-se dos papéis definidos socialmente como o responsável pelas decisões e estabilidade do lar (FERNANDES, 2015, p. 83). Quaisquer queixas e sintomas relacionados às consequências da violência psicológica na saúde da mulher, entretanto, são constantemente desqualificadas pela sociedade em geral. Tais circunstâncias também se refletem no tratamento dado pelo sistema de justiça a esses crimes. A começar por uma das inovações da Lei Maria da Penha: as medidas protetivas. Previstas nos artigos 18 a 24 da Lei, tem entre suas características a prescindibilidade de boletim de ocorrência ou qualquer outro meio de prova, o que é razoável, considerando que a maior parte dos crimes de violência doméstica se dá no ambiente privado. Na prática, entretanto, a realidade é outra. No Distrito Federal, um em cada quatro pedidos de medidas protetivas são indeferidas sem justificativas ou por ausência de provas, ignorando o caráter privado dos crimes e a urgência das medidas, que visam, em última instância, não a instrumentalização de um processo penal, mas à proteção da mulher (CAMPOS, 2017). Outra prática comum no judiciário é a tentativa de superação de situação de violência em prol da harmonização do lar. Tais decisões, que muitas vezes levam à absolvição do agressor, além de reforçar a compreensão de que a mulher deve priorizar a família acima de quaisquer circunstâncias, nega à estas mulheres o reconhecimento da gravidade da violência sofrida (NASCIMENTO, 2012). Tais circunstâncias se tornam ainda mais recorrentes nas comarcas onde ainda não há vara especializada para o julgamento das demandas de violência doméstica e familiar contra a mulher, conforme 88

107 expressamente determinado pela legislação, em seu artigo Sem a infraestrutura e especialização que a complexidade de tais crimes demanda, a banalização dos crimes cometidos é comum, o que acaba por deixar a vítima sem o amparo necessário. Na maior parte das comarcas ainda não houve a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, nos termos da lei. Enquanto esta não ocorrer, quem acumulará a competência para o julgamento das causas cíveis e criminais relacionados à violência contra mulher serão as varas criminais. Na prática, porém, em muitos lugares isto não funciona. Decisões de varas criminais declinando a competência de causas cíveis, mesmo que relacionadas à violência doméstica e familiar contra a mulher, como divórcio, guarda e fixação de alimentos aos filhos, são muito comuns (CNJ, 2019). Nestes casos, é preciso que a mulher passe por todas as etapas necessárias ao ajuizamento de outra ação novamente, em um momento em que sem encontra vulnerável emocional e fisicamente. Um processo lento e doloroso pelo qual muitas mulheres não estão dispostas a passar e desistem em pleitear por justiça. Tais decisões evidenciam o desconhecimento da realidade em que estas vítimas se encontram, bem como o sofrimento não só físico, mas emocional que a violência de gênero lhes impõe, o que na prática onera e revitimiza mulheres, criando ainda mais obstáculos a seu acesso à justiça. Como visto, a violência de gênero possui muitas facetas, e os crimes decorrentes de sua incidência possuem características peculiares que demandam um tratamento diferenciado. Pela violência contra a 1 Lei /2006, Art. 33: Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente. 89

108 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição mulher ocorrer principalmente no ambiente privado, e por terem como autores familiares, maridos e companheiros, ou seja, possuírem um contexto social que traz às vítimas ainda mais vulnerabilidade, as sequelas trazidas por sua ocorrência são inúmeras, e as dificuldades de superação são infinitamente maiores. A existência de um diploma legal específico para o combate da violência de gênero é extremamente importante, e por si só representa enorme progresso. É preciso, porém, garantir a aplicabilidade e eficácia da lei, o que só será possível através da compreensão das especificidades em que esta forma específica de violência se reproduz, das circunstâncias de vulnerabilidade em que estas mulheres convivem em virtude dessa violência, e, assim, dos obstáculos impostos às vítimas no processo de superação. Apenas assim será possível assegurar, de fato, a proteção e o exercício dos direitos destas mulheres, garantindo assim a efetividade e o acesso à justiça. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Lei nº , de 7 de agosto de Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 08 de agosto Seção 1, p. 01. BRASIL. Lei nº , de 9 de março de Altera o art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 de março de

109 CERQUEIRA, D. R. C. et al. Atlas da violência Rio de Janeiro, Disponível em: com_content&view=article&id=34784&itemid=432. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. O poder judiciário na aplicação da Lei Maria da Penha Disponível em: 0c e10_1c3f3d621da010274f3d69e6a6d6b7e6.pdf. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Relatório - o poder judiciário no enfrentamento à violência doméstica e familiar contra as mulheres Disponível em: =com_content&view=article&id=35101&itemid=432. CUBAS, Marina Gama. ZAREMBA, Julia. AMÂNCIO, Thiago. Brasil registra 1 caso de agressão a mulher a cada 4 minutos, mostra levantamento. Folha de São Paulo, 09 de setembro de Seção Cotidiano, B1. Disponível em: caso-de-agressao-a-mulher-a-cada-4-minutos-mostralevantamento.shtml. Acesso em 03 de janeiro de DE CAMPOS, Carmen Hein; Lei Maria da Penha necessidade de um novo giro paradigmático. Revista Brasileira de Segurança Pública, São Paulo, v. 11, n. 1, p , fev/mar FERNANDES, Valéria Diez Scarance. Lei Maria da Penha: o processo penal no caminho da efetividade: Abordagem jurídica e Interdisciplinar. 1ª Edição, p. 91

110 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição MACHADO, Isadora Vier et al. Da dor no corpo à dor na alma: uma leitura do conceito de violência psicológica da lei Maria de Penha. Revista de Estudos Feministas. v. 23, n. 2, p , maio/agosto NASCIMENTO, Luana Regina Ferreira do. Aplicação da Lei Maria da Penha: um estudo sobre estereótipos de gênero no Judiciário Dissertação (Mestrado em Política Social) Instituto de Ciências Humanas, Departamento de Serviço Social, Universidade de Brasília, Brasília. WINCK, Gustavo Espíndola. Percepções sobre violência e relações de gênero em homens acusados de agressão Dissertação. (Mestrado em Psicologia) - Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. 92

111 LEI MARIA DA PENHA E DIREITO DO TRABALHO: em defesa da manutenção do contrato de emprego da mulher vítima de violência doméstica * * A violência contra as mulheres é matéria corriqueiramente denunciada pela mídia, tanto no que se refere à violência física e sexual quanto à psicológica. Por mais que o cenário atual se mostre mais avançado no que respeita à emancipação do gênero feminino quando em comparação com outros momentos históricos, paradigmas de um modelo patriarcal de sociedade ainda são latentes e naturalizados. Por isso, necessário se faz zelar pelas existentes normas protetivas aos direitos das mulheres, garantindo-lhes segurança e dando-lhes o apoio necessário para superar momentos de fragilidade advindos das agressões sofridas. A Lei Maria da Penha representa um significativo marco no combate à violência doméstica e familiar. Além de inovar no âmbito penal, nuance mais conhecida da lei por prever punição severa ao agressor, traz também previsões que geram debates em outras esferas, como na trabalhista. Importante previsão é a do artigo 9º, 2º, inciso II, de referida Lei, que prevê a manutenção do vínculo empregatício quando necessário o afastamento da mulher de seu local de trabalho, por até seis meses, para preservar sua integridade física e psicológica. O dispositivo silencia, entretanto, quanto à modalidade da manutenção contratual, se * Mestranda em Direitos Humanos e Democracia pela Universidade Federal do Paraná. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela EMATRA-IX. Advogada inscrita na OAB/PR sob o n * Mestranda em Direitos Humanos e Políticas Públicas pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada inscrita na OAB/PR sob o n

112 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição suspensão ou interrupção. As autoras defendem seja o caso de incidência do instituto da interrupção, conforme se detalhará. Cabe, inicialmente, estabelecer breves intersecções entre gênero, trabalho, divisão sexual do labor, reestruturação produtiva e ocupação do mercado de trabalho pelas mulheres. O trabalho pode ser considerado uma das mais evidentes maneiras de controle e reafirmação da hierarquia de gênero, sendo um eficaz elemento na organização das relações de poder, inerentes às relações de gênero. A consideração do trabalho invisível (reprodutivo) decorre apenas posteriormente à percepção do trabalho das mulheres 1 e da existência de uma divisão sexual do trabalho, que traduz não uma complementaridade de tarefas entre os gêneros, mas uma relação de poder entre homens e mulheres. (KERGOAT, 2000, p. 2-3). Diversos estudos antropológicos deram conta de demonstrar que a designação prioritária dos homens para a produção e das mulheres para a reprodução não data do modo de produção capitalista (GAMA, 2014, p. 39), mas pode-se afirmar que é nele que a sujeição da mulher ao homem se torna ainda mais virulenta e devastadora (PENA, 1981, p. 14). Se, portanto, é pretérita ao capitalismo a diferenciação dos espaços de produção e de reprodução, do ambiente público e do privado e dos lugares de homens e mulheres de acordo com uma suposta atribuição natural, é apenas no capitalismo que essas relações se transformam em questão de Estado, de modo a adequá-las e torná-las úteis a esse modo de produção. (BITTENCOURT, 2015, p. 4). Com o advento da mecanização, a Revolução Industrial representou um marco no trabalho das mulheres. É o momento em que a 1 O termo trabalho das mulheres é utilizado propositadamente e de forma a evitar a expressão trabalho feminino, por ser mais abrangente do que o trabalho reprodutivo e privado, abarcando todas as formas de trabalho exercido pelas mulheres, inclusive o produtivo. A existência de trabalhos naturalmente femininos é fruto, em verdade, de processos históricos, sociais e culturais, ainda que haja a predominância de mulheres em determinados ramos. 94

113 mulher deixa de ter sua imagem vinculada tão somente aos afazeres do lar e se lança ao mercado de trabalho. Contudo, essa não pode ser considerada uma grande conquista das mulheres, pois o interesse pela mão de obra feminina ocorre em razão de seu baixo custo, da mesma forma que com a mão de obra de crianças (BARROS, 1995, p. 29). A jornada de trabalho, à época, era de aproximadamente 17 horas diárias, não raramente submetidas a condições insalubres e periculosas, também com constantes assédios sexuais. (ANDREUCCI, 2012, p ). O panorama de participação de mulheres no mercado de trabalho sofreu sensíveis alterações com as grandes guerras, quando um contingente nunca antes alcançado de mulheres passou a exercer trabalho nas indústrias, especialmente nas bélicas e têxteis, em decorrência dos postos vagos de operários que foram chamados a participar dos campos de batalha. Os números, entretanto, não se mantiveram. Finda a guerra, o trabalho das mulheres regrediu aos níveis anteriores, retornando aos postos de formação do exército industrial de reserva (ANDREUCCI, 2012, p. 79). Com a retomada dos homens ao emprego, a quem é dada prioridade, a consequência é o retorno feminino ao lar, ao espaço doméstico e domesticado. O cenário sofre também influências da reestruturação produtiva e do advento do neoliberalismo a partir de 1980, quando direitos sociais são flexibilizados em nome do livre jogo do mercado, comprometendo a dignidade humana e a solidariedade entre os trabalhadores. 2 A flexibilização das relações trabalhistas típicas desse modelo de produção acarreta precarização à classe trabalhadora como um todo, porém atinge, em especial, as mulheres. Nas palavras elucidativas de Kergoat: 2 Com o fim da Guerra Fria e o desaparecimento da concorrência ideológica, surge o que Wilson Ramos Filho denomina capitalismo descomplexado: aquele que não mais precisa se legitimar e relegitimar, tendo em vista a vitória ideológica do mercado e da democracia liberal sobre os ideais igualitaristas. Esse fenômeno abriu caminho para a consolidação, em escala mundial, de práticas neoliberais. (RAMOS FILHO, 2012, p. 281). 95

114 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição A participação da mulher no mercado de trabalho aumenta, mas as segmentações, horizontais e verticais, entre empregos masculinos e femininos, perduram. As desigualdades de salário persistem, e as mulheres continuam a assumir o trabalho doméstico. A meu ver, no entanto, isso não representa nenhuma aporia ou contradição interna às relações sociais de sexo, mas aponta para o fato de que o capitalismo tem necessidade de uma mão de obra flexível, que empenhe cada vez mais sua subjetividade: o trabalho doméstico assumido pelas mulheres libera os homens e, para as mulheres de alta renda, há a possibilidade de externalizacão do trabalho doméstico para outras mulheres. (KERGOAT, 2010, p. 94). É certo que nessa matéria muito se avançou. Reconhece-se que no século XX a maternidade, por exemplo, estereotipicamente um papeldever da mulher, fortalece-se como uma opção ou faculdade. A mulher almeja uma carreira profissional, em detrimento das funções de esposa e mãe (BARDWICK, 1981, p. 41). O que se ressalta, porém, é que apesar da crescente inserção das mulheres no mercado de trabalho, ainda persistem desigualdades nas relações laborais. Salários menores, dificuldade para promoção na carreira, assédio moral e sexual, bem como exaustivas triplas jornadas de trabalho (carreira-casa-filhos) são uma realidade na vida das mulheres brasileiras (ANDREUCCI, 2012, p. 113). O acesso das mulheres ao trabalho assalariado jamais suprimiu o abismo existente entre homens e mulheres em termos de igualdade. Nesse contexto, merece menção o papel do movimento feminista, cuja radicalidade, segundo Vera de Andrade, desvelou as múltiplas formas de violência às mulheres, captando-a em toda sua extensão: desde as microdiscriminações à macroviolência física. No âmbito do trabalho, denunciou, além da divisão sexual e hierárquica, a violência que atinge o corpo, as formas de assédio e abuso sexual. (ANDRADE, 2003, p ). Conforme irretocável texto preambular da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a 96

115 Mulher (Convenção de Belém do Pará), a violência contra a mulher constitui violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais e limita total ou parcialmente a observância, gozo e exercício de tais direitos e liberdades;. A mulher vítima de violência tem violados seus direitos à vida, à saúde e à integridade física e psicológica, e é nesse contexto que se deve ressaltar o papel que cabe ao Direito do Trabalho, sendo de fulcral importância que sejam assegurados à trabalhadora vítima de violência doméstica ao menos os direitos provenientes da relação de emprego que conseguiu estabelecer. Em vista da complexidade do problema, deve haver ações conjuntas que abarquem tanto o âmbito público como o privado (GAMA, 2014, p. 42), inclusive no que tange ao vínculo empregatício. Isso porque o trabalho assalariado formal representa o que de melhor o capitalismo brasileiro tem a oferecer à classe trabalhadora, pois ele se faz acompanhar de um conjunto de normas de proteção social e trabalhista (DELGADO, 2010, p. 57). Pode-se afirmar, portanto, que o trabalho produtivo possibilita ao trabalhador acesso a outros direitos sociais, como a previdência e a própria cidadania. Em relação às mulheres, o trabalho assalariado representa e possibilita sua independência financeira em relação ao companheiro que, no mais das vezes, é o provedor da família (DIAS, 2007, p. 93), devido às construções históricas e sociais a que já se aludiu. O emprego, portanto, auxilia mulheres a porventura saírem de situações de violência doméstica, eis que ao menos garante sua autonomia financeira. Assim, a previsão de afastamento da mulher de seu emprego, contida no artigo 9º, 2º, II, da Lei Maria da Penha, garante não apenas o vínculo estabelecido, por até seis meses, mas também assegura e viabiliza o afastamento da própria situação de violência sofrida pela mulher, na medida em que a distancia de seu agressor, especialmente considerando a possibilidade de o agressor, ou alguém a seu mando, 97

116 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição rondar o ambiente de trabalho da vítima para se vingar da denúncia por ela eventualmente ofertada. (MARTINEZ, 2015, p. 572). A manutenção do vínculo empregatício da mulher assegurada pela Lei Maria da Penha, portanto, tem imensa magnitude na vida de diversas Marias. Guarda consonância, ademais, com a Declaração Universal de Direitos Humanos, que em seu artigo 23, item 1, estabelece a proteção contra o desemprego, nos seguintes termos: 1.Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego. Converge, ainda, com a Convenção n. 111 da OIT e a previsão do artigo 7º, XX, da Constituição, na medida em que dispõem sobre a proteção do mercado de trabalho da mulher, da liberdade de trabalho e o livre acesso a ele. Também se alinha com o artigo 3º, inciso IV, da CF, que faz constar como objetivo fundamental da República a promoção do bem de todos, livre de qualquer ato discriminatório, da mesma maneira que o artigo 5º, que em seu caput estabelece a igualdade de todos, inclusive no tocante a homens e mulheres (inciso I). Da mesma maneira, não se pode olvidar do artigo 226 da Constituição, que expressamente dispôs a paridade de direitos e deveres quanto a seu exercício tanto pelo homem quanto pela mulher ( 5º), mencionando em seu 8º que o Estado assegurará a assistência à família, criando mecanismos de coibir a violência no âmbito de suas relações. No mesmo sentido, no âmbito infraconstitucional, também merece menção a plena compatibilidade com a Lei 9.799/99, por meio da qual se inseriu o artigo 373-A na CLT, cujo caput menciona a correção de distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho, os incisos proíbem comportamentos discriminatórios do empregador, e seu parágrafo único dá abertura a outras medidas de proteção e correção das distorções que afetam o acesso da mulher ao trabalho. A previsão legal objeto deste estudo, entretanto e conforme se disse inicialmente, apesar de muito bem subsidiada em normas nacionais e internacionais, traz lacunas interpretativas que geram percalços para 98

117 sua plena efetividade e aplicabilidade: o afastamento da empregada de seu local de trabalho, por até seis meses, não teve sua natureza jurídica explicitada pela Lei Maria da Penha. No tema em debate, em que há silêncio do legislador, a doutrina se divide. Quem defende o enquadramento da situação prevista no artigo 9º, 2º, II, da Lei Maria da Penha como sendo hipótese de suspensão 3 do contrato de trabalho argumenta que o empregador não tem culpa ou responsabilidade pela violência sofrida por sua empregada em âmbito privado, não sendo justo que continuasse a pagar salário sem receber a contraprestação. 4 Entende que ao empregador caberia fazer só o que a lei determina. Assim, tendo em vista a lacuna existente, a obrigação imposta pela lei seria a de manter o vínculo empregatício, nada mais. No nosso sentir, por outro lado, a manutenção do vínculo empregatício, pura e simplesmente, sem o pagamento de salário, confronta com a própria finalidade da lei, qual seja oferecer proteção real à mulher em situação de violência, fornecendo-lhe efetiva assistência. A interrupção 5 do contrato, assim, seria o instituto mais apropriado na hipótese e que mais se afinaria com o ordenamento jurídico pátrio 3 A suspensão consiste na sustação ampliada e recíproca dos efeitos do contrato, mantendo incólume o vínculo entre as partes. Quase a totalidade das cláusulas contratuais não se aplicam nessa ocasião, pois não se presta serviço, não se paga salário, não é computado tempo de serviço, não ocorrem recolhimentos previdenciários e fiscais etc. As cláusulas a respeito de condutas omissivas, entretanto, continuam vigentes, como por exemplo, o dever do obreiro de lealdade e fidelidade, não podendo violar segredo da empresa, tampouco concorrer deslealmente nesse período (artigo 482, c e g, da CLT). (DELGADO, 2015, p. 1150). 4 Comungam desse entendimento os autores Sérgio Pinto Martins (MARTINS, 2009, p ) e Pedro Rui da Fontoura Porto (PORTO, p ). 5 A interrupção do contrato empregatício é a sustação restrita e unilateral dos efeitos contratuais, pois apenas a prestação laborativa pelo obreiro e sua disponibilidade perante a empresa fica sustada, permanecendo inalteradas as demais obrigações durante esse período. Dessa forma, por mais que a obrigação principal do empregado perca eficácia, as obrigações do empregador devem continuar sendo rigorosamente cumpridas. O principal exemplo são as férias, ocasião em que não há prestação de serviço embora haja pagamento de salário, cômputo do tempo de serviço e ocorram os descontos legais devidos. (DELGADO, p. 1150). 99

118 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição protetivo aos direitos das mulheres, especialmente com os dispositivos invocados acima. Ainda nesse contexto, importa mencionar o artigo 377 da CLT, que considera que todas as formas de proteção ao trabalho das mulheres, tal qual a que ora se discute, são de ordem pública, sendo injustificável a redução de seus salários. 6 Assim, a partir de uma hermenêutica sistemática do ordenamento jurídico, é inaceitável defender que a previsão contida no artigo 9º, 2º, II, da Lei Maria da Penha se pretende tão-somente a garantir o vínculo empregatício, deixando a trabalhadora, que teve inúmeros de seus direitos gravemente violados, sem o percebimento de salário no período correspondente ao afastamento legal. Se se almeja uma sociedade realmente comprometida com a justiça social e que objetiva a igualdade e a plena liberdade das mulheres que a compõem, a lacuna interpretativa da Lei Maria da Penha deve ser preenchida com a máxima proteção possível à trabalhadora em situação de violência, assegurando-lhe o pagamento de salários durante o período de afastamento legal, sendo certo que a atuação da advocacia deve se dar com igual rigor nessa direção. REFERÊNCIAS ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Sistema penal máximo versus cidadania mínima: códigos da violência na era da globalização. Porto Alegre: Livraria do Advogado, ANDREUCCI, Ana Claudia Pompeu Torezan. Igualdade de gênero e ações afirmativas: desafios e perspectivas para as mulheres brasileiras pós Constituição Federal de São Paulo: LTr, Art A adoção de medidas de proteção ao trabalho das mulheres é considerada de ordem pública, não justificando, em hipótese alguma, a redução de salário. 100

119 BARDWICK, Judith. Mulher, sociedade, transição: como o feminismo, a liberação sexual e a procura da auotorrealização alteraram nossas vidas. São Paulo: DIFEL, BARROS, Alice Monteiro de. A mulher e o direito do trabalho. São Paulo: LTr, BITTENCOURT, Naiara Andreoli. Gênero, trabalho e marxismo: a luta das mulheres brasileiras e a construção de um direito insurgente. UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE. Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas sobre Marx e o Marxismo NIEP. Colóquio internacional Marx e o marxismo 2015: Insurreições, passado e presente. Disponível em: < Acesso em: 06 jan BRASIL. Portal Brasil. Observatório Brasil da Igualdade de Gênero. Enfrentamento de todas as formas de violência contra as mulheres. Disponível em:< Acesso em: 06 jan DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, Curso de direito do trabalho. 14. ed. São Paulo: LTr, DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça: a efetividade da Lei /2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. São Paulo: LTr, GAMA, Andréa de Sousa. Trabalho, família e gênero: impactos dos direitos do trabalho e da educação infantil. São Paulo: Cortez,

120 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição KERGOAT, Danièle. Divisão sexual do trabalho e relações sociais de sexo. In: HIRATA, Helena; LABORIE, Françoise; SENOTIER, Danièle (Orgs). Dictionnaire critique du féminisme. Tradução de Miriam Nobre. Paris: Presses Universitaires de France, p Dinâmica e consubstancialidade das relações sociais. Tradução de Antônia Malta Campos. Revista Novos Estudos, São Paulo, n. 86, p , mar MARTINEZ, Luciano. Curso de direito do trabalho: relações individuais, sindicais e coletivas do trabalho. 6. ed. São Paulo: Saraiva, MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, PENA, Maria Valéria Junho. Mulheres e trabalhadoras. Rio de Janeiro: Paz e Terra, PORTO, Pedro Rui da Fontoura. Violência doméstica e familiar contra a mulher: Lei /06 análise crítica e sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, RAMOS FILHO, Wilson. Direito capitalista do trabalho: história, mitos e perspectivas. São Paulo: LTr,

121 VIÉS RACIAL COMO ENTRAVE AOS EFEITOS DA LEI MARIA DA PENHA * * O presente artigo tem como escopo uma sumária reflexão dos problemas encontrados na efetiva aplicação da Lei nº /06, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, ícone em coibir e sancionar a violência contra à mulher, sob o enfoque racial. É notório e sabido o fato de que os Operadores do Direito em todos os níveis e em sua grande maioria, encontram-se despreparados à aplicação plena da Lei às mulheres em situação de violência. Indiferença e descaso no acolhimento, inobservância no cumprimento dos procedimentos implícitos na referida lei e respectivas diligências, falas incentivadoras de eventual arquivamento, julgamentos pré equivocados por causa de vestimenta, são alguns atos frequentemente constatados por parte de Instrumentadores do direito em várias instâncias. Despreparo que reflete-se, como em cadeia, desde o momento da recepção da mulher na Delegacia até a sentença proferida pelo Douto Julgador, e portanto, inevitável sua associação com a coexistência de conceitos preconcebidos racistas e sexistas, e consequentemente a análise do paradoxo entre estes e a aplicabilidade da Lei. Notadamente, no caso da mulher negra isso é potencializado face ao histórico lugar 'estar escrava'. O legado escravocrata foi * Advogada, Pós Graduação em Direito Constitucional, Jornalista, Colunista do Jornal Digital Flor de Dendê - BA, Feminista, Ativista do Movimento Negro, Co-Fundadora do MNU-MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO - SP, membro da COMISSÃO DA MULHER ADVOGADA - Subseção Santana-SP. * Advogada, Pós-Graduada em Direito Previdenciário, Presidenta da Comissão da Igualdade Racial OAB-SP - Subseção Judiaí SP. 103

122 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição devastador, no sentido de ter alicerçado divisões raciais excludentes com efeitos que abalam o pressuposto democrático da igualdade. Nas relações entre senhor de escravos versus escrava, a subordinação era exercida pela força e pela sexualidade, autorizando estupros institucionais, sob a égide de utilização do ventre negro como 'força motriz', delegando à mulher negra o papel de 'moto contínuo do mundo' (Conceição Evaristo, Poema Eu Mulher). A filósofa, ativista e militante negra norte americana Ângela Davis, autora de vários clássicos norteadores do pensamento político racial hodierno e defensora dos direitos civis dos negros norteamericanos, reafirmou o mote de que conceitos advindos da situação de escravidão, são motivadores da desqualificação histórica e da consequente exclusão da mulher negra. Em seu livro Mulheres, Raça e Classe, Ângela Davis preconizou ser o racismo encorajador da violência sexual: A escravidão se sustentava tanto na rotina do abuso sexual quanto no tronco e no açoite, escreve. O direito alegado pelos proprietários e seus agentes sobre os corpos das escravas era uma expressão direta de seu suposto direito de propriedade sobre pessoas negras como um todo." Segundo a filósofa, a violência e abuso sexual persistiu até mesmo após a escravidão ter sido abolida, estando ainda presente no inconsciente coletivo como o racismo estrutural que embasa pensamentos atitudes e pré-julgamentos racistas e preconceituosos. As desigualdades são potencializadas, posto oriundas de uma experiência histórica diferenciada. Históricas e constantes violações à sua dignidade, tais como estupro coletivo e sistemático ocorrido durante a escravidão, separação familiar, utilização como mão de obra sistemática e 'pau para toda obra', lhe conferem o direito de "outro olhar", face a diferença qualitativa da opressão sofrida. 104

123 O clássico discurso da opressão à mulher negra passa pelo rompimento de velhos modelos preestabelecidos bem como pela rejeição da prática da discriminação racial que institui a mulher branca institucionalmente e no contexto histórico, como modelo privilegiado e absoluto de mulher. As bases do pensamento nacional e das relações inclusive econômicas, estão minadas pelo pensamento escravagista, segundo Sueli Carneiro, (1999, p. 19): [...] "O chamado estupro colonial ocorrido em nosso país perpetrado pelos senhores sobre mulheres negras é um dos pilares da decantada democracia racial pela mestiçagem que produziu, fato que está na origem de todas as construções sobre a identidade nacional e das relações hierárquicas de gênero/raça presentes em nossa sociedade. A mulher negra é a principal agente de superação do quadro que vive desde os tempos da escravidão. Se firmou como mantenedora de sua família e comunidades, com efetivas contribuições materiais para a perpetuação familiar. O tipo escrava mulher incansável trabalhadora é um dos mais antigos e reforçados, vigorando há centenas de anos e se adaptando ás mudanças econômicas e culturais da sociedade. Poda o potencial e auto estima das mulheres negras, como correntes à sua liberdade e ao reconhecimento da igualdade. A violência intrafamiliar exercida sobre a mulher negra e o contexto comunitário, impregnado de práticas violentas se constitui em um fenômeno que avilta sua dignidade, ao tempo em que se configura uma violação sistemática dos direitos humanos. Corroborando o alegado, vamos aos índices: no Dossiê Mulher consta que mulheres negras e pardas são a maioria das vítimas de homicídio doloso 59,1%; tentativa de homicídio 55,0%, estupro 55,8%. A cada 100 mil mulheres negras, 6,8% foram vítimas do homicídio doloso. 105

124 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição O Atlas da Violência 2019 aponta um relevante aumento da violência doméstica contra mulheres negras A taxa entre mulheres negras cresceu em 29,9% enquanto para mulheres não negras aumentou 1,6%. Desse modo, a taxa de homicídios entre mulheres negras chegou a 5,6 a cada 100 mil, já entre mulheres não negras é de 3,2 a cada 100 mil além de serem as mulheres negras maioria em crimes de lesão corporal e estupro, sendo que somos as maiores vítimas do feminicídio. Os números alarmantes mostram que o racismo, sexismo, dominação de classe, são matrizes de práticas institucionais exercidas sistematicamente pelo Estado, e configuram-se como ideologias estruturantes que interferem sobremaneira à efetivação de leis embasadoras da cidadania. Parafraseando o Mestre Milton Santos,...'não existe cidadania em um país que é racista..." Bell Hooks, autora, ativista e feminista negra, no texto 'Vivendo de Amor' ressalta a máxima "numa sociedade onde prevalece a supremacia dos brancos, a vida dos negros é permeada de questões políticas que explicam a interiorização do racismo e de um sentimento de inferioridade". Urge desvincular e desconstruir papéis sociais (inclusive utilizados pela mídia dominante) pré-estabelecidos à mulher negra tais como 'pau para toda obra', 'mulata sensual, 'mulher forte' que reforçam o pensamento racista e escravagista exaltando a dominação e a hipersexualidade, influindo diretamente, inclusive, na aplicação e eventual banalização de sanções aplicadas aos incursos na Lei Maria da Penha. Relata a Professora, Vera L. Benedito, 2009: Quando prestarmos mais atenção à amplitude devastadora do racismo como indiferença ou estranhamento em relação a um ou mais grupos sociais, talvez possamos agir mais concretamente para reforçar ferramentas sociais de combate às desigualdades. 106

125 Ao comparecer à Delegacia, a mulher em estado de vulnerabilidade e violência, vence entraves como desconhecimento, descrença, distanciamento geográfico, medo e pobreza. Incabível ter que passar por outras formas sutis de violência, quando roga a ajuda estatal. É mister que os agentes públicos encarregados do acolhimento, exerçam a sensibilidade ao avaliar a complexidade das relações, se privando de emitir opiniões e julgamentos pré-concebidos. Devem ser pessoas despidas dos padrões culturais racistas que negligenciam, banalizam, subestimam a ocorrência e consequências da violência doméstica. Nesse diapasão, o termo 'ferramenta social, se insere como um fomento à formação transformadora no âmbito jurídico operacional, vinculando a questão racial a todos os setores do Direito. A desconstrução de valores sexistas e racistas, passa pela de inclusão nos currículos dos cursos de Ciências Jurídicas, de Disciplina Anti Discriminatória, isto é uma disciplina qualificadora de formação jurídica nas relações de sexo, gênero e raça, á guisa da visão da literatura clássica negra, olvidando o pensamento europeu, que por vezes erroneamente alicerçam a discricionariedade exercida pelos operadores do Direito. Impõem-se como parâmetros inegociáveis na ordem jurídica, a inclusão efetiva da disciplina Direito Anti Discriminatório, que estude o percurso das relações raciais no Brasil, discutindo questões de gênero, raça e igualdade jurídica étnico racial à base de pensamentos elaborados por intelectuais e filósofos negros, 'griot's de nossa ancestralidade. "Enquanto os leões não tiverem seus próprios historiadores a história continuará sendo uma versão dos caçadores", diz uma inscrição numa tabuleta do Zaire. Análises de pensamentos de escritoras feministas, como as citadas, Ângela Davis, Lélia Gonzalez, Sueli Carneiro, Bell Hooks, Vera Benedito, entre inúmeras outras; devem ser incorporados na formação obrigatória nos bancos de Universidades e programas de formação jurídica. Concepções como a 'interseccionalidade'... conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas 107

126 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição da interação entre dois ou mais eixos da subordinação, acrescentando a forma pela qual o racismo, o patriarcado, a opressão de classe dentre outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras ; (Kimberlé Crenshaw) devem ser estudados para melhor compreensão dos mecanismos de subordinação e desigualdades. O Poder Judiciário deve cumprir seu papel equânime com indicadores mínimos para garantir às mulheres em situação de violência tratamentos igualitários, atentando para o recorte raça, classe e sexo, com especial atenção às diferenças e diversidades sociais. Em razão da complexidade e amplitude da violência intrafamiliar da mulher negra, é mister que os Poderes constituídos desenvolvam ações integradas para que a questão seja tratada com a multiplicidade que exige. O objetivo da promoção de contínuo investimento educacional, é envolver como uma rede a comunidade, com a promoção de seminários, estudos e debates sobre o tema, garantindo a efetividades das decisões judiciais com o consequente encaminhamento e vítima e agressores aos órgãos competentes, terapêuticos e sociais. O resultado propiciará gradual mudança por parte da sociedade em relação aos valores, resultando em minimização da violência como um todo. A compreensão fática do racismo e suas implicações, abre a possibilidade do desenho de um novo e abrangente projeto social, rumo à construção de um novo marco civilizatório, com pensamento comprometido com o antirracismo, democracia e igualdade entre os seres. O desmantelamento do Racismo Estrutural deve ser palco de rico debate sobre a melhor utilização da Lei como instrumento de conquista dos direitos do Povo Negro. Cumpre ressaltar o fato de que a OAB-Seccional São Paulo, antenada com o óbvio e ininterrupto movimento do Direito, em prol dos 'usos e costumes', e através da Comissão de Igualdade Racial, também se utiliza da tal ferramenta social promovendo sistemáticos eventos 108

127 com a temática racial, com a participação de nobres especialistas e militantes especialistas discutindo temas controversos como a intolerância religiosa; o estado de exceção e racista que preconiza o sistemático genocídio do jovem negro; diversas questões ligadas à atuação jurídica da mulher negra; além de estratégias ao pleno exercício da legislação ligada à questão racial e suas nuances jurídicas. Face à pertinência do assunto, os debates são sempre lotados e acalorados, trazendo à tona um novo olhar e adequando às questões raciais às questões jurídicas, imprescindíveis e pertinentes ao pleno exercício do Estado de Direito. Sobressai-se, no contexto, o trabalho da Educafro, Rede de Pré Vestibulares Comunitários, Bolsa de Estudo em Graduação e Pós- Graduação, Educação para Afrodescendentes e Carentes, que entre outras iniciativas, organizou o Curso de Direito Racial, com a participação de advogados e operadores do Direito, com discussão de estratégias condizentes e eficazes ao combate do racismo e discriminação racial. Cumpre ressaltar, o ineditismo da atuação do CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, que atento ás demandas raciais do momento, organizou o Seminário Questões Raciais e Poder Judiciário, com intensas discussões acerca do racismo estrutural e institucional e que entrava o sistema de Justiça e políticas judiciárias na perspectiva racial. A consequente criação do Grupo de Trabalho de Igualdade Racial do CNJ, vem de encontro ao nosso pleito de enfrentamento do Poder Judiciário no exercício de igualdade, a fim de dirimir os nós que entravam a aplicação dos direitos mandamentais, no tocante ao povo negro. Mas não basta. A OAB como templo do exercício do Direito deve firmar posição e juntar esforços no sentido de influir na grade curricular das Universidades do Direito, para a implantação da Disciplina Anti Discriminatória e cumprir seu papel na adequação e efetivação dos direitos humanos. 109

128 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Conforme reza Piovesan, 2006, "há que se assumir o risco de romper com a cultura da naturalização da desigualdade, reafirmando ser a cultura dos direitos humanos "única plataforma emancipatória de nosso tempo". A aplicabilidade plena da Lei Maria da Penha no tocante à mulher negra há que ser questionada em um contexto maior, posto ser sua inadequação oriunda de uma especificidade, ainda invisível como invisíveis são as questões ligadas ao racismo. Nesse sentido, o objetivo primário da presente reflexão é implementar discussões e reflexão sobre alianças, intersecções e especificidades - complexidades impeditivas à aplicabilidade da Lei Maria da Penha à mulher negra e ampliar estudos relacionando o racismo como um mecanismo impeditivo à sua plena efetividade. Os entraves, advindos do legado escravocrata e reforçados pelo racismo estrutural; devem fazer parte do amplo rol de quesitos embasadores e imprescindíveis à uma reflexão mais aprofundada, a fim de identificar e combater as desigualdades. Cumpre a nós, Operadoras de Direito, comprometidas com o Estado Democrático de Direito e com a Democracia, a construção de novos pensamentos atinados com a plena adequação e efetivação dos direitos humanos a todos os seres, para reconstrução de uma nova sociedade civilizatória, com outros mapas conceituais e territoriais; outros tipos de Estados, embasados pelo respeito à pluralidade e diferenças regionais. E assim, fortalecer os baluartes da democracia, a liberdade, solidariedade e igualdade, sem desigualdades e sem espaço para intolerância. BIBLIOGRAFIA BENEDITO, Vera Lucia. Sobre o Mito da Democracia Racial In: Revista Cultura e Mercado, fls

129 CARNEIRO, Sueli. Revista de Estudos Avançados. nº 17, pg.49.são Paulo CONCEIÇÃO, Evaristo - "Poemas da recordação e outros movimentos". Belo Horizonte: Ed. Nandyala, DAVIS, ANGELA - Mulheres, Raça e Classe, Ed. Boitempo, HOOKS, BELL. Texto 'Vivendo de Amor': PIOVESAN, FLÁVIA - Direitos Humanos e Direito Constitucional Internacional, 14a ed. Ed. Saraiva, SANTOS, MILTON - Cidadanias Mutiladas - palestra publicada no livro O Preconceito, Imprensa Oficial do Estado SP /

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131 ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO: os reflexos do patriarcado nas relações laborais femininas * RESUMO: Este trabalho procura demonstrar o quanto assédio moral nas relações laborais femininas está presente, tendo em vista sua execução discreta no âmbito trabalhista e suas fortes consequências. O assédio moral também está relacionado ao Patriarcado, no qual direciona grande parte dos aspectos interpessoais contemporâneos. Objetiva-se a promoção do debate acerca da temática, e principalmente como o Patriarcado induz aos abusos patronais, além da dificuldade em identificação das condutas caracterizadoras dele. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, no que tange doutrina, teses, artigos científicos e informativos. O Assédio Moral nas relações laborais femininas precisa ser prevenido por meio do conhecimento e debate acerca das questões, além da criação de políticas de prevenção no ambiente de trabalho, tornando-o mais seguro para a trabalhadora. Palavras-chave: Assédio. Moral. Mulher. Patriarcalismo. Trabalhista 1 INTRODUÇÃO O ramo empresarial, dito como corporativo, possui a necessidade de grandes resultados em pouco espaço de tempo, tornando o mercado competitivo e acirrado ao passar dos anos. Dito isto, os trabalhadores vêm sofrendo inúmeros abusos, no que diz respeito a sua produtividade, sendo cobrados de maneira demasiada, dando lugar ao chamado Assédio Moral no Trabalho (AMT). * Advogada OAB/PI nº Bacharel em Direito. Mediadora e árbitra extrajudicial. Pós graduanda em direito do trabalho e previdenciário. 113

132 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição O Assédio Moral possui grande participação no contexto trabalhista atual, sendo caracterizado pela ocorrência de uma conduta manifestadamente abusiva, manifestados pela fala, gestos, atos, conversas, que possam proporcionar dano à moral, a honra, à personalidade, ao bem estar físico e psicológico, refletindo demasiadamente no ambiente laboral, o tornando menos ergonômico e pouco produtivo. Sua completude se realiza ao ser praticado de maneira habitual e prolongada, levando a vítima a se desequilibrar emocionalmente, provocando seu isolamento e muitas vezes até a depressão. O AMT causa grande danos, tanto no aspecto laboral, quanto a vida pessoal daquele que o sofre. Externa-se por meio de xingamentos, constrangimentos, consequentemente trazendo prejuízos a longo prazo e danos até mesmo irreversíveis, conforme preleciona Dra. Marie Grenier Pezé: Numa situação de assédio, a repetição das humilhações aos novatos, os vexames e as injunções paradoxais têm valor de destruição psíquica e suspendem todo trabalho do pensamento. A impossibilidade de demitir-se sob pena de perder seus direitos sociais barra a descarga sensóriomotora. O impasse criado nestas duas grandes vias de escoamento das excitações traumáticas convoca fatalmente a ruína depressiva e a via somática mais ou menos a longo termo. (PEZÉ, 2004, p.7). Dentro do percentual de trabalhadores que sofrem este abuso, as mulheres são as maiores vítimas, constituindo um percentual de 65% contra 35 % dos homens, conforme estudo realizado em Assédio moral no trabalho, gênero, raça e poder, publicado na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional em São inúmeros os casos que abrangem xingamentos, apelidos maliciosos, condutas racistas, atribuições vexatórias, entre outras práticas subversivas. Nota-se que o tema está entrelaçado no contexto social, dentro de um grande plano de desigualdades, dentre elas: a de gênero. 114

133 Estudos realizados recentemente, apontam que a força de trabalho feminina é a que mais sofre o Assédio Moral no ambiente laboral, sendo de até 1,8 vezes mais que os homens, de acordo com a Task Force for Prevention of Workplace Bullying (HSA, 2001), tendo como reflexo o posicionamento dos gêneros em nosso meio social. No que tange as desigualdades de sexos, se torna salutar a discussão a respeito do modelo social no qual a nossa sociedade foi alicerçada até os tempos atuais, organizada de modo que o gênero masculino prepondere de forma primária sob aspectos sociais, políticos, éticos, entre outros, sob o gênero feminino, tornando a mulher um ente mais frágil socialmente. Pode-se ilustrar sua definição pelas palavras de Sylvia Walby: "um sistema de estruturas sociais inter-relacionadas que permitem que os homens explorem as mulheres. (GORDON, 1996). Desta forma, o Patriarcado guia a divisão de tarefas no ambiente trabalho. Assim, é nítido notar sua influência na formação do Assédio Moral em desfavor do gênero feminino, no que tange o ambiente laboral. A questão científica está nitidamente ligada ao grande número de mulheres que sofrem diariamente com o Assédio Moral no ambiente de trabalho e de que forma o Patriarcalismo, que nossa sociedade ainda está inserida, pode influenciar na origem de tantos casos. No desembaralhar das eras, a mulher se determinou a conquistar grandes espaços de trabalho, tidos como masculinos, consequentemente aumentou -se as formas de discriminar a divisão de trabalho para os gêneros, já que se entendia que o segmento feminino se voltava apenas para o ramo privado, ao lar e as demais funções primitivas atribuídas ao sexo feminino. A ruptura paradigmática do monopólio masculino da vida em sociedade constituiu uma espécie de rebeldia inconveniente a deturpar os antigos alicerces de segmentação das atribuições, os quais encarceravam a mulher no segmento privado, expressão que guarda 115

134 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição evidente sinonímia à privação de todas as relações sociopolíticas (GUERRA, 2011, p. 73). Os ditames sociais no qual estamos inseridos, demonstram que diretamente a divisão de papéis sociais entre o homem e a mulher, com base em questões biológicas rudimentares, nos direcionando ao arquétipo reprodutivo. A divisão da reprodução social trabalho por desenvolvida géneros no âmbito da no quadro familiar determinaria, assim, a diferenciação entre homens e mulheres no mercado de emprego. Na gênese deste, modelo analítico persiste a importância das categorias biológicas: a maternidade e a paternidade são aspectos implícitos deste tipo de análise. As funções dos indivíduos na sociedade surgem estreitamente associadas à procriação - às mulheres caberia viver a maternidade muito para além da gravidez e do parto e aos homens conseguir os recursos materiais que asseguram a sobrevivência material do agregado. (ANDRÉ, 2019, p. 26). Neste aspecto é relevante o conhecimento a respeito da influência do Patriarcalismo nas relações sociais e principalmente laborais. O termo ideológico possui conexão com o modelo social no qual o homem possui nítida preponderância sobas mulheres, tornando-a refém, ao ponto de sofrer grandes dificuldades em desenvolver-se profissionalmente, já que o labor externo era visto apenas pela ótica masculina. Assim as relações de poder, tornam mais fácil a exposição do gênero feminino aos abusos morais. Todavia é importante frisar o quanto o assédio moral torna ineficaz a produção dentro do ambiente laboral, tornando a vida da trabalhadora, em especial, mais dificultosa. Pois além de sofrer estigmas sociais fora do âmbito laboral, dentro deste intensifica mais ainda a desigualdade de gênero sofrida pelas mulheres. 116

135 O sucinto escorço da justaposição das mulheres no mercado de trabalho demonstra que elas não foram e talvez ainda não sejam totalmente bem-vindas no ambiente laboral, pois a independência econômica alcançada pelo exercício de atividade produtiva desmonta o estado de sujeição aos homens e faz com que elas invadam um setor outrora exclusivo e compitam por posições de maior destaque. A assimilação dessa premissa sociológica faz com que se aquilate a possibilidade da configuração de ambientes de trabalho hostis, ofensivos e vexatórios, nos quais a ojeriza à companhia feminina é externada por diferentes manifestações que desdenham os propalados ideais de igualdade. (HIGA, 2016, p. 490). O assédio moral sofrido pela trabalhadora pode se externar de inúmeras formas, proporcionando grande efeitos psicológico e físicos, com difícil comprovação por parte da mesma, apesar das estatísticas apontarem que as mulheres em sua maioria tendem a pedir ajudar em frente dos constrangimentos caracterizados como assédio moral no trabalho (ANDRADE,ASSIS,2018). É nítido o reflexo do Patriarcalismo nas relações sociais e inclusive no campo de trabalho, tornado demasiadamente difícil para mulher torna-se livre do AMT, permitindo entender, que as relações laborais refletem as relações de poder, tornando a trabalhadora mais vulnerável aos grandes abusos gerados e alimentados pelo patriarcado, pelo gênero masculino no comando e a submissão do gênero feminino. 2 METODOLOGIA Metodologia do estudo é a bibliográfica, coletando dados a partir de livros, artigos, teses, dissertações, o método utilizado é descritivo a fim de expor as características, procurando descobrir concomitantemente com que frequência ocorre o assédio moral, qual sua natureza, suas características, relações com o patriarcalismo, conexões através do direito do trabalho. 117

136 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO O conhecimento em torno das relações de poder e como nossa sociedade se estrutura, torna mais eficiente a prevenção em torno do Assédio Moral no ambiente laboral, tendo em vista a dificuldade na sua comprovação, já que ele se alicerça em dispositivos constitucionais, cíveis e indiretamente na CLT. Torna-se necessário a ciência de que o Patriarcado se enraíza em nossas relações laborais e particularmente coloca a mulher em situação de risco no que diz respeito a vexame, xingamentos, situações humilhantes no trabalho. Visto a conscientização é possível que se torne o ambiente laboral mais saudável, tornando mais confortável e produtiva a vida da trabalhadora. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS/CONCLUSÕES O Assédio Moral nas relações laborais femininas tende a ser comum, sendo essencial sua prevenção, a fim de permitir que as mulheres possam exercer sua profissão de maneira cômoda e saudável. A conscientização das práticas que caracterizam o AMT, dentro do próprio ambiente laboral poderá ajudar tanto as vítimas a procurarem ajuda, como evitar que possíveis abusadores se manifestem. Além da informação, a empresa deve regulamentar em seu código de conduta, de ética, a caracterização do Assédio Moral, e permitir que haja um espaço para que a funcionária possa se sentir segura e denuncie o abuso, sendo aconselhável que não haja represália posterior a denúncia de assédio moral. A trabalhadora é uma grande engrenagem nos ambientes laborais, tornando necessária a atenção ás suas condições de trabalho, já que as mesmas irão refletir fisicamente, psicologicamente e socialmente, é válido que haja o asseguramento dos princípios constitucionais vigentes, sendo importante a valorização da mão de obra feminina que é vigorosa e indispensável para a nossa evolução. 118

137 REFERÊNCIAS ANDRADE, Cristiane Batista; ASSIS, Simone Gonçalves. Assédio moral no trabalho, gênero, raça e poder: revisão de literatura. Rev. bras. saúde ocupacional., São Paulo, v. 43, e11, Available from Acesso em: 03 de dez ANDRÉ, Isabel Margaria de Almeida. O falso neutro em Geografia Humana: género e relação patriarcal no emprego e no trabalho doméstico. 1. Ed. Lisboa: CEGUL, p. GUERRA, Raquel Diniz. Mulher e discriminação. Belo Horizonte: Fórum, HIGA, Flávio da Costa. Assédio sexual no trabalho e discriminação de gênero: duas faces da mesma moeda? Rev. direito FGV, São Paulo, v. 12, n. 2, p. 484/515, Aug Available from: &lng=en&nrm=iso. Acesso em: 03 de dez HSA. Health and Safety Authority. Dignity at Work: the challenge of workplace bullying. Report of the Taskforce on the Prevention of Workplace Bullying, The Stationary Office, Dublin, UK. Disponível em: Acesso em: 30 de nov

138 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição GORDON, April A. Transforming capitalism and patriarchy: gender and development in Africa. Londres: Editora Lynne Reiner, PEZÉ, M. G. Forclusão do feminino na organização do trabalho: um assédio de gênero. Revista Produção, v. 14, n. 3,

139 ALÉM DO GÊNERO NA ADVOCACIA BRASILEIRA * nenhuma revolução política é possível sem uma mudança radical em nossa noção sobre o possível e o real Judith Butler (Problemas de Gênero) RESUMO: Este trabalho objetiva fomentar e disseminar as discussões referentes aos desafios enfrentados por profissionais LGBTQ+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais ou transgêneros, que posteriormente passou a incluir mais letras e, portanto, sexualidades) que exercem à advocacia brasileira. A abordagem retrata a vulnerabilidade, da representatividade nas questões de gênero, almejando identificar que o assunto não é só ter uma o reconhecimento a equiparação da homofobia ao crime de racismo, que é um conceito que protege não só a discriminação contra raça e cor, mas contra um grupo específico da população (nesse caso, o grupo LGBTQ+). É preciso ter um judiciário imparcial, além de uma classe profissional com uma visão não permeada pelo preconceito institucional e conservador que implicam em problemas e experiências concretas de violência, desrespeito, a não inclusão e a não implementação de políticas afirmativas. Palavras-chave: LGBTIQ+. Transgêneros. Representatividade. Ordem dos Advogados do Brasil. ABSTRACT: This work aims to foster and disseminate discussions regarding the challenges faced by LGBTQ + professionals (lesbians, gays, bisexuals, transsexuals or transgenders, who subsequently started to include more letters and, therefore, sexualities) who exercise Brazilian law. The approach portrays the vulnerability, of representativeness in * OAB/DF nº Advogada. 121

140 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição gender issues, aiming to identify that the issue is not only to have a recognition of homophobia and the crime of racism, which is a concept that protects not only discrimination against race and color, but also against a specific group of the population (in this case, the LGBTQ + group). It is necessary to have an impartial judiciary, in addition to a professional class with a view that is not permeated by institutional and conservative prejudice that imply problems and concrete experiences of violence, disrespect, non-inclusion and non-implementation of affirmative policies. Keywords: LGBTIQ +. Transgender. Representativeness. Brazilian Bar Association. 1 INTRODUÇÃO Um dos objetivos fundamentais da República brasileira, segundo a Constituição, é promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Infelizmente, porém, estamos muito longe de ser uma sociedade sem preconceitos ou que não discrimine as pessoas por sua cor, sua classe social, sua idade, seu gênero ou sua orientação sexual, entre outros fatores. No entendimento do escritor Ingo Wolfgang Sarlet, qualquer tipo de discriminação negativa fere historicamente a dignidade da pessoa humana compreendida como: Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida 122

141 saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. As identidades se alimentam das alteridades. A metamorfose pressupõe transitar de um estado a outro, de um ente a outro, de uma identidade a outra. Contudo, respeitar as diferenças na identidade é um conceito que caminha a passos lentos no Brasil. A questão de ser um profissional LGBTQ+ no exercício da advocacia brasileira carregam e, como de maneira naturalizada, a violência e discriminação para a maioria dos profissionais transexuais, travestis e transgêneros. Os episódios quase diários de agressões físicas e homicídios, reportados pela imprensa de todas as regiões do País, são apenas a face mais visível da realidade cotidiana de preconceito e privação de direitos enfrentada pela população LGBTQ+ nos espaços públicos, no trabalho, nas escolas e, até mesmo na própria família. Dentro do mundo jurídico, falamos dos Direitos dos LGBTQ+ como se fosse algo distante, rarefeita e sem conteúdo. Pouquíssimos são os seminários, os eventos e as discussões que tenham na pauta a questão de Direitos dos profissionais LGBTQ+ no exercício da profissão. Quando não consideramos os problemas e experiências concretas de violência e desrespeitos a estes profissionais, o conteúdo do Direito não passa de uma palavra vã, vazia, um oco e até mesmo uma bolha normativa. Em 2016 a Ordem dos Advogados do Brasil em âmbito nacional, por meio da Resolução 5/ do Conselho Federal regulamentou o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil em registros e carteiras de identidade profissional, 1 ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Conselho Federal. Conselho Pleno. Resolução nº 05, de 7 de junho de Altera o Regulamento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, n. 85, p. 127, terça-feira, 5 de julho de

142 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição constituindo uma vitória incontestável, mas isso não significa que está superado a violência e o preconceito no meio jurídico. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal determinou que a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero fosse considerada crime semelhante ao racismo, inafiançável e imprescritível, punido com detenção de uma a cinco anos de prisão 2. Outro avanço importante foi a Súmula n. 11/2019 do Conselho Pleno da OAB Nacional que decidiu por unanimidade o não ingresso de inscrição de acusados de agressão contra pessoas LGBTI+, em razão da Orientação Sexual, Identidade de Gênero e Expressão de Gênero, significa dizer, que esses agressores não poderão integrar os quadros da OAB 3. Por outro lado, é pertinente lembrar que, no Código de Ética da Advocacia não inclui regras que protejam a mulher ou os transgêneros, transexuais e travestis, do assédio físico e moral. E, ainda, não temos a propagação de igualdade de gênero estendida as diversas instituições e entidades como, delegacias, fóruns, tribunais, presídios, dentre outros. Faz necessário mencionar também, sobre os direitos e o reconhecimento da mulher advogada transexual, travestis e transgêneros. Desde da Desburocratização nos registros para exercer a profissão, além do respeito que essas mulheres merecem, seja, com licença maternidade, banheiros acessíveis em órgãos jurisdicionados, bem como, os enfrentamentos contra as posições e/ou exclusões na vida social e profissional dessas mulheres. Infelizmente, a realidade é outra. O Ministério Público Federal, Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, em sua Cartilha lançada em 2017, esclarece que: 2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) n. 26. Relator: Ministro Celso de Mello. Brasília, 13 de junho de Disponível em: Acesso em: 25 jul OAB não aceitará inscrição de acusados de agressão contra LGBT. Exame. Disponível em: Acesso em: 25 jul

143 São enormes os obstáculos para acesso, permanência e ascensão profissional no mercado de trabalho, sobretudo por travestis e transexuais e que resultam em salários menores e oportunidades mais escassas e, na maioria das vezes marginalizadas, são poucas as pessoas transgênero que conseguem romper as barreiras do preconceito e da discriminação. 4 Temos ainda, a questão de ser um dos países com alto índices de violência contra esse público, ou seja, milhares são assassinados todos os anos em função de sua orientação sexual 5. Vale ainda, citar sobre o debate em torno da representatividade. Quando colocamos as discussões sobre a questão da exclusão de alguns grupos sempre falamos dos preconceitos, da inclusão, do respeito, porém, poucos candidatos LGBTQ+, negros(as) ou mulheres chegam a ocupar cargos de direção, isso evidencia negação do direito democrático de representação. Significa dizer, em última análise, é silenciar Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros, pessoas de cor e mulheres. Empoderamento não é apenas reconhecer as forças sistêmicas que excluem ou oprimem, mas também atuar para mudar as relações de poder existentes. Não se pode negar a importância do intenso debate identitário nos meios tradicionais da advocacia brasileira. Não só isso, empoderamento também é questionar: como a Ordem dos Advogados Nacional retrata esses profissionais? Quais foram as suas políticas em demandas envolvendo interesses de pessoas LGBTQ+ em suas derivações legislativas e administrativas? A OAB está sendo uma esfera institucional capaz de incluir e dar espaços para essas 4 O Ministério Público e a Igualdade de Direitos para LGBTI: Conceitos e Legislação / Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, Ministério Público do Estado do Ceará. 2. ed., rev. e atual. Brasília: MPF, Relatórios de Violência LGBTFóbica. Governo Federal, Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Disponível em: Acesso em: 25 jul

144 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição pessoas? O público jurídico estaria disposto a ouvir os relatos das dificuldades enfrentadas pela questão do gênero não convencional, que põem em xeque o padrão binário masculino/feminino? Notório que muito nos falta ainda, uma sensibilização por parte do mundo jurídico, seja pelos escritórios, órgãos e instituições a reconhecerem e oportunizar aos profissionais LGBTQ+, melhores condições de reconhecimento profissional e pessoal, como: o não tratamento desigual por sua orientação sexual; fomentar a contratação desse público; promover o acesso a cargos de liderança, seja, em Comissões da Ordem ou em Cargos representativos; promover eventos/seminários que trate das principais dificuldades desses setores excluídos em determinados contextos. Nada mais nobre do que tratar mulheres transgêneras que adotam nome, aparência e comportamentos femininos como quaisquer outras mulheres. De igual modo, homens transgêneros que adotam nome, aparência e comportamentos masculinos devem ser tratados como quaisquer outros homens. Para tornar realidade esta ampliação de objetivos teremos de desenvolver, pelo menos 3 (três) pontos que ao meu ver são essenciais para o fortalecimento da inclusão de advogados e advogadas LGBTQ+: I - Incluir os debates sobre a diversidade e inclusão, sendo capaz de desmascarar por dentro a falácia da normalidade, da estabilidade do gênero e das estratégicas reguladoras dos grupos dominantes; II - As necessidades do aqui e agora têm que ser comtempladas, ao lado dos objetivos de médio e longo prazos, nas principais pautas do movimento LGBTQ+ e, por fim, III - Humanização nas estruturas judiciais, em especial, na OAB Nacional. Dentro dos próprios movimentos, há uma infinidade de identidades em conflitos e precisamos discutir essas questões. As necessidades sociais avançam e tudo o que antes não se falava explicitamente sobre o público LGBTQ+ começou a vir à tona em razão da busca pela conscientização que ultrapasse barreiras impostas por uma 126

145 sociedade machista e preconceituosa, inclusive, a sociedade patriarca jurídica brasileira liderada por homens e brancos. Repito: a Ordem dos Advogados do Brasil continua sendo em sua maioria liderada por homens e brancos, excluindo, inclusive a liderança não só de público LGBTQ+, mas também, de mulheres. Apesar de já ter havido mulheres na liderança na classe de advogados, nada se compara ao quantitativo de liderança masculina na OAB de todos os Estados brasileiros. Essas barreiras são ainda mais intransponíveis quando o sujeito em questão é LGBTQ+, pior ainda se for negro(a), digo-lhes quantas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais ou transgêneros negros(as) ocupam nossos espaços de representação jurídica? Por essa perspectiva, nos dias de hoje, temos tido inúmeras campanhas referentes a representatividade de igualde racial e de gênero, contudo, não suficientes para forçar mudanças efetivas de políticas de identidade. Significa dizer que, apesar das previsões legais pela igualdade a esse grupo LGBTQ+, ela é insuficiente para garantir o exercício de Direitos, pois não há critérios de aplicação a efetivação das igualdades nos casos concretos, o que favorece as pessoas já privilegiadas 6. Quando as discussões não geram inclusão e reflexão positiva, perde o propósito maior de elevar a condição humana, bem como, desampara prezar pelo lado mais humano da advocacia. Entender quais são as identidades que nos representam é fundamental para identificar privilégios, preconceitos e relações de poder que, voluntariamente ou não, reproduzimos. Logo, a dimensão do tratamento de igualdade deve ser aplicada para que todas as pessoas possam ter oportunidades semelhantes, inclusive, no âmbito do exercício da advocacia brasileira. 6 ANTRA. Associação Nacional de Travestis e Transexuais. Disponível em: Acesso em 26 jul

146 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição 2 CONSIDERAÇÕES FINAIS A OAB precisa ser forte com representatividade das minorias até mesmo dentro da própria instituição. Esse avanço de representatividade, dará espaço, possivelmente, para uma advocacia mais sensibilizada, dissolvendo concepções culturais da advocacia atual, além de redefinir noções de como resolver conflitos da vida humana com novas visões de um sistema jurídico mais humanizado, igualitário. Portanto, cabe a nós entendermos de uma vez por todas que não há razão para as pessoas serem excluídas por sua identidade de gênero. As dessemelhanças não implicam na capacidade de excelência profissional e pessoal. E é possível que ela/ele possa falar hoje, que nós possamos ouvir e, por fim, conversemos para humanizar o mundo jurídico diante das questões LGBTQ+. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, p BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismos e subversão da identidade. Tradução Renato Aguiar Rio de Janeiro Civilização Brasileira, SARLET, Ingo Wolfgang.Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de Porto Alegre. Livraria do Advogado p

147 CADÊ A JURISTA NEGRA? A (não) representatividade de mulheres negras no espaço jurídico * * O Poder Judiciário é reconhecidamente um espaço de poder que regula as relações dos sujeitos de direitos a partir do modelo eurocêntrico adotado no Brasil. Tendo sido criado pelas elites nacionais e, considerando o histórico colonial do país, a maior parte dos indivíduos que o compõe são homens, brancos e (aparentemente) heterossexuais que representam a classe burguesa. Identificar estes sujeitos é fundamental para compreender as relações de gênero e raciais existentes no poder judiciário de certo visa desmistificar a vasta sensação de ilusão nas noções principiológicas que os isentam dos crimes cometidos, quais sejam, a neutralidade e a imparcialidade das suas decisões judiciais. Em 2018, foi publicado o perfil sociodemográfico da magistratura brasileira. De acordo com a pesquisa, as mulheres representam 38% da magistratura. Juízes negros, entre homens e mulheres, somam 18% por autodeclaração. A maioria das juízas, especificamente 80%, se declaram brancas. Somente 2% das magistradas se declaram como pretas. * Advogada, pós graduanda em Estudos Culturais e Políticas Públicas da Universidade Federal do Amapá. Pós graduanda em Direito Público pela Faculdade Legale. Atual presidenta da Comissão de Igualdade Racial da OAB Triênio 2019/2021 e da Comissão de Igualdade Racial da Associação dos Advogados Criminalistas Amapá - ABRACRIM/AP. * Advogada, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Estudos africanos, Povos Indígenas e Culturas Negras da Universidade Estadual da Bahia, Presidenta da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB-BA, Presidenta da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da Associação Baiana de Advogados Criminalistas. 129

148 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição No III Encontro Nacional de Juízas e Juízes negros ENAJUN -, um dos principais temas foi a resistência de corpos negros em um espaço historicamente branco e elitista. A ausência de representatividade da maioria da população brasileira neste espaço pode ocasionar um distanciamento de pessoas negras na busca pelo acesso ao judiciário ou ainda austero que as decisões alí apresentadas. Apesar da lei de cotas (Lei n /2014) estabelecer a reserva de 20% de vagas para pessoas negras no âmbito de concursos federais, ainda permanece baixo o número de magistrados e servidores negros no poder judiciário. Nas varas e tribunais de justiça, é possível perceber através do exercício do pescoço a ausência de indivíduos negros ocupando os principais cargos. Em contrapartida, estas pessoas prestam serviço de limpeza e/ou de segurança, restando em posição de subalternidade que lhes é imposta desde que o primeiro negro chegou no território brasileiro. Aliado à baixa representatividade de magistradas negras, a visibilidade de advogadas negras na advocacia parece depender somente das mesmas, uma vez que não há o censo da advocacia negra no sistema OAB, embora a demanda seja antiga e urgente. Considerando o perfil sociodemográfico acima exposto com o Atlas da Violência de 2019, cujos dados apontam a crescente do número de violência doméstica infligida às mulheres negras 1, é compreensível o abismo social e racial desta figura em relação ao restante da sociedade, especialmente àquela sociedade que representa o poder judiciário brasileiro. O racismo institucional é definido como o conjunto de ações ou omissões sistêmicas caracterizadas por normas, práticas, critérios e padrões formais e não formais de diagnóstico e atendimento, de natureza organizacional e institucional, pública e privada, resultantes de ³ De acordo como Atlas da Violência, a taxa de homicídio de mulheres negras entre os anos de 2007 e 2017 aumentou em 29,9% enquanto houve um decréscimo neste índice para mulheres brancas. In: Publicação Atlas da Violência Disponível em: < Acesso em 14 dez

149 preconceitos ou estereótipos, que resulta em discriminação e ausência de efetividade em prover e ofertar atividades e serviços qualificados às pessoas em função da sua raça, cor, ascendência, cultura, religião, origem racial ou étnica. Em 2015, a ONU classificou o Brasil como um país que reproduz o racismo institucional, sendo necessárias mais que políticas de ações afirmativas para perquirir a equidade racial em todos os espaços. Nas palavras de Sueli Carneiro, as mulheres negras são socialmente desvalorizadas em todos os níveis inclusive esteticamente. Com uma vivência que perpassa a violência de gênero e o racismo estrutural, a mulher negra raramente alcança espaços de poder, pois os obstáculos raciais e sociais lhe são limitantes e definidores de papéis sociais. A probabilidade de uma mulher negra vencer as estatísticas de violência e conseguir ascender socialmente é tão baixa que, quando finalmente o consegue, vira reportagem. Sobre este último apontamento, Pádua escreveu para o jornal Jota o seguinte: Quantas magistradas negras existem no Brasil? Onde elas estão alocadas? Para responder a estas perguntas, a Associação de Juízes Federal do Brasil (Ajufe) enviou um pedido de providências ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na última terça-feira (10/4). A associação busca justamente entender como as mulheres negras estão representadas mais precisamente sub-representadas na magistratura.. Segundo a Ajufe, o Censo do Poder Judiciário, cuja última realização data de 2014, tem omissão relevante relativa à representatividade das juízas mulheres negras, que precisa ser sanada (2018). De acordo com Moreira (2017), o discurso jurídico constitui uma narrativa cultural, delimitado não somente pelas circunstâncias sociais, mas também pela construção ideológica do magistrado. Então o sistema judiciário brasileiro, pesa a mão em sentenças carregadas de heteronormatividades, pautadas pela branquitude. 131

150 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Como exemplo, temos um caso de injúria racial em que um humorista ofereceu banana em uma rede social para um usuário negro. O caso foi absolvido no juízo de primeiro grau, uma vez que o douto magistrado entendeu não haver animus injuriandi e sim somente uma brincadeira do agente ativo. Este pensamento colonizador que não contempla a conduta acima como racismo, haja vista a profissão de humorista que implica em fazer piada com quaisquer assuntos. Aqui, fica um questionamento, somos nós advogadas feministas negras, as competentes para esta formação em nossas petições ou somos somente vitimas do Racismo Institucional, uma vez que ainda precisamos provar que somos advogadas? O título deste artigo faz referência ao livro Cadê a juíza? Travessias de magistradas negras no Judiciário brasileiro, da autora Raíza Feitosa Gomes, lançado pela editora Lumen Juris. O material conta a experiência da MM. Bruna dos Santos Costa Rodrigues, titular da Vara Única da comarca de Paracuru. Como única juíza negra da comarca, Bruna tem que constantemente se identificar como magistrada desde a entrada no Fórum até o atendimento aos advogados, brancos em sua maioria, que descredibilizam em todas as oportunidades a sua presença naquele espaço masculino e embranquecido. Não enxergar mulheres negras no espaço jurídico é recorrente na realidade racista que se enquadra o Brasil. Em 2018, a advogada Valéria Santos foi algemada e expulsa da sala de audiência do juizado especial de Duque de Caxias, Rio de Janeiro, pelo fato de ter invocado suas prerrogativas em uma severa violação da juíza que presidia o ato. Meses depois, o tribunal de justiça de região negou que tivesse havido qualquer falha por parte do órgão de justiça. Se Valéria ou se Bruna fossem Caio e Tício, homens brancos heterossexuais, seriam seus corpos questionados e violentados? Às juristas negras, parece ser relegado o lugar da ausência. Felizmente, existem iniciativas (de juristas negras) que apoiam e exaltam o lugar da mulher negra nos espaços de poder. Exemplo disto é o cursinho 132

151 preparatório para carreiras jurídicas Abayomi Juristas Negras, formado por mulheres de Pernambuco que aplicam um método de estudo aquilombado. Mulheres negras movem estruturas, já disse Angela Davis. A grade curricular do curso de Direito não dispõe de disciplinas obrigatórias que dissertem acerca de gênero e raça, contudo, nós precisamos orientar, argumentar, convencer, passar constrangimentos, para que os direitos de nossos clientes sejam, ao menos analisados em consonância com o que está escrito. De acordo com Moreira (2017), existe uma dificuldade do Judiciário em compreender os crimes de racismo e algumas nuances dos crimes de violência doméstica, pois os sujeitos não são sensíveis às questões sociais por não protagonizarem atravessamentos de raça e gênero. Em outras palavras, dificilmente um magistrado branco irá compreender a violência das microagressões no crime de injúria racial tampouco as pesarosas consequências para a vida da mulher que se encontra em situação de violência doméstica. Somos nós advogadas feministas negras que laboramos em prol das mulheres negras, que por intermédio de nossas petições e diálogos permanentes visamos a alteração das decisões judiciais. Faz-se necessário que os vereditos sejam cada vez mais próximos da realidade sócio cultural brasileira. Recopilando o desgaste existente entre a advocacia e a magistratura para o convencimento de aspectos sociais íntimos e não legislativos. Não queremos somente sermos lembradas nas comissões temáticas ou para falar somente sobre racismo e suas violências. Queremos alertar para o perigo da história única, clamado por Chimamanda Ngozi Addiche, que é a solidão de sermos as únicas negras em um universo de milhões de palestrantes, juízes, advogados, servidores, oficiais, membros do Ministério Público brancos. Em um país que possui mais de 56% da população declarada negra, a não representatividade destes sujeitos em especial, do sujeito feminino negro no sistema de justiça revela a legitimação do racismo e machismo estruturais na base da sociedade brasileira. 133

152 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição REFERÊNCIAS MOREIRA, Adilson. Direito, poder, ideologia: discurso jurídico como narrativa cultural. In: Revista Direito e Práxis. v. 08. n. 2. Ano pp Disponível em: < Acesso em: 31 mai RIBEIRO, Maria Fernanda. Mulheres negras e a (in) justiça no Brasil. Disponível em: < Acesso em 13 dez Preconceito: As pessoas se assustam vendo uma mulher negra juíza, revela magistrada. Disponível em: < Acesso em 13 dez IPEA. Atlas da Violência Disponível em: < Acesso em 14 dez CARNEIRO, Sueli. Gênero, raça e ascensão social. In: Revista Estudos Feministas. n. 2. Disponível em: < Acesso em 13 dez CNJ Bahia. Lei nº de 06 de junho de PÁDUA, Luciano. Quantas são as mulheres negras na magistratura? Jota, São Paulo, 18 abr Disponível em: < >. Acesso em 12 dez

153 OS DESAFIOS SOCIAIS, PESSOAIS, FAMILIARES E JURÍDICOS DE SER MULHER * Historicamente, nem os dois maiores marcos (a Revolução Francesa e a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã) foram capazes de eliminar as desigualdades sofridas pelas mulheres. As convenções e os acordos internacionais foram firmados, visando minimizar as consequências sofridas pelas mulheres, seja no âmbito dos direitos civis e políticos, seja nas liberdades públicas, seja na diferença de gênero, assim como em qualquer conduta que cause morte ou sofrimento físico, mental e sexual. Outro marco importante constituiu-se internacionalmente, durante e após as duas grandes Guerras Mundiais, porque a presença das mulheres nos espaços sociais, laborais, científicos e culturais até então, ocupados exclusivamente por homens produziu profundas transformações na sociedade e na mentalidade coletiva. É bem verdade que esse acontecimento foi alvo de muitas críticas, porém pavimentou o caminho para uma nova fase de construções socialmente ligadas ao empoderamento da mulher na sociedade. Ainda que não ronhecido por muitos, o símbolo feminino sempre teve uma representatividade sem precedentes para a humanidade, conforme destaca José Murilo de Carvalho, apud August Comte, fazendo referência à forma de governo denominada de República: A república era a forma ideal de organização da pátria. A mulher representava idealmente a humanidade. Comte julgava que somente o altruísmo (palavra por ele criada) * Advogada, OAB-PE nº , residente na cidade do Recife-PE. Pós-Graduada em Direito Público, pela Faculdade Estácio (ESTÁCIO/FIR). MBA em Finanças e Controladoria, pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). 135

154 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição poderia fornecer a base para nova convivência social na nova sociedade sem Deus. A mulher era quem melhor representava esse sentido, daí ser ela o símbolo ideal para a humanidade. Em meados do século 19, surge o movimento feminista, com o intuito de lutar pelo direito ao voto e pela abolição dos escravos, pela educação feminina etc. No Brasil, atualmente, existem diversos movimentos feministas que reivindicam as demandas de um novo tempo, como a inclusão de pautas ligadas à diversidade sexual e ao direito ao aborto; no entanto, cabe destacar as organizações antifeministas lideradas por mulheres. A partir dos anos 80, o Brasil potencializa a criação de políticas públicas voltadas ao gênero feminino; em 2006, com a sanção da Lei Maria da Penha (marco no combate à violência contra a mulher), aumenta-se o rigor das punições em caso de agressão às mulheres. Igualdade, liberdade, direitos: até que ponto, de fato, alcançamos esses ideais, posto que as organizações lutam, de forma legislativa, para conquistá-los? Qual a construção social que fizemos a partir de uma sociedade hipocritamente machista, com sujeitos que resultam de experiências arraigadas de um ceio familiar culturalmente empobrecido, e que, desde tenra idade, assimilam as representações simbólicas e as crenças na superioridade e no domínio do homem sobre a mulher? A igualdade da causa que defendemos evidencia a necessidade de equilíbrio entre homens e mulheres, e deve ser uma discussão iniciada no âmbito familiar. Igualmente, é fundamental inseri-la nos ambientes de trabalho e educacionais, e nos veículos de comunicação, a fim de mudar a compreensão populacional acerca do tema orquestrado. Contudo, enfrentamos o problema da pouca representatividade feminina nos cargos de alto escalão da política, do judiciário, e até mesmo na chefia de empresas de alta representatividade no Brasil e no mundo. 136

155 Quem de nós nunca experimentou o dissabor do constrangimento apenas por ser mulher? Quem de nós não teve sua dignidade invadida? Quem de nós nunca foi desacreditada de sua competência profissional, com a simples desculpa de ser mulher? Em algum momento de suas vidas, todas passaram por situações discriminatórias, porque essas se perpetuam, em todas as sociedades ricas ou pobres, brancas ou negras; e calar-se diante de tais situações só ajudará a promover a cultura machista e desguaritaria. É interessante notar que, muitas vezes, inconscientemente, nós mulheres deixamos de contribuir com a igualdade, quando não valorizamos ou incentivamos os homens a participarem de tarefas que são quase que exclusivamente endereçadas a nós. Esses hábitos familiares são transformadores do nosso núcleo e, consequentemente, se habitualmente implantados, serão copiados em diversos setores sociais. A igualdade, por conseguinte, traz a liberdade atrelada ao seu exercício, as quais, na atualidade, são julgadas como uma sensação de independência imediata. Mas, o que a verdadeira liberdade pressupõe? Será que é apenas fazer o que se quer na hora que der vontade? Liberdade é a condição daquele que é livre, em sua forma e capacidade de agir e pensar; de independência, de autonomia, de autodeterminação, e não de submissão. Entretanto, para as mulheres, o exercício da liberdade lhes impõe restrições quanto à sua aplicação, de forma prática e no cotidiano. Para que eu possa exercer a minha liberdade profissional, outra mulher terá que assumir o serviço doméstico, enquanto outra cuidará da educação dos meus filhos, simplesmente porque a minha liberdade de ser quem sou, em todas as formas, não liberta o machismo do meio em que vivo, tampouco libertará aquelas que, assim como eu, são do gênero feminino. É nesse prisma que avaliamos a necessidade de agregarmos ao universo feminino: criar um círculo de empatia, cultivador de atitudes 137

156 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição integrativas e positivas, que possa gerar uma comunidade global de mulheres que buscam e lutam pelas mesmas causas, fazendo com que as reinvindicações de uma tornar-se-ão de todas. Essa união em várias dimensões da vida feminina refletirá na convivência harmoniosa entre as mulheres, as quais, afetivamente, conectar-se-ão umas às outras pelas suas próprias experiências. E essa conexão fortifica a parte que nos cabe de não nos julgarmos, senão, juntas, enfrentarmos os problemas comuns que adquirimos apenas por nascermos do sexo feminino. A luta é conjunta no combate à objetificação, à sexualização e aos padrões de beleza intangíveis, os quais, de modo geral, são impostos pela mídia, bem como por outras mulheres. É a luta para provar que se é capaz e que ser mulher não significa incapacidade; é a luta pela solidarizarão com a outra, e, acima de tudo, pela fraternidade universal feminina em ação. Entre os maiores debates do feminismo e da sororidade encontram-se a descontração de estereótipos e a afirmação de comportamentos novos e de identidade. Mesmo antes do período da onda feminista, ainda no século 18, Mary Wollstonecraft já analisava os comportamentos femininos, aprendidos desde a infância pelas mulheres, e os considerava, àquela época, frutos da ignorância e do preconceito. Nesse sentido, as lutas travadas pelas feministas conferem grande importância à socialização como um mecanismo de extinção das desigualdades entre os gêneros. O que se percebe é que a luta feminista, em conjunto com a solidariedade feminina e os marcos histórico de luta pela igualdade, buscou a desconstrução da mulher abstrata, a qual fora elaborada universalmente por padrões ditados por uma sociedade machista. 138

157 Por meio da convergência entre gênero e outros registros sociais (a desigualdade de classe social, a etnia, a orientação sexual, a identidade de gênero) procura-se até os dias atuais considerar as particularidades da luta feminina em sua concreta existência, porque consideram as lutas e as especificações de diferença pautadas na mulher negra, pobre, indígena, lésbica, transgêneros, com deficiência, refugiada, entre outros milhares de especificações. Essa luta atualmente, pluralista, a partir de concepções das áreas da medicina, da filosofia, da cientifica, da jurídica traz uma força viva à humanidade e ao combate às descriminações; e, neste terreno, o Direito é privilegiado na legitimação e na categorização dos meios de proteção, através da normativa, da jurisprudência no âmbito nacional e internacional, e na aplicação de políticas públicas na sociedade, a fim de dissipar o machismo ainda operante. A luta contra todas as formas de discriminação exige uma problematização, a começar em nós mesmos, em nossas casas, em nosso trabalho, em nossa vida social, nas escolas, na rua, no mundo jurista, nos consultórios médicos, em todo lugar. O pensamento crítico é ferramenta importante porque lança ao mundo um olhar diferente das ideologias já praticadas, e nos leva aos questionamentos éticos, políticos, sociais, idealistas. Nesse sentido, Hannah Arendt nos convida de forma brilhante: (...) pensar e estar completamente vivo são a mesma coisa, e isto implica que o pensamento tem sempre que começar de novo; é uma atividade que acompanha a vida e tem a ver com conceitos como justiça, felicidade e virtude, que nos são oferecidos pela própria linguagem, expressando o significado de tudo o que aconteceu na vida e nos ocorre enquanto estamos vivos. 139

158 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição A cegueira que mina os ideais feministas afeta profundamente os direitos humanos, e isso exige de nós o exercício do pensamento crítico disseminado em toda parte. Fica evidente que é um grande desafio para as mulheres, para a humanidade, mas, sem dúvida, é uma ação conjunta entre a sociedade e o nosso sistema jurídico (este como indexador de eficiência na aplicabilidade das normas). A convergência entre o judiciário, a sociedade e a família, trabalhando no sentido de mudarmos as perspectivas, produzirá, de fato, a verdadeira efetividade que idealizamos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEZERRA, Juliana. Feminismo no Brasil. Disponível em: Acessado em 13/11/2019. BEDÍA, Rosa Cobo. Aproximaciones a la teoría crítica feminista. Boletín del programa de formación, nº 1, ano 1. Lima: CLADEM, abr., Disponível em: < Acessado em: 20/11/2019. GRUDEM, Weyne. PIPER, John. Disponível em: Acessado em: 15/11/2019. LEONI, Camila. Dia Internacional da igualdade Feminina Evidencia Desequilíbrio. Disponível em: 140

159 a-internacional-da-igualdade-feminina-evidencia-desequilibrio.html. Acessado em: 14/11/2019. MURILO, José. A Formação das Almas. O Imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, PALMEIRA, Fábio. Desigualdade de Gênero: O Machismo Reinante na Sociedade. Disponível em: eito/desigualdade-genero-machismo-reinante-na-sociedade.htm. Acessado em: 14/11/2019. PIMENTEL, Silvia. Género e Direito. Disponível em: Acessado em: 18/11/2019. SOUZA, Babi. Vamos Juntas? O Guia da Sororidade para Todas. 1. Ed. São Paulo. Grupo Editorial Record (Galera Record), WIKIPEDIA. Direitos da mulher. Disponível em: Acessado em: 13/11/

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161 REFLEXOS DA FRAGILIDADE DA REDE DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR COM RECORTE NO MUNICÍPIO DE SERRA TALHADA/PE * RESUMO: Este artigo aborda a importância do tema Violência contra a Mulher e as instituições que fazem parte da rede do enfrentamento, sendo responsáveis pelo amparo e proteção às vítimas que rompem o silêncio. Trata-se da importância da Lei Maria da Penha com suas recentes alterações e de que forma vem auxiliando no combate à violência na cidade de Serra Talhada/PE onde não há delegacia e justiça especializadas. A metodologia do trabalho fundamentou-se na coleta de dados que foram obtidos a partir de órgãos como: Secretaria de Defesa Social do Estado de Pernambuco, Delegacia de Polícia Civil local, Centro Especializado de Atendimento à Mulher, Francisquinha Godoy CEAM, bem como por meio dos trabalhos de conscientização e mediação, quer no âmbito do judiciário, quer nas delegacia competentes realizados pela Comissão da OAB, Subseção de Serra Talhada/PE de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Palavras-chave: Mulher. Violência. Lei Maria da Penha. Rede. Atendimento Humanizado. Prevenção. Feminicídio ABSTRACT: This article addresses the importance of violence against women and the institutions that are part of the network of coping, being * Especialista em Direito Previdenciário e Trabalhista. Secretária Adjunta da OAB/Subseccional Serra Talhada-PE. Presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da OAB/Serra Talhada. Advogada Técnica do CEAM. 143

162 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição responsible for the protection and protection of victims who break the silence. It is the importance of the Maria da Penha Law with its recent changes and how it has been helping to combat violence in the city of Serra Talhada/PE where there is no specialized police and justice. The methodology of the work was based on the collection of data that were obtained from agencies such as: Secretariat of Social Defense of the State of Pernambuco, Local Civil Police Station, Specialized Center for Women's Care, Francisquinha Godoy - CEAM, as well as through awareness and mediation work, both within the judicial framework, or in the competent police stations carried out by the OAB Commission, Subsection of Serra Talhada / PE to Combat Domestic and Family Violence against Women. Keywords: Woman. Violence. Maria da Penha Law. Network. Humanized care. Prevention. Femicide 1 INTRODUÇÃO Surge da prática vivenciada de um trabalho de combate à violência doméstica e familiar em uma cidade do Sertão de Pernambuco, arraigada de machismo e derrame de sangue de difícil elucidação em face a brigas de famílias tradicionais, pistolagem e violência contra a mulher. Discussões sobre a importância de se ter delegacia especializada neste cenário, aonde havendo trabalho público e notório de uma rede articulada em pleno funcionamento, com cada equipamento empenhado na sua função, alcançaria o proposto na Lei Maria da Penha: prevenção, proteção da vítima e punições dos agressores, mesmo sem a existência de uma delegacia da mulher. Teve como objetivo uma pesquisa quali-quantitativa, principalmente no que diz respeito aos equipamentos responsáveis pelo enfrentamento à violência contra a mulher, utilizando dados e experiências colhidas no órgão municipal local, na Secretaria de 144

163 Defesa Social, Patrulha Maria da Penha e com entrevistas com os delegados municipal e regional, bem como o trabalho realizado de forma preventiva desses órgãos públicos e da sociedade civil como a Comissão da OAB local. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A violência contra a mulher não surgiu de repente: sempre esteve presente nas famílias brasileiras independente de classe social. Era vista e tratada como uma propriedade do homem e com a responsabilidade de cuidar da família e do lar, subjugada pela sociedade, vítima de violência psicológica e sexual fruto de uma submissão refletida pelo machismo tendo muitas vezes o vício em álcool e drogas como basilares motivadores dessas agressões. Razões pelas quais essas vítimas se mantêm em relacionamentos abusivos, muitas vezes por falta de condições econômicas para sustentar a si e aos seus filhos, carente de formação profissional e escolaridade, na maioria das vezes sob o medo das ameaças de mortes a ela e a sua família (MOVIMENTO DE MULHERES OLGA BENÁRIO, 2011). Com advento da Lei /2006 nomeada como Lei Maria da Penha em homenagem a uma mulher que ficou paraplégica após sofrer duas tentativas de assassinato pelo seu marido, determinou-se marco de mudanças no Brasil na forma de punição de agressores de mulheres na condição de gênero. Mecanismos para coibir e prevenir a violência contra a mulher, no âmbito de suas relações nos termos de convenções e tratados internacionais e do parágrafo 8º do art. 226 da Constituição Federal; punições no sentido de prestações de serviços à comunidade, pagamento em dinheiro, dentre outras determinações que geraram evoluções legislativas significativas para o enfrentamento (DIAS, 2015). A proteção célere, com possibilidade de concessão de medidas protetivas de urgência, trouxe essa lei, onde o juiz concede de forma mais 145

164 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição rápida determinações como limites de aproximação, proibição de contato com a vítima e familiares, apreensão de porte de armas, dentre outras sob pena de descumprimento ser levado à prisão, após recente lei sancionada como Descumprimento de Ordem Judicial. Na prática, ainda é difícil uma mulher ter coragem de denunciar seu agressor. A aprovação da Lei Maria da Penha ocasionou evoluções tais como: a ação incondicionada à vontade da vítima em casos de violência física; o crime de feminicídio, desqualificando-o como crime passional; impossibilidade de retirar as Medidas Protetivas de Urgências na própria delegacia suscitando criação de equipamentos governamentais no âmbito estadual e municipal, estimulando e incentivando a importância de rede. A Secretaria da Mulher do Estado tem a missão de promover o direitos das mulheres, implementando o Plano Estadual de Segurança do Governo de Pernambuco através do Pacto pela Vida, com fins de prevenir, reduzir e controlar a criminalidade com objetivo de construir mecanismos efetivos que possibilitem o enfrentamento e a coibição da violência contra as mulheres com planos e ações. Em 2009, a Lei Estadual nº instituiu o Serviço de Proteção, Atendimento e Abrigamento de Mulheres em situação de violência de gênero, sob risco iminente de morte e que não possuindo no seu convívio um local seguro para se refugiar no estado ou em outro, disponibiliza a opção de ser protegida nas casas abrigos às custas do estado, conforme prevê o artigo 35 da Lei Maria da Penha, bem como diversos outros serviços, programas e ações especializadas ou não especializadas nas áreas de Prevenção, Proteção, Assistência e Justiça, como o CEAM. Implantado em Serra Talhada/PE no ano de 2014 com profissionais técnicos (advogada, psicóloga e assistente social) capacitadas pelo Estado e de preferência do sexo feminino, sobretudo a considerar pela condição da formação técnica e humanizada desfavorecerem o pré-julgamento das vítimas de gênero (PERNAMBUCO, 2018). 146

165 3 RESULTADOS Informações colhidas no site da Secretaria de Defesa Social mostram que em Pernambuco foram registrados, entre 2017 e 2018, Boletins de Ocorrências. Na cidade de Serra Talhada,1.219 entre 2017 e novembro de Tabela 1 Dados colhidos diretamente da Delegacia local, Serra Talhada. ANO BOs IPs, TCOs e Viol. Doméstica % Instaurados BOCs , , ,4 BOs = Boletins de Ocorrência; IP = Inquérito Policial; TCO = Termo Circunstanciado de Ocorrência; BOCs = Boletins de Ocorrência Circunstanciada. A tabela 2 evidenciou o quantitativo de atendimentos do CEAM de sua criação até novembro de Ressalta-se que nenhuma das mulheres atendidas pelos programas de Monitoramento Eletrônico de Agressores e 190 Mulher se tornou vítima de feminicídio no município. Por sua vez, apenas uma das mulheres visitadas pela Patrulha Maria da Penha, foi vítima de feminicídio, em decorrência da fuga de seu excompanheiro que se encontrava encarcerado à época. Não obstante este desfecho trágico, importa enaltecer que, ainda que a vida humana não seja mensurável, o objetivo do programa do ponto de vista de resultados e eficiência está corroborado pelo índice de 1,31% de perdas humanas nos últimos três anos, com destaque para registros descendentes como se pode ver na tabela. 147

166 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Tabela 2 Dados de Atendimento do CEAM até novembro de ANO Quant. Atend. / Feminicídio Abrigamento Mulheres Técnicas Fonte: CEAM, DISCUSSÃO O Brasil, apesar de ser um país com altos índices de violência contra a mulher, tem a terceira melhor lei do mundo, a Lei nº , de 07/08/2006 (Lei Maria da Penha), perdendo apenas para a Espanha e o Chile (DIAS, 2015). Pernambuco, apesar de ser um estado empenhado no desenvolvimento de políticas públicas e no enfrentamento a essa violência, ainda apresenta uma crescente estatística de casos de agressão. Serra Talhada é o município mais populoso da região intermediária de Pernambuco, com habitantes de acordo com estimativas de 2018 (IBGE, 2018),uma cidade sertaneja, com uma história de sangue, homicídios por vingança, ainda gera temor às mulheres em acreditar que sairão do ciclo da violência de seus agressores ao procurarem uma delegacia, ainda mais ordinária. Desafio enorme para a política pública local, que não dispõe de delegacia e juizado especializado, apenas um o órgão municipal, o Centro Especializado de Atendimento à Mulher (CEAM). Faz parte da Secretaria de Municipal de Desenvolvimento Social e Cidadania vem trabalhado em parceira com diversos órgãos do Estado e do Município para chegar até a essas vítimas e ajudá-las, por meio do esclarecimento quanto aos seus direitos e assim lhes estimular na decisão de romper o silêncio do medo e denunciar seu agressor. Ele é regido por uma norma técnica que preza, também, pela segurança de toda a equipe e de profissionais técnicos que trabalham com o enfrentamento da violência contra a mulher. A partir de 2017, através de um 148

167 trabalho de conscientização e publicidade, o órgão obteve um importante avanço na visibilidade institucional da rede de enfrentamento com a abertura das portas da delegacia municipal não especializada para o acolhimento e oitiva das mulheres agredidas, de forma mais humanizada. Desde então, por meio do acesso aos boletins de ocorrências disponibilizados pela Delegacia, o CEAM pode contatar as vítimas, assim oferecer os serviços de proteção como: 190 mulher, que concede à vítima uma preferência na urgência; Patrulha Maria da Penha, que fiscaliza as Medidas Protetivas sempre com uma policial feminina; monitoramento de agressores; e o abrigamento, já mencionado. O problema persiste quando há delegacia especializada, mas necessita a vítima peregrinar para resolver pensão do filho, guarda e até a saída do agressor do lar. Cidades como Serra Talhada/PE, sem Delegacia da Mulher e Vara Especializada de Violência contra a Mulher, os processos se acumulam e nem mesmo as Medidas Protetivas de Urgências são de fato analisadas ao tempo legal. Não menos importante são os órgãos locais que compõe a rede, fato que pode ter o desígnio de identificar a violência no âmbito familiar e domiciliar que perpassa, muitas vezes, diversas outras áreas como: a saúde, a educação, a assistência social, cultura, entre outros muitas vezes despercebidos por falta de preparo profissional. De toda política pública prestada às serra-talhadenses, ainda não se alcança o desejado, mas através de diversas campanhas sobre o tema em datas alusivas ao enfrentamento da violência contra a mulher, nacional e internacional, por meio de falas em rádios locais, televisão, palestras em escolas, faculdades, empresas locais e parceria com a Comissão da OAB de Combate à violência doméstica e familiar, frente que atua no poder judiciário, promotoria, delegacias, já se vê resultados que são fruto do trabalho de órgãos como o CEAM. Destaca-se, ainda, a aprovação do projeto de lei para criação de um dia municipal de conscientização sobre a violência contra a mulher, aprovado na Câmara 149

168 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Municipal de Serra Talhada, demonstrando ser uma cidade que luta contra a covardia que é a violência contra as mulheres. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar de ser uma batalha constante seja a implantação da delegacia especializada na cidade de Serra Talhada, a equipe do Centro Especializado de Atendimento à Mulher em Situação de Violência local percebe que o trabalho empenhado pela rede de enfrentamento alcança resultados positivos e céleres. Uma cidade em que a delegacia conte com delegados, agentes e comissários em quantidade adequada à população, sensíveis, treinados e acessíveis à possiblidade de encaminhamentos para os outros órgãos como PM, CEAM, CRAS, Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Promotoria, Justiça e demais órgãos que fazem parte da rede de enfrentamento a violência de gênero com certeza alcançaria resultados esperados pela vítima: proteção. Portanto, se cada mulher que busca uma delegacia para pedir ajuda contra uma pessoa que deveria amá-la receber o acolhimento e a escuta humanizada, independentemente de ser ou não especializada na mulher, com os devidos encaminhamentos para o judiciário, havendo ali uma resposta rápida, com direcionamentos aos órgãos locais lotados com profissionais técnicos, evitaria uma mulher de outra violência e até de um feminicídio. Além da sensibilidade e conhecimento da sociedade de como ajudar uma mulher que sofre a violência de gênero associado com a importância de haver profissionais capazes de acolher, orientar e executar a lei nos seus rigores e celeridade, atrelada a importância de uma Delegacia especializada ou não da Mulher, mister seria que toda a circunscrição implantasse uma Vara Especializada para que o Estado de fato exerça a sua finalidade que se impõe. 150

169 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de Brasília: DOU, CEAM. Dados Estatísticos do Centro Especializado de Atendimento à Mulher de Serra Talhada/PE DIAS, Elves. Lei Maria da Penha: a terceira melhor lei do mundo, Disponível em: Acesso em 12/11/2019. MOVIMENTO DE MULHERES OLGA BENÁRIO. As raízes da violência contra a mulher Disponível em: Acesso em 11/11/2019. PERNAMBUCO. Dados Estatísticos da Secretaria de Defesa Social do Estado de Pernambuco. Disponível em: Acesso em 24/12/2019. PERNAMBUCO. Secretaria da Mulher. Norma Técnica do Serviço de Proteção. Portaria nº 015 de 30/11/

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171 A IMPRESCINDIBILIDADE DA REPRESENTAÇÃO DA MULHER ADVOGADA NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL * RESUMO: O artigo aborda sobre a Mulher Advogada e a importância do seu papel na estrutura da instituição e o empoderamento frente as conquistas alcançadas ao longo do tempo e que mesmo no século XXI, ainda prescinde de instrumentos e ações para fazer valer a sua condição de ser humano enquanto Mulher, visando a imprescindibilidade de sua representação por suas próprias pares como forma de visibilizar e fomentar a inclusão real da Mulher Advogada nas estruturas de cargos e funções de poder na Ordem dos Advogados do Brasil onde faz parte como profissional efetiva. Palavras-chave: Mulher Advogada. Mulher. Gênero. Empoderamento. 1 INTRODUÇÃO A jornada da Mulher é contínua, com muitos obstáculos à transpor, o que requer habilidade para ultrapassa-los e seguir em frente. Agora, imagina trilhar essa jornada rumo a uma formação acadêmica como a Carreira Jurídica onde já quebramos paradigmas e ainda enfrentamos muitos outros a serem quebrados. Não é de hoje que imbuídas de lições de grandes pares, que deixaram conhecimento e entendimento, para que pudéssemos nos organizar em várias frentes e assim discipular novas pares podendo ser quem somos e ocupar os lugares que desejamos, conquistamos o direito de nos profissionalizar em matérias que não admitiam as mulheres. Isso * Graduada pela Universidade Federal Fluminense UFF. Advogada. Pós-graduada em Gênero e Direito pela EMERJ. 153

172 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição envolveu sacrifícios, sendo necessário compreender que mesmo em competição no mercado de trabalho, o fato de ter uma par ocupando espaço de poder, antes ocupado apenas por homens, demonstra que estamos no caminho certo, e quanto mais fomentamos essa compreensão, alargamos as fronteiras da dita equidade de direitos, sabendo que ainda somos poucas a ocupar tais espaços. Essa compreensão, há que ser construída para reformulação dos aspectos políticos e sociais que produz a desigualdade na sociedade. Muitas de nós ainda não compreende a importância destas conquistas, seja pela falta de conhecimento e ou de oportunidade em razão das prioridades na luta pela sobrevivência. O momento agora é de por em prática e executar ações que eleve a Mulher Advogada a um patamar acima, tendo em vista os direitos conquistados. O Plano de Valorização da Mulher Advogada, Provimento n.164/ 2015, vem para fortalecer e tratar das questões inerentes as Advogadas, principalmente na sua condição de Ser Humano, vislumbrando a construção de equidade profissional, reformulando a estrutura institucional existente; sendo uma das ferramentas que proporciona um ganho para atuação profissional, trazendo mecanismos para atender as necessidades específicas da Mulher Advogada. Mister se faz, que, como garantia ao respeito a profissional Mulher Advogada, a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, não somente reconheça, como o fez através do Provimento n.164/2015, mas que intensifique e fomente projetos, campanhas, ações afirmativas, etc..., contribuindo efetivamente para práticas concretas permanentes no combate a desigualdade de gênero, visto a crescente renovação do quadro de Mulheres Advogadas na Instituição. Nesse diapasão, o foco é estabelecer melhores condições para mulher nos desafios do dia-a-dia no exercício da advocacia, o trabalho nos fóruns, delegacias e demais órgãos públicos e privados, o cumprimento das prerrogativas da Mulher Advogada, protegendo assim seus direitos. 154

173 Ainda nesse sentido, é fundamental interagir com outros órgãos e instituições, como a Subsecretaria de Políticas para as Mulheres e Secretaria Municipal da Mulher, visando melhores condições no exercício profissional para o trabalho da Mulher Advogada nas Delegacias e Presídios por meio de parceria entre elas. Outras medidas se fazem necessárias para o efetivo apoio a Mulher Advogada, como a punição rigorosa nos casos de assédio físico e moral contra a profissional, além de denúncia aos órgãos competentes; debater nas reuniões dos Conselhos Estaduais e Federal sobre as violações das prerrogativas da Mulher Advogada; bem como a promoção de campanhas contra o assédio físico e moral. Cumpre ressaltar a importância da implementação na Política de Classe da alteração do processo eleitoral da OAB com regras que incluam a Mulher Advogada, e abordando pautas não só em painel temático, mas em todos os painéis na Conferência Nacional da OAB para debater as questões da Mulher Advogada, e sua ascensão. A busca da identificação das regiões do País e áreas de atuação onde a Mulher Advogada ainda recebe honorários inferiores em relação ao gênero masculino, é essencial para o combate dessa desigualdade. Para que Mulher Advogada venha ocupar espaços até então não alcançados ou se quer almejados na instituição, ela precisa ser representada por suas pares, como reconhecimento do importante papel que exerce ante as mais diversas situações peculiares e inerentes a sua condição de Mulher. Em pleno século XXI embora cada vez mais a Mulher ocupe espaços, profissões e funções as quais no passado só cabiam aos homens, ainda não há representatividade suficiente do gênero feminino nas tomadas de decisões nas instituições para que verdadeiramente tenhamos respostas e soluções compatíveis com os valores intrínsecos da condição de ser Mulher. 155

174 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição A I Conferência Nacional da Mulher Advogada 1, que se deu em Maceió no ano de 2015 assumiu em sua carta o propósito de fazer perpetuar o compromisso assumido pela constituição Federal de 1988 para promover o princípio fundamental pelo bem de todos sem qualquer forma de discriminação e preconceito. Já a II Conferência Nacional da Mulher Advogada 2 no ano de 2016, que aconteceu em São Paulo, resultou na conclamação das Advogadas e Advogados e todo sistema diretivo da OAB para que unidos, lutar efetivamente pela equidade de gênero e respeito as diversidades, promovendo a igualdade entre Mulheres e Homens, reconhecendo e reafirmando o papel essencial da Mulher Advogada na concretização do estado democrático de direito. A XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira 3 em sua carta declara: A Ordem precisa da força das mulheres..., como instrumento de efetivação da igualdade de gêneros., ratificando a imprescindibilidade da profissional, Mulher Advogada para a estrutura institucional, para tanto, em esforço conjunto cabe a todos contribuir incessantemente para a concretização de mecanismos para realização dos objetivos insertos no plano de valorização da Mulher Advogada como reconhecimento de sua importância no cenário da advocacia. 1 A I Conferência Nacional da Mulher Advogada elaborou a Carta de Maceió que propõe ações para perpetuação do compromisso assumido pela Constituição Federal de 1988 em concretizar o objetivo fundamental de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 2 A II Conferência Nacional da Mulher Advogada elaborou a Carta de Belo Horizonte conclama as advogadas e os advogados e todo o conjunto diretivo do Sistema OAB, para juntos fortalecer, com equidade, a advocacia brasileira, concretizando os ditames constitucionais do Estado Democrático de Direito. 3 A XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. A Carta foi elaborada a partir das conclusões dos 40 painéis e mais de 50 eventos especiais da Conferência, que teve como tema Em Defesa dos Direitos Fundamentais: Pilares da Democracia, Conquista da Cidadania. 156

175 O empoderamento das Mulheres, tem por objetivo refletir sobre a condição de sujeito político, elemento fundamental para sua emancipação e participação ativa na sociedade. Envolve um processo político para gerar compreensão dos complexos fatores que criam subordinação/exclusão das Mulheres do mundo público/político e engendrar consciência sobre a reformulação e desconstrução dos atuais esquemas políticos e sociais da sociedade. Maria Helena Santana Cruz Nós, Mulheres Advogadas uma vez, conscientes da importância de nosso papel para o desenvolvimento da sociedade, não podemos deixar de trazer a visão apresentada acima quanto ao empoderamento como reflexão da nossa condição de sujeito político como componente para autonomia e atuação junto a sociedade em consonância a Carta Magna, que, em seus direitos e garantias fundamentais, versa sobre a igualdade de direitos e deveres individuais e coletivos, respeitando as peculiaridades de gênero. Observando os princípios estabelecidos pela ONU Mulheres visando o empoderamento da Mulher, resta claro que não se pode pensar em autonomia, quando a Mulher não tem o controle de seus próprios assuntos, do seu destino, e de suas habilidades, contrariando os conceitos legais, morais e éticos de uma sociedade que afirma ser avançada, destoando o discurso na prática. Sendo assim, seja na condição de Mulher Advogada ou na condição de Mulher Cidadã, os princípios para ascensão de todas deve pautar em técnicas, ferramentas e práticas que venham gerar novas políticas e estratégias para políticas de gênero articulando com os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. A Conferência Nacional da Mulher Advogada é um grande referencial de avaliação dos avanços até aqui conquistados, respaldados pela Comissão Nacional da Mulher Advogada, a Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia e a Procuradoria 157

176 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Nacional de Defesa das Prerrogativas do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, nos dão o amparo na consolidação dos nossos direitos conquistados em consonância com os três pilares da nossa luta Feminista de empoderamento: Igualdade, Liberdade e Sororidade, tema de nossa III edição, onde juntas, somaremos e não mediremos esforços na construção de novas metas e ações no fortalecimento e avanço do plano de Valorização da Mulher Advogada, a sua importância e se assim pudesse ser comparado o mesmo seria equiparado a tal nível de grandeza de reconhecimento como Magna Charta Libertatum das nossas prerrogativas que desejamos ver sendo cumpridas em sua plenitude. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Carta da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. Disponível em: < em: 25 jul I Carta de Maceió OAB/AL. Disponível em: < Acesso em: 25 jul II Carta de Belo Horizonte OAB/MG. Disponível em: < em: 25 jul CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE Disponível em: < ao/constituicao.htm>. Acesso em: 25 jul

177 CRUZ, Maria Helena Santana. Empoderamento das Mulheres. Disponível em: < Acesso em: 25 jul OAB Federal Comissão Nacional da Mulher Advogada. Portal de Valorização da Advogada. Disponível em: < nma/>. Acesso em: 25 jul ONU MULHERES, Cartilha Princípios de Empoderamento das Mulheres. Disponível em: < Acesso em: 25 jul

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179 OS PRINCIPAIS AVANÇOS NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DE GÊNERO CONTRA MULHERES EM TERESINA-PI DE 2011 A 2018 * RESUMO: A presente investigação científica, cuja problemática gira em torno da violência de gênero contra mulheres em Teresina-PI, tendo em vista os altos índices de Feminicídio na Capital, buscou verificar os principais avanços no enfrentamento a essa violência no período temporal delimitado entre os anos de 2011 a A metodologia utilizada foi revisão bibliográfica e estudo bibliográfico comparativo associado à análise jurisprudencial. A partir dos dados obtidos foi possível se constatar como o enfrentamento à violência de gênero contra mulheres vem avançando ao longo dos anos na Capital do Piauí. Palavras-chave: Violência de gênero. Avanços. Teresina-PI. 1 INTRODUÇÃO A realização da presente investigação científica se mostrou imprescindível por ser sabido e notório que, no Piauí, é alarmante o índice de Feminicídio, crime recentemente previsto no Código Penal Brasileiro no art. 121, 2º, VI, como homicídio qualificado, praticado contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, tratando-se de um crime hediondo. Tendo como objetivo o de verificar como está * Advogada inscrita na OAB-PI sob o nº 9346.Bacharela em Direito pela Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí NOVAFAPI (2011), Especialista em Direito Público e em Direito Privado pela Escola Superior de Magistratura do Estado do Piauí ESMEPI (2012/2013), pós-graduada em Ciências Criminais pela Escola Superior de Advocacia do Piauí ESAPI (2018) e em Democracia e Direitos Humanos pela Faculdade Adelmar Rosado FAR (2019). 161

180 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição ocorrendo o enfrentamento dessa problemática, podendo então se chegar a conclusões em torno de como as políticas públicas têm avançado nesse sentido e o que poderia ser realizado para que avancem cada vez mais na proteção da mulher. 2 METODOLOGIA O presente artigo científico abordou a violência de gênero contra mulheres em Teresina-PI focando nos avanços no enfrentamento a essa violência no período temporal delimitado entre o ano de 2011 e Foi realizado por meio de revisão bibliográfica, teve como ponto de partida os dados coletados através da pesquisa de campo da investigação científica intitulada de LEI MARIA DA PENHA: é eficaz na garantia da proteção da mulher contra a violência doméstica em Teresina-PI? 1, pela qual foi possível uma análise temporal comparativa. Contou com o apoio teórico da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; do Plano Estadual de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí; do Plano Estadual de Segurança Pública do Estado do Piauí; e da pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudo e Pesquisa em Violência de Gênero e Núcleo Policial Investigativo de Feminicídio. Ao estudo teórico foi associada uma breve análise jurisprudencial, tendo em vista que no período delimitado entre 2011 e 2018 surgiram novos entendimentos, inclusive enunciados de súmulas dos tribunais superiores; bem como análise das principais alterações legislativas afetas à problemática na Lei Maria da Penha e no Código Penal, a exemplo da recente previsão do Feminicídio. 1 GALVÃO, Teresa Raquel Gomes dos Santos. Lei Maria da Penha: é eficaz na garantia da proteção da mulher contra a violência doméstica em Teresina-PI? Orientador Profº Esp. Alessander Mendes do Nascimento. Monografia (Bacharelado em Direito) Faculdade NOVAFAPI. Teresina,

181 3 DESENVOLVIMENTO Inicialmente é importante destacar algumas considerações sobre a Lei Maria da Penha, que criou mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, estabelecendo medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Consoante seu artigo 2º, é assegurado a toda mulher oportunidades e facilidades para viver sem violência, ter preservada sua saúde mental e física, e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. Determinado ainda que cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados, quais sejam: vida, segurança, saúde, acesso à justiça, dignidade e respeito, dentre outros. Com efeito, a referida lei não trazia rol de crimes em seu texto, passando a prever apenas a sessão do crime referente ao descumprimento das medidas protetivas de urgência. Prioritariamente, essa lei trouxe em seu bojo as regras processuais instituídas para proteger a mulher vítima de violência doméstica, não prevendo portanto o crime de Feminicídio, que foi acrescentado pela lei /2015 ao art. 121 do Código Penal como qualificadora do crime de homicídio se este for cometido contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, sendo a pena de reclusão, de doze a trinta anos, demonstrando importantíssimo avanço na proteção da vida da mulher. Insta salientar que, ainda no ano de 2011, com a Nova lei das Prisões (Lei /11) houve alteração no art. 313 do CPP, sendo acrescida a possibilidade de decretação da prisão preventiva também para garantir a execução das medidas protetivas de urgência. E em 2018, a lei /2018 tipificou como crime autônomo o ato de descumprimento de medida protetiva de urgência, acrescentando o art. 24 A à Lei Maria da Penha: Seção IV (Incluído pela Lei nº , de 2018) 163

182 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição Do Crime de Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. 1 o A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas. 2 o Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança. 3 o O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis. Percebe-se que a intenção do legislador foi levar cada caso de descumprimento para a apreciação da autoridade judiciária, uma vez que a autoridade policial sequer poderá arbitrar fiança, mesmo em se tratando de crime punido com pena inferior a quatro anos de reclusão, perfazendo exceção à regra do inciso I do art. 313 do CPP. Demonstrando que, com o passar dos anos, o legislador também se preocupou em tentar solucionar o problema referente ao não cumprimento das medidas protetivas de urgência. Importante lembrar que a Lei Maria da Penha dispõe ainda sobre a criação de juizados especiais e delegacias especializadas no atendimento à mulher em situação de violência, entre outras instituições com igual objetivo, além de prever que o atendimento da vítima deve ser multidisciplinar, ou seja, deve ser realizado por equipes de profissionais especializados não só da área jurídica, mas também do serviço social e da psicologia por exemplo. Vale ressaltar quanto a Defensoria Pública do Estado, por GALVÃO (2011, p. 11): A Defensoria é um direito da sociedade e um dever do Estado, tendo como missão garantir ao cidadão o acesso à justiça e a efetivação dos seus direitos. E o Núcleo da Mulher em Situação de Violência consiste num segmento da Defensoria Pública do Estado do Piauí que presta, de 164

183 forma gratuita, assistência jurídica, psicológica e social a mulheres vítimas de qualquer situação de violência doméstica, seja ela, física, psicológica, moral, sexual, ou patrimonial. Atuando em diversos setores da estrutura de proteção da mulher do Piauí, buscando seu bem-estar, intervindo nos casos em que esta se encontra em situação de vulnerabilidade. Consoante a pesquisa LEI MARIA DA PENHA: é eficaz na garantia da proteção da mulher contra a violência doméstica em Teresina-PI?, que foi realizada no ano de 2011, através de pesquisa de campo devidamente autorizada pelo Comitê de Ética em Pesquisa: [...] realizada, por meio de uma pesquisa de campo (autorização do Comitê de Ética em Pesquisa anexa) em algumas das principais entidades de apoio à mulher vítima de violência doméstica situadas em Teresina-PI, instituídas pela Lei Maria da Penha, Lei n /2006, quais sejam: Defensoria Pública do Estado do Piauí (Núcleo De Defesa Da Mulher Em Situação De Violência e Conselho Estadual dos Direitos da Mulher), delegacias especializadas na defesa da mulher (Zona Centro e Zona Sudeste), além do Juizado especial da mulher (5ª vara criminal) onde existe o Núcleo Multidisciplinar Lei Maria da Penha da capital. Teve como base os dados colhidos nessas instituições citadas, através de entrevistas realizadas com as autoridades responsáveis e questionários respondidos pelas vítimas de violência doméstica atendidas nas mesmas (GALVÃO, 2011, p. 3). Verifica-se uma eficácia razoável quanto a aplicação da Lei Maria da Penha em Teresina-PI após a análise dos dados coletados na referida pesquisa, que se deu no ano de 2011, através de questionários respondidos por um espaço amostral de vítimas, e da entrevista das principais autoridades atuantes na defesa da mulher dentre as quais: Juiz, Promotor, Defensora Pública, e Delegadas. Tal pesquisa apontou, entretanto, circunstancias negativas, que obstaculizam uma eficácia plena da Lei Maria da Penha, quais sejam: i) machismo, ii) uso de 165

184 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição drogas/álcool pelo agressor, iii) dependência da vítima em relação agressor, especialmente financeiramente, além de iv) existir verdadeiros incentivos ao perdão do agressor (como a ocorrência de audiência de retratação sem prévio requerimento da vítima). Nesse contexto, ressalta-se que o art. 16 da Lei em comento traz os quatro requisitos para a renúncia à representação da vítima: que seja perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público. Percebese, entretanto, que existe peculiar recrudescimento em relação aos crimes praticados com violência contra a mulher, não sendo possível a desistência pela vítima quando o caso envolver violência física, mesmo que se trate de lesão leve culposa, pois, consoante enunciado de súmula do Superior Tribunal de Justiça de 2015, Sum. 543-STJ: a ação relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada e, portanto, independem de representação. Ademais, também em 2015 foi firmado entendimento no sentido de que não se pode utilizar institutos próprios de Juizados Especiais em situações que envolvam violência doméstica, consoante a Sum 536-STJ: a suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. Não sendo possível ainda a substituição da pena por restritiva de direitos e nem a aplicação do princípio da insignificância em tais casos, conforme entendimento firmado pelos Tribunais Superiores. Com efeito, percebe-se que tal enfrentamento tem avançado bastante teoricamente. No tocante ainda à eficácia da Lei Maria da Penha, a falta de uma estrutura ideal adequada foi mencionada como um obstáculo, a exemplo da falta de viaturas para condução e notificação dos agressores e falta de equipamentos para realização de perícias especializadas. Ademais, consoante a referida pesquisa, as medidas protetivas de urgência, requeridas pela Defensoria Pública, foram devidamente deferidas pelo juiz no prazo de 48 horas, consoante previsão legal, para todas as vítimas participantes da pesquisa. Todavia, algumas das vítimas 166

185 afirmaram que as agressões perduraram mesmo após a concessão da medida protetiva. Tal fator ocorre em virtude da sensação de impunidade do agressor e do sentimento de posse, objetificação/coisificação da mulher advinda do machismo estrutural da sociedade. Ainda em relação à pesquisa, que concluiu que a Lei Maria da Penha era eficaz em Teresina-PI, só existiam três delegacias especializadas no atendimento à mulher em situação de violência: [...] no estado do Piauí, em sua Capital, para a efetivação dessa lei foram criados: delegacias especializadas em atendimento à mulher em situação de violência (DEAM- Norte, DEAM- Centro e DEAM- Sudeste), juizado especial da mulher (5ª vara criminal), o núcleo da defesa da mulher em situação de violência da Defensoria Pública, o Centro de Referência Francisca Trindade, dentre várias outras entidades de apoio à mulher vítima de violência (GALVÃO, 2011, p. 9). Nesse contexto, é válido salientar o segundo capítulo do Plano Estadual de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, que traz a time line das ações desenvolvidas no âmbito da segurança da mulher, constando que a primeira delegacia especializada no atendimento à mulher em situação de violência da Capital do Piauí foi criada ainda em 1989, enquanto que, em junho do ano de 2016, a quarta DEAM foi implementada na Zona Sul da Capital. Ademais, além das 4 delegacias especializadas, a Capital possui o Núcleo Policial Investigativo do Feminicídio, criado e implementado em 2015, contando atualmente com o Sistema Integrado de Prevenção e Enfrentamento à Violência Contra a Mulher SIPEVM, com o Departamento Estadual na de Proteção à Mulher na Polícia Civil e com o Sistema Integrado e Enfrentamento à Violência Sexual SIPEVS, ambos implementados no ano de Com efeito, a Polícia Civil do estado do Piauí desenvolve, desde 2015, o projeto intitulado Núcleo de Estudo e Pesquisa em Violência de Gênero, que faz parte de um conjunto de iniciativas de enfrentamento à 167

186 Igualdade, Liberdade e Sororidade 2ª edição violência contra a mulher, e tem como objeto principal implementar e difundir um modelo de gestão orientado pela perspectiva de gênero nas organizações policiais. O referido Núcleo tem planejado e estabelecido ações como: i) desenvolvimento de metodologia investigatória e de protocolos de atendimento para ocorrências de violência de gênero, especialmente Feminicídio; ii) realização de capacitações, na perspectiva de gênero; e iii) a criação de plantão de gênero, dentre outras. Verifica-se que ao longo dos anos houve um enorme avanço na proteção da mulher através da implementação não só das delegacias, mas também de projetos, mapeamentos da violência, campanhas, caravanas, grupo de estudos e capacitações de maneira continuada com todos os especialistas que atuam na proteção da mulher no Estado. Tendo o Piauí participado de diversos Fóruns em todo o Brasil e até no exterior, inclusive tendo sido finalista no Prêmio VIVA, categoria Segurança, da Revista Marie Claire e Instituto AVON. O Plantão Policial Metropolitano de Gênero constitui outra importante estratégia de enfrentamento à violência contra a mulher na capital, voltado à: [...] fornecer atendimento policial civil qualificado, 24h/dia, em Teresina/PI, às violências de gênero praticadas em face de mulheres e de meninos em situação de abuso sexual. ESPECÍFICOS: a) dar resposta imediata e qualificada às violências de gênero perpetradas em face de meninas, mulheres, trans e meninos em situação de abuso sexual; b) proporcionar atendimento policial preferencialmente feminino, 24h/dia em face da violência de gênero; c) aplicar protocolos de atendimento na perspectiva de gênero integrado com as Redes estadual e municipal; d) autuar em flagrante delito, registrar ocorrências e representar por medidas cautelares na perspectiva de gênero; e) aprimorar as futuras investigações policiais e f) gerar estatísticas criminais na perspectiva de gênero 2. 2 Notas retiradas da FICHA DE INSCRIÇÃO - Selo FBSP de Práticas Inovadoras no Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Edital de seleção

187 Observa-se que a maior parte dos registros se dá nos turnos noite e madrugada dos finais de semana (sábado/domingo), sinalizando para a necessidade de se pensar políticas de assistência à Mulher considerando essas circunstâncias 3. Nesse contexto, o governo do Estado do Piauí, em consonância com o poder legislativo e judiciário, também vem demonstrando uma atenção especial no tocante ao enfrentamento à violência contra a mulher, tendo em 2017 lançado um aplicativo que pode salvar vidas ao ser acionado em qualquer hora e lugar. Trata-se do aplicativo Salve Maria, gratuito e que possui as funções de pedir socorro, através do botão de pânico, e de denunciar, através do botão denúncia. Ao acionar o botão de pânico, uma mensagem será enviada para uma unidade policial mais próxima e uma viatura é imediatamente deslocada para prestar o atendimento. O botão de denúncia serve para realização de denúncias de caso de violência contra mulher, podendo ser feito pela própria vítima ou por terceiros, mantendo em sigilo a identidade da pessoa denunciante. Figura 1 Logomarca e material publicitário do aplicativo Salve Maria S/A Propaganda LTDA, O Plantão se destina ao atendimento de mulheres (IBGE 2010) de Teresina e da região metropolitana. Desde a implementação do Painel de Monitoramento Eletrônico do Plantão ( ) até a atualidade, foram registradas 887 ocorrências, uma média de 40 registros/mês, considerando que o funcionamento 24h/dia só veio a ser implementado em , pois anteriormente ( a ) restringia-se ao horário comercial com atendimento noturno aos finais de semana. 169

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