Introdução da Comunicação Alternativa em adulto com Deficiência Múltipla: estudo de caso
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- Vergílio Lacerda Fidalgo
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1 Introdução da Comunicação Alternativa em adulto com Deficiência Múltipla: estudo de caso Olívia Silva e Silva Fonoaudióloga Dayanne Rezende Heitor de Queiroz Terapeuta Ocupacional Resumo O presente artigo trata-se de um estudo de caso realizado com uma usuária da Associação de Pais, Amigos e Excepcionais - APAE de Frutal/MG com diagnóstico de Deficiência Múltipla (Paralisia Cerebral Tetraplégica Atetósica associada à Deficiência Intelectual). Este estudo apresenta como proposta a discussão dos benefícios da comunicação alternativa implantada na fase adulta em indivíduos com comprometimentos motores e funcionais severos. Descreve-se o processo de introdução da comunicação alternativa através do sistema Picture Communication Symbols (PCS), realizado pela equipe multidisciplinar da APAE. A implantação do sistema possibilitou à usuária aumentar suas possibilidades comunicativas manifestando seus desejos, sentimentos e pensamentos e ampliar significativamente seu repertório de respostas. Além disso, os resultados apontam que a comunicação alternativa pode evidenciar as potencialidades do usuário, visto que com a utilização do sistema o indivíduo tem a possibilidade de demonstrar sua capacidade de raciocínio, percepção, planejamento e tomada de decisões. Foi possível perceber que, mesmo a usuária tendo idade avançada e comprometimentos motores severos, os resultados satisfatórios foram obtidos com a comunicação alternativa, ressaltando desta forma a importância de se acreditar nas potencialidades destes sujeitos. Palavras chave: Deficiência Múltipla; Comunicação Alternativa; Potencialidades.
2 Introdução A comunicação é uma habilidade fundamental para a integração das pessoas. Pelosi (2007) aponta que a fala associada a gestos, expressão facial e corporal caracteriza a condição humana. As pessoas recebem informações através do olhar, do ouvir, do cheirar, do experimentar e do sentir e transmitem informações olhando, movendo-se, tocando, escrevendo e falando. O nível de comunicação nos sujeitos com deficiência múltipla (intelectual e física) varia desde bem próximo da normalidade, apresentando leves distúrbios articulatórios, até graves retardos na aquisição da fala ou total impossibilidade de emitir um som compreensível, com dificuldade motora na produção da linguagem expressiva (CASANOVA, 1992). Nestes casos, pode ocorrer alteração na interação do sujeito com o meio, em decorrência dos comprometimentos dos aspectos cognitivos e motores expressivos, visto que estas dificuldades prejudicam a capacidade de exploração do sujeito. Em casos como estes, em que a pessoa possui limitações na expressão oral e escrita é indicado o sistema de comunicação alternativa que pode ser usado como auxiliar primário ou suplementar no processo de inclusão, oferecendo a ele um meio no qual consiga transmitir seus desejos e anseios. Para o desenvolvimento da comunicação alternativa pode-se dispor de sistemas criados ou adaptados especialmente com finalidade educativa ou terapêutica, como a língua de sinais, as pranchas ou símbolos pictográficos, os comunicadores até sistemas sofisticados de computador com voz sintetizada. Segundo Pelosi (2007) um sistema de comunicação alternativa é um grupo integrado de componentes que inclui os símbolos, os recursos, as estratégias e as técnicas utilizadas pelo individuo para auxiliar o desenvolvimento do processo comunicativo. Em suma, a comunicação alternativa refere-se a todas as formas de comunicação que possam complementar ou substituir a fala a fim de aumentar a interação comunicativa. Este estudo apresenta como proposta a discussão dos benefícios da comunicação alternativa implantada na fase adulta em indivíduos com comprometimentos motores e funcionais severos. Além disso, pretende avaliar sua eficácia e identificar seus benefícios quando implantada em sujeitos com este quadro.
3 Métodos Este artigo refere-se a um estudo de caso realizado com uma usuária da Associação de Pais e Amigos e Excepcionais (APAE) de Frutal MG. Trata-se de B.S.G, 25 anos, gênero feminino com quadro de deficiência múltipla. A mesma realiza atendimentos semanais nos setores de Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional e Fisioterapia, em cujo tratamento foi introduzido um sistema alternativo para sua comunicação. Para que fosse possível a implantação do sistema, realizou-se avaliação multidisciplinar, sendo utilizado o Picture Communication Symbols (PCS), o mesmo foi implantado em abril de Os dados aqui descritos foram colhidos da referida data até maio de Durante o processo de avaliação a usuária demonstrou: - quadro de paralisia cerebral tetraplégica atetósica; - referente aos aspectos cognitivos, apresentou déficit intelectual considerável, mas com capacidade suficiente para manter uma boa comunicação; - necessidade de auxilio de outras pessoas para se locomover, fazendo uso de cadeira de rodas e apresentando movimentos não coordenados de membros superiores, o que dificultava o apontar para o símbolo; - problemas no controle cervical, ocorrendo escape de sialorreia quando apresentava dificuldade para controlar a cabeça, mas com deglutição eficiente da saliva quando elevada; - déficit na linguagem expressiva, respondendo apenas aos questionamentos feitos pelos outros, através de movimentos afirmativos e negativos com a cabeça, estando impossibilitada de expressar acontecimentos de seu cotidiano, com boa linguagem compreensiva; - aspectos sensoriais (visuais e auditivos) sem alterações. Em seguida, os dados foram colhidos com a família e as cuidadoras da usuária. Foram coletadas informações sobre seu cotidiano, áreas de desempenho ocupacional, pessoas de seu convívio, seus gostos e preferências. A partir destas informações, a fonoaudióloga iniciou o processo de implantação do sistema de comunicação alternativa.
4 O programa selecionado para o caso de B.S.G foi o Picture Communication Symbols (PCS) visto que, o mesmo é considerado um sistema que atende a todas a idades, e a várias deficiências tais como a intelectual, apraxia oral e paralisia cerebral. Além disso, levou-se em consideração o fato de que os símbolos do PCS são apropriados para indivíduos que aceitam um nível simples de linguagem expressiva, ou seja, envolvendo um vocabulário limitado e estruturas frasais relativamente curtas. Considerando os seus comprometimentos motores significativos, optou-se pela indicação da técnica de varredura, que consiste na possibilidade de uma pessoa indicar as figuras das linhas até a usuária escolher o símbolo por meio do direcionamento do olhar. Para iniciar o trabalho, a fonoaudióloga e a usuária utilizaram o programa Boardmaker no computador. Nesta etapa, B.S.G selecionou os símbolos apresentados de acordo com as informações colhidas sobre sua rotina. Em seguida, iniciou-se o processo de confecção da prancha, a qual foi fixada sobre um tampão (bandeja) que pode ser removível da cadeira de rodas. Este modelo de prancha foi escolhido por ser indicado para pessoas que apresentam movimentos involuntários e comprometidos que impedem o uso de pasta comum. A prancha foi composta por um fundo preto confeccionado em papel cartão exatamente na medida do tampão. Os estímulos para comunicação foram colados sobre o papel cartão e em seguida, os mesmos foram revestidos com papel contact. A prancha foi organizada a partir de categorias e dividas por cores: - amarelo: pessoas e pronomes pessoais; - verde: verbos; - laranja: substantivos; - azul: adjetivos e advérbios; - rosa: sociais (palavras usadas em interações sociais); - branco: artigos, conjunções, preposições, conceitos temporais, cores, alfabeto, números e outras palavras abstratas.
5 Na parte superior dos símbolos foram escritos em letra caixa alta o nome das figuras para facilitar a compreensão do interlocutor. Vale ressaltar, que a prancha foi confeccionada para ser utilizada em casa, na APAE e nos momentos de lazer. Desta forma, a família, a professora, as cuidadoras e outras pessoas de sua convivência foram orientadas quanto ao uso do sistema. A ampliação e/ou substituição de novos símbolos tem acontecido gradualmente com a ajuda destas pessoas e conforme o desejo da usuária.
6 Discussão A paralisia cerebral é descrita como uma série de síndromes clinicas caracterizadas por distúrbios motores, crises convulsivas, alterações do tônus muscular, da postura, comprometimento de fala, visão e audição, podendo ou não estar associada a alterações cognitivas. No caso em questão, observa-se, além das dificuldades motoras e funcionais, a presença de deficiência intelectual associada à paralisia cerebral. B.S.G não teve oportunidades comunicativas intencionais durante toda a sua infância e adolescência, visto que não houve introdução da proposta de comunicação alternativa. Se esse trabalho tivesse sido realizado precocemente a usuária provavelmente teria tido melhores resultados nas áreas de desempenho ocupacional. Considerando as possibilidades cognitivas, visuais e motoras da usuária a prancha de comunicação foi selecionada por ser um dispositivo simples, um meio permanente e facilitador do processo de comunicação. Este recurso apresenta algumas vantagens: - baixo custo; - facilidade da confecção e modificação; - fácil manuseio para aqueles usuários que apresentam comprometimento significativo da função manual, com dificuldade para virar páginas; - podem ser utilizadas sozinhas ou com outros apoios técnicos; - disposição permanente dos símbolos. Porém, podemos destacar também algumas desvantagens: - geralmente o vocabulário é limitado; - dependendo da limitação motora do usuário, a comunicação pode ser dificultada sem o auxilio de parceiros de comunicação. Após um longo período de adaptação e prática com a prancha e a técnica da varredura, a equipe multidisciplinar, diante das desvantagens apontadas, percebeu a necessidade de encontrar uma alternativa viável a fim de aumentar a independência no processo de comunicação. Para isso, era necessário diminuir o auxilio de um parceiro para apontar o símbolo. Diante disso, houve a tentativa
7 de implantação da técnica de seleção por meio de uma ponteira de cabeça, observando alguns movimentos que B.S.G possui. Considerando o fato que este tipo de recurso possui alto custo, percebeu-se a importância de primeiramente realizar uma avaliação prática a fim de detectar a real eficácia da ponteira de cabeça, verificando se o objeto realmente facilitaria a ação da usuária e das pessoas de seu convívio. A partir de então, iniciou-se a confecção de uma ponteira de cabeça de baixo custo. Foram utilizados: tiara larga, elástico, arame, E.V. A, tampas de garrafa PET, durex colorido, espuma e resina epox (durepox). A ponteira confeccionada foi uma alternativa eficaz para o processo de avaliação, no entanto, a usuária em questão não obteve bons resultados com seu uso, já que os poucos movimentos cervicais preservados não foram suficientes para facilitar o processo de indicação do símbolo. Desta forma, descartou-se a possibilidade de aquisição de uma ponteira de cabeça e optou-se, então, em dar continuidade ao processo de comunicação alternativa com um parceiro. Vale ressaltar, que os parceiros de comunicação devem ter paciência e compreensão, de forma que consigam proporcionar a interação do usuário da prancha com os interlocutores, facilitando a manifestação de suas experiências, sentimentos e opiniões. Os símbolos utilizados são os meios que o usuário dispõe para manifestar seus desejos e os parceiros devem entendê-los como tais, nunca os considerando uma forma de avaliação ou uma história ilustrada. No caso em questão, os parceiros foram orientados a estimular e ampliar os gestos afirmativos e negativos (realizados com a cabeça), o direcionamento do olhar e a expressão por meio de sorrisos, como forma gestual com finalidade de comunicação. É importante destacar, que as habilidades ou gestos indicativos apresentados pelos usuários jamais devem ser reprimidos, ao contrário devem ser estimulados e utilizados na comunicação alternativa com objetivo de possibilitar a troca dialógica. O sistema de comunicação alternativa consegue mostrar que o sujeito que não se comunica oralmente pode ter habilidades cognitivas como raciocino, percepção, planejamento e atenção além de evitar o isolamento social daqueles que não conseguem se comunicar. Durante todo este período de acompanhamento, várias adaptações foram feitas para melhorar a utilização da prancha pela usuária. Atualmente, com o avanço tecnológico, a equipe multidisciplinar da APAE de Frutal começa a cogitar a hipótese de buscar uma alternativa com recurso de alta tecnologia que futuramente possa dispensar um parceiro, considerando o seu comprometimento
8 significativo de movimentos dos membros superiores. Todavia, para que este recurso seja adquirido é de extrema importância que antes se realize uma avaliação que indicará a real eficácia do recurso.
9 Conclusão A introdução da comunicação alternativa, mesmo que tardia, possibilitou à B.S.G a manifestação de seus desejos, sentimentos e pensamentos. Hoje, a usuária utiliza trocas dialógicas que possibilitam a interação com o todo tipo de interlocutor e aumentou sua independência em situações comunicativas, podendo assim ampliar suas oportunidades de socialização. Sabe-se que o início do trabalho de comunicação alternativa deve ser precoce. Porém, este estudo mostra que o trabalho iniciado na fase adulta também proporciona resultados satisfatórios, visto que o caso em questão mostrou avanços significativos na autonomia e competência em situações comunicativas. Isto indica que os profissionais que atuam diretamente com este publico devem estar atentos às potencialidades de cada sujeito, não podendo descartar as possibilidades considerando apenas a idade avançada e os comprometimentos motores severos.
10 Referências bibliográficas CASANOVA, J. P. Manual de fonoaudiologia. Porto Alegre: Artes Médicas, PELOSI, M. B. Comunicação Alternativa e Suplementar. In: CAVALCANTI, A. e GALVÃO, C. (org.). Terapia Ocupacional: Fundamentação e Prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, TABITH JUNIOR, A. Foniatria: disfonias, fissuras labiopalatais, paralisia cerebral. São Paulo: Cortez, Disponível em: Acesso em abril de 2013.
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