Marisabel Patarroyo 1, Patrícia Furtado Gonçalves 2, Olga Dumont Flecha 3

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1 R. Periodontia - Junho Volume 18 - Número 02 A DOENÇA PERIODONTAL COMO FATOR DE RISCO PARA A PNEUMONIA POR ASPIRAÇÃO REVISÃO DE LITERATURA Periodontal disease as a risk factor for the aspiration pneumonia Marisabel Patarroyo 1, Patrícia Furtado Gonçalves 2, Olga Dumont Flecha 3 RESUMO A presente revisão analisou os fatores etiológicos da pneumonia, relacionando-os com o acúmulo de biofilme dental, principal fator etiológico da doença periodontal. A pneumonia bacteriana é o resultado da aspiração da flora da orofaringe para o trato respiratório inferior devido a uma falha nos mecanismos de defesa. A colonização do biofilme dental por patógenos aeróbios pode ter um papel muito importante como reservatório de microrganismos causadores da pneumonia por aspiração. A falta de cuidados orais aumenta o risco para pneumonia, que tem sido documentada não só em pacientes idosos como também em pacientes mantidos em UTIs. Estes cuidados têm um papel significativo na redução do número de potenciais patógenos respiratórios presentes na boca e possivelmente na prevalência da pneumonia por aspiração. UNITERMOS: Doença periodontal; pneumonia por aspiração; microbiologia periodontal; tratamento periodontal. R Periodontia 2008; 18: Especialista em Periodontia pela UFVJM- Diamantina 2 Professora Adjunta de Periodontia da UFVJM Diamantina 3 Professora Adjunta de Periodontia da UFVJM- Diamantina Recebimento:12/02/08 - Correção:20/03/08 - Aceite:18/04/08 INTRODUÇÃO Estudos recentes na medicina periodontal sugerem a associação entre a doença periodontal e certas desordens sistêmicas como a pneumonia. Sugerem ainda que a cavidade oral pode desempenhar um importante papel nas infecções adquiridas em hospitais e asilos, especialmente infecções do trato respiratório (FOURRIER et al, 2000; TERPENNING et al, 2001; GARCIA, 2005). A pneumonia é uma infecção do parênquima pulmonar causada por diferentes tipos de agentes etiológicos, incluindo bactérias, vírus e fungos. A infecção resulta do desequilíbrio entre os mecanismos imunitários e o patógeno e pode se constituir numa causa de significativa morbidade e mortalidade, especialmente em indivíduos idosos e/ou imunocomprometidos, considerando-se também como significante causa de morbidade em pacientes de todas as idades (SCANNAPIECO & MYLOTTE, 1996). A pneumonia pode ser classificada como adquirida na comunidade ou nos hospitais, estas últimas também conhecidas como infecções nosocomiais (SCANNAPIECO, 2005). A pneumonia bacteriana em adultos é o resultado da aspiração da flora orofaringeal para dentro do trato respiratório inferior e uma falha nos meca- 24

2 nismos de defesa para eliminar a contaminação bacteriana, a qual multiplica-se e causa a infecção pulmonar (SCANNAPIECO & MYLOTTE, 1996). Então, dentro deste contexto, KHAN et al (2003) afirmam que a doença periodontal deve ser considerada um problema em destaque. A doença periodontal é uma infecção multifatorial, induzida por um complexo bacteriano que interage com os tecidos e células do hospedeiro causando a liberação de um amplo espectro de citocinas, quimiocinas e mediadores inflamatórios, alguns dos quais levam à destruição de estruturas periodontais, incluindo os tecidos que suportam o dente, osso alveolar e ligamento periodontal. O gatilho para o início da doença é a presença do biofilme microbiano complexo, que coloniza as regiões do sulco gengival entre a superfície dental e as margens gengivais, através de interações de adesão específicas e acúmulo devido a alterações arquiteturais no sulco, como perda de aderência e formação de bolsa (HOLT & EBERSOLE, 2005). A cavidade bucal pode abrigar mais de 700 espécies bacterianas. Entretanto, o acúmulo do biofilme sobre as superfícies dentárias pode alterar essa flora bacteriana oral, atuando como reservatório de patógenos respiratórios, o que aumenta ainda mais o risco de pneumonia por aspiração em pessoas susceptíveis (SOCRANSKY & HAFFAJEE, 2005). Através de uma revisão de literatura, o presente artigo tem como finalidade abordar a relação entre a doença periodontal como fator de risco para a pneumonia por aspiração e a presença do biofilme dental como potencial nicho de microrganismos causadores de infecções pulmonares. REVISÃO DE LITERATURA Como relatado por SCANNAPIECO & MYLOTTE (1996), a pneumonia bacteriana em adultos pode resultar da aspiração da flora orofaringeal somada à falha dos mecanismos de defesa para eliminar a contaminação. Indivíduos sadios aspiram, freqüentemente, pequenas quantidades de secreções orofaríngeas, principalmente durante o sono. No entanto, muitos desses eventos de aspiração são pequenos, causam poucos sintomas e raramente resultam em infecções do trato respiratório (DRINKA & CRNICH, 2005). Normalmente, o trato respiratório é capaz de se defender dessas invasões através de mecanismos diretos ou indiretos, tais como: barreiras anatômicas (glote e laringe); reflexo da tosse que ajuda a expelir as partículas inaladas; o fluxo salivar que lava as superfícies epiteliais; secreções traqueobronquiais; estruturas mucociliares que retêm microorganismos para serem expelidos através da nasofaringe ou enviados à orofaringe para serem eliminados pela salivação; imunidade humoral e celular e um duplo sistema fagocítico constituído pelos macrófagos alveolares e os neutrófilos (GARCIA, 2005). Porém, indivíduos com desordens neurológicas, idosos e pacientes hospitalizados constituem um grupo de risco para a pneumonia por aspiração, visto que nestes indivíduos o reflexo da tosse, a capacidade de expectoração e as barreiras imunológicas estão deficientes (DRINKA & CRNICH, 2005). Várias vias de acesso dos microorganismos para o trato respiratório têm sido descritas, tais como: inoculação direta por aspiração, inalação de aerossóis infectados, disseminação hematógena e extensão da infecção de áreas adjacentes. Destas, a aspiração de microorganismos da cavidade bucal e orofaringe é a via mais comum de infecção, significando então que a microbiota oral tem papel primordial na etiologia das infecções pulmonares (TUNES & RAPP, 1999; SCANNAPIECO & MYLOTTE, 1996; FOURRIER et al, 1998; SCANNAPIECO, 2005). Segundo DRINKA & CRNICH (2005), a síndrome de pneumonia por aspiração é um processo infeccioso secundário à disfagia orofaringeal, com inalação de bactérias periodontais ou colonizadoras da orofaringe. Estas pneumonias também podem ser causadas por regurgitação de material gástrico infectado. Dado que a colonização da mucosa faringeana por patógenos respiratórios parece ser um fenômeno transitório; sugere-se que o biofilme dental possa servir como reservatório destes patógenos, principalmente naqueles pacientes com alto risco e higiene bucal pobre (EL-SOLH et al, 2004). Quatro mecanismos têm sido sugeridos para explicar o papel das bactérias orais na patogênese das doenças respiratórias (SCANNAPIECO, 2005): 1) Os organismos que vivem no biofilme dental podem ser liberados na saliva e pequenas gotículas podem ser aspiradas nos pulmões. Normalmente os mecanismos de defesa pulmonar previnem a infecção. Entretanto, a colonização do trato respiratório inferior pode ocorrer se o sistema imune está deprimido ou comprometido, se um patógeno virulento, pouco usual, é aspirado ou se um grande número destes é aspirado simultaneamente. 2) A ação das enzimas bacterianas sobre as células epiteliais da mucosa oral pode promover a colonização de patógenos respiratórios. Normalmente, moléculas sobre a superfície epitelial inibem a adesão bacteriana, porém enzimas liberadas por essas bactérias podem degradar es- 25

3 sas moléculas. Ainda, a deficiente higiene bucal resulta em maior atividade enzimática, que pode lesar a superfície das células epiteliais e aumentar a susceptibilidade para a colonização de patógenos. 3) As enzimas bacterianas podem reduzir a proteção contra a colonização promovida pelas secreções mucosas. Proteínas presentes nestas secreções se ligam às bactérias invasoras, inibindo a adesão às células epiteliais e promovendo a sua eliminação. Entretanto, enzimas bacterianas podem modificar essas proteínas protetoras, facilitando desta forma a colonização por patógenos invasores. 4) As citocinas podem contribuir para a colonização do epitélio respiratório. Na periodontite há liberação de citocinas que podem induzir alterações sobre a superfície celular. Estes mediadores inflamatórios podem recrutar neutrófilos para o local da inflamação, os quais liberam proteases e radicais livres de oxigênio que também lesam o epitélio. Assim, o efeito destas ações pode aumentar a susceptibilidade do tecido para a colonização bacteriana. A contaminação do epitélio respiratório pelas citocinas liberadas oralmente ou a liberação de citocinas pelo próprio epitélio respiratório como resposta ao contato com patógenos orais pode promover a infecção respiratória. A presença de P. gingivalis, um importante anaeróbio Gram-negativo no biofilme supragengival, associa a colonização oral por patógenos periodontais com o risco de pneumonia por aspiração. P. gingivalis e vários outros patógenos periodontais são organismos proteolíticos capazes de degradar a fibronectina. Isto levou à hipótese que a atividade proteolítica das bactérias periodontopatógenas podia alterar a superfície das células epiteliais da mucosa oral, comprometendo a barreira protetora e permitindo assim a colonização secundária da mucosa oral com potenciais patógenos respiratórios (TERPENNING et al, 2001), o que mais uma vez suporta a idéia da importância da doença periodontal como fator de risco para a pneumonia por aspiração. Essas enzimas proteolíticas podem alterar as características da mucosa oral e aumentar a colonização por bactérias patogênicas (PIHLSTROM et al, 2005). Vários estudos têm sido realizados a fim de constatar evidências que ligam a doença periodontal e a pneumonia por aspiração. O primeiro estudo relacionando o risco de pneumonia com a falta de cuidados odontológicos foi realizado em 1992 por SCANNAPIECO et al. Eles estudaram 34 pacientes internados em UTIs, que foram comparados com 25 pacientes tratados numa escola de odontologia e não mantidos em UTIs. Em 62% dos pacientes internados nas UTIs à época da admissão, o biofilme dental estava colonizado por patógenos aeróbios se comparado com 16% nos pacientes não internados. Neste estudo, a quantidade do biofilme dental era maior nos pacientes mantidos nas UTIs, embora não tenha sido correlacionada com a colonização bacteriana e nem com a ocorrência de infecções nosocomiais (FOURRIER et al., 2000). Em 1997, MOJON et al., realizaram um estudo longitudinal entre março de 1993 e março de 1995, sobre a associação entre saúde bucal, saúde geral, estado nutricional e incidência de infecções bronco-pulmonares. A amostra era composta por 302 residentes de um asilo, cuja média de idade era de 85 anos e todos os participantes possuíam algum tipo de comprometimento motor ou neurológico. Durante o estudo morreram 64 indivíduos, sendo que 26 deles (41%) haviam recebido antibióticos por causa de infecções do trato respiratório, uma semana antes do óbito. Um dentista foi selecionado para avaliar a higiene oral dos pacientes. Observou-se que 51% dos idosos eram desdentados e 49% dentados, sendo que destes, 40% tinham bolsas acima de 3 mm. Entre o grupo de desdentados, 27% teve pelo menos um episódio de pneumonia e entre os dentados, essa porcentagem aumentou para 40%. Esse resultado levou à conclusão que o risco de desenvolver pneumonia é 1,7 vezes maior entre os dentados. Concluíram, ainda, que pelo fato da população ser muito idosa e que dependia de ajuda para realização de atividades básicas, como alimentação, a grande maioria dela era negligente com a própria higiene bucal, razão pela qual o tamanho do biofilme era grande, as cáries eram freqüentes e as próteses, quando presentes, estavam em péssimas condições. Um estudo prospectivo, realizado em 1995 por FOURRIER et al (1998) durante um período de três meses, objetivou estudar o status dental e a evolução do biofilme dental, prevalência de colonização do biofilme no momento da admissão e durante a permanência na UTI, relação entre colonização do biofilme com patógenos aeróbios e a ocorrência de infecções nosocomiais. O estudo foi realizado em 57 pacientes cuja média de idade era 49 +/- 18 anos e o período de internação foi de 14 +/- 16 dias. Em todos os pacientes foi examinado o status dentário e era tomada uma amostra do biofilme supragengival para exame microbiológico. Paralelamente, eram realizados exames de aspirado traqueal, secreção nasal e urina para cultura bacteriana, no momento da internação e a cada cinco dias. Neste estudo, FOURRIER et al (1998) concluíram que a colonização do biofilme dental ocorreu em 40% dos pacientes; quando o tempo de internação excedeu 10 dias, 46% dos pacientes adquiriram colonização do biofilme com patógenos aeróbios; a colonização do biofilme foi altamente relacionada com presença ou infecção nosocomial subse- 26

4 qüente; em seis pacientes, a colonização do biofilme por bacilos Gram-negativos parecia ser a fonte de infecção; uma alta concordância foi encontrada entre a colonização de patógenos respiratórios no biofilme dental com a presença desses patógenos nas culturas aspiradas da traquéia, nas placas de cultura obtidas a partir dos biofilmes dentais ou da saliva. Em outro estudo prospectivo com duração de 8 anos, TERPENNING et al (2001) analisaram a importância de fatores médicos e dentais na pneumonia por aspiração em 358 pacientes idosos com idade a partir de 55 anos, procedentes de asilos, clínicas e hospitais. Foi feita visita anual para exames dentais e avaliação médica para avaliar se havia desenvolvimento de pneumonia, coleta de saliva para cultura, coleta de mucosa da orofaringe, biofilme supra e subgengival para detecção de espécies aeróbias e anaeróbias. Alguns dos resultados obtidos no estudo citado foram: 50 pacientes desenvolveram pneumonia por aspiração durante o estudo, 28 dos quais eram dentados; a presença de Porphyromonas gingivalis no biofilme dental, de Streptoccocus sobrinus e Staphyloccocus aureus na saliva foi significativamente mais alta nos indivíduos com pneumonia por aspiração. Os pacientes dentados que tiveram pneumonia por aspiração tenderam a possuir maior número de dentes destruídos e notavelmente houve grande proporção de indivíduos com biofilme dental visível. Concluiu-se que há uma associação significativa entre a presença de necrose dental, bactérias cariogênicas e patógenos periodontais como importantes fatores de risco da pneumonia por aspiração. ABBE et al (2001) realizaram um estudo sobre a influência dos cuidados orais, feitos por um profissional (cirurgião dentista e THD), na ocorrência de pneumonia por aspiração em 54 idosos que foram divididos em dois grupos: 20 pacientes que moravam nas suas casas e não receberam cuidados dentais profissionais; 34 pacientes que moravam em asilos e receberam periodicamente cuidados dentais profissionais. Foi realizado exame clínico, coleta de saliva e análise das amostras por PCR. Os resultados obtidos mostraram que os episódios de pneumonia nos idosos com cuidados orais profissionais foram menores que naqueles que não tiveram os mesmos cuidados. Os autores concluíram que o número de potenciais patógenos respiratórios pode ser reduzido quando os cuidados orais são realizados por profissionais e que em pacientes idosos que precisam de cuidados diários, estes profissionais desempenham um papel significativo na redução de sintomas sugestivos de infecções bacterianas. Mais recentemente, EL-SOLH et al (2004) investigaram a associação entre colonização do biofilme dental e infecção do trato respiratório inferior, em pacientes idosos institucionalizados, usando genotipagem molecular para identificação dos patógenos. Foram utilizados 49 pacientes, sendo que 14 possuíam sintomas de pneumonia e tiveram o lavado broncoalveolar (LBA) coletado. Os patógenos isolados deste fluído foram comparados geneticamente com aqueles que foram isolados do biofilme dental, usando a técnica de eletroforese. Em 28 pacientes (57%) constatouse colonização do biofilme com patógenos aeróbicos, sendo encontrado na maioria dos isolados Staphyloccocus aureus (45%) e Pseudomona aeruginosa (13%). A etiologia da pneumonia foi confirmada em dez pacientes. Dos 13 isolados que foram recuperados do fluído bronco alveolar, nove patógenos eram geneticamente semelhantes àqueles que foram encontrados no biofilme dental de oito pacientes. Num estudo cujo objetivo foi verificar a presença de Staphylococcus spp. na cavidade bucal e presença de bolsas periodontais de pacientes com periodontite crônica, LOBERTO et al (2004) observaram que da amostra de 88 pacientes, 37,5% apresentaram esse microrganismo na bolsa periodontal e 61,36% na cavidade bucal, sendo que 27,27% apresentaram a bactéria nos dois sítios. DISCUSSÃO Quanto aos tipos de patógenos presentes no biofilme dental de pacientes internados em asilos ou em UTIs, os estudos realizados por SCANNAPIECO et al (1992), FOURRIER et al. (1998), ABBE et al (2001) e TERPENNING et al (2001) constatam que as cepas de bactérias aeróbias são prevalentes às de anaeróbias, sendo o S. aureus a espécie encontrada em maior proporção. Sabe-se que em pacientes internados em UTIs, a colonização por patógenos aeróbios ocorre muito rapidamente devido a alterações na barreira antibacteriana local, tais como: ressecamento da mucosa oral, lesão epitelial, diminuição da secreção de saliva, diminuição do conteúdo de IgA na saliva, além das lesões mecânicas produzidas pelas sondas nasogástricas e traqueobronquiais, facilitando desta forma a adesão de bacilos aeróbios e conseqüente proliferação sobre a mucosa orofaringeal (FOURRIER et al., 2000). O S.aureus normalmente não é isolado na cavidade bucal, quando isso ocorre são considerados microrganismos da microbiota transitória. Indivíduos com doença periodontal apresentam possível reservatório deste patógeno na cavidade oral. O uso de antibióticos para o tratamento da doença periodontal ou outras infecções como a pneumonia pode causar aumento deste microrganismo na boca, além de que 27

5 essa espécie pode causar superinfecção (LOBERTO et al, 2004). Nos estudos de MOJON et al (1997), TERPENNING et al (2001), ABBE et al (2001) a amostra foi de pacientes idosos. Estes tipos de pacientes são os mais estudados quanto à presença de biofilme dental e a pneumonia devido às dificuldades próprias da idade. A maioria de pacientes idosos que vivem em asilos ou estão internados, possui alguma doença sistêmica (como Alzheimer, hiper tensão, diabetes e hemiplasia), além de já terem sofrido AVC ou possuírem algum comprometimento do sistema nervoso. Todos esses fatores podem dificultar a capacidade do idoso em manter boa higiene da cavidade oral (ABBE et al, 2001). Segundo SCANNAPIECO & MYLOTTE (1996), a idade acima de 70 anos, por si, já é considerado um fator de risco para a pneumonia nosocomial, além de que o sistema imunológico e os mecanismos de defesa pulmonar nos idosos diminuem sua efetividade com o aumento da idade. Pacientes imunocomprometidos, diabéticos e alcoólatras, parecem ser mais propensos a apresentarem colonização orofaringeal por potenciais patógenos respiratórios (PRPs), além do fato que estes indivíduos apresentam um alto risco para a doença periodontal. Então, o biofilme dental nestes pacientes pode ser a superfície na qual os patógenos se aderem, constituindo-se no reservatório para as infecções do trato respiratório inferior. Por outro lado, em pacientes hospitalizados, com alto risco para a pneumonia, a mucosa oral pode ser modificada e levar ao aparecimento de receptores para estes patógenos. Além disso, a precária higiene oral aumenta a carga bacteriana do biofilme e, conseqüentemente, o nível de enzimas proteolíticas na saliva. A fonte destas enzimas tem sido atribuída às bactérias do biofilme ou aos neutrófilos que entram à saliva através do sulco gengival inflamado (GARCIA, 2005). Quanto à importância da limpeza feita pelo dentista ou higienista dental e sua correlação com a incidência de pneumonia, os estudos de ABBE et al (2001) e ADACHI et al (2002), demonstraram que cuidados de higiene bucal administrados por profissionais da área estão associados com a diminuição da prevalência de febre e pneumonia por aspiração. A importância do cuidado com a higiene oral em pacientes internados, principalmente em entubados, não é um assunto tão recente. Tanto manuais de cuidados médicos quanto protocolos instituídos pela Associação Americana de Cuidados Médico-Hospitalares (AACN), advogam adequado cuidado oral feito através de escovas, gazes e sucção de secreções orais. Apesar destas recomendações e procedimentos clínicos terem como objetivo a diminuição efetiva da colonização da orofaringe, a implementação destes protocolos em clínicas e hospitais não é uma prática comum (GARCIA, 2005). Considerando que o meio que transporta as bactérias, presentes no biofilme dental, para o trato respiratório inferior é a saliva e que o desenvolvimento de pneumonia depende da quantidade de saliva aspirada no pulmão, é lógico deduzir que a falta de cuidados orais aumenta o risco para pneumonia nosocomial. Esta doença tem sido documentada não só em pacientes idosos como também em pacientes mantidos em UTIs, demonstrando a importância de adequada higiene bucal, a qual diminui consideravelmente a quantidade de uma patógenos orais ( ABBE et al, 2001). O controle desses microrganismos é difícil, principalmente em pessoas idosas, porque esses agentes são continuamente liberados do biofilme dental portanto, é essencial que o mesmo seja removido mecanicamente (GARCIA, 2005). CONCLUSÕES 1. Há evidências que confirmam que colonização do biofilme dental por patógenos aeróbios pode ter um papel muito importante como reservatório de microrganismos causadores da pneumonia por aspiração (semelhanças genéticas). 2. Pacientes idosos e dentados têm maior risco de desenvolverem a doença periodontal e maior risco de contraírem a pneumonia por aspiração. 3. A principal via para os microrganismos chegarem ao sistema respiratório inferior é a aspiração de patógenos da orofaringe. Os organismos mais freqüentemente isolados no biofilme de pacientes com doença periodontal são Gramnegativos os quais podem alterar a integridade das mucosas, facilitando mais agregação de outros microrganismos. 4. O tratamento profissional da saúde bucal, em pacientes idosos, tem um papel significativo na redução do número de potenciais patógenos respiratórios presentes na boca e na prevalência da pneumonia por aspiração. 5. A retirada mecânica do biofilme dental pode diminuir a ocorrência de pneumonia em pacientes internados em UTIs. ABSTRACT The present review analyzed the etiologic factors of pneumonia, relating them to bacterial plaque accumulation, the main etiologic factor of periodontal disease. The bacterial pneumonia results from the aspiration of the oropharyngeal contents to the lungs and a fail in the host immunology. The colonization of the dental plaque by aerobic pathogens may 28

6 develop an important role as a reservatory of microorganisms. The lack of oral cares increases the risk for pneumonia that has been documented not only in elderly patients as well as in patients maintained in UTIs. These cares have a significant role in the reduction of the number of potential pneumonia pathogens in the mouth and in the prevalence of the aspiration pneumonia. UNITERMS: Periodontal disease; aspiration pneumonia; periodontal microbiology; periodontal treatment. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1- Abbe S, Ishihara K, Okuda, K. Prevalence of potential respiratory pathogens in the mouths of elderly patients and effects of professional oral care. Archives of Gerontology and Geriatrics 2001; Adachi MD, Ishihara K, Abe S, Okuda K. Effect of professional oral health care on the elderly living in nursing homes. Oral Surgery, Oral Medicine, Oral Pathology, Oral Radiology, and Endodontics 2002; 94(2): Drinka PJ, Crnich MD. Pneumonia in the nursing home. Journ of Amer Med Dir Assoc 2005; 6: El-Solh AA, Pietrantoni C, Bhat A, Okada M, Zambon J, Aquilina A. Colonization of dental plaques: a reservoir of respiratory pathogens for hospital-acquired pneumonia in institutionalized elders.chest 2004;126: Fourrier F, Duvivier B, Boutigny H, Roussel-Delvallez M, Chopin C. Colonization of dental plaque: a source of nosocomial infections in intensive care unit patients. Critical Care Medicine 1998; 26: Fourrier F, Cau-Pottier E, Boutigny H, Roussel-Delvallez M, Jourdain M, Chopin C. Effects of dental plaque antiseptic decontamination on bacterial colonization and nosocomial infections in critically ill patients. Intensive Care Medicine 2000; 26: Garcia R. A review of the possible role of oral and dental colonization on the occurrence of health care-associated pneumonia: underappreciated risk. American Journal of Infection Control 2005; 33(9): Glogauer M, McCulloch C. An overview: introduction to the RCDSO symposium. Oral health: a window to systemic disease. Supplement to RCDSO DISPATCH, p. 2-7, Holt SC, Ebersole JL. Porphyromonas gingivalis, Treponema denticola and Tannerella forsythia: the red complex, a prototype polybacterial pathogenic consortium in periodontitis. Periodontology ; 38: Khan S, Sardenberg E, Silva LR, Machado WAS, Alves J. Pneumonia por aspiração associada à doença periodontal. Revista Brasileira de Odontologia 2003;60(4): Loberto JCS, Martins CAS, Santos SSF, Cortelli JR, Jorge AOC. Staphylococcus spp. In the oral cavity and periodontal pockets of chronic periodontitis patients. Brazilian Journal of Microbiology 2004; 35 (1-2). 12- Mojon P, Budtz-Jorgensen E, Michel JP, Limeback H. Oral health and history of respiratory tract infection in frail institutionalised elders. Gerondontology 1997; 14(1): Pihlstrom BL, Michalowicz BS, Johnson NW. Periodontal diseases. Lancet, 2005; 366: Scannapieco FA. Oral inflammation and respiratory diseases. Colgate White Papers: Oral Inflammation, Scannapieco FA, Mylotte JM. Relationship between periodontal disease and bacterial pneumonia. Journal of Periodontology 1996; 67(10):

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