Dengue. Febre hemorrágica Febre não diferenciada Síndrome de febre da dengue (síndrome viral) da dengue (efusão de plasma)
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- Edite Beppler Ferretti
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1 Dengue Manifestações clínicas As infecções pelos vírus da dengue podem ser assintomáticas ou produzir febre não diferenciada, febre de dengue ou febre de dengue hemorrágica (figura 1). Figura 1- Manifestações da síndrome da dengue Infecção pelo vírus da dengue Assintomático Sintomático Febre hemorrágica Febre não diferenciada Síndrome de febre da dengue (síndrome viral) da dengue (efusão de plasma) Sem hemorragia Com hemorragia Sem choque Síndrome de (incomum) choque da dengue (SCD) Febre de Dengue Dengue hemorrágica Fonte: adaptado de WHO, As características clínicas da dengue, em geral, têm relação com a idade do paciente. A febre indiferenciada é freqüente em crianças pequenas. Às vezes se acompanha de transtornos digestivos. Podem ser observados, também, sintomas do aparelho respiratório, porém não são freqüentes, nem importantes. Crianças maiores e adultos podem ter uma síndrome febril leve ou a doença clássica. A síndrome de febre da dengue clássica apresenta-se como doença incapacitante, com início abrupto e febre alta, cefaléia intensa, dor retroorbitária, mialgias, artralgias, astenia e exantema, o qual aparece nos primeiros dias em cerca de 26 a 50% dos casos, podendo, também ocorrer vômitos. Podem-se observar petéquias ou outras hemorragias menores (epistaxe, sangramento gengival, sangramento gastrintestinal, hematúria e metrorragia), mesmo que não se apresente uma redução importante do número de plaquetas. A duração da doença é de 5 a 7 dias. A recuperação é, principalmente, em adultos, acompanhada de fadiga prolongada e depressão. A dengue hemorrágica é caracterizada por febre alta, fenômenos hemorrágicos, freqüentemente hepatomegalia e, nos casos severos, falência circulatória caracterizando a síndrome de choque da dengue. A alteração principal e característica da dengue hemorrágica é o extravasamento de plasma para os espaços intersticiais. Esta forma clínica se inicia com quadro similar ao da dengue clássica, cujas manifestações se mantém durante as primeiras 48 horas de doença, podendo se estender por mais alguns dias. Nesta etapa febril da enfermidade não é possível
2 predizer se o paciente terá sintomas e sinais de dengue clássica todo o tempo, até a cura, ou se evoluirá para a dengue hemorrágica e síndrome de choque da dengue. Entre o terceiro e o sexto dia depois da aparição dos primeiros sintomas nas crianças e entre o quarto e o sexto dia nos adultos, mais freqüentemente, a febre cai, a dor abdominal se faz intensa e constante e se constata a presença de derrame pleural ou ascítico, os vômitos aumentam em freqüência e começa a etapa crítica da doença. Este é o momento em que, com maior freqüência, se apresenta o choque e se faz evidente a hepatomegalia. O choque se faz presente com uma freqüência 4 a 5 vezes maior quando baixa a febre ou nas primeiras 24 horas depois de seu desaparecimento. A presença de alguns sinais de alarme pode antecipar a possível evolução para esta etapa: Clínicos: 1. Dor abdominal intensa ou mantida 2. Vômitos muito freqüentes e abundantes 3. Queda brusca da temperatura, que pode chegar á hipotermia, com queda do estado geral e ás vezes lipotímia. Laboratoriais: 1. Aumento progressivo do hematócrito, ou hematócrito já elevado em 20% ou mais 2. Queda progressiva do número de plaquetas A Organização Mundial de Saúde (OMS) propõe uma classificação da dengue hemorrágica por grau de severidade que se mostrou útil clínica e epidemiologicamente em epidemias de dengue hemorrágica em crianças no Sudeste Asiático e Pacífico Ocidental: Grau I Febre acompanhada de sintomas inespecíficos; a única manifestação hemorrágica é a prova do laço positiva. Grau II - Sangramento espontâneo, além das manifestações presentes no Grau I, geralmente na forma de sangramentos da pele ou outros. Grau III Insuficiência circulatória manifestada por pulso rápido e fraco, redução da diferença entre a pressão arterial sistólica e diastólica até 20mm Hg ou menos, ou hipotensão, com pele pegajosa e fria e inquietação. Grau IV Choque profundo com pressão sanguínea e pulso não detectáveis. (Graus III e IV = Síndrome de choque da dengue) Para diferenciar dengue clássica com hemorragia da síndrome de dengue hemorrágica deve ser avaliada a presença de hemoconcentração, presente na última. Torres (2006) propõe uma classificação prática com vistas à conduta a ser tomada, propondo que se classifique o caso com os critérios da OMS por ocasião da alta do paciente, com finalidade epidemiológica. A classificação proposta deverá ser feita ao se atender um caso suspeito de dengue: A B Caso febril Caso com febre e prova do laço positiva ou petéquias (ou outro sangramento)
3 C D Caso com sinais de alarme Caso com sinais de choque Esta classificação determinará as decisões clínicas, de laboratório, de hospitalização e terapêuticas (vide tratamento). A classificação de cada caso deve ser dinâmica, pois o paciente pode apresentar modificações no seu quadro clínico que o façam passar de um grupo a outro em curto espaço de tempo. Dengue com complicações corresponde a todo caso que não se enquadre nos critérios de febre hemorrágica da dengue e quando a classificação de dengue clássica é insatisfatória, dado o potencial de risco. Nessa situação, a presença de um dos itens a seguir caracteriza o quadro: alterações neurológicas, disfunção cardiorrespiratória, insuficiência hepática, plaquetopenia igual ou inferior a 50000/mm 3, hemorragia digestiva, derrames cavitários, leucometria global igual ou inferior a 1000/mm 3 e óbito. Morbidade e Letalidade De acordo com a OMS, durante as epidemias de dengue, a taxa de ataque entre os susceptíveis é freqüentemente de 40 a 50%, mas em alguns casos pode alcançar 80 a 90%. No Brasil, inquéritos soro-epidemiológicos, realizados após as primeiras epidemias, em cidades de médio e grande porte, mostraram prevalência de infecções por vírus da dengue de 25 a 56 %. No Estado de São Paulo, inquéritos soro-epidemiológicos realizados após as primeiras epidemias encontraram, nas cidades de Santa Bárbara D Oeste, Ribeirão Preto e Campinas, prevalências de 0,63%, 5,4% e 14,80% respectivamente. Em algumas epidemias, a febre da dengue pode vir acompanhada de sangramentos, como visto no item anterior, podendo ocorrer hemorragia em indivíduos com úlcera péptica prévia, e em alguns casos, raros, levar à morte. A letalidade da dengue clássica, contudo, é de menos de 1%. A dengue hemorrágica tem apresentado um padrão no Pacífico Ocidental e sudeste da Ásia no qual ocorrem casos esporádicos ou pequenos surtos em áreas urbanas que crescem em intensidade até que ocorre uma epidemia explosiva que chama a atenção das autoridades para a doença. Em seguida a enfermidade se estabiliza em um padrão com atividade epidêmica cada 2-5 anos. Nestas regiões, este quadro praticamente só acomete crianças. Pelo menos 2,5% dos casos falecem, no entanto, a letalidade pode ser duas vezes mais elevada. Sem tratamento apropriado a letalidade por dengue hemorrágica pode exceder 20%. Com o recurso de terapia preventiva e intensiva estas taxas podem ser reduzidas a menos que 1%. Nas Américas, as epidemias de dengue hemorrágica têm afetado crianças e adultos, e em algumas situações têm predominado nestes últimos, como se observou no Brasil. (ver prevalência e letalidade no CVE e na SVS) Diagnóstico diferencial Dengue clássica: as principais doenças a serem consideradas são: gripe, rubéola, sarampo, e outras infecções virais e bacterianas exantemáticas.
4 Dengue hemorrágica: no início, o diagnóstico diferencial é semelhante àquele da dengue clássica, a partir do 3 ou 4 dia, diferenciar do choque endotóxico por infecção bacteriana ou meningococcemia, leptospirose, febre amarela, malária, hepatite infecciosa, hantavirose, riquetsioses. Diagnóstico Laboratorial Exames específicos: são utilizados dois métodos básicos para o diagnóstico de infecção por dengue: detecção do vírus ou detecção de anticorpos. Até recentemente, a detecção do vírus se restringia à recuperação do vírus pela cultura, no entanto, já existem outros testes que podem detectar o RNA viral (diagnóstico molecular feito por transcriptase reversa reação em cadeia de polimerase, RT-PCR) e antígenos virais específicos (imunoistoquímica de tecidos). Estes testes irão se tornar rotineiros assim que os reagentes e equipamentos necessários para sua realização se tornarem mais amplamente acessíveis. Os métodos sorológicos demonstram a presença de anticorpos da classe IgM, em única amostra de soro (MAC-ELISA) ou o aumento do título de anticorpos IgG (conversão sorológica) em amostras pareadas (inibição da hemaglutinação, teste de neutralização, ELISA). Exames inespecíficos: hematócrito e plaquetometria são os mais importantes para o diagnóstico e acompanhamento das formas hemorrágicas.são, também, utilizados leucograma e hemoglobina. Tratamento O sucesso no tratamento das formas graves de dengue se baseia numa estratégia cuja essência é preventiva e implica: 1 no acompanhamento de todos os casos febris com suspeita de dengue e na tomada de medidas para prevenir o desequilíbrio hidromineral através do aporte de líquidos abundantes por via oral 2 na identificação precoce dos sinais de alarme para iniciar precocemente a rehidratação parenteral que permita prevenir o choque 3 no tratamento enérgico do choque com soluções eletrolíticas em quantidade suficiente para prevenir complicações, como a coagulação intravascular disseminada, os sangramentos abundantes e a síndrome de hipoperfusão que conduz à falência de múltiplos órgãos, e evitar, também, a super-hidratação com o objetivo de prevenir o edema pulmonar que causa a síndrome de dificuldade respiratória. O objetivo do tratamento é a aplicação eficiente de um conjunto de conhecimentos que permite classificar o paciente de acordo com seus sintomas e fase da doença, assim como reconhecer precocemente os sinais que anunciam a gravidade do quadro clínico e decidir a tempo as condutas terapêuticas adequadas.
5 O que determina o prognóstico final do paciente é seu diagnóstico e tratamento iniciais e seu estado ao chegar à unidade de cuidados intensivos e não a quantidade de recursos empregados depois. Após classificar o paciente de acordo com Torres (2006) (vide Manifestações Clínicas) devem ser observados os seguintes procedimentos: A Caso febril Realizar prova do laço. Se a prova resultar negativa, é indicado tratamento ambulatorial sintomático (não utilizar aspirina ou medicamentos antiinflamatórios não esteróides). Orientar para ingerir grande quantidade de líquidos, pois esta medida tem contribuído para diminuir o número de hospitalizações por dengue. Deve ser dada informação sobre a doença, principalmente sobre os sinais de alarme e sobre a observação necessária especialmente durante a queda da febre. Um resultado negativo da prova do laço não permite descartar uma evolução para dengue hemorrágica. Obs. Recomenda-se solicitar hematócrito, hemoglobina, plaquetas e leucograma para pacientes que se enquadrem nas seguintes situações: gestantes, idosos (mais de 65 anos), hipertensão arterial, diabetes melito, doença pulmonar obstrutiva crônica, doenças hematológicas crônicas (principalmente anemia falciforme), doença renal crônica, doença severa do sistema cardiovascular, doença ácido-péptica e doenças auto-imunes. B Caso com febre e petéquias ou prova do laço positiva (ou outro sangramento) Deve ser pedida uma contagem de plaquetas e hematócrito (que devem ser repetidos com a freqüência adequada para cada caso, mas pelo menos uma vez ao dia) e devese manter o paciente sob observação. Contagem plaquetária com diminuição progressiva e aumento do hematócrito são critérios para hospitalização. Os sinais vitais devem ser acompanhados: pressão arterial, freqüência respiratória e freqüência cardíaca, diurese, e, também o surgimento de sinais de alarme. C Caso com sinais de alarme Deve-se estar preparado para prevenir o choque. Começar reidratação enérgica por via endovenosa. Acompanhamento de perto do paciente com cuidados intensivos. D Caso com sinais de choque Sinais de choque: pressão arterial diferencial próxima a 20 mmhg ou hipotensão. Iniciar o tratamento para choque hipovolêmico. A infusão de líquidos deve ser iniciada assim que se observem os sinais de choque inclusive no serviço de atenção primária à saúde enquanto se encaminha o paciente ao hospital.
6 Para um tratamento eficaz e prevenção de mortes por dengue é necessário um conjunto de medidas administrativas e de capacitação que devem executar-se em cada hospital e unidade de atenção primária dos quais depende o tratamento individual de cada paciente. Um bom administrador de saúde é capaz de salvar mais vidas, durante uma epidemia de dengue, do que os médicos e intensivistas. O treinamento de recursos humanos é a medida que traz mais retorno. Isto contempla de modo prioritário o trabalho informativo-educativo com a população até que se consiga sua participação ativa no autocuidado e que possa reconhecer oportunamente os sinais que anunciam a possível gravidade do caso. Referências Bibliográficas Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde. Manual de Dengue - Vigilância Epidemiológica e Atenção ao Doente. 2º edição - Brasilia:DEOPE, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Manual de Vigilância Epidemiológica de Dengue. São Paulo, Tiriba AC. Dengue. In: Lopes AC, Tratado de Clínica Médica. Vol III, pág ROCA, Torres EM, La prevención de la mortalidad por dengue: un espacio y un reto para la atención primaria de salud. Rev Panam Salud Publica/Pan Am/ Public Health 201, Dengue. Doenças Agudas Transmissíveis Dengue. Secretaria de Vigilância em Saúde Tópicos de Saúde. /topics/ dengue World Health Organization. Dengue hemorrhagic fever : diagnosis, treatment, prevention and control. 2 nd ed. Geneva: WHO; 1997.
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