ERLIQUIOSE CANINA - RELATO DE CASO
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- Martim Castilho Martins
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1 UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO INSTITUTO QUALITTAS DE PÓS-GRADUAÇÃO CURSO LATU-SENSU DE CLÍNICA MÉDICA E CIRURGICA DE PEQUENOS ANIMAIS ERLIQUIOSE CANINA - RELATO DE CASO Gleizer Lopes de Campos dos Santos Matias Rio de Janeiro 2012
2 GLEIZER LOPES DE CAMPOS DOS SANTOS MATIAS Aluno de Pós-Graduação do Instituto Qualittas ERLIQUIOSE CANINA - RELATO DE CASO Trabalho de monografia de conclusão do curso de Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais (TCC), apresentado ao Instituto Qualittas de Pós-Graduação para obtenção do título de Especialização Lato sensu em Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais sob a orientação da Profa. Dra. Simone Salles Pontes Xavier. Rio de Janeiro 2012
3 ERLIQUIOSE CANINA - RELATO DE CASO Gleizer Lopes de Campos dos Santos Matias Aluno do Curso Qualittas de Pós-graduação em Clínica Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais Foi analisado e aprovado com grau:... Rio de Janeiro, 15 de Março de 2012 Membro Membro Membro Presidente Rio de Janeiro, Mar ii
4 Dedico este trabalho aos meus pais, Mario e Eliane, que sempre me motivaram e incentivaram meus estudos. iii
5 Agradecimentos À minha noiva Mariana pelo carinho e confiança; À Professora Doutora Simone Pontes Xavier Salles, minha orientadora pelo carinho e por acreditar na realização deste trabalho; Aos meus amigos que me ajudaram nos momentos de difículdades. iv
6 MATIAS, Gleizer Lopes de Campos dos Santos. Erliquiose Canina - Relato de caso RESUMO A Erliquiose canina é uma doença infecciosa grave que acomete os cães, causada pela Rickettsia Ehrlichia canis. As manifestações clínicas variam de doença aguda, subclínica e crônica. O agente causador é visto raramente no citoplasma de leucócitos, na forma de mórulas. Os sinais progridem comumente de agudo a crônico e é uma doença de difícil diagnóstico. A resposta ao tratamento geralmente é satisfatória. A gama de medicamentos que podem ser utilizados é grande, como a tetraciclina, doxiciclina e o dipropionato de imidocarb, sendo que a recuperação depende da intensidade do caso clínico e do período em que se inicia a medicação. Palavras-chave: Erliquiose. Ehrlichia. Cães. v
7 MATIAS, Gleizer Lopes de Campos dos Santos Canine Ehrlichiosis A Case Report ABSTRACT The Canine Ehrlichiosis is a serious infectious disease that affects dogs, caused by the rickettsia Ehrlichia canis. Clinical manifestations vary from acute, subclinical and chronic. The causative agent is rarely seen in the cytoplasm of leukocytes, as morula. Signs of progress commonly acute to chronic and is a difficult disease to diagnose. Response to treatment is generally satisfactory. The range of drugs that can be used is big, such as tetracycline, doxycycline and imidocarb dipropionate, and the recovery depends on the intensity of the case history and the period during which the medication begins. Keywords: Ehrlichiosis. Ehrlichia. Dogs. vi
8 SUMÁRIO Página RESUMO... v ABSTRACT... vi LISTA DE ILUSTRAÇÕES... viii Partes 1. INTRODUÇÃO Problema Justificativa Objetivos FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Mecanismos de Infecção Manifestação da Doença Achados Laboratoriais Diagnóstico e Diagnóstico Diferencial Tratamento e Profilaxia RELATO DO CASO DISCUSSÃO CONCLUSÃO REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS vii
9 LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURA FIGURA FIGURA FIGURA Tabela Tabela viii
10 9 1. INTRODUÇÃO 1.1 Problema A Erliquiose canina é uma doença infecciosa grave que acomete os cães (NELSON; COUTO, 2001), causada pela Rickettsia Ehrlichia canis. É de ocorrência mundial (BREITSCHWERDT, 2004; CORREA & CORREA, 1992) e foi descrita pela primeira vez na Argélia em 1935 e relatada pela primeira vez nos Estados Unidos em 1963 (BREITSCHWERDT, 2004). O gênero Ehrlichia atualmente compreende cinco espécies válidas: Ehrlichia canis, E. chaffeensis, E. ewingii, E. muris e E. ruminantium. (DUMLER et al. 2001). No Brasil, a única espécie descrita até o momento é E. canis, responsável pela erliquiose monocítica canina, doença considerada endêmica principalmente nas áreas urbanas, onde abundam populações do carrapato Rhipicephalus sanguineus (LABRUNA, PEREIRA, 2001). As manifestações clínicas variam de doença aguda, subclínica e crônica. O agente causador é visto raramente como colônias de corpúsculos cocoides no citoplasma de leucócitos, na forma de mórulas. Afetam os monócitos mais frequentemente, embora algumas cepas possam afetar apenas neutrófilos, eosinófilos, ou ambos (URQUHART et al., 1998). Os sinais progridem comumente de agudo a crônico, variando conforme a cepa e a imunidade do hospedeiro (ANDEREG; PASSOS, 1999) e os achados patológicos incluem edema e enfisema pulmonares, ascite, glomerulonefrite, esplenomegalia, hepatomegalia e linfadenopatia. Podem ser encontradas hemorragias no sistema urogenital, intestinos e narinas. Pode haver a presença de petéquias na gengiva, conjuntiva ocular, bucal e nasal (CORRÊA & CORRÊA, 1992). É uma doença de difícil diagnóstico, pois mimetizam outras patologias. Porém o diagnóstico se baseia no histórico de carrapato, sinais clínicos, exames laboratoriais, identificação das mórulas citoplasmáticas (através de coleta de sangue, testes sorológicos para identificar anticorpos para erliquia, através da cadeia de reação da polimerase (PCR) ou por meio de anticorpos por imunofluorescência indireta (BREITSCHWERDT, 2004). A resposta ao tratamento geralmente é satisfatória, exceto nos casos crônicos, nos quais a resposta ao tratamento é mínima. A gama de medicamentos que podem ser utilizados é grande, como a tetraciclina, doxiciclina e o dipropionato de imidocard, sendo que a recuperação depende da intensidade do caso clínico e do período em que se inicia a medicação (TROY & FORRESTER, 1990). Evidências sorológicas indicam que a Ehrlichia canis ocorre em seres humanos, que se infectam a partir da exposição a carrapatos. Os sinais clínicos incluem febre, dor de cabeça, mialgia, dor ocular e desarranjo gastrintestinal (BARR, 2003). A doença então é uma zoonose transmitida ao homem da mesma forma que é transmitida para o cão, tendo, portanto, importância relevante na saúde humana (TROY & FORRESTER, 1990).
11 Justificativa Por ser uma doença de grande importância e muito comumente encontrada na Clínica Médica Veterinária, este trabalho relata um caso de sucesso no tratamento da doença. 1.3 Objetivos Este estudo teve como objetivo relatar um caso clínico de Erlichiose, evidenciando os sinais clínicos, exames laboratoriais e tratamento. Concomitantemente alertar aos clínicos veterinários sobre a importância desta doença que vem crescendo nos últimos anos no Brasil. 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 MECANISMOS DE INFECCÇÃO O carrapato Rhipicephalus sanguineus é o vetor primário e reservatório do microorganismo e sua ocorrência está relacionada à distribuição do carrapato (ANDEREG; PASSOS, 1999). A infecção canina provavelmente ocorre quando as secreções salivares do carrapato contaminam o ponto de fixação durante a ingestão de um repasto sanguíneo. Como não há transmissão transovariana de E. canis em carrapatos, as larvas de R. sanguineus não são importantes na transmissão, porém podem se infectar pelo agente, mantendo a infecção até o estágio adulto. Esse carrapato encontra-se preferencialmente em regiões urbanas do país, porém também em menores densidades nas áreas rurais e provavelmente, em todo o território nacional (UENO et al.,2009). A infecção também pode ser introduzida em cães durante transfusões sanguíneas (FRASER, 1996; BREITSCHERDT, 2004). 2.2 MANIFESTAÇAO DA DOENÇA A incubação da erliquiose pode levar de 8 a 20 dias após a infecção, durando de 2 a 4 semanas. A recuperação espontânea pode ocorrer, ficando o animal, portador por vários meses (ANDEREG; PASSOS, 1999; STILES, 2000; URQUHART et al., 1998). A erliquiose causa nos cães, quadro clínico severo, com manifestações clínicas em vários sistemas, variando sua intensidade conforme as fases da doença: aguda, assintomática e crônica (BREITSCHERDT, 2004). A fase aguda, que dura, aproximadamente quatro semanas, o microorganismo se multiplica dentro das células leucocitárias circulantes e dos tecidos fagocitários de fígado, baço e linfonodos, levando a linfadenomegalia, e hiperplasia do fígado e baço. As células infectadas podem se aderir no endotélio vascular, causando vasculite (BREITSCHWERDT, 2004). A fase aguda é comum em áreas
12 11 enzoóticas e rara em outras regiões, durando aproximadamente de duas a quatro semanas, consistindo de sinais clínicos moderados a graves, secundários à hiperplasia linfóide, febre e citopenias (CODNER; ROBERTS; AINSWORTH, 1985; GLAUS; JAGGY, 1992 apud ACCETTA, 2008). Os sinais clínicos que ocorrem geralmente são depressão, fraqueza, anorexia, perda de peso, edema periférico, anemia, febre, sangramento devido à diminuição de plaquetas, infecções bacteriológicas secundárias, pneumonia, glomerulonefrite, artrite, problemas de reprodução, sinais neurológicos e alterações oculares (ORIÁ et al, 2004), relutância ao andar, edema de membros, tosse e dispneia (FRASER, 1996). O diagnóstico é feito observando a mórula em leucócitos durante esta fase, porém em pequeno número e por um curto espaço de tempo (STILES, 2000; URQUHART et al., 1998). A fase assintomática ocorre normalmente de seis a nove semanas após infecção e se caracteriza pela persistência variável da trombocitopenia, em decorrência do sequestro e destruição das plaquetas durante a fase aguda, sem apresentação de sinais clínicos. Os cães quando entram em fase subclínica e não apresentam sintomas e voltam a ganhar peso, parecendo estar saudáveis (ANDEREG; PASSOS, 1999; STILES, 2000). Quase todas as infecções em cães são assintomáticas; pesquisas indicam que de 11 a mais de 50% dos cães possuem anticorpos anti-e. canis (JONES et al., 2000).Podem ficar infectados por um longo período, eliminar o parasita caso sejam imunocompetentes, e se curam espontaneamente ou desenvolvem a fase crônica da doença, com piora do quadro caso essa resposta não seja eficaz contra o microorganismo (BREITSCHERDT, 2004; HARRUS et al., 1998), podendo o animal apresentar sangramento pelas mucosas e conjuntivas, devido à lise plaquetária e supressão medular (ANDEREG; PASSOS, 1999; STILES, 2000). Na fase crônica, os sinais clínicos associados são discretos e ausentes em alguns cães e graves em outros. Não é difícil encontrar em áreas endêmicas, alterações hematológicas decorrentes da infecção por E. canis em cães saudáveis que estejam sendo avaliados para a terapia contra dirofilárias. A trombocitopenia não-encontrada nesses cães pode potencializar a gravidade da hemorragia pulmonar associada ao tromboembolismo. Facilidades para o sangramento, palidez em decorrência de anemia, perda de peso acentuada, debilidade, sensibilidade abdominal, uveíte anterior, hemorragias retinais e sinais neurológicos compatíveis com meningoencefalite, caracterizam cães que desenvolvem manifestações de doença durante a fase crônica. Em decorrência da imunossupressão, infecções bacterianas podem ser comprovadas (BREITSCHWERDT, 2004). Hepatomegalia, esplenomegalia e linfadenopatia são mais detectadas nessa fase (NELSON; COUTO, 2001). A trombocitopenia severa pode causar frequentemente diátese hemorrágica. Em dolicocefálicos, torna-se comum a epistaxe; hematúria, melena e petéquias, e equimoses ocorrem em todas as raças (FRASER, 1996).
13 ACHADOS LABORATORIAIS Alterações laboratoriais graves podem contribuir para o índice de suspeita da doença, como pancitopenia, anemia aplásica, neutropenia ou trombocitopenia, seriam compatíveis com infecção pelo parasita. A trombocitopenia é a alteração hematológica mais consistente, tanto na fase aguda como na fase crônica da doença. Alterações laboratoriais séricas como azotemia pré-renal pode ocorrer durante a fase aguda ou crônica; a azotemia renal desenvolve-se em alguns cães cem consequência de glomerulonefrite grave, causada pela doença crônica (LAPPIN, 2001). Leucopenia, hipergamaglobulinemia, com aumento dos níveis de gamaglobulinas e glicoglobulina no soro, também são achados clínicos observados na doença numa fase mais avançada (JONES et al. 2000). O aumento da fosfatase alcalina, bilirrubina total e AST são encontradas com menor frequência (BREITSCHWERDT, 2004). Anemia normocítica normocrômica é considerada uma alteração comum na erliquiose canina (ALMOSNY et al., 2002; MACHADO, 2004). Os quadros anêmicos observados na doença tendem a ser arregenerativos, com diminuição da resposta medular diante dos estímulos eritropoiéticos (ALMOSNY et al., 2002), provavelmente em decorrência do comprometimento orgânico importante, com diminuição acentuada da resposta medular, mesmo diante destes estímulos (OLIVEIRA et al., 2000). Trombocitopenia é a alteração hematológica mais comum em todas as fases da erliquiose canina (TROY et al., 1980 apud DAGNONE et al., 2003) 2.4 DIAGNÓSTICO E DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL O diagnóstico laboratorial vem sendo realizado como rotina para identificação direta das mórulas de E. canis em amostras de sangue periférico disposto em lâminas, através de inprint, e corados, consorciada aos exames hematológicos (NAKAGHI et al., 2008) se confirmando pela demonstração do microorganismo no interior dos leucócitos, ou por uma combinação de sinais clínicos. A técnica do anticorpo fluorescente indireto (IFI) ou análise imunoabsorvente ligada à enzima (ELISA) estão disponíveis para a detecção dos anticorpos contra espécies de Ehrlichia. A resposta ao tratamento também chega como uma forma de diagnóstico caso não seja possível a realização dos métodos anteriores. Como a trombocitopenia é um achado relativamente consistente, a contagem de plaquetas se torna um teste de triagem importante (BREITSCHWERDT, 2004; FRASER, 1996). Uma identificação dos organismos (mórulas) em citologia de aspiração com agulha fina do baço, dos linfonodos e dos pulmões, em leucócitos nos líquidos cérebro-espinhal e articular, ou em leucócitos no sangue periférico, é confirmatória, mas é demorada e difícil (BIRCHARD E SHERDING, 2003). Recentemente, visando aumentar a sensibilidade e a especificidade do diagnóstico laboratorial, vem sendo utilizada a detecção molecular de E. canis (DAGNONE et al., 2003; BULLA et al., 2004;
14 13 MACIEIRA et al., 2005). Entretanto, na rotina clínica, o diagnóstico ainda é firmado com base na associação entre os sinais clínicos e os resultados de exames hematológicos. O diagnostico diferencial inclui outras causas de febre e linfadenopatia, como febre maculosa, brucelose e endocardite; doenças imunomediadas, intoxicação (FRASER, 1996). O diagnóstico diferencial inclui ainda o Mieloma Múltiplo, Linfoma, Leucemia Linfocítica Crônica, Lúpus Eritematoso Sistêmico, Trombocitopenia Imunomediada e Cinomose. (CORRÊA & CORRÊA, 1992). 2.5 TRATAMENTO E PROFILAXIA Cuidados de suporte devem ser fornecidos quando indicados, assim, deve-se corrigir a desidratação com fluidoterapia e as hemorragias devem ser compensadas pela transfusão sangüínea. Terapia a base de glicocorticóides e antibióticos pode também ser utilizada nos casos em que a trombocitopenia for importante e nos casos de infecções bacterianas secundárias, respectivamente (NELSON; COUTO, 2001; PASSOS et al., 1999). A droga de escolha é a tetraciclina na dose 22mg/kg, trez vezes ao dia durante quatorze dias ou doxiciclina na dose de 5mg/kg a cada doze horas durante 21 dias (BREITSCHERDT, 2004). Na literatura, existem várias indicações de dosagens e tempo de duração do tratamento da Erliquiose utilizando-se a doxiciclina. Os critérios para o tratamento variam de acordo com a precocidade do diagnóstico, da severidade dos sintomas clínicos e da fase da doença que o paciente se encontra quando do início da terapia, recomenda-se nas fases agudas, a dosagem de 5mg/kg, duas vezes por dia, via oral, durante sete a dez dias e, nos casos crônicos 10mg/kg, via oral, durante sete a vinte e um dias (WOODY et al., 1991). O dipropionato de imidocarb (5mg/kg, por via intramuscular) administrado uma ou duas vezes durante duas semanas, foi usado para tratar com sucesso a erliquiose canina (NELSON; COUTO, 2001). O prognóstico para erliquiose canina em geral é bom. Uma melhora clínica espetacular ocorre comumente dentro de 24 a 48 horas após início do tratamento na fase aguda ou crônica moderada da doença. Muitas vezes uma melhora clínica é notada em cães cronicamente infectados; porém, pode ser necessário até um ano para a completa recuperação hematológica. A presença de hemorragia pode colaborar para o óbito desses animais, apesar do inicio do tratamento. Atualmente, nenhuma vacina contra a doença está disponível (BREITSCHERDT, 2004). O controle do R. sanguineus é realizado com pulverizações de carrapaticidas e manutenção das condições de higiene perfeitas (CORRÊA & CORRÊA, 1992).
15 14 3. RELATO DO CASO Em Janeiro de 2011, um cão, macho, da raça Labrador, de onze anos de idade, foi atendido no Consultório Veterinário 18 Q Late em Barra do Piraí, RJ, com histórico de apatia, anorexia e infestação de carrapatos, com relatos do proprietário de que o animal se encontrava quieto e deprimido nos últimos dias (FIGURA 1). Figura 1: animal se mostrando prostrado durante correção hídrica. Ao exame físico, o animal apresentava-se prostrado, com membranas mucosas e escleras ictéricas (FIGURA 2 e 3), epistaxe (FIGURA 4), tempo de preenchimento capilar (TPC) de 5 segundos, grau de desidratação de aproximadamente 10%, normotermico (37,8 C) e frequência cardíaca de 148 BPM. O proprietário relatou que o animal tem acesso à rua e a outros cães, que segundo ele, não tem dono.
16 15 Figura 2: mucosa peniana completamente ictérica Figura 3: porção interna da orelha com coloração ictérica
17 16 Figura 4: sangue coagulado proveniente da cavidade nasal (epistaxe) A colheita de sangue foi efetuada, após consentimento do proprietário, por punção da veia cefálica. A amostra de sangue foi colocada em tubos de vidro, identificada e mantidas sob refrigeração até a chegada ao laboratório, Os exames solicitados foram hemograma completo com contagem de plaquetas, pesquisa de hematozoário, glicose, ALT, ureia e creatinina. Posteriormente, foi iniciado o tratamento a base de fluidoterapia com solução de cloreto de sódio 0,9%, glicose a 50% e vitaminas do complexo B. Após o resultado do hemograma, representado na Tabela 1, o animal foi encaminhado pra internação para tratamento e acompanhamento hematológico. Durante a internação o animal foi tratado com fluidoterapia de solução de cloreto de sódio 0,9%, glicose 50%, corticosteroide, vitaminas do complexo B, furosemida e doxiciclina injetável na dose de 10 mg/kg. Uma dose de dipropionato de imidocarb foi feita por via subcutânea no animal no terceiro dia, na dose de 5 mg /Kg e o proprietário, por motivos pessoas preferiu levar o animal. Como protocolo terapêutico, de responsabilidade do proprietário realizar, foi instituído doxiciclina na dose de 10mg/kg a cada 12 horas, via oral, durante 28 dias, complexo B associado a ferro, via oral, totalizando dois ml a cada 24 horas, durante 30 dias e prebiótico com probiótico.
18 17 TABELA 1: Exames laboratoriais realizados no dia da consulta e nos outros dois dias consecutivos para avaliação hematológica e bioquímica Valor Valor Valor Valor de referência Eritrograma apresentado Dia 1 apresentado Dia 2 apresentado Dia 3 Eritrócitos 2,80 milhões 3,08 milhões 4,20 milhões 5,5-8,5 milhões Hemoglobina 5,6 g/dl 6,2 g/dl 8,5 g/dl 12,0-18,0 g/dl Hematócrito 16,4 % 17,9 % 23,4 % % VGM 58,6 micra³ 58,1 micra³ 55,7 micra³ 60,0-75,0 micra³ HGM 20,0 pg 20,1 pg 20,2 pg 19,5-26 pg CHGM 34,2 % 34,6 % 36,3 % 31,0-37,0 Plaquetas /mm³ /mm³ /mm³ /mm³ Leucograma Leucócitos Eosinófilos 03 % (243) 04 % (596) 02 % (274) 2-10 % Bastões 07 % (567) 06 % (894) 05 % (685) 0-3 % Segmentados 64 % (5184) 74 % (11026) 71 % (9727) % Linfócitos 24 % (1944) 14 % (2086) 17 % (2329) % Monócito 02 % (162) 02 % (298) 5 % (685) 3-10 % Bioquímica Glicose 83 mg/dl 92 mg/dl 89 mg/dl mg/dl ALT 80 UI/L 74 mg/dl 78 mg/dl UI/L Ureia 414 mg/dl 354 mg/dl 145 mg/dl mg/dl Creatinina 6,20 mg/dl 4,43 mg/dl 1,56 mg/dl 0,5-1,5 mg/dl Pesquisa de Hematozoários Positiva para Ehrlichia Positiva para Ehrlichia Negativa para Ehrlichia *Valores de referência segundo Viana (2007) Nos dois dias consecutivos o hemograma com contagem de plaquetas, pesquisa de hematozoário, ureia e creatinina foi repetido, conforme verificado na Tabela 1 e foi realizada uma ultrassonografia abdominal, no qual foi evidenciado um aumento do baço.
19 18 4. DISCUSSÃO O proprietário retornou com o animal três semanas depois para a revisão. O cão apresentava significativa melhora, segundo o proprietário estava se alimentando bem, ativo e com ganho de peso. Foi coletado sangue para mais um hemograma (TABELA 2) e o proprietário foi orientado a continuar o tratamento conforme receitado. Considerando os limites mínimos de hematócrito e hemoglobina para realização de uma transfusão, no cão, hematócrito menor que 15%, o procedimento não foi indicado. Pelos resultados laboratoriais dos dias 1, 2 e 3 verificou-se uma anemia microcítica normocrômica Avaliando o perfil renal observou-se um aumento de ureia e creatinina. Essa elevação sérica de ureia e creatinina podem estar relacionadas à azotemia pré-renal, principalmente nos animais com desidratação severa, que foi o caso deste animal com um grau de desidratação estimado de 10% ao exame clínico. A alanina aminotransferase (ALT) se encontrou elevada, possivelmente dano hepático ou de estresse sistêmico provocado pela doença (ALMOSNY, 2002). No presente caso, o animal apresentou epistaxe, sugerindo um prognóstico desfavorável devido ao quadro grave de trombocitopenia observado nos exames laboratoriais (Tabela 1). De acordo com Corrêa & Corrêa (1992) esse quadro hemorrágico é relatado em 35% dos animais com a doença e raramente se observa quadros de icterícia, mas quando se apresenta indica que o animal pode estar concomitantemente com Babesiose. Nos exames laboratoriais realizados não foi visualizado a mórula de Babesia sp. A terapia realizada com Doxiciclina é a de eleição nos tratamentos da Erliquiose em todas as suas fase, sua vida média no soro de cães é de 10 a 12 horas, sendo absorvida com rapidez quando administrada por via oral. É mais lipossolúvel e penetra nos tecidos e fluídos corporais melhor que o cloridrato de tetraciclina e a oxitetraciclina. A eliminação da doxiciclina se dá primariamente através das fezes por vias não biliares, na forma ativa. Sendo assim, a mesma não se acumula em pacientes com disfunção renal e por isso pode ser usada nesses animais sem maiores restrições como foi no presente estudo devido ao comprometimento renal com a elevação da ureia e creatinina (WOODY et al., 1991). Na literatura, existem várias indicações de dosagens e tempo de duração do tratamento da Erliquiose utilizando-se a doxiciclina. Os critérios para o tratamento variam de acordo com a precocidade do diagnóstico, da severidade dos sintomas clínicos e da fase da doença que o paciente se encontra quando do início da terapia, recomenda-se nas fases agudas, a dosagem de 5mg/kg, duas vezes por dia, via oral, durante sete a dez dias e, nos casos crônicos 10mg/kg, via oral, durante 7 a 21 dias (WOODY et al., 1991). O dipropionato de imidocard (IMIZOL ), administrado em dosagem de 5 mg/kg, via subcutânea, e repetido em quinze dias, é altamente efetivo em cães com Erliquiose refratária e em cães com
20 19 infecções mistas por Ehrlichia canis e a Babesia canis segundo Couto (1998). Desta forma, se o animal estivesse com babesiose, a recuperação é justificada pelo uso deste fármaco. Outras drogas possam ser utilizadas como tetraciclinas, cloranfenicol, oxitetraciclinas. De acordo com Troy & Forrester (1990) o prognóstico é mais favorável com o uso de Dipropionato de imidocard. quando o tratamento é iniciado precocemente. No presente estudo, optou-se por administrar a doxiciclina duas a três horas antes ou após a alimentação para que não ocorram alterações na absorção durante 28 dias. Estudos relizados por Woody et al. (1991) sugerem que o tratamento pode ter duração de três a quatro semanas nos casos agudos e até oito semanas nos casos crônicos. Frequentemente deverá ser fornecido um tratamento de suporte, principalmente nos casos crônicos e corrigir a desidratação com fluidoterapia no intuito de evitar complicações renais como evidenciadas nesse caso clínico. As hemorragias severas causadas pela trombocitopenia devem ser compensadas pela transfusão sanguínea, porém essa decisão deve ser tomada pelo veterinário após o exame clínico juntamente com avaliação de parâmetros hematológicos tais como hematócrito, hemoglobina e contagem de reticulócitos Felizmente não foi necessário neste estudo. Terapia a base de glicocorticóides e antibióticos pode também ser utilizada nos casos em que a trombocitopenia for importante e nos casos de infecções bacterianas secundárias, respectivamente (PASSOS et al., 1999). Como nos cães anoréxicos, podem-se utilizar vitaminas do complexo B como estimulantes inespecíficos do apetite ou diazepam, intravenoso ou oral, antes de oferecer o alimento. Hormônios androgênicos como o Stanozolol (metilandrostenol) e o Oxymethalone (hidróxi-metil diostrano) podem ser utilizados para estimular a medula óssea (CORRÊA & CORRÊA, 1992). A terapia com glicocorticóides por um curto período de dois a sete dias pode ser de grande valor no início do tratamento, quando estiver ocorrendo trombocitopenia, já que um mecanismo imunomediado pode ser a causa dessa queda plaquetária. Pode ser utilizado também em casos de poliartrite crônica (TROY & FORRESTER, 1990).
21 20 TABELA 2: Exame laboratorial realizado após 21 dias de tratamento. Eritrograma Valor apresentado Valor de referência Eritrócitos 5,80 milhões 5,5-8,5 milhões Hemoglobina 13,2 g/dl 12,0-18,0 g/dl Hematócrito 38,6 % % VGM 66,5 micra³ 60,0-75,0 micra³ HGM 22,7 pg 19,5-26 pg CHGM 34,2 % 31,0-37,0 Plaquetas /mm³ /mm³ Leucograma Leucócitos Eosinófilos 04 % (468) 2-10 % Bastões 02 % (234) 0-3 % Segmentados 67 % (7839) % Linfócitos 24 % (2808) % Monócito 3 % (351) 3-10 % ALT 38 UI/L UI/L Ureia 22 mg/dl mg/dl Creatinina 1,5 mg/dl 0,5-1,5 mg/dl Pesquisa de Hamatozoário Negativa para Ehrlichia *Valores de referência segundo Viana (2001) 5. CONCLUSÃO Deste estudo pode-se concluir que o exame clínico apurado juntamente com o diagnóstico precoce da doença é fundamental para o sucesso terapêutico. Tendo em vista a melhora do quadro do paciente, frente aos dados de anamnese fornecidos pelo proprietário, exames clínicos e complementares realizados, pôde-se chegar ao diagnóstico de erliquiose canina. Quadro clínico de anorexia, pirexia, esplenomegalia, hemorragias e presença de carrapato em conjunto com anemia e trombocitopenia são na maioria das vezes diagnosticados como Ehrlichiose, embora a presença do parasito e avaliação do hemograma completo seja essencial para o diagnóstico. A terapêutica com doxiciclina e dipropionato de imidocarb foi satisfatória para o tratamento da Erliquiose e o controle de carrapato no cão e no ambiente é essencial na profilaxia da doença.
22 21 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACCETTA, E. M. T.; Ehrlichia canis e Anaplasma platys em cães (canis familiaris, linnaeus, 1758) trombocitopênicos da região dos lagos do Rio de Janeiro, Dissertação (mestrado) Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Curso de Pós-Graduação em Medicina Veterinária. f , ALMOSNY, N. R. P. Hemoparasitoses em Pequenos Animais Domésticos e como Zoonoses. 1ed. Rio de Janeiro: L. F. Livros de Veterinária. 135p, ANDEREG, P. I.; PASSOS, L. M. F. Canine ehrlichiosis. Clínica Veterinária, v.19, p.31-8, BARR, S. C. Erliquiose. In: TILLEY, L. P. SMITH, F. K. Consulta veterinária em 5 minutos espécies canina e felina. Ed. Manole, p. 665, 2003 BREITSCHWERDT, E. B. Riquetisioses. In: ETTINGER, S. J.; FELDMAN, E. C. Tratado de medicina interna veterinária. V.1, 5ª ed. São Paulo: Manole, Cap. 86, p BULLA, C. et al. The relationship between the degree of thrombocytopenia and infection with Ehrlichia canis in an endemic area. Veterinary Research, v. 35, n. 1, p , CORRÊA, W. M.; CORRÊA, C..N. M. Outras rickettsioses. Enfermidades infecciosas dos mamíferos domésticos. 2ª ed. Rio de Janeiro, 1992, cap.48, p DAGNONE, A. S. et al. Ehrlichiosis in anemic, thrombocytopenic, or tick-infested dogs from a hospital population in south Brazil. Veterinary Parasitology, v. 117, n. 4, p , DUMLER, J.S. et al. Reorganization of genera in the families Rickettsiaceae and Anaplasmataceae in the order Rickettsiales: unification of some species of Ehrlichia with Anaplasma, Cowdria with Ehrlichia and Ehrlichia with Neorickettsia, descriptions of six new species combinations and designation of Ehrlichia equi and HGE agent as subjective synonyms of Ehrlichia phagocytophila. Int J Syst Evol Microbiol, v.51, p , FRASER, 1996 Manual Merck de Veterinária: um manual de diagnóstico, tratamento, prevenção e controle de doenças para o veterinário. Clarence M. Fraser, editor. 7. Ed. São Paulo: Roca, HARRUS, S.; WARNER, T.; AIZENBERG, I.; FOLEY, J.; POLANO, A.M.; BARN, H. Amplification of Ehrlichial DNA from dogs 34 months after infection with Ehrlichia canis. Journal of Clinical Microbiology, v.36, p.40-2, JONES, T. C.; HUNT, R. D.; KING, N. W. Patologia Veterinária. 6. Ed. Tamboré: Manole LABRUNA, M. B.; PEREIRA, M. C. Carrapatos em cães no Brasil. Clinica Veterinaria, v. 30, p , LAPPIN, M. R. Doenças riquetsianas polissistêmicas. In: NELSON, R. W.; COUTO, C. G. Medicina Interna de Pequenos Animais. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, p MACHADO, R. Z. Erliquiose Canina. XXIII Congresso Brasileiro de Parasitologia Veterinária & I Simpósio Latino-Americano de Rickettsioses. Ouro Preto MG MACIEIRA, D. B. et al. Prevalence of Ehrlichia canis infection in thrombocytopenic dogs from Rio de Janeiro, Brazil. Veterinary Clinical Pathology, v. 34, n. 1, p. 44-8, NAKAGHI, A. C. H. et al. Canine ehrlichiosis: clinical, hematological, serological and molecular aspects. Ciência Rural, Santa Maria, v.38, n.3, p , Mai./Jun., 2008.
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