RELATÓRIO. Apelação Cível nº fl. 2
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- Débora Sales Gomes
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1 APELAÇÃO CÍVEL Nº , DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA 2ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA, FALÊNCIAS E RECUPERAÇÃO JUDICIAL. Apelante 1: MARIA NASCIMENTO DE GOUVEIA E OUTROS Apelante 2: HOMERO BARBOSA NETO Apelante 3: MUNICÍPIO DE LONDRINA Apelante 4: CETEL CONSTRUÇÕES ELÉTRICAS LTDA Apelados: OS MESMOS Relator: DES. NILSON MIZUTA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO POPULAR. DESAFETAÇÃO DE BEM DE USO COMUM DO POVO E POSTERIOR DOAÇÃO, COM ENCARGOS, PARA EMPRESA PRIVADA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CARÊNCIA DE AÇÃO RECONHECIDA. NECESSIDADE DA PRESENÇA DO BINÔMIO ILEGALIDADE- LESIVIDADE. INEXISTÊNCIA DE LESIVIDADE AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. FECHAMENTO DE VIELA PÚBLICA. PREJUÍZO SOMENTE DE ALGUNS ADMINISTRADOS, QUE TERÃO DE CAMINHAR MAIS PARA ALCANÇAR O OUTRO LADO DA QUADRA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. APELAÇÃO 1 PREJUDICADA. APELAÇÃO 2 PROVIDA. APELAÇÃO 3 PREJUDICADA. APELAÇÃO 4 PREJUDICADA. Página 1 de 12
2 Apelação Cível nº fl. 2 Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº , do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Londrina 2ª Vara da Fazenda Pública, Falências e Recuperação Judicial, em que são apelante 1 MARIA NASCIMENTO DE GOUVEIA E OUTROS, apelante 2 HOMERO BARBOSA NETO, apelante 3 MUNICÍPIO DE LONDRINA, apelante 4 CETEL CONSTRUÇÕES ELÉTRICAS LTDA, e apelados OS MESMOS. RELATÓRIO Maria Nascimento de Gouveia e outros ajuizaram ação popular em face de Município de Londrina e Cetel Construções Elétricas Ltda. Alegaram que o Município de Londrina, através da Lei Municipal nº /2011 desafetou do uso comum do povo as terras de 250 m², constituídas pelas vielas A, B, C e D existentes entre as quadras V e XII, entre a rua Deputado Ardinal Ribas e a rua do Aço, no Jardim São Francisco de Assis, em Londrina. Após a desafetação, a área foi doada à empresa Cetel Construções Elétricas Ltda, para que esta ampliasse suas atividades. Relatou que, durante o processo administrativo, inicialmente, o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina - IPPUL emitiu parecer contrário à doação, pela ausência de concordância dos moradores. Posteriormente, com a Página 2 de 12
3 Apelação Cível nº fl. 3 apresentação, pela Cetel, de documento com algumas assinaturas de moradores lindeiros, o IPPUL mudou seu posicionamento. Afirmaram que o fechamento da viela está causando prejuízo aos moradores, que utilizavam a viela para ir ao ponto de ônibus, escola, padaria e igreja, motivo pelo qual requerem a anulação do ato administrativo. Pleitearam a concessão de tutela antecipada com o fim de suspender os efeitos do processo administrativo nº 19320/2009, que resultou na doação da área a Cetel Construções Elétricas Ltda. No mérito, requereram a declaração de ilegalidade do ato. A liminar pretendida não foi concedida (fls. 92/95). às fls. 117/142. O Município de Londrina apresentou contestação contestação às fls. 396/411. Cetel Construções Elétricas Ltda apresentou O MM. Juiz determinou a citação do Prefeito Municipal Homero Barbosa Neto e do então Secretário de Governo Marco Antônio Cito, como litisconsortes passivos. contestação às fls. 739/754. Citado, Homero Barbosa Neto apresentou Sobreveio sentença na qual o MM. Juiz julgou procedentes os pedidos iniciais, e declarou a ilegalidade e inconstitucionalidade do ato de doação com encargo, com Página 3 de 12
4 Apelação Cível nº fl. 4 consequente restituição do domínio da área ao Município e condenação dos réus à abertura das vielas, no prazo de 30 dias. Ainda, condenou os réus ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de R$ 1.000,00. Contra essa sentença, Maria Nascimento de Gouveia e outros interpõe apelação buscando somente a majoração dos honorários advocatícios para R$ 5.000,00. Homero Barbosa Neto interpõe apelação às fls. 854/877. Alega cerceamento de defesa em razão do indeferimento da prova pretendida, com o julgamento antecipado da lide. Sustenta que o julgamento foi extra petita, pois na petição inicial não se impugnou a motivação do ato administrativo que culminou na doação da área, não podendo ser fundamento para a sentença. Defende a nulidade da sentença por ausência de formação do litisconsórcio passivo necessário, pois a Câmara Municipal de Vereadores, que aprovou o projeto de lei em discussão, e a Companhia de Desenvolvimento de Londrina CODEL deveriam integrar a lide. Afirma que a Lei nº 8.666/93, em seu artigo 17, estabelece que é possível a alienação de bens públicos na hipótese de existência de interesse público. Relata que também existe expressa autorização legislativa, pois a Lei Municipal nº /2001 expressamente desafetou o bem e autorizou sua doação à CETEL. Sustenta que o interesse público que justificou a doação está consubstanciado na geração de novos empregos e aumento da arrecadação de impostos com a expansão das atividades da donatária, erradicação dos crimes que vinham Página 4 de 12
5 Apelação Cível nº fl. 5 ocorrendo na área doada, que servia de abrigo para marginais e ponto de venda de drogas. Alega manifesta ausência de ato ilegal e lesividade ao erário a fim de justificar a interposição de ação popular. Requer o provimento do recurso, com reforma da sentença apelada. O Município de Londrina interpõe apelação às fls. 880/893. Alega a ocorrência de cerceamento de defesa ante o indeferimento da produção das provas requeridas. Afirma que o artigo 78 da Lei Orgânica do Município de Londrina autoriza a alienação de bens municipais, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado. Já a Lei nº 8.666/93 permite a dispensa de licitação para a doação com encargo no caso de interesse público devidamente justificado. Defende que a doação gerou benefícios a toda coletividade, não podendo ser anulada em razão de alguns moradores, que utilizavam a viela como um atalho, terem de andar mais para chegar de uma quadra a outra. O direito dos moradores em preservar a viela para seu uso tem caráter individual, não podendo se sobrepor ao interesse público devidamente comprovado. Sustenta que não há impedimento para a desafetação de bens públicos, inclusive quanto aos de uso comum. Requer o provimento do recurso, com reforma da decisão recorrida. Cetel Construções Elétricas Ltda apresentou recurso às fls. 895/914. Defende a ocorrência de cerceamento de defesa ante o requerimento de produção de provas por todas as partes. Afirma que existe previsão legislativa municipal que autoriza a alienação de bens de uso comum do povo, desde que Página 5 de 12
6 Apelação Cível nº fl. 6 devidamente justificado o interesse público e mediante autorização legislativa, o que ocorreu no presente caso. Sustenta que foram respeitadas as normas gerais de licitação, previstas na Lei nº 8.666/93. Salienta que houve apenas o fechamento de uma viela, e não de vias públicas. Narra que no processo administrativo fora devidamente demonstrado o interesse público. Alega a ocorrência de julgamento extra petita e inexistência de lesividade ao patrimônio público. Pugna pelo conhecimento e provimento do recurso. O Município de Londrina apresentou contrarrazões às fls. 936/942, Homero Barbosa Neto apresentou contrarrazões às fls. 948/953, Cetel Construções Elétricas Ltda apresentou contrarrazões às fls. 956/959. O Ministério Público de primeiro grau se manifestou pelo conhecimento e desprovimento dos recursos (fls. 974/991). A Douta Procuradoria Geral de Justiça se manifestou pelo conhecimento e não provimento dos recursos (fls. 14/28). VOTO Inicialmente, todos os recursos devem ser conhecidos, ante a presença dos pressupostos de admissibilidade. NETO RECURSO INTERPOSTO POR HOMERO BARBOSA Página 6 de 12
7 Apelação Cível nº fl. 7 ato ilegal e lesividade ao erário. Alega a inadequação da via eleita, por ausência de Razão lhe assiste. Dispõe o art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal, que serão objeto de ação popular os atos nulos que causem lesão ao patrimônio público: LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; Ainda, o art. 1º da Lei nº 4.717/65 estabelece o âmbito de impugnação da ação popular: Art. 1º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista (Constituição, art. 141, 38), de sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou Página 7 de 12
8 Apelação Cível nº fl. 8 fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos. 1º - Consideram-se patrimônio público para os fins referidos neste artigo, os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. Desses dispositivos extrai-se que, para o ajuizamento da ação popular, é necessária a demonstração do binômio ilegalidade-lesividade. Segundo Hely Lopes Meirelles, o terceiro requisito da ação popular é a lesividade do ato ao patrimônio público. Na conceituação atual, lesivo é todo ato ou omissão administrativa que desfalca o erário ou prejudica a Administração, assim como o que ofende bens ou valores artísticos, cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade. (...) Assim, exige-se o binômio ilegalidade/lesividade para a propositura da ação, dando-se tão somente sentido mais amplo à lesividade, que pode não importar prejuízo patrimonial, mas lesão a outros valores, protegidos pela Constituição. 1 1 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança e Ações Constitucionais. 34ª ed. São Paulo: Malheiros, p Página 8 de 12
9 Apelação Cível nº fl. 9 Ainda, afirma o autor, que a ação popular é um instrumento de defesa dos interesses da coletividade, não se amparando direitos individuais próprios. O beneficiário direito da ação popular não é o autor, mas sim o povo, titular de um direito subjetivo. 2 No caso em tela, apesar da alegada ilegalidade do ato administrativo que culminou na doação, com encargos, de bem público, não está demonstrada a lesividade ao patrimônio público. Afirmam os autores da ação popular que o fechamento da viela, área que foi doada à Cetel, lhes causou prejuízos, pois agora têm de caminhar mais 500 metros para alcançarem outros quarteirões. Evidentemente, esse prejuízo alegado pelos autores não demonstra a lesividade ao patrimônio público, no qual se incluem os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. A ação popular não constitui instrumento processual adequado à declaração de nulidade de ato administrativo tão-somente em razão de prejuízos, em tese, causados aos administrados. A única consequência da doação realizada pelo Município foi o fechamento de uma viela, não havendo que se falar em nenhum prejuízo ao patrimônio público. 2 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança e Ações Constitucionais. 34ª ed. São Paulo: Malheiros, p Página 9 de 12
10 Apelação Cível nº fl. 10 Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, sobre a necessidade de demonstração de lesão ao patrimônio público como condição para a propositura da ação popular: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO POPULAR. ANULAÇÃO DE TESTAMENTO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AFASTAMENTO DA MULTA IMPOSTA. SÚMULA Nº 98. (...) 2. Para que o ato seja sindicável mediante ação popular, deve ele ser, a um só tempo, nulo ou anulável e lesivo ao patrimônio público, no qual se inclui "os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico". Com efeito, mostra-se inviável deduzir em ação popular pretensão com finalidade de mera desconstituição de ato por nulidade ou anulabilidade, sendo indispensável a asserção de lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público. (...) 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido. (REsp /RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/10/2009, DJe 26/10/2009) Ainda, verifica-se dos autos que os benefícios gerados à coletividade são superiores aos prejuízos causados a alguns moradores. Para a realização da doação, a empresa se comprometeu a criar, no mínimo, mais 4 empregos diretos e deslocar sete postes da rede elétrica para viabilizar a pavimentação asfáltica na rua Jaçanã. Além disso, com a expansão das atividades da donatária, seria aumentado em R$ ,00 a arrecadação de impostos pelo Município. Já a área doada foi avaliada em R$ Página 10 de 12
11 Apelação Cível nº fl ,00, conforme consta no processo administrativo nº PAL/SMGP-0012/2011. Também, verifica-se do abaixo assinado de fls. 176/178 que muitos moradores foram favoráveis à doação. Portanto, ante a ausência de lesividade ao patrimônio público, deve ser extinta a presente ação, sem resolução de mérito, por carência das condições específicas da ação popular. Com a extinção do feito sem resolução de mérito ficam prejudicadas as outras apelações interpostas. Sobre os ônus de sucumbência na ação popular, dispõe o art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal: LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; No caso dos autos, em virtude da não comprovação da má-fé dos autores, não há que se falar em condenação ao pagamento das custas e honorários advocatícios de sucumbência. Página 11 de 12
12 Apelação Cível nº fl. 12 Do exposto, voto no sentido de dar provimento a apelação interposta por HOMERO BARBOSA NETO, para extinguir o feito sem resolução de mérito em virtude da carência de ação; e julgar prejudicadas as apelações interpostas por MARIA NASCIMENTO DE GOUVEIA E OUTROS, MUNICÍPIO DE LONDRINA e CETEL CONSTRUÇÕES ELÉTRICAS LTDA. ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento a apelação interposta por HOMERO BARBOSA NETO, para extinguir o feito sem resolução de mérito em virtude da carência de ação; e julgar prejudicadas as apelações interpostas por MARIA NASCIMENTO DE GOUVEIA E OUTROS, MUNICÍPIO DE LONDRINA e CETEL CONSTRUÇÕES ELÉTRICAS LTDA. A Sessão foi presidida pelo Senhor Desembargador NILSON MIZUTA, com voto, e participaram do julgamento os Senhores Desembargadores CARLOS MANSUR ARIDA e LEONEL CUNHA. Curitiba,09 de dezembro de NILSON MIZUTA Relator Página 12 de 12
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