MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO

Transcrição

1 Processo PGT/CCR/ICP/Nº 13120/2014 Câmara de Coordenação e Revisão Origem: PRT 2ª Região. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Interessados: 1. Fábio Oliveira Freitas 2. CREA/SP Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo. Assunto: Trabalho na Administração Pública Procuradora Oficiante: Dr. Ana Elisa Alves Brito Segatti. RECURSO ADMINISTRATIVO. PROMOÇÃO DE ARQUIVAMENTO PARCIAL. RECURSO PREMATURO. NÃO OCORRÊNCIA. REVISÃO DE TESE ADOTADA. IGUALDADE DE OPORTUNIDADE E DISCRIMINAÇÃO NAS RELAÇÕES DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE SITUAÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO POSITIVA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Assim como ocorre na sentença judicial, a apreciação prévia e da notícia de fato pode ser dividida em capítulos, devendo estes ser entendidos como as partes em que ideologicamente se decompõe, contendo, cada uma delas, a análise de uma pretensão distinta. Ou seja, óbice não há em arquivar um tema e prosseguir na investigação de outro, menos ainda, em submeter à instância revisora os fundamentos que conduzem a decisão de arquivar, sob pena de eventual prejuízo, pelo decurso do prazo, à parte interessada. 2. Como a presente notícia de fato se dividia em dois capítulos, quais sejam: adaptação/acessibilidade ao meio ambiente de trabalho (1) e igualdade de oportunidade e discriminação nas relações de trabalho (2), o recurso referente a um dos capítulos da apreciação prévia de promoção de indeferimento de instauração de inquérito civil deve ser conhecido, vez que representa uma questão de fato autônoma, sendo independente em relação ao outro capítulo, passível de ser mantido ou reformado sem prejuízo deste. O STF já vem encampando tal tese, a exemplo do que fora adotado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, no RE /DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 23/03/2014. No mesmo sentido também entende o TST, aplicando o entendimento da divisão de pronunciamento decisórios em capítulos no tocante a ação rescisória, nos termos da súmula 100 do TST. 3. Inicialmente, urge salientar que o atual cenário do Ordenamento Jurídico Brasileiro revela uma preocupação em resguardar e garantir a inclusão das pessoas com deficiência, tendo sido editada uma série de normas sobre o assunto, a exemplo da Lei 7.853/89 e o Decreto 3298/99. 1

2 4. Assim, nos termos do art. 34 da Decreto 3298/99, percebe-se que a pessoa com deficiência pode ser inserida no mercado de trabalho em igualdade de condições com as demais, fato que se denomina COLOCAÇÃO COMPETITIVA, ou ser incorporada ao sistema laboral sob condições especiais, o que se denomina COLOCAÇÃO SELETIVA. 5. No presente caso, restou demonstrado que o denunciante foi inserido nos quadros laborais do CREA-SP mediante a colocação competitiva, por meio de concurso público, fato que obsta a pretensão do denunciante de lhe ser disponibilizado apoios especiais, conforme fora minunciosamente explicado às fls.54/ Assim, como a empresa é obrigada a fornecer horários diferenciados apenas a quem foi admitido aos quadros mediante colocação seletiva, havendo, nessas situações, proporcionalidade de salários, não houve irregularidade na conduta do CREA-SP que não concedeu horário diferenciado ao denunciante e não o abonou da compensação dos meio-expedientes. Além disso, conforme consta nas fls.35v e 36, a médica do trabalho da empresa atestou que não encontrou substrato clínico que impedisse o denunciante de realizar tal compensação, afirmando que ele estaria apto a realiza-la. 7. Como não há nenhuma situação apta a acarretar uma discriminação positiva em favor do denunciante, foi-lhe aplicado o mesmo regramento imposto aos demais empregados, estando tal conduta em perfeita sintonia com o princípio da isonomia. 8. O voto é pelo conhecimento e não provimento do Recurso Administrativo, homologando a promoção de arquivamento. Relatório Trata-se de notícia de fato que teve origem com denúncia formulada por Fábio Oliveira de Freitas, em face do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo. Da citada denúncia, foram originadas duas notícias de fato, sendo o objeto desta análise a notícia de número /09, que averigua os fatos relacionados a adaptação e acessibilidade ao meio ambiente de trabalho e igualdade de oportunidade e discriminação nas relações de trabalho, envolvendo pessoa com deficiência (jornada de trabalho). Na linha do procedimento, o membro oficiante determinou a instauração do inquérito civil no tocante a um dos temas, qual seja: adaptação e acessibilidade ao meio 2

3 ambiente de trabalho, entendendo, no que tange a outra temática, indeferir liminarmente a instauração do inquérito, igualdade de oportunidade e discriminação nas relações de trabalho. Quanto ao último tema citado, aduz o denunciante que é vítima de discriminação pelo CREA-SP, que este se recusa a promover qualquer tipo de adaptação razoável em relação às suas reais possibilidades de cumprimento de horário e de deslocamento. Alega que a citada instituição o obriga a realizar compensação de jornada, sob pena de desconto de salário, impondo-lhe o mesmo ritmo de trabalho exigido dos demais empregados, bem como que está impossibilitado de realizar tratamento fisioterápico de um problema que possui na lombar, conforme fls. 3/4. A procuradora do Trabalho Dra. Ana Elisa Alves Brito Segatti promoveu o arquivamento com relação a igualdade de oportunidade discriminação na relação de trabalho, por entender que não havia qualquer conduta irregular por parte do CREA-SP, que não estava obrigado a conceder jornada diferenciada ao denunciante. O denunciante, Sr. Fábio Oliveira de Freitas, interpôs Recurso Administrativo em face da decisão de arquivamento com relação ao capítulo concernente à discriminação na relação de trabalho da pessoa deficiente, em que, em suma, mantém os mesmos argumentos expostos na denúncia. O procurador oficiante manteve a proposta de indeferimento parcial de instauração de inquérito civil, reportando-se aos fundamentos expostos na sua decisão de fls.50/64, bem como ponderou que não seria o caso sequer de conhecimento do recurso, já que se trata de arquivamento parcial, conforme entendimento da Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público. Admissibilidade Foram oferecidas contrarrazões às fls. 100 a 104. É o Relatório. CONHEÇO do Recurso Administrativo, atendido o prazo de 10 (dez) dias previsto no artigo 5º, parágrafo primeiro, da Resolução 69/2007/CSMPT, visto que a notificação do recorrente se deu em (segunda-feira), tendo o recurso sido protocolado no dia (segunda-feira). Demais disso, no tocante ao fato de não se poder conhecer recurso oriundo de arquivamento parcial, conforme entendimento da CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, entendo que referida tese deve ser revista, mormente pela aplicação analógica da tese do caráter fragmentário das decisões judiciais, a exemplo do que fora adotado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, no RE /DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 23/03/

4 Isso porque, assim como ocorre na sentença judicial, a apreciação prévia e da notícia de fato pode ser dividida em capítulos, devendo estes ser entendidos como as partes em que ideologicamente se decompõe, contendo, cada uma delas, a análise de uma pretensão distinta. Ou seja, óbice não há em arquivar um tema e prosseguir na investigação de outro, menos ainda, em submeter à instância revisora os fundamentos que conduzem a decisão de arquivar, sob pena de eventual prejuízo, pelo decurso do prazo, à parte interessada. Como a presente notícia de fato se dividia em dois capítulos, quais sejam: adaptação/acessibilidade ao meio ambiente de trabalho (1) e igualdade de oportunidade e discriminação nas relações de trabalho (2), o recurso referente a um dos capítulos da apreciação prévia de promoção de indeferimento de instauração de inquérito civil deve ser conhecido, vez que representa uma questão de fato autônoma, sendo independente em relação ao outro capítulo, passível de ser mantido ou reformado sem prejuízo deste. Em outras palavras, cada capítulo da notícia de fato é como se representasse uma notícia de fato independente, apesar de estar em um mesmo documento. No mesmo sentido também entende o TST, aplicando o entendimento da divisão de pronunciamento decisórios em capítulos no tocante a ação rescisória, nos termos da súmula 100 do TST. Fundamentação Inicialmente, urge salientar que o atual cenário do Ordenamento Jurídico Brasileiro revela uma preocupação em resguardar e garantir a inclusão das pessoas com deficiência, tendo sido editada uma série de normas sobre o assunto, a exemplo da Lei 7.853/89 e o Decreto 3298/99. Assim, nos termos do art. 34 da Decreto 3298/99, percebe-se que a pessoa com deficiência pode ser inserida no mercado de trabalho em igualdade de condições com as demais, fato que se denomina COLOCAÇÃO COMPETITIVA, ou ser incorporada ao sistema laboral sob condições especiais, o que se denomina COLOCAÇÃO SELETIVA. No presente caso, restou demonstrado que o denunciante foi inserido nos quadros laborais do CREA-SP mediante a colocação competitiva, por meio de concurso público, fato que obsta a pretensão do denunciante de lhe ser disponibilizado apoios especiais, conforme fora minunciosamente explicado às fls.54/60. Assim, como a empresa é obrigada a fornecer horários diferenciados apenas a quem foi admitido aos quadros mediante colocação seletiva, havendo, nessas situações, proporcionalidade de salários, não houve irregularidade na conduta do CREA-SP que não concedeu horário diferenciado ao denunciante e não o abonou da compensação dos meioexpedientes. 4

5 Além disso, conforme consta nas fls.35v e 36, a médica do trabalho da empresa atestou que não encontrou substrato clínico que impedisse o denunciante de realizar tal compensação, afirmando que ele estaria apto a realiza-la. Como não há nenhuma situação apta a acarretar uma discriminação positiva em favor do denunciante, foi-lhe aplicado o mesmo regramento imposto aos demais empregados, estando tal conduta em perfeita sintonia com o princípio da isonomia. Anote-se que, no tocante ao tratamento fisioterapêutico, não haveria necessidade de ser deferida jornada de trabalho diferenciada, vez que é plenamente possível que o denunciante apresente os atestados médicos respectivos à empresa, solicitando, assim, o abono dos atrasos relacionados com o seu tratamento e, caso este fosse indeferido, a via correta para a sua implementação seria o ajuizamento de demanda individual na justiça do trabalho, e não a atuação administrativa do Ministério Público do Trabalho. Portanto, nego provimento ao Recurso Administrativo, homologando o arquivamento proposto, tendo em vista a ausência de qualquer prática ilegal por parte do CREA-SP que, em nenhum momento, adotou postura anti-discriminatória e inclusiva. Voto: nos termos da fundamentação acima exposta, voto pelo conhecimento e não provimento do Recurso Administrativo, homologando a promoção de arquivamento. Brasília, 08 de janeiro de EDELAMARE MELO RELATORA PROCURADORA REGIOANL DO TRABALHO 5