Apelação Cível n , de Blumenau Relator: Des. Marco Aurélio Gastaldi Buzzi

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1 Apelação Cível n , de Blumenau Relator: Des. Marco Aurélio Gastaldi Buzzi APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INIBITÓRIA - SISTEMAS DE VENTILAÇÃO INDUSTRIAL - SENTENÇA EXTINGUINDO O PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL (ART. 267, VI, DO CPC). INSURGÊNCIA DOS AUTORES - 1. JULGAMENTO EXTRA PETITA - INOCORRÊNCIA - POSSIBILIDADE DE O JUÍZO EXAMINAR E PROCLAMAR A AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES DA AÇÃO, INDEPENDENTEMENTE DE ARGÜIÇÃO DAS PARTES - MATÉRIAS DE ORDEM PÚBLICA (ART. 267, 3º, DO CPC) - 2. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO - DESNECESSIDADE DA PRODUÇÃO DE PROVAS, PARA CORROBORAR TESES AFETAS AO MÉRITO DA CAUSA, QUANDO NÃO VERIFICADO O PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO - 3. EXTINÇÃO DO FEITO MANTIDA - O MERO DEPÓSITO DO PEDIDO PARA REGISTRO DE PATENTE, JUNTO AO INPI, NÃO CONFERE DIREITO DE EXCLUSIVIDADE AO POSTULANTE, MAS MERA EXPECTATIVA DE SUA OBTENÇÃO, NÃO VIABILIZANDO AO REQUERENTE OBSTAR A COMERCIALIZAÇÃO DO MODELO DE UTILIDADE PERANTE TERCEIROS - DIREITO QUE SURGE APENAS COM A EXPEDIÇÃO DA CARTA, OCASIÃO A PARTIR DA QUAL NASCE A TITULARIDADE DA PATENTE, PODENDO ENTÃO O PREJUDICADO HAVER, ANTE OS INFRATORES, EVENTUAL INDENIZAÇÃO PELO USO INDEVIDO (ART. 44, CAPUT, DA LEI N /1996) - FALTA DE INTERESSE DE AGIR, DADA A INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA - RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. Não basta, para a proteção da propriedade industrial, a mera solicitação da patente, não se podendo cogitar de impedimento a terceiros de produção e comercialização dos bens ditos plagiados se não expedida a carta-patente (Apelação Cível n /001(1), de Belo Horizonte, rel. Des. Dídimo Inocêncio de Paula, DJ ) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n , da comarca de Blumenau (1ª Vara Cível), em que é apelante Robert's Projetos e Engenharia de Sistemas de Ventilação Industrial, e apelado Estruturas

2 Metalicas Blumenau - Indústria e Comércio Ltda: ACORDAM, em Câmara Especial Temporária de Direito Comercial, por votação unânime, conhecer e negar provimento ao recurso. Custas legais. RELATÓRIO Ação: inibitória, ajuizada originariamente na comarca de Porto Alegre - RS, por Robert's Projetos e Engenharia de Sistemas de Ventilação Industrial em face de Estruturas Metálicas Blumenau - Indústria e Comércil Ltda, pretendendo obstar que a ré continue a comercializar "sistema de ventilação industrial", uma vez que se trata de modelo de utilidade desenvolvido pelo segundo demandante, o qual foi objeto de pedido de patente junto ao INPI. Sentença: após contestação e réplica, bem como acolhimento de exceção de incompetência, que importou na remessa dos autos à comarca de Blumenau SC, o magistrado extinguiu o processo, sem resolução do mérito, assinalando que os autores são carecedores de interesse processual, na medida em que deflagraram a demanda apenas com base em pedido de registro da patente, o que gera mera expectativa de direito. Por fim, condenou os acionantes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 3.500,00. Apelação: irresignados, os autores afirmam: a) julgamento extra petita, porquanto a falta de interesse processual foi reconhecida, de ofício, pelo juiz, o qual deveria se limitar a examinar as matérias agitadas em contestação; b) cerceamento de defesa, dada a necessidade de produção de provas voltadas a demonstrar a concorrência desleal, face à utilização indevida do sistema de ventilação industrial por parte da acionada; c) violação aos arts. 44, 3º, da Lei n /1996 e 5º, XXXV, da CF, pois a interpretação na senda de que o titular de patente somente poderia acessar o poder judiciário após a expedição da respectiva carta, deixa a descoberto todo o período que intermedeia a protocolização do pedido e a concessão definitiva, olvidando "o juízo monocrático que os prazos de tramitação de um pedido de patente não tramitam em menos de dois, três anos em face dos trâmites e entraves burocráticos do próprio INPI. Apresentadas as contrarrazões, os autos ascenderam a este egrégio Tribunal. É o relatório. VOTO O recurso é conhecido e desprovido. O apelo desafia sentença que extinguiu ação inibitória, sem resolução do mérito, por entender inadequado o seu manejo por requerente de mero pedido de registro de patente, atinente a modelo de utilidade, junto ao INPI.

3 Suscitam os recorrentes preliminares de julgamento extra petita e cerceamento de defesa, defendendo, no mérito, a possibilidade de manejo da ação inibitória, ante o depósito de pedido de registro de patente junto ao INPI. As teses, entretanto, não merecem prosperar. Quanto ao julgamento extra petita, é cediço que o exame do preenchimento das condições da ação, por se tratar de matéria de ordem pública, é tarefa que compete ao juízo, independentemente de provocação das partes. O art. 267, 3º, do CPC espanca qualquer dúvida: "O juiz conhecerá, de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e VI", sendo que, no aludido inciso VI, está determinada a extinção do processo "quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual". Nessa esteira: Condição da ação, dizendo respeito à ordem pública, é matéria que interessa à atividade jurisdicional, não sujeita à disponibilidade das partes, pelo que insuscetível de preclusão, sendo possível o reexame, mesmo que irrecorrido despacho saneador que a enfrentou (TJSC, Apelação cível n , de Sombrio. Relator: Juiz Paulo Roberto Camargo Costa, j. em ). Logo, não assiste razão aos recorrentes ao afirmarem que a falta de interesse processual somente poderia ser proclamada, caso tivessem os réus da ação argüido preliminar invocando tal temática, razão pela qual impõe-se o desacolhimento da prefacial em enfoque. Também não houve cerceamento de defesa, alegado pelos recorrentes por não ter sido aberta fase processual para comprovação de eventual concorrência desleal; isso porque tal providência somente se faria necessária na hipótese de o juízo adentrar ao mérito da causa, na medida em que a existência ou não da aludida praxis importaria na procedência ou rejeição do pedido inicial. Como, entretanto, o magistrado de primeiro grau não anteviu possibilidade de ingressar no exame da questão de fundo, uma vez que, previamente, constatou a falta de interesse processual, restaria inócua qualquer produção de provas em audiência, porque incabível a análise do mérito da causa. Nessa esteira, lecionam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery: Para que o juiz possa aferir a quem cabe a razão no processo, isto é, decidir o mérito, deve examinar questões preliminares que antecedem lógica e cronologicamente a questão principal: o mérito, vale dizer, o pedido, a pretensão, o bem da vida querido pelo autor. O mérito é a última questão que, de ordinário, o juiz deve examinar no processo. Essas questões preliminares dizem respeito ao próprio exercício do direito de ação (condições da ação) e à existência e regularidade da relação jurídica processual (pressupostos processuais). As condições da ação possibilitam ou impedem o exame da questão seguinte (mérito). Presentes todas, o juiz pode analisar o mérito, não sem antes verificar se também estão presentes os pressupostos processuais. Ausente uma delas ou mais de uma, ocorre o fenômeno da carência de ação (art. 301 X), circunstância que torna o juiz impedido de examinar o mérito (Código de Processo Civil e Comentado e Legislação Extravagante, p. 628;

4 RT: 2003). Por essas razões, não há falar em cerceamento de defesa. Ultrapassadas as questões prefaciais, impositiva a manutenção da sentença extintiva. Sem embargo dos argumentos deduzidos pelos insurgentes, está correto o entendimento firmado no decisum hostilizado, no sentido de que o mero pedido de registro de patente não confere ao requerente a possibilidade de obstar judicialmente o uso do respectivo modelo de utilidade, sendo necessária, para tanto, a conclusão do procedimento administrativo, com a final expedição da carta de patente. Com efeito, o depósito do requerimento de concessão da patente estabelece uma mera expectativa de direito ao postulante, porquanto a pretensão deverá ser previamente examinada pelo órgão de proteção industrial; é dizer, não há garantia alguma de que o INPI, ao cabo do procedimento, deferirá a patente em favor do postulante, já que incumbe àquele averiguar se a invenção atende aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial (art. 8º da Lei n /1996). Nessas condições, o requerimento da patente não é suficiente a lastrar ação inibitória, voltada a obstar a comercialização de produtos contra terceiros, cabendo ao postulante aguardar a final concessão da patente. Somente quando expedida a carta de patente, é que nascerá o direito de exclusividade, com o qual o titular poderá postular ordem judicial a impedir o uso indevido do modelo de utilidade por ele desenvolvido, desde que comprovando má-fé de pessoas físicas ou jurídicas que comercializavam o produto previamente à outorga da patente, porquanto "à pessoa de boa fé que, antes da data de depósito ou de prioridade de pedido de patente, explorava seu objeto no País, será assegurado o direito de continuar a exploração, sem ônus, na forma e condição anteriores" (art. 45 da Lei n /1996). Corroborando tal orientação, veja-se que o art. 44 da Lei de Propriedade Industrial dispõe que "Ao titular da patente é assegurado o direito de obter indenização pela exploração indevida de seu objeto, inclusive em relação à exploração ocorrida entre a data da publicação do pedido e a concessão da patente". Assim, ao reportar-se ao "titular da patente", obviamente, a Lei está assegurando direitos apenas àquele que já teve a carta devidamente expedida, e não ao mero requerente de registro de patente. Observe-se, ademais, que o fato de o artigo acima citado referenciar a possibilidade de a indenização, a ser reclamada perante o infrator, poder abarcar a "exploração ocorrida entre a data da publicação do pedido e a concessão da patente", não confere ao requerente do registro o direito de fazer valer a exclusividade desde a data do respectivo depósito, como argumentam os recorrentes. Na realidade, o teor da norma garante apenas a indenização dos prejuízos causados ao titular da patente, que poderá, após a expedição da carta em seu favor, demandar os terceiros de má-fé que, no período entre o depósito e a conclusão do procedimento administrativo, utilizaram-se indevidamente do modelo de utilidade. Essa linha de compreensão, por outro lado, não viola o art. 5º, XXXV, da

5 CF, porquanto o aludido dispositivo não exclui do judiciário lesão ou ameaça a direito, não englobando mera expectativa de direito, como se enquadra a posição do requerente de registro de patente. Nesse sentido, seguem julgados dos Tribunais Estaduais: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DEPÓSITO DO PEDIDO DE PATENTE. EXPECTATIVA DE DIREITO. CONCORRÊNCIA DESLEAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - O simples depósito do pedido de patente, dirigido ao INPI, não confere, por si só, ao requerente o direito de exclusividade do produto, mas mera expectativa de tal direito, sendo que, apenas após a concessão da patente, advirá o direito de seu titular impedir que terceiros produzam o produto patenteado, podendo, inclusive, pleitear indenização face à eventual exploração indevida, ex vi da exegese dos artigos 42 e 44 da Lei 9.279/96. - Julgada improcedente a demanda, deverá o Juiz fixar a verba honorária consoante sua apreciação equitativa, de acordo com o artigo 20, parágrafo 4º, do CPC.Súmula: Rejeitaram a preliminar, negaram provimento à primeira apelação e deram parcial provimento à segunda (Apelação Cível n /000(1), de Guarani, rel. Juiz Silas Vieira, DJ ). APELAÇÃO - AÇÃO COMINATÓRIA - PEÇAS DE BIJUTERIA - CONTRAFAÇÃO - PROPRIEDADE INDUSTRIAL - DEPÓSITO DE PEDIDO DE PATENTE - AUSÊNCIA DE REGISTRO - INEXISTÊNCIA DE DIREITO DE EXCLUSIVIDADE. - Não basta, para a proteção da propriedade industrial, a mera solicitação da patente, não se podendo cogitar de impedimento a terceiros de produção e comercialização dos bens ditos plagiados se não expedida a carta-patente (Apelação Cível n /001(1), de Belo Horizonte, rel. Des. Dídimo Inocêncio de Paula, DJ ). Deste Tribunal de Justiça, mutatis mutandis: O depósito do pedido de registro da marca no Instituto Nacional de Propriedade Industrial, por si só, confere mera expectativa de direito, sem a outorga da exclusividade de propriedade industrial. Para tanto, é necessária a expedição do Certificado de Registro de Marca pelo Órgão competente, nesse caso o INPI (Agravo de Instrumento n , de Timbó. Relator: Des. Salim Schead dos Santos). A exclusividade de uso de marca em todo o território nacional pertence àquele que obtiver o seu registro no INPI, uma vez que o simples pedido ou registro JUNTO À AUTARQUIA não outorga a exclusividade de propriedade industrial, visto que pela lei vigente adotamos o direito não declarativo mas constitutivo e, portanto, atributivo do uso da marca; inexistindo, assim, qualquer respaldo legal que empreste utilidade jurídica ao pré-uso de marca (Apelação Cível n (49.640), da Capital, rel. Des. Anselmo Cerello, j. em ). Por fim, registre-se que a ação restou ajuizada em 1999, ao passo que o depósito do pedido de patente está datado de 1997, razão pela qual, provavelmente, o INPI já procedeu ao julgamento definitivo do pedido formulado pelo segundo demandante. Não obstante, independentemente da deliberação final daquele órgão,

6 se concessiva, ou não, da patente, essa decisão não interfere no julgamento do presente recurso, porquanto aos autores, quando do início da demanda, não assistia o interesse processual, não se podendo cogitar, em caso de eventual expedição da carta de patente no curso do feito, por exemplo, de eventual sanação da mácula, pois, para tanto, dar-se-ia a alteração da causa de pedir vertida na petição inicial, providência vedada no art. 264 do CPC. Do exposto, o voto é no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso. DECISÃO Nos termos do voto do relator, decidiu a Câmara, por votação unânime, conhecer e negar provimento ao recurso. Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Ricardo Fontes (Presidente) e Rodrigo Collaço. Florianópolis, 28 de setembro de Marco Aurélio Gastaldi Buzzi RELATOR