OSCIP: DO MARCO REGULATÓRIO NO TERCEIRO SETOR À DESORGANIZAÇÃO

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1 OSCIP: DO MARCO REGULATÓRIO NO TERCEIRO SETOR À DESORGANIZAÇÃO Tendências e Inovações na Gestão Pública Prof. Dr. José Carlos Vaz Por: David Ohannes Bezirganian Leonardo Aragão Christovão Wagner Kimura

2 Um breve Histórico do Terceiro Setor no Brasil 1543 Fundação da Santa Casa de Misericórdia na Vila de Santos 1908 A Cruz Vermelha Brasileira é fundada em 5 de dezembro 1934 O Estado Brasileiro, assume o modelo de Estado Social 1935 Promulgada a Lei de Declaração de Utilidade Pública que regulamenta a colaboração do Estado 1938 É criado o Conselho Nacional do Serviço Social (CNSS), consolidando a aliança entre o Estado e a as entidades prestadoras de serviços de interesse público nas áreas da assistência social, saúde e educação. Mais tarde viraria CNAS Getúlio Vargas cria a Legião Brasileira de Assistência (LBA) com o objetivo de prestar, diretamente ou em colaboração com outras entidades, serviços de assistência social 1954 É criada no Rio de Janeiro, a primeira APAE 1970 Surgimento de ONG s 1988 A Constituição Federal, de maneira expressa, atribui à sociedade civil, por meio de organizações privadas sem fins lucrativos, o dever de contribuir para a consecução dos objetivos do Estado brasileiro Começa a busca por parcerias de forma mais aguda, devido a redução dos programas estatais na área social, decorrente da crise econômica iniciadas no final da década de Criação, em 12 de janeiro, do Conselho da Comunidade Solidária, cuja presidenta nomeada é Ruth Cardoso, na época primeira dama Promulgada a Lei das OSCIP s

3 Uma definição para Terceiro Setor Terceiro Setor é um elo de ligação entre o Primeiro e o Segundo Setor, composto de pessoas jurídicas de direito privado com finalidades filantrópicas, sem fins lucrativos, suprindo carências e necessidades do Estado na promoção dos direitos previstos em sua Constituição e nos demais dispositivos legais com relação à prestação de serviços públicos

4 Décadas de 80 e 90 Tempos de crise Os reflexos da crise inciada no final dos anos 70, nos anos 90 foram: - Redução da atuação e destinação de verba para ações assistenciais; - Crescente atuação de entidades dos Terceiro Setor; - Desordem instaurada, principalmente quando envolve o uso de verbas públicas destinadas às ações assistenciais Maria da Glória Marcondes Gohn, pesquisadora da UNICAMP diz: o terceiro setor é um tipo de Frankenstein : grande, heterogêneo, construído de pedaços, desajeitado, com múltiplas facetas.

5 Conselho da Comunidade Solidária O Conselho da Comunidade Solidária foi a aposta de inovação do governo federal em 1995, como solução para o enfrentamento da pobreza e a exclusão social no Brasil Tinha como objetivo a melhoria da mobilização dos esforços disponíveis no governo e na sociedade para a implementação de programas assistencialistas do governo federal. O Conselho da Comunidade Solidária seria o interlocutor das relações: -Entre órgãos públicos de qualquer esfera, e -Entre os órgãos públicos e entidades do Terceiro Setor

6 Marco Legal no Terceiro Setor Mediante encomenda do Governo Federal, em 1997, o Conselho da Comunidade Solidária inicia os estudos para regulamentação do Terceiro Setor. Em 24 de julho de 1998, é encaminhado para o então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, o anteprojeto do chamado Marco Legal no Terceiro Setor. O resultado foi a promulgação da Lei Federal das OSCIP s nº 9.790/99 em 23 de março.

7 Lei das OSCIP s e Leis das OS s e Voluntariado O Conselho da Comunidade Solidária ao propor a a lei das OSCIP s, procurou não conflitá-la com as leis anteriormente promulgadas, a do Voluntariado (Lei n de 18 de Fevereiro) e a das OS s (Lei Federal nº 9637/98 de 15 de maio). Com relação a Lei das OS s, a redação da Lei das OSCIP s passa a convergir em muitos pontos, o que provoca um entendimento equivocado da lei. Porém existem diferenças conceituais e fronteiriças.

8 O que é uma OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público Qualificação/título concedido pelo Ministério da Justiça a uma associação civil sem fins lucrativos/econômicos, que cumpra os requisitos previstos em lei federal. Permite celebrar um ajuste (Termo de Parceria) com o Poder Público, visando desenvolver projetos ou atividades complementares que visem a melhoria das atividades daquele Poder.

9 Diferenças conceituais e fronteiriças entre OS s e OSCIP s Estado Estado OS Transfere atividades/serviços realizados pelo Estado para a sociedade (transfere a gestão de bens e serviços existentes) OSCIP Traz a atividade/serviço para o Estado (inovações e melhorias da iniciativa privada, através de projetos) Sociedade Sociedade

10 Convergências entre OS s e OSCIP s OSCIP OS Natureza jurídica Obtenção Publicidade Cassação, revogação ou desqualificação Áreas de atuação (gênero) Controle Governamental Associação ou fundação privada, sem fins lucrativos, constituída de acordo com o Código Civil. Vinculada ao cumprimento dos requisitos legais peculiares. Não decorre de serviços prestados. Deve haver publicidade do relatório de atividades e da demonstração financeira. Poderá ocorrer, caso sejam descumpridos os requisitos legais para sua manutenção e na hipótese de a entidade deixar de cumprir suas finalidades sociais, sempre precedido de processo administrativo. Assistência social, educação, saúde e novos movimentos sociais: ambiental, creditícia, cultural, jurídica, pesquisa, defesa do consumidor etc. Por resultados atingidos

11 Diferenças entre OS s e OSCIP s OSCIP Prazo para obtenção Simples. Ato vinculado Discricionária Legislação Leis 9.790/99 e /02; Decreto 3.100/99; MP /01; Portaria MJ 361/99; outras leis estaduais e municipais Ente Expedidor e Revogador Prestação de contas e renovação Cumulação com outro título Áreas de atuação (espécies) Atuação especificidade de relacionamento Poder Executivo (Somente Federal) Anual, junto ao MJ Não pode Áreas mais amplas. Vide legislação e a resposta à pergunta no. 12 na página 24 desta cartilha. Leva à esfera pública atividades e técnicas inovadoras da iniciativa privada, que o ente público não possua. OS Lei federal 9.637/98 e outras estaduais e municipais Poder Executivo Anual Pode Áreas mais restritas: ensino; pesquisa científica; desenvolvimento tecnológico; proteção e preservação do meio ambiente; cultura; saúde. Assume atividades do serviço público que estejam sendo mal executadas ou que estejam sendo executadas a contento, mas estão relacionadas com a implantação de alguma estratégia de gestão pública.

12 Diferenças entre OS s e OSCIP s OSCIP OS Controle interno Conselho Fiscal Conselho de Administração Controle externo (auditoria independente) Recursos recebidos acima de R$600 mil Sem previsão Forma de contratação Termo de Parceria Contrato de Gestão Licitação Remuneração de Dirigentes Incentivo fiscal Dedução das doações A seleção de uma entidade deve ocorrer na modalidade de Concurso de Projetos, estabelecida na Lei Federal nº 9.790/99. Não cabendo a escolha através de certame licitatório sob a égide da Lei Federal nº 8.666/93 Opicional, mas condicionada aos benefícios fiscais. Sim, aos doadores desde que sob regime contábil de lucro real. É possível, parcial, 30% dos valores doados, limitados em 2% do IR Dispensada pelo art. 24, XXIV, da Lei Federal nº 8.666/93. Opicional Não Não é possível

13 Finalidades de uma OSCIP I promoção da assistência social; II promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; III promoção gratuita da educação, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; IV promoção gratuita da saúde, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; V promoção da segurança alimentar e nutricional; VI defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; VII promoção do voluntariado; VIII promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza; IX experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito; X promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar; XI promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais; XII estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos que digam respeito às atividades mencionadas neste artigo.

14 Estrutura Funcional Mínima de uma OSCIP 1- Um Diretor Executivo: responsável maior, mandatário e representante direto da Instituição e pelas ações demandas junto aos associados; 2- Um Tesoureiro: responsável pelo fluxo financeiro e contábil da Instituição, assina juntamente com o Diretor Executivo, todas as ordens de pagamento da entidade; 3- Um Secretário: responsável pela comunicação e redação dos atos administrativos emanados, tem por incumbência a relatoria de todas as Assembléias ocorridas; 4- Um Conselho Fiscal: Representado por um Diretor responsável, tem por atribuição a execução de auditorias e fiscalizações de contas e Termos de Parceria. Obs: Para todas as funções acima descritas é necessária a figura de um segundo elemento com plena capacitação e poderes para assumir as funções na ausência do titular (vice-diretor, segundo tesoureiro, segundo secretário)

15 OSCIP s atuando em 2006 em São Paulo Área de Atuação N OSCIP s Percentual (%) Ambiental e ecológico ,70 Assistencial e Beneficente ,47 Cidadania e Integração 45 4,08 Creditícia 41 3,67 Cultural e Ética 100 8,95 Educacional 68 6,08 Esportista 6 0,54 Jurídica 20 1,79 Outros 6 0,54 Pesquisas e Tecnologia 90 8,05 Saúde 58 5,19 Voluntariado 8 0,72 Não há informação 104 9,30 TOTAL ,00

16 Legislação Local para as OSCIP s Ente Político Lei de criação Regulamentação Pernambuco Lei /00 Acre Lei 1.428/02 São Paulo Lei /03 Minas Gerais Lei /03 e Lei /04 Pedro Leopoldo/MG Lei 2.810/05 Rio Grande do Sul Lei /08 Ainda que qualificada na órbita do Ministério da Justiça, vale dizer, no nível Federal, o título de OSCIP tem validade perante toda a estrutura federativa nacional, pelo que não há necessidade de Lei Estadual ou Municipal para autorizar a celebração do Termo de Parceria, pois a Lei Federal nº 9.790/99 tem caráter nacional.(mj, 2009)

17 Lei das OSCIP s como inovação As Agendas políticas se abriram no final dos anos 90 em busca de uma solução para o Terceiro Setor e a desordem que reinava. O projeto do Marco Legal no Terceiro Setor era a solução proposta pelo Conselho da Comunidade Solidária. Sem ineditismo, pois já haviam exemplos na Europa, mas inovador no Brasil. O projeto ocupou o topo da agenda e suas propostas aceitas e implementadas. (KINGDON, 1995)

18 Um projeto mal implantado? - Não houve a perfeita disseminação dos entendimentos sobre a Lei das OSCIP s - A convergência coma lei das OS s gerou confusões e erros interpretativos. - Faltou por parte do Poder Público, algo que é essencial na implantação de qualquer projeto, a última fase, a fase de avaliação, onde arestas são acertadas e onde você opta pela continuidade ou não da solução implementada. - Faltam estudos e análises de resultados. (RIPLEY, 1995)

19 O Mito 8666 Um fato porém, é um dos maiores empecilhos para a assimilação cultural da lei das OSCIP s: Os adoradores da Lei 8666 A Lei Federal nº 8666/93 é considerada por um grande número de juristas como uma dos mais eficientes instrumentos legais. A disseminação do entendimento da lei foi intensamente realizado, pelo poder público e pela sociedade civil, alcançando resultados expressivos. Porém, virou regra máxima, nada pode suplantá-la ou se colocar no mesmo patamar.

20 O Mito 8666 A Lei das OSCIP s trouxe uma nova modalidade de certame: O Concurso de Projetos Não cabe a OSCIP, a dispensada de licitação prevista pelo art. 24, XXIV, da Lei Federal nº 8.666/93. O órgão público deve estabelecer o quanto irá dispor de recurso financeiro para ter uma determinada solução. Através do Concurso de Projetos selecionará o melhor projeto. A escolha não envolve menor preço, só técnica.

21 Longe de ser o Mar de Rosas Conforme dados da Fundação Prefeito Faria Lima CEPAM Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal, menos da metade das localidades que pactuaram com OSCIP s, até 2006, utilizava-se de Termo de Parceria, instrumento legal, obrigatório, para firmar o compromisso entre o órgão público e a OSCIP. Vários municípios, de forma equivocada, utilizam o contrato administrativo ou contrato de gestão para firmar compromisso com uma OSCIP.

22 Onde está pairando o desconhecimento legal? - Nos poderes públicos, - Executivo, - Legislativo, - Judiciário (este mais agravante) - Na sociedade cívil, - No próprio Terceiro Setor. O grau de desconhecimento é gritante, e pode ser comprovado em vários casos.

23 Exemplos da desorganização no Terceiro Setor 1 - São Borja RS; 2 Porto Alegre RS e o Instituto Sollus; 3 Caso Souza - PB e Interset; 4 Caso da ANVFEB; 5 Caso do Instituto Acqua; 6 Caso de Jandira; 7 Caso de Maceió; 8 Caso de Tocantins.

24 Concluíndo: a ação acertada de Minas Gerais O Ministério Público de Minas Gerais e a OSCIP CEMAIS - Centro Mineiro de Alianças Intersetoriais estão realizando diversos encontros, batizados de Encontro das Alianças Intersetoriais, para apresentação das parcerias bem sucedidas firmadas entre os municípios e entidades do Terceiro Setor (OS s e OSCIP s) e realizando os chamados Ciclos de Fomento de Alianças Intersetoriais, onde disseminam conhecimento e entendimentos sobre a legislação vigente. Esta iniciativa tem como objetivo a catalisação de forças do Governo, do Mercado e das Organizações sem fins lucrativos visando a potencialização dos resultados das ações de cada um na busca de melhorias sócio-ambientais e para o crescimento do setor e da qualidade de vida de todos. Contam com o apoio do CAOTS Centro de Apoio Operacional ao Terceiro Setor do Ministério Público de Minas Gerais.

25 Fonte: Pesquisa SEP/Cepam, Novas Formas Organizacionais, 2006.