O Ministério da Justiça realizou recentemente uma parceria com o MEC para dar novas diretrizes nacionais à Educação Penitenciária, o que muda?
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- Bernardo Mangueira
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1 Leia boletim completo sobre o tema. Para representante do Ministério da Justiça, ações educacionais no sistema prisional sempre foram marcadas por voluntarismo e improvisação. Através de parceria com o MEC, proposta é levar para dentro das prisões programas oficiais de educação de jovens e adultos, como o Fazendo Escola e o Brasil Alfabetizado. O Ministério da Justiça realizou recentemente uma parceria com o MEC para dar novas diretrizes nacionais à Educação Penitenciária, o que muda? No começo dessa gestão, nós tínhamos apenas convênios com os Estados para repassarmos recursos para ações na área educacional, que em geral eram tele-salas. Começamos um diálogo em 2004 com o Ministério da Educação para constituirmos um grupo de trabalho para pensarmos na Educação na Prisão, não só o modelo de financiamento, mas também como orientação política. Então fixamos o entendimento de que o atendimento em termos educacionais da população prisional deveria ser feito pela rede pública de ensino, pelos programas oficiais, porque a característica que encontrávamos no sistema prisional era de muito voluntarismo, muita improvisação, precisávamos superar isso, colocar lá dentro os programas de governo de EJA: Fazendo Escola e o Brasil Alfabetizado. E de onde vinha esse diagnóstico? 1 / 6
2 Em 2003, o Ministério da Justiça tinha feito um diagnóstico de toda a segurança pública no Brasil, com um capítulo sobre o sistema penitenciário. Tínhamos ali dados que apontavam para a falta de programas regulares e mostrava que havia demanda enorme: 70% não têm primeiro grau completo e 10,5% são analfabetos. E isso era coerente com as demandas que apareciam no Ministério: só financiávamos projetos pontuais, sem visualizar políticas públicas por trás. Então o MEC abre imediatamente no Brasil Alfabetizado uma seção específica para educação no presídio para mapear as propostas existentes e também para dar uma bolsa maior para os educadores. Em seguida, realizamos os seminários estaduais e em julho o nacional sobre educação na prisão. Quais são os indicativos para a construção das diretrizes nacionais que apareceram na realização desses seminários? O primeiro ponto é a remição da pena pelo estudo. Tem juiz que aceita e juiz que não aceita, às vezes chegamos a situações com dois presos na mesma sala de aula e um terá a remição e o outro não. Outra questão é a cultura institucional e até a atuação dos demais profissionais, agentes penitenciários, diretores de presídios etc, que por razões históricas é muito pouco favorável a esse tipo de atendimento. Uma preocupação que emerge desses seminários é a de envolver esse pessoal, sensibiliza-los e torna-los parceiros na oferta de educação. Outro ponto muito importante é a questão da gestão, é preciso que exista uma articulação muito forte entre Justiça e Educação para que a oferta ocorra como queremos. Se a educação vai entrar com seus professores nos presídios, são duas lógicas distintas de se trabalhar, uma é a lógica da segurança e a outra é a lógica do envolvimento com o aluno. Isso precisa ser muito costurado e os gestores precisam estar em diálogo. Outra questão que esteve muito presente, que não é uma particularidade da educação prisional mas uma característica da EJA como um todo, é o fato de a abordagem não infantilizar o sujeito e levar em conta sua história de vida. 2 / 6
3 Em relação a essa dificuldade de se inserir a educação numa cultura institucional pouco propícia, quais os caminhos para se envolver nas ações educativas as instâncias das unidades, a direção e os agentes penitenciários? Estamos trabalhando para organizar atividades conjuntas entre agentes e professores por exemplo. Nós, MEC e Ministério da Justiça, trabalhamos no desenvolvimento das diretrizes e também trabalhamos com financiamento em seis estados - e agora queremos ampliar para mais oito. A idéia é repassar recursos para fortalecer esse desenho que a gente propõe. Nesses convênios que fizemos com os seis estados existem programas de formação continuada de professores em conjunto com agentes. Para todas as demandas que estão aparecendo, estamos dando uma resposta em termos de financiamento. De onde vem a verba destinada a esse programa? O Fundo Penitenciário Nacional responde por parte e a SECAD (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação ) vai entrar com outra. O Ministério da Justiça tem alguma forma de monitoramento para poder diagnosticar as ações de educação penitenciária nos estados? Em relação a esse ponto, existem duas dimensões. Uma é quantitativa: estamos trabalhando muito fortemente para disponibilizar para os estados um sistema 3 / 6
4 informatizado. Alguns módulos já estão prontos, mas ainda não podemos dizer que está funcionando a pleno vapor. Cada unidade prisional teria um computador com esse software de gestão para termos um cadastro exato de todos que participam das atividades educacionais. A previsão para que isso comece a funcionar é 2007/2008. Por outro lado, há o monitoramento qualitativo, que estamos fazendo através dos seminários, tentando formar uma rede. Mas a gente sabe o trabalho que isso dá e a dificuldade que há por trás disso. A Educação Penitenciária deve ser oferecida em todas as unidades? Incluindo os centros de detenção provisória e cadeias públicas? A gente ainda não conseguiu enfrentar esse problema especificamente. No sistema prisional, o sujeito entra e em tese deve ficar pouco tempo como preso provisório, e então é julgado: ou é absolvido e sai ou é condenado e fica. Muitas vezes ele pode ser condenado e continuar em liberdade. Mas a gente observa que há uma distorção no país, muitas vezes a pessoa fica muito tempo como preso provisório e nas unidades provisórias não existe estrutura para educação, justamente porque ele deveria ficar pouco tempo. Mas essa não é uma questão que a gente conseguiu enfrentar ainda. Por enquanto, queremos assegurar que pelo menos nas unidades para presos condenados, a educação aconteça, porque aí realmente é uma obrigação prevista em lei. Até hoje isso não aconteceu, porque o nível de oferta é muito pequeno. Como criar condições para que essa educação se realize plenamente? Por que tão poucos alunos estudam? Existe um problema de oferta: em muitos presídios não existe quem vá dar aula. 4 / 6
5 Existe esse problema crônico. Um caminho muito interessante seria a remição da pena pelo estudo, seria um estímulo. Mas realmente sabemos que existe limite para realizar direitos humanos na prisão. Não dá para conciliar direitos humanos e prisão plenamente. Mas nossa tentativa é de esgarçar esse limite. Como o senhor enxerga a oferta da educação formal e não-formal dentro dos presídios? Mesmo a educação formal é muito improvisada. Tem muito preso que dá aula. Num primeiro momento, isso não é um problema, mas deve estar articulado com algo oficial, senão o sujeito está lá assistindo às aulas e depois sai sem nenhum certificado. Claro que serve para algo, mas isso ainda não é cidadania. E a educação para o trabalho? Vem sendo oferecida? Como articulá-la com as demais atividades? O próprio conceito de Educação de Jovens e Adultos dá abertura para que trabalhemos com tudo isso de maneira articulada, parte do mesmo processo. Nesse sentido a parceria com o MEC é muito salutar, nossa idéia é começar a ampliar esse leque de parcerias, trazer outros órgãos, como o Ministério do trabalho. Precisamos romper com esse modelo de fazer bola e pipa e inserir educação profissionalizante mesmo. E também precisamos considerar mais as atividades e políticas culturais. Inclusive precisamos reconhecer isso como educação. Um grande desafio no caso de aprovado o projeto de lei da remição pelo estudo é identificar o que vai ser considerado educação qual vai ser a posição do juiz quando o preso apresentar as horas que acumulou participando de atividades culturais? 5 / 6
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