USO E OCUPAÇÃO DO SOLO NA REGIÃO OCEÂNICA: OS CORDÕES ARENOSOS LITORÂNEOS. Pelo Geólogo Josué Barroso
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1 USO E OCUPAÇÃO DO SOLO NA REGIÃO OCEÂNICA: 1-INTRODUÇÃO OS CORDÕES ARENOSOS LITORÂNEOS Pelo Geólogo Josué Barroso No extenso litoral brasileiro, o do Estado do Rio de Janeiro está entre os de maior concentração de lagunas e cordões arenosos associados. Entre essas lagunas, as menores foram extintas por aterros comandados pela expansão urbana, mas os cordões arenosos foram mantidos, em face de suas características de ocupação, mas também impactados pela urbanização. Na Região Oceânica de Niterói, as lagunas de Itaipu e Piratininga, entre as de porte maior, ainda não foram extintas, mas, historicamente, vêm sofrendo fortes ações de aterramento e assoreamento (Artigo 12 Parte 2). Tais ações de aterramento e assoreamento processam-se preferentemente fora do domínio dos cordões arenosos e são fortemente acentuadas nos lados das baixadas aluvionares (quadrante norte), em face das características dos terrenos imediatamente vizinhos às lagunas e do aporte de materiais sólidos transportados pelos rios. Pelo lado dos cordões arenosos, a chegada das águas da precipitação pluviométrica às lagunas se dá por fluxo subterrâneo e os aterros são feitos por avanços sobre a lâmina dágua, para ganho ou extensão de novas áreas de terreno. A origem marinha dos cordões arenosos, fruto das ações transgressivas e regressivas do mar (Artigos 8 e 9), confere a essa unidade geológica características de uma larga faixa de praia, daí advindo propriedades geotécnicas próprias. O uso e ocupação dos cordões arenosos vêm sendo administrados pela Prefeitura de Niterói sem considerá-los como uma unidade do meio físico bem diferente das unidades correspondentes às áreas elevadas e às baixadas aluvionares, conforme se depreende do PUR da Região Oceânica. 2-PROPRIEDADES GEOLÓGICO-GEOTÉCNICAS Diferente das áreas elevadas (Artigo 11) e das baixadas aluvionares (Artigo 12 Parte 1 e Parte 2), os cordões arenosos litorâneos exibem pequenas variações de homogeneidade de propriedades, como as diferenças dos setores de sedimentos transportados pelos ventos, que provocam a sobreposição de dunas e o domínio de areias finas. A característica de homogeneidade dominante dos cordões arenosos possibilita uma
2 apreciação global, com extrapolação de propriedades, embora não seja possível prescindir de investigações locais, quando de intervenções para obras civis. Tendo em vista a ocupação do solo, é importante relevar as 3 propriedades fundamentais da engenharia civil: deformabilidade, resistência e permeabilidade. Deformabilidade Uma alta deformabilidade inicial é característica das formações arenosas, puras ou quase puras, que se reduz rapidamente, à medida que se aprofunda no terreno, em face da compactação provocada pelo peso das camadas superiores, até que, com o aprofundamento, seja alcançado comportamento tensão x deformação admitido como elástico. A deformação inicial deve também ser considerada no estabelecimento da profundidade das valas onde são instalados os tubulões das galerias de escoamento das águas pluviais, geralmente rasas. Resistência A composição mineral dos cordões arenosos litorâneos é de domínio absoluto do quartzo. O quartzo é um mineral de alta resistência e ruptura instantânea característica, à semelhança do vidro. Parte importante dessa resistência é transferida às areias. Ainda a acrescentar para essas areias quartzosas um ângulo de atrito em torno de 35º e, pela ausência de minerais de argila, a coesão é praticamente nula. Tais propriedades conferem a essas areias altíssima capacidade de suporte para fundações, mas exigem que as paredes laterais das escavações para as fundações sejam escoradas, para evitar escorregamentos e desmoronamentos, durante a fase de execução das cavas de fundação e das garagens semi-enterradas. Por outro lado, as areias são de fácil escavação e, na grande maioria dos casos não alcança o lençol freático. Permeabilidade Para esta propriedade, toma-se como referência a dissertação de mestrado de Lowsby (2000), desenvolvida no Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro: para o cálculo da condutividade hidráulica (K), resolvemos utilizar o método proposto por Hazen (1911), in Fetter (1994), que, na equação K = C. (d10)², leva em consideração o coeficiente (C), relacionando-o com o tamanho, o grau de seleção dos grãos e o tamanho efetivo dos grãos retidos na peneira n 10 (d10). Os valores de gráficos de análises granulométricas de areias do cordão arenoso de Camboinhas foram adotados tanto do ponto de vista granulométrico quanto hidrogeológico. Então foram utilizados os valores de C=1 e (d10)²=0,3mm, o que resulta em K= 9.0/10² cm/s = 0.09 cm/s.
3 É uma permeabilidade bastante alta, capaz de absorver precipitações pluviométricas elevadas, desde que, é claro, áreas de infiltração estejam presentes. Porém tais áreas não vêm sendo efetivadas, em desobediência ao que determina o PUR da Região Oceânica Lei 1968/2002 (taxa máxima de impermeabilização igual a 70%), em diversas construções residenciais coletivas recentes. Há que se ressaltar que o próprio PUR é falho em algumas concessões que faz, se considerarmos que a infiltração visa beneficiar o reabastecimento do lençol freático, importante alimentador das lagunas e do oceano, além de poder constituir uma fonte alternativa de fornecimento de água. Assim, deve ter-se em mente que a taxa máxima de impermeabilização não constitui uma norma a obedecer, pura e simplesmente, para evitar os riscos de inundação nos cordões arenosos, de probabilidade baixíssima, salvo se erros grosseiros forem cometidos, como o asfaltamento generalizado. As concessões feitas pelo PUR quanto à taxa máxima de impermeabilização são apresentadas na Seção IX Artigo 55, com a seguinte redação: Para cálculo da taxa máxima de impermeabilização, são computadas como áreas permeáveis: I áreas com pavimentações em blocos de concreto intertravados ou outros materiais permeáveis... II áreas ajardinadas na área do terreno; III-as coberturas ajardinadas de pavimento semi-enterrado, do subsolo e das garagens, independentes da lâmina; IV-piscinas V - soluções de aproveitamento de águas pluviais Com a exceção do item II, desde que as áreas ajardinadas estejam sobre o terreno natural, os demais não garantem a recarga do aqüífero. O uso de blocos intertravados não garante a permeabilidade. Esta fica dependente da permeabilidade dos materiais usados como base de assentamento de tais blocos. A taxa máxima de impermeabilização não é estendida à pavimentação das vias públicas e, pior ainda, grande parte delas são asfaltadas sem infraestrutura de drenagem (Foto 2), transformando os pavimentos em leitos de rios que deságuam diretamente nas lagunas, aí despejando toda carga sólida transportada. A drenagem, quando construída, é constituída de galerias de águas pluviais que as despejam nas lagunas, por vezes estendendo-se por grandes distâncias, por exemplo, da praia até a laguna (Foto 1) Tais galerias subterrâneas são dispensáveis, em face da alta permeabilidade dos terrenos. Veja fotos 1,2 e 3 e 4.
4 Foto 1 Avenida Almirante Tamandaré - Praia de Piratininga.É toda impermeável, incluindo áreas de estacionamento. No centro da foto vê-se bueiro para escoamento das águas pluviais, despejadas na laguna. O canteiro central, em concreto, exibe plantação de coqueiros (há mais de 10 anos), atrofiados por não terem acesso às águas. Foto 2 Asfaltamento da Rua 116, entre a Avenida Acúrcio Torres e a Laguna de Piratininga, sem a instalação da galeria de drenagem e, portanto, despejando as águas, por fluxo superficial, diretamente na laguna. Observe a forte declividade no sentido da laguna, ao fundo.
5 Foto 3 Uso de saibro como base de asfaltamento de rua. O saibro é material inadequado para constituir base de pavimento, por ter baixa permeabilidade. As ruas que foram pavimentadas com saibro começaram a sofrer degradação em apenas 3 meses. Foto 4 Praça em construção com uso de pavimento permeável. Observe na parte central da foto, o acúmulo de água no canteiro circular, por uso de saibro.
6 3-SUGESTÕES A urbanização, da forma como vem sendo desenvolvida nos cordões arenosos litorâneos da Região Oceânica, agride uma de suas propriedades geotécnicas mais marcantes, a permeabilidade, fundamental na manutenção do lençol freático. A recarga nos cordões arenosos dá-se, dominantemente, sem contribuição externa, resultado que é da precipitação pluviométrica direta, toda infiltrada no meio arenoso. O impedimento à infiltração tem reflexos diretos na sanidade das lagunas: qualidade da água e assoreamento, além de reduzir o potencial de uso do aqüífero, como recurso alternativo. O betume, componente do revestimento asfáltico, é material impermeável e, portanto deveria sofrer limitações de uso, como, por exemplo, nas vias secundárias, de atendimento exclusivamente local. Nessas vias e nas áreas destinadas ao estacionamento, sugere-se dispensar o uso do aglomerante betuminoso e aplicar a alternativa de base de macadame hidráulico (ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas-NBR11804/91). Quanto às vias asfaltadas é possível substituir, com vantagens, a rede de galerias pluviais, por poços substitutos dos bueiros tradicionais. Tais poços exerceriam o papel de sumidouros, em quantidades a serem calculadas, e seriam preenchidos por brita graduada, exercendo o papel de filtro, evitando assim a ocorrência de piping. Faz-se também necessária uma revisão do PUR da Região Oceânica no estabelecimento da taxa máxima de impermeabilização, tendo em vista as exceções constantes da Seção IX-Art. 55, apresentadas no item 2. Os canteiros ajardinados devem evitar camadas superficiais de solos diferentes dos existentes nos cordões arenosos (Foto 4) sob pena de também torná-los menos permeáveis. O plantio de vegetação típica é o adequado, por evitar solos estranhos ao meio. 4-REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FETTER, C.W.-(1994) Applied Hydrogeology 3rd.edition Prentice- Hall, Inc. New Jersey USA LOWSBY, M.G. -(2000) Estudo da Intrusão Salina no Aqüífero Costeiro de Piratininga, Região Oceânica do Município de Niterói-RJ Dissertação de Mestrado Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. - Rio de Janeiro
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