CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

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1 CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Origem: PRT 4ª Região Interessado(s) 1: Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região Interessado(s) 2: Ministério Público do Trabalho Assunto(s): Conflito negativo de atribuições entre membros da Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região Procurador suscitante: Fabiano Holz Beserra CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÕES. A prevenção não se estabelece com os fundamentos expressados no encerramento do procedimento, e sim, com os termos da denúncia nele oferecida. A Representação paradigma, autuada anteriormente a esta na Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região e sob a condução do suscitante, diz respeito, dentre outros, a tema relacionado ao meio ambiente do trabalho da empresa investigada, o que configura hipótese de prevenção, na forma do art. 3º, II, a, da Resolução CSMPT nº 86/2009. Atribuição fixada na pessoa do ilustre Procurador suscitante. RELATÓRIO Trata-se de conflito negativo de atribuições, oriundo da Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região, e suscitado pelo ilustre Procurador do Trabalho, Dr. Fabiano Holz Beserra, contra a digna Procuradora do Trabalho, Dra. Sheila Ferreira Delpino. 1

2 A instauração do presente procedimento administrativo teve como fundamento matéria veiculada no periódico O SUL de Porto Alegre/RS, em 03 de outubro de 2011, dando conta de acidente fatal com operário da empresa OAS, responsável pela construção da arena do Grêmio agremiação futebolística local. A vítima foi atropelada por uma caminhonete no quilômetro 94 da BR-290, nas proximidades das obras do novo estádio do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense, no bairro Humaitá, na Zona Norte de Porto Alegre. Na mesma reportagem há informação de que cem trabalhadores da empresa em questão e que atuavam nas obras da indigitada arena pediram demissão. Eles reivindicavam reajuste salarial e melhores condições de trabalho (melhorias nos alojamentos e fornecimento de vestimenta/uniforme para redução do firo e manutenção de técnicos de segurança no trabalho na obra). Em apreciação prévia (fls. 06v/07), a ilustre Procuradora suscitada, Dra. Sheila Ferreira Delpino, assim despachou, verbis: 1. Examinando os termos da denúncia ora apresentada, entendo ser hipótese de redistribuição desta Representação ao Procurador-Oficiante na de nº /0, porque configurada hipótese de prevenção, na forma do art. 3º, II, a, da Resolução nº 86/2009 do CSMPT. Isso porque, em ambos os procedimentos, há fatos denunciados contra a mesma empresa e relacionados ao tema meio-ambiente do trabalho. 2. Com efeito, esta denúncia narra a ocorrência de acidente por atropelamento, com morte do trabalhador José 2

3 Elias Machado, empregado da Construtora OAS, contratada para construção da Arena do Grêmio. O sinistro provocou manifestação dos colegas de trabalho da vítima e dos moradores dos arredores, culminando com um início de incêndio do alojamento, como forma de protesto contra a necessidade de os trabalhadores atravessarem a BR-290 para chagarem ao alojamento. Além disso, informa a denúncia que houve paralisações nos meses de fevereiro, março e junho e, ainda que cem trabalhadores solicitaram demissão, reivindicando melhores condições de trabalho (melhorias nos alojamentos para redução do frio, fornecimento de vestimenta/uniforme para proteção contra o firo excessivo deste Estado e manutenção de técnicos de segurança no trabalho na obra). 3. Na representação nº /0, a denúncia diz respeito ao não-reconhecimento da ocorrência de acidente do trabalho, com subsequente despedida do trabalhador, sem emissão de CAT, tampouco o pagamento das verbas trabalhistas e rescisórias. O denunciante relatou, ainda, não ter condições de pagar o hotel e com torção na coluna, não tem como trabalhar (fl. 02, verso). De observar que o denunciante anexou boletim de atendimento da Emergência do Trauma do Hospital Cristo Redentor, com data de 24/6/2011, às 14h39min, indicando a ocorrência de queda com trauma, havendo o registro de encaminhamento ao CAT, pelo médico que realizou o atendimento (vide fl. 03) 3. Portanto, para evitar a duplicidade de investigações contra a mesma investigada, com o mesmo tema (meio ambiente do trabalho); visando atender aos princípios de celeridade e economia processuais; objetivando privilegiar a atuação uniforme e eficaz do Ministério Público do Trabalho, considerando que a Representação nº /0 foi autuada anteriormente nesta Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região, encaminhem-se os autos à Exma. Coordenadora de Atuação em Primeiro Grau, com solicitação de redistribuição do expediente, porque entendo configurada hipótese de prevenção, na forma do art. 3º, II, a, da Resolução nº 86/2009 do CSMPT. Autos encaminhados à Dra. Juliana Horlle Pereira, Coordenadora de Atuação em 1º Grau de Jurisdição, em substituição, da 3

4 Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região, a qual assim despachou (fl. 07v), ad litteram: Não considero que o evento do anverso tipifique providência instrutória urgente, a cargo do Coordenador da COORD1, em razão da indefinição, por ora, sobre a titularidade do expediente. Cumpra-se a determinação do despacho de fls. 6-v e 7, mediante a redistribuição dos autos ao Procurador oficiante na REP /1, no primeiro dia posterior à cessação de seu afastamento. Certifico que, em contato com a Procuradora Sheila Ferreira Delpino, fui informada de que a Câmara Municipal já fora comunicada do não-comparecimento do MPT. Posteriormente, o presente feito foi encaminhado ao i. Procurador do Trabalho, Dr. Fabiano Holz Beserra, que suscitou conflito negativo de atribuições (fls. 10/v), nos seguintes termos, ipsis litteris: Trata-se de encaminhamento dos autos da Representação em epígrafe ao signatário, alegando-se conexão com o expediente nº /0, sob a justificativa de que em ambos os procedimentos, há fatos denunciados contra a mesma empresa e relacionados ao tema meio-ambiente do trabalho. Com a devida licença, discordo da decisão tomada pela douta Procuradora suscitada, alinhando-me à conclusão exposta pela Coordenadora-substitua de 1º Grau de Jurisdição (fl. 05vº). Em primeiro lugar, apenas para registro, entendo que o cerne da denúncia contida na REP nº /0, a qual fundamentaria a conexão, é o não pagamento das verbas rescisórias. Efetivamente, há referência à não emissão de CAT pela empresa providência que foi realizada pelo médico que atendeu o trabalhador, 4

5 inclusive em cumprimento de seu dever legal, diante da mera alegação de que o evento, de pouca gravidades, segundo o prontuário, estaria relacionado ao trabalho -, mas não há qualquer menção, na narrativa da denúncia, à condições inseguras de trabalho, mas sim a uma situação individual, inclusive duvidosa, objeto de arquivamento, como destacado abaixo, e não contextualizada coletivamente. (...) O procedimento em epígrafe, por seu turno, versa sobre situação completamente distinta do ponto de vista fático, a saber, o atropelamento de os trabalhadores cruzarem à rodovia para chegarem ao alojamento. Paralelamente, vieram à tona questões relacionadas com frio a que estariam submetidos (por falta de roupas e pelas condições de alojamento) os trabalhadores e a alegada ausência de um técnico de segurança na obra. Como se observa, efetivamente não há qualquer conexão, do ponto material, entre as situações a serem investigadas nos distintos expedientes, o que é reforçado pela promoção de arquivamento realizada nos citados autos. Não se pode concordar, portanto, com a conclusão de que o simples fato de ambas as investigações se encontrarem formalmente indexadas na ampla Área temática 1 do temário do MPT ( meio ambiente do trabalho ) implique conexão. Nessa ordem de ideias, ao contrário da celeridade processual e de maior contato com a prova (finalidade instrumental) pretendida pela Resolução nº 86/2009 do CSMPT, haverá cumulação indevida de investigações distintas. (fls. 11/12 anverso e verso), verbis: Ouvida, a i. Procuradora suscitada assim respondeu Considerando que na denúncia da Representação nº /0 o trabalhador narrou claramente que (...) Machucou a coluna em serviço, conforme boletim de atendimento. A empresa não considerou o fato. Deu demissão. Não pagou (...), fl. 02; 5

6 Considerando que o douto Colega suscitante corrobora o entendimento de que, na Representação nº /0, houve denúncia de ocorrência de acidente, que causou trauma na coluna de trabalhador dentro do canteiro da obra executada pela Construtora OAS Ltda., sem a emissão de CAT pela empresa; Considerando que a proteção à integridade física dos trabalhadores, inequivocamente, prepondera sobre qualquer fato relacionado à sonegação de pagamento de verbas trabalhistas pela empregadora. No caso, nãopagamento de verbas rescisórias; Considerando que a conduta atribuída à empresa afronta o artigo 7º, inciso XXII, da Constituição Federal e aos artigos 157 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como aos artigos 19, 20 e 22 da Lei nº 8.213/91, que dispõem sobre a caracterização do acidente de trabalho e sobre a obrigatoriedade de expedição do correspondente comunicado (CAT) pela empregadora; Considerando que o direito que a denúncia indica ter sido lesionado pela empregadora se enquadra como normas de ordem pública, constitucionalmente assegurada, o que vem a legitimar a atuação do Parquet Laboral, nos termos do estatuído no artigo 129, inciso III, da Constituição Federal, bem como no artigo 6º, incisos VII, a, c e d, e XII, no artigo 83, inciso III, e no artigo 84, inciso II, todos da Lei Complementar nº 75/93, entendo descabido cogitar de uma situação individual ou de evento de pouca gravidade, conforme concluído pelo douto Colega suscitante. Os fatos denunciados exigiam uma mínima apuração, inclusive com a finalidade de verificar-se se a conduta da empresa não se constitui em comportamento genérico, que alcance aos demais empregados (sendo fato público e notório que são diversos, diante da magnitude da obra novo estádio do Grêmio Futebol Clube, bem como que muitos oriundos do Nordeste), de modo a configurar violação a interesses coletivos. Pelas razões acima expostas, mantenho o entendimento explicitado no despacho das fls. 06, verso e 07. 6

7 nos seguintes termos: À fl. 12v despachou o ilustre Procurador suscitante, Apenas para registro, o prontuário de fl. 03 da REP consigna uma contusão na região da coluna lombossacra e não um trauma na coluna, como referido na fl. 11vº destes autos, o que é uma situação completamente diferente da diagnosticada. Dito isso, remeta-se com urgência à E. CC encaminhados a esta Relatora (fl. 15). Remetidos os autos à CCR/MPT (fl. 14), foram eles É o relatório. ADMISSIBILIDADE Atendido o quanto preceituado no artigo 3º da Resolução 69/CSMPT, recebo, com esteio no inciso VI do artigo 103 da LC 75/93, o presente conflito negativo de atribuições. VOTO-FUNDAMENTAÇÃO Evidencia-se dos autos que assiste razão à ilustre Procuradora do Trabalho suscitada, Dra. Sheila Ferreira Delpino, senão vejamos. 7

8 A presente representação trata-se, precipuamente, de irregularidades no meio ambiente do trabalho da empresa Construtora OAS Ltda. A Representação nº /0, autuada anteriormente a esta na Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região e sob a condução do ilustre Procurador suscitante, diz respeito, dentre outros, a tema também relacionado ao meio ambiente do trabalho da aqui denunciada, o que configura hipótese de prevenção, na forma do art. 3º, II, a, da Resolução CSMPT nº 86/2009. Narra a denúncia oferecida nos autos da Representação nº /0 (fl. 02/v do anexo I), verbis: O denunciante veio do Maranhão. A empresa foi buscar. Trabalha como servente. Machucou a coluna em serviço, conforme boletim de atendimento. A empresa não considerou o fato. Deu demissão. Não pagou. Está com a carteira de trabalho, mas não recebeu o pagamento. Trabalhou um mês na empresa. Com quinze dias tirou um vale de R$ 272,00. O salário é de R$ 680,00 = ou -. O hotel é por conta da empresa. Agora demitido, não tem como pagar o hotel e com torção na coluna, não tem como trabalhar. Conforme se infere dos termos da denúncia acima, há inegável notícia de infortúnio relacionado ao meio ambiente do trabalho da empresa Construtora OAS Ltda., ora investigada. Outrossim, a prevenção não se estabelece com os fundamentos expressados no encerramento do procedimento, e sim, com os 8

9 termos da denúncia. E, conforme acima transcrito, a denúncia oferecida na representação paradigma (REP nº /0) encerra situação relacionada ao meio ambiente do trabalho da Construtora OAS Ltda. Ademais, diferentemente do entendimento expressado pelo ilustre Procurador suscitante de que a autuação do procedimento no tocante aos temas investigados não implique necessariamente conexão com outro expediente autuado, parcial ou integralmente, sob o mesmo assunto, temos que a autuação da REP nº /0 obedeceu toda uma sistemática adotada no âmbito do Ministério Público do Trabalho. Logo, se o procedimento, sob sua ótica, encontra-se mal autuado, caberia ao suscitante, em juízo inicial e por meio de despacho saneador, definir e/ou alterar a abrangência dos temas da investigação, determinando a imediata reautuação do feito, e não agora nesta fase. De outro giro, pelo que consta do espelho dos autos da REP nº /0 (anexo I), o digno Procurador nela oficiante e aqui suscitante não submeteu o arquivamento, naquele feito promovido, ao crivo da Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público do Trabalho. Portanto, sem a análise revisional a ser procedida pela CCR/MPT, as razões arquivatórias, por mais relevantes que possam ser, não se prestam a sustentar os argumentos expedidos no conflito negativo de atribuições sub examine, mormente porque passíveis de revisão. 9

10 Diante de tais aspectos, entendo que o presente procedimento deva ser conduzido pelo ilustre Procurador do Trabalho, Dr. Fabiano Holz Beserra, ora suscitante. CONCLUSÃO Posto isso, VOTO no sentido de CONHECER do presente Conflito Negativo de Atribuições, na forma do art. 103, inc. VI, da Lei Complementar nº 75/93, dirimindo-o para estabelecer a atribuição de conduzir este feito na pessoa do Exmo. Procurador do Trabalho, Dr. Fabiano Holz Beserra, lotado na Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região. Dê-se ciência ao suscitante, à suscitada e à chefia da PRT de origem, determinando-se o retorno dos autos à Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região/RS para as providências cabíveis e necessárias. Brasília, 24 de novembro de VERA REGINA DELLA POZZA REIS Subprocuradora Geral do Trabalho Membro da CCR/MPT - RELATORA 10