Simone Guisi Feuerschütte * Paula da Rosa Wernke ** Ricardo de Almeida Pimenta *
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- Gilberto Cabral Lombardi
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1 DIFICULDADES E DESAFIOS DA ATUAÇÃO DE GESTORES ESPORTIVOS DIFICULTADES Y DESAFÍOS EN LA ACTUACIÓN PROFESIONAL DE LOS GESTORES DEPORTIVOS DIFFICULTIES AND CHALLENGES OF PROFESSIONAL ACTION OF SPORT MANAGERS Alfredo Ribeiro Cárdenas * alfredorcardenas@hotmail.com Simone Guisi Feuerschütte * guisi.simone@gmail.com Paula da Rosa Wernke ** paula.rosa@ifsc.edu.br Ricardo de Almeida Pimenta * ricardo275@gmail.com Resumo Resumen Abstract * Universidade do Estado de Santa Catarina, Santa Catarina - Brasil ** Instituto Federal de Santa Catarina, Santa Catarina - Brasil Este estudo teve como objetivo identificar dificuldades/desafios na atuação profissional de gestores esportivos. No estudo, a terminologia dificuldade/desafio foi empregada com uma conotação mais abrangente, abarcando problemas ou situações críticas enfrentadas durante a atuação dos gestores esportivos. Foram realizadas entrevistas com dez gestores de variadas organizações esportivas, da região da grande Florianópolis, sul do Brasil. Os resultados demonstram que: a ausência de experiência; a falta de determinados conhecimentos; o acúmulo de funções; o relacionamento com pessoas; e a captação de recursos (humanos e financeiros) para a organização são alguns dos principais desafios/dificuldades da atuação dos gestores esportivos investigados. Conclui-se que a compreensão sobre esses e outros aspectos da atuação de gestores esportivos pode contribuir para um melhor entendimento das necessidades desses profissionais e, colaborar para a clamada melhoria da formação e qualificação de gestores do esporte no contexto brasileiro. PALAVRAS CHAVE: Gestão do Esporte; Gestores Esportivos; Atuação de Gestores.... Este estudio tuvo como objetivo identificar las dificultades/desafíos en la actuación profesional de los gestores deportivos. En el estudio, la dificultad/desafío fue terminología utilizada con una connotación más amplia, que abarca problemas o situaciones críticas que los gestores enfrentan durante la actuación. Se entrevistó a diez gestores de diversas organizaciones deportivas, la región de Florianópolis, el sur de Brasil. Los resultados muestran que: la ausencia de la experiencia; la falta de conocimientos; la acumulación de funciones; relaciones con personas; y la captura de los recursos (humanos y financieros) para la organización son algunos de los principales desafíos/dificultades de la actuación de los gestores deportivos investigados. Se llegó a la conclusión de que la comprensión de estos y otros aspectos de la función de los administradores de los deportes puede contribuir a una mejor comprensión de las necesidades de estos profesionales, y contribuir a la clamada mejora en la formación y cualificación de los gestores deportivos en el contexto brasileño. PALABRAS CLAVE: Gestión del Deporte; Gestores deportivos; Actuación de los gestores.
2 ... This study aimed to identify difficulties/challenges of professional action of sport managers. In the study, the difficulty/challenge terminology was employed with a broader connotation, encompassing problems or critical situations faced during the performance of sport managers. Interviews with ten managers of various sports organizations, from Florianopolis, south of Brazil, were made. The results show that: the absence of experience; the lack of specific knowledge; accumulation functions; relationships with people; and the capture of resources (human and financial) to the organization are some of the main challenges/difficulties of the action of sport managers investigated. It is concluded that an understanding of these and other aspects of the action of sport managers can contribute to a better understanding of the needs of these professionals and contribute to the necessary improvement of the training and qualification of sport managers in the Brazilian context. KEYWORDS: Sport management; Sports managers; Practice Managers. 1. Introdução Atualmente, a gestão do esporte tem sido foco de crescente interesse, tanto da comunidade acadêmica como da sociedade em geral, devido a fatores diversos como, por exemplo, a realização dos megaeventos que o Brasil sediou nesta década. Não obstante a esse panorama e embora se observe evolução da área, principalmente no âmbito das pesquisas e estudos desenvolvidos sobre o contexto brasileiro, observa-se, ainda, um espaço em potencial para a produção de conhecimento aplicado ao campo da gestão esporte no país e igualmente para a evolução da área de atuação/intervenção profissional. A gestão do esporte, como área de intervenção profissional onde atuam os gestores esportivos acontece dentro de organizações/estruturas administrativas, cujo fim está relacionado ao desenvolvimento de serviços voltados às atividades físicas, esportivas e de lazer (Bastos, 2003; Vieira & Stucchi, 2007). No entanto, em se tratando da condução administrativa dessas organizações em termos da gestão realizada estudiosos e especialistas da área convergem na opinião de que, muitas vezes, essa administração é exercida de forma amadora, não profissional, intuitiva e ineficiente, em grande parte das organizações brasileiras (Capinussú, 2002; Azevêdo; Barros & Suaiden, 2004; Bastos et al., 2006; Maciel, 2009; Maroni; Mendes & Bastos, 2010, Bastos & Mazzei, 2012). Deste modo, questiona-se sobre a efetividade da atuação de gestores esportivos e, consequentemente, sobre o impacto da gestão no desenvolvimento esportivo alcançado pelas instituições. Destaque tem sido dado à necessidade de profissionalização da gestão do esporte no país (Capinussú, 2002; Bastos, 2003; Costa & Marinho 2005; Valente & Serafim, 2006; Vieira & Stucchi, 2007; Azevedo, 2009; Ferraz et al., 2010; Bastos & Mazzei, 2012), existindo um esforço em demonstrar a necessidade de aprimoramento da qualificação dos atuais gestores do esporte, e, concomitantemente, dos próprios processos de formação dos futuros profissionais que atuarão neste campo. Em se tratando da intervenção profissional, pesquisas têm sido desenvolvidas e publicações têm buscado evidenciar especificidades dos diferentes segmentos/setores esportivos (Mazzei & Bastos, 2012), Entretanto, devido à diversidade de contextos esportivos existentes, de Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
3 objetos de estudo passíveis de investigação, e considerando, ainda, as particularidades das distintas regiões do país, é cabível considerar a necessidade de desenvolver estudos em maior volume e profundidade. Diante deste cenário, uma compreensão aprofundada das diversas realidades de intervenção e dos diferentes aspectos relacionados à atuação de gestores esportivos brasileiros entre esses aspectos, as dificuldades enfrentadas no cotidiano e os desafios da atuação profissional, etc. podem contribuir para uma melhor compreensão das necessidades profissionais e de preparação destes indivíduos. Ao mesmo tempo pode colaborar para a clamada melhoria da formação e qualificação de gestores esportivos brasileiros. Então, alinhado aos entendimentos e argumentos concatenados até aqui, e considerando que a atuação profissional é um objeto de estudo passível de ser investigado sob a luz de distintas perspectivas, este artigo teve como objetivo identificar dificuldades/desafios da atuação profissional de gestores esportivos. Frente ao objetivo proposto, o artigo está estruturado, além desta introdução, da seguinte forma: a segunda seção apresenta a fundamentação teórica que contextualiza o escopo da investigação; a terceira seção expõe os procedimentos metodológicos empregados na pesquisa empírica; a seção quatro apresenta os resultados da pesquisa e; por fim são apresentadas as considerações finais sobre o estudo realizado e as referências utilizadas. II. Fundamentação Teórica II.I. Gestão do Esporte A gestão do esporte é compreendida como uma área profissional na qual atuam os gestores esportivos. Apesar de estar recebendo maior atenção acadêmica e social nos últimos tempos, existe ainda, conforme alegam Rocha e Bastos (2011), grande desentendimento sobre vários aspectos e conceituações fundamentais da área. Na literatura acadêmica, entendimentos distintos sobre o tema começam a partir das terminologias utilizadas para referenciar a área. Gestão esportiva, gestão desportiva, administração desportiva, gestão de organizações/entidades/instituições esportivas, são termos comumente utilizados nas publicações científicas. Para Bastos e Mazzei (2012) gestão do esporte é vista como a terminologia mais apropriada e atual para referir-se ao tema. Internacionalmente, sport management e sport administration são as expressões comumente utilizadas. A despeito da diversidade conceitual apontada sobre a gestão do esporte, há convergência entre os estudiosos quanto à confluência entre os princípios e fundamentos da Administração à realidade dos esportes e das organizações esportivas. Sob este prisma, Rocha e Bastos (2011. p.94) afirmam que a gestão do esporte pode ser entendida, basicamente, como a aplicação dos princípios de gestão a organizações esportivas. Além desta conexão entre os princípios da Administração e o contexto esportivo, a gestão do esporte conflui outros saberes como os da Sociologia, da Psicologia e do Direito, fazendo com que seja compreendida como um campo Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
4 de conhecimento e de intervenção multidisciplinar (PIRES; SARMENTO, 2001; BASTOS, 2003; FERRAZ, et al., 2010; BASTOS; MAZZEI, 2012). No contexto brasileiro, diferentemente de outros países, o enquadramento conceitual da área não está ainda bem estabelecido, existindo divergência entre estudiosos que consideram a gestão do esporte como um campo dependente de outras áreas, e autores que a compreendem como uma área de estudos independente, que possuiria literatura, teorias e práticas próprias. Em países da Europa, da Ásia e nos EUA a gestão esportiva é considerada uma área de formação específica, inclusive com cursos de graduação e pós-graduação stricto sensu desenvolvidos exclusivamente para a formação de profissionais que desejam atuar na gestão do esporte (BASTOS; MAZZEI, 2012). Em termos de intervenção profissional, a gestão de organizações esportivas ocorre desde a criação das primeiras entidades de prática e organização do esporte no Brasil clubes, associações, federações, confederações. Todavia, a gestão dessas organizações tem sido considerada por estudiosos e especialistas da área como amadora e ineficiente (AZEVÊDO; BARROS; SUAIDEN, 2004; AZEVÊDO; BARROS, 2004; BASTOS et al, 2006; MACIEL, 2009; MARONI; MENDES; BASTOS, 2010). Tal avaliação pode estar relacionada, dentre outros fatores, à qualificação dos gestores e, ao mesmo tempo, à sua formação (ou a falta dela) para atuar no âmbito da gestão do esporte (CAPINUSSÚ, 2002; BASTOS, 2003; COSTA; MARINHO 2005; VALENTE; SERAFIM, 2006; VIEIRA; STUCCHI, 2007; AZEVEDO, 2009; FERRAZ et al, 2010). II.II. A atuação do gestor esportivo O profissional que desempenha funções como gestor esportivo ou gestor do esporte atua, basicamente, em organizações/estruturas administrativas que promovam ou ofereçam serviços voltados à atividade física, esportiva, recreativa, de lazer e tenha como objetivo o desenvolvimento e a manutenção das mesmas (BASTOS, 2003; VIEIRA; STUCCHI, 2007). Algumas possibilidades de atuação desse profissional são os clubes, academias de ginástica, ligas, federações, confederações, instituições de administração pública e empresas privadas, com ou sem fins lucrativos. Dentro de tais instituições os profissionais podem assumir diferentes cargos, como de diretores, gerentes, gestores de eventos, de produto e de recursos humanos, da área de marketing, consultores e até investigadores (Pires & Sarmento, 2001; Vieira & Stucchi,2007; Ferraz et. al. 2010; Rocha & Bastos, 2011). Considera-se gestor esportivo o indivíduo que desenvolve atividades administrativas em organizações esportivas, independentemente, segundo Bastos e Mazzei (2012), se está situado hierarquicamente no vértice estratégico (presidência) ou no nível intermediário da estrutura organizacional (gerência, supervisão, direção, etc.). Para Hatzidakis (2012) também não importa se o indivíduo é remunerado ou não pela atividade que desenvolve. O gestor esportivo é, portanto, aquele que administra/gere organizações esportivas. Pesquisas sobre o perfil do gestor esportivo brasileiro têm encontrado profissionais com variadas formações. Embora existam profissionais com distintas formações e alguns sem Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
5 formação superior alguma, os estudos apontam uma predominância de gestores formados nas áreas da Educação Física/Esportes (predominantemente) e na Administração (Azevêdo & Barros, 2004; Sarmento, 2005; Bastos et. al., 2006; Maciel, 2009; Maroni; Mendes & Bastos, 2010). Conforme pesquisa de Cárdenas (2013), a atuação de gestores esportivos está, habitualmente, fundamentada em dez principais atividades e responsabilidades, quais sejam: (1) uma responsabilidade geral pela organização esportiva e atividades relacionadas à mesma; (2) manutenção e melhoria dos processos organizacionais e da estrutura física que a organização dispõe; (3) planejamento organizacional; (4) gestão financeira; (5) captação de recursos; (6) gestão de marketing; (7) relacionamento com o público-alvo e outros stakeholders da organização; (8) lidar com pessoas, gerir pessoas; (9) avaliar, corrigir e solucionar problemas e; (10) organização de eventos esportivos. Ao que pode ser observado, a atuação do gestor esportivo está associada a uma variedade de aspectos, especialmente em relação às características e demandas do contexto esportivo no qual está inserido, além da posição hierárquica que ocupa dentro da organização esportiva. Muitas vezes a atuação de gestores esportivos pode ser semelhante a do administrador de empresas não-esportivas no desenvolvimento de atividades nas áreas financeira, de recursos humanos, marketing, planejamento estratégico, por exemplo ; outras vezes, conforme a especificidade do contexto esportivo, o gestor pode atuar no desenvolvimento de atividades como gestão de eventos e competições esportivas, instalações e programas para a prática de esportes e captação de patrocínios (Horch & Schutte, 2003; Bastos & Mazzei, 2012). III. Procedimentos metodológicos O estudo é caracterizado como descritivo de abordagem qualitativa (Creswell, 2010; Richardson et al., 2007; Gil, 2008), o qual buscou identificar dificuldades/desafios da atuação profissional de gestores esportivos. Para tanto, utilizou-se como estratégia de pesquisa a realização de entrevistas em profundidade, com gestores esportivos dos níveis estratégico e tático de variados contextos esportivos (clube, federação, academia...). Considerando-se a importância de contemplar diferentes realidades da gestão do esporte, estabeleceu-se que 10 indivíduos adiante descritos integrariam o grupo de sujeitos da investigação. Utilizando-se, ainda, de critérios como acessibilidade aos sujeitos e conveniência do pesquisador, delimitou-se que a investigação seria realizada com indivíduos atuantes em organizações esportivas da região da grande Florianópolis, Santa Catarina, Sul do Brasil. Após contatos, por s, entre os pesquisadores e os sujeitos selecionados, as entrevistas foram agendadas e realizadas em locais escolhidos pelos entrevistados e convenientes as suas agendas de compromissos. As entrevistas foram realizadas por um dos autores deste estudo que possuía experiência na condução de investigações científicas. Utilizou-se de um roteiro semiestruturado de perguntas composto por aproximadamente sete indagações, as quais buscaram captar, fundamentalmente, as principais dificuldades, desafios, pontos críticos enfrentados na gestão das organizações esportivas. Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
6 As entrevistas tiveram duração média de trinta minutos. Com o consentimento dos entrevistados foram gravadas em áudio e, posteriormente, transcritas. O resultado das transcrições foi submetido à análise de conteúdo, segundo as recomendações de Bardin (2004), nomeadamente a organização da análise, a codificação e a categorização. IV. Apresentação dos Resultados Os resultados do estudo estão apresentados em duas partes principais: a primeira faz uma breve caracterização dos gestores esportivos entrevistados e das organizações em que atuam; em seguida são apresentadas as dificuldades/desafios da atuação dos gestores esportivos investigados. IV.I. Caracterização dos gestores e das organizações em que atuam Na intenção de melhor compreender sobre as dificuldades/desafios da atuação dos sujeitos entrevistados, julgou-se necessário identificar acerca de características dos próprios respondentes e do contexto organizacional que desempenham suas funções. Neste sentido, buscou-se identificar no início das entrevistas características como idade, formação acadêmica e cargo ocupado na organização esportiva, as quais são sinteticamente apresentadas no Quadro 1. Conforme previsto nos termos de consentimento assinados pelo pesquisador e por cada participante da pesquisa no momento das entrevistas, e para que os dados particulares de cada indivíduo e, também, das organizações envolvidas na investigação não sejam divulgados, os gestores esportivos estão identificados doravante no estudo como: GE1 (gestor esportivo um), GE2, GE3, GE4, GE5, GE6, GE7, GE8, GE9 e GE10; Quadro 1 Características dos gestores esportivos e dos contextos organizacionais Gestor Idade Organização Esportiva Cargo Formação Acadêmica (GE1) 47 Federação Esportiva 1 Gerente Educação Física (GE2) 32 Federação Esportiva 2 Gerente Educação Física (GE3) 63 Federação Esportiva 3 Presidente Educação Física (GE4) 32 Departamento de esportes Promotor Educação Física (GE6) 27 ONG Presidente Educação Física (GE5) 53 Clube de futebol Gestor Pleno Superior incompleto (GE7) 27 Empresa de gestão e marketing esportivo Diretor Executivo Administração (GE8) 31 Academia Proprietária Administração (GE9) 44 Órgão Público de fomento ao esporte Presidente Direito (GE10) 57 Órgão Público de fomento ao esporte Analista técnico Educação Física Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
7 Embora as características, apresentadas no Quadro 1, não sejam, especificamente, o objeto principal desta investigação, contribuem para uma melhor compreensão e contextualização da atuação profissional dos gestores investigados. IV.II. Dificuldades e desafios da atuação dos gestores esportivos As informações obtidas por meio da realização das entrevistas com os gestores esportivos demonstraram a existência de diferentes dificuldades relacionadas à atuação dos mesmos. Não obstante, cabe ser mencionado que certas dificuldades relatadas por alguns entrevistados não necessariamente são entendidas da mesma forma por outros gestores, provavelmente devido às diferenças de formação, experiência na função e a própria percepção dos mesmos quanto ao cotidiano de atuação profissional. Deste modo, destaca-se que não foi intenção deste estudo apontar as dificuldades específicas de cada indivíduo ou de cada contexto organizacional, mas proporcionar, um entendimento geral sobre as principais dificuldades enfrentadas pelos gestores esportivos envolvidos no estudo. Novamente é importante destacar que o próprio significado de dificuldade empregado neste estudo (e durante as entrevistas) teve uma conotação mais abrangente, abarcando também problemas ou situações críticas enfrentadas, bem como os desafios da atuação dos gestores esportivos. Inicialmente, identificou-se que grande parte das dificuldades pautadas pelos gestores entrevistados estava diretamente relacionada à ausência de uma experiência em determinada questão, e/ou à deficiência ou falta de determinado conhecimento necessário à sua atuação profissional. A falta de experiência em determinadas questões foi relatada como um ponto dificultador da atuação de certos entrevistados e portanto um desafio a ser superado como pode ser observado no discurso, abaixo, que ilustra a falta de experiência da gestora em lidar com colaboradores da organização. No começo eu apanhei muito, principalmente, no relacionamento com os funcionários, porque eu era muito nova e imatura. Não tinha experiência nenhuma. Então, tu acaba querendo ser amiga de todo mundo, e não é por aí. [...] Tive que aprender até onde eu posso ir, até onde dá pra ser legal, daí onde tem que parar e mudar a postura e agir de outra maneira. Hoje eu já consigo trabalhar melhor isso (GE8). A falta de determinados conhecimentos relevantes à atuação profissional no campo da gestão foi igualmente apontada como um ponto dificultador da atuação dos entrevistados. Neste sentido, a ausência de determinados saberes ou mesmo de uma formação acadêmica que pudesse colaborar diretamente para gestão de organizações esportivas foi apontada como uma dificuldade. Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
8 Sobre a falta de conhecimentos e, ainda, sobre como lidar com essa necessidade, um gestor declarou: Eu senti muita falta no início, porque minha formação foi todinha, sempre, na prática e benchmarking. [...]. Só que num determinado momento eu senti falta de uma parte acadêmica. Senti muita falta. Do lado teórico. [...] Eu tive que fazer vários cursos pra aprender. Fiz vários cursos pra buscar isso que me faltava. [...] Sempre que eu podia estava falando com profissionais, tava perguntando, aprendendo com quem sabia (GE6). Não obstante, para lidar com a ausência de determinados conhecimentos ou com a dificuldade de dominar a ampla gama de saberes necessários à gestão de uma organização esportiva, os entrevistados indicam a possibilidade de o gestor ser assessorado por outros profissionais especialistas nas diferentes áreas do conhecimento necessárias à gestão de uma organização esportiva. Saber tudo?! [o gestor falava sobre os diversos conhecimentos, ou áreas do conhecimento, relacionados à gestão de uma organização esportiva] [...] Acho que tem que ter os princípios básicos de tudo. Ter uma visão sistêmica do todo e ser bom em duas ou três áreas. Tem que trazer pessoas boas pra compartilhar. Eu acredito muito no trabalho em equipe (GE6). Para lidar com a falta do conhecimento técnico, específico de determinada área, um dos gestores afirma: Se eu não tenho a parte técnica [referindo-se ao conhecimento específico da área da Educação Física, pois a organização esportiva, no caso, é a academia] e eu não tenho interesse em estar buscando, eu tenho que me cercar de uma equipe de pessoas que tenham o conhecimento e que me ajudem nesse sentido. Porque em várias situações, principalmente, quando a gente vai fazer investimentos em aparelhagem, ou quando a gente vai, sei lá, mudar as modalidades, diversificar, a gente precisa de ajuda. Isso tudo é decidido com outras pessoas. Então, o conhecimento na área é essencial para gerir o negócio. Ou ter o conhecimento, ou estar cercado de pessoas que te auxiliem, né? Montar uma equipe que contribua nesse sentido (GE8). Porém, ao contrário da possibilidade de o gestor cercar-se de profissionais/especialistas nas diversas áreas, outro ponto identificado como dificultador da atuação de determinados gestores foi, justamente, o excesso de atividades e responsabilidades ou acúmulo de funções dentro de uma organização esportiva. Em algumas organizações, por uma restrição de recursos Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
9 financeiros, os gestores relataram que, muitas vezes, acabam acumulando outras funções, outras atividades/responsabilidades, o que os impede de desempenhar com mais plenitude as funções administrativas da organização. Antes era tudo em cima de um cargo só. [...] A gente fazia tudo, do planejamento à operação. E não era pra fazer tudo. Era pra gente tá gerindo, tomando decisão, pensando no negócio. Hoje nós conseguimos dividir um pouco mais, e aí eu consigo fazer muitas coisas que fazem com que a federação consiga crescer um pouco mais (G1). Hoje, infelizmente, nos não temos um quadro de pessoal pra cada um cuidar de uma coisa, porque o orçamento que nós temos pra trabalhar é pequeno. Aí, pela falta de pessoas, você acaba indo pra operação também, não fica só no estratégico (GE6). Além das dificuldades apresentadas e implícito a alguns discursos já apresentados a questão do relacionamento e/ou o trato com pessoas internas e externas da organização foi apontado como um dos grandes desafios da atuação de gestores esportivos, sobretudo na percepção dos mais jovens ou com menos experiência na função independentemente da formação conforme pode-se observar no seguinte depoimento: Pra mim, a parte mais difícil sempre foi o relacionamento com o funcionário, com o cliente, é o lidar com pessoas. Cada um é de um jeito e, às vezes, tu não sabe com agir. [...] Sem as pessoas, sem tua equipe, claro, tu não vai a lugar nenhum. Lidar com as pessoas é importante, mas complicado (GE8). Lidar com pessoas é um grande desafio e eu dependo muito das pessoas ao redor de mim pra poder realizar as atividades da organização, por que sozinho não adianta. [...] Se você vai manejar sua empresa, você vai estar manejando pessoas. Acho que isso faz muita diferença na gestão da sua empresa. A forma que você consegue lidar com as pessoas. Entender como você vai incentivar as suas peças [as pessoas] a utilizar os mecanismos que você deu pra eles, pra entregar pra você, de volta, os resultados que você tá procurando. Esse incentivo é muito importante, e cada pessoa é diferente, tem sua atitude e postura. Tem que saber lidar, lidar com pessoas (GE7). Permeando o mesmo sentido, alguns gestores afirmaram encontrar dificuldades em localizar pessoas qualificadas/capacitadas para o trabalho na gestão das organizações esportivas. Relataram ser difícil encontrar pessoas com qualificação para o trabalho e também, algumas Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
10 vezes, de fazer com que as pessoas que trabalham na organização correspondam às demandas que lhes são solicitadas. [...] a gente encontra muita gente despreparada pra trabalhar com a gente. A qualificação profissional nessa área [da gestão do esporte] é muito complicada. [...] as pessoas não têm muita noção do que tem que fazer. Não sei se a falha é na hora de orientar, se não tem uma orientação adequada pra essas pessoas, ou se é em encontrar essas pessoas bem qualificadas. Pode ser as duas coisas, mas eu acredito que seja mais a falta de qualificação das pessoas mesmo, da formação delas. [...] por não ter passado por aquilo ali em algum momento da graduação mesmo, até mesmo numa experiência de estágio, de não ter atuado nas diversas áreas, ter ficado restrito. (GE4) Alguns gestores relataram, ainda, encontrar dificuldades relacionadas à captação de recursos que poderiam subsidiar financeiramente as atividades das organizações em que atuam. Mencionaram dificuldades em acessar os recursos de fundos públicos e também de convencer investidores da iniciativa privada a aplicar recursos em projetos e organizações esportivas. Por fim, a necessidade de contornar situações adversas, apagar incêndios, emergências são outras questões pontuais alegadas como pequenos desafios do cotidiano de gestores esportivos, relacionados às especificidades de cada situação e contexto organizacional. O Quadro 2 apresenta uma síntese dos principais resultados encontrados pelo presente estudo. Quadro I Síntese dos resultados do estudo Dificuldades/desafios da atuação profissional de gestores esportivos - Ausência de experiência em determinada questão; - Falta de determinado conhecimento; - Acúmulo de funções; - Relacionamento e o trato com pessoas; - Dificuldades em localizar pessoas qualificadas/capacitadas para trabalhar na organização; - Captação de recursos para a organização. V. Considerações Finais Frente aos elementos e argumentos encadeados ao longo do estudo, e reportando-se ao objetivo da pesquisa o qual pretendeu identificar dificuldades/desafios da atuação profissional de gestores esportivos é possível se chegar algumas considerações e conclusões. Inicialmente, observou-se que grande parte das principais dificuldades enfrentadas pelos gestores esportivos está relacionada à ausência de experiência em determinadas questões e/ou a falta de determinado conhecimento relevante à atuação profissional no âmbito da gestão de uma organização esportiva. Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
11 O acúmulo de funções por parte dos gestores, em muitas organizações, faz com que a atuação desses gestores seja dificultada. Igualmente, o relacionamento e o trato com as diversas pessoas internas e externas envolvidas com a organização são vistos como grandes desafios da atuação de gestores do esporte nos contextos pesquisados. A captação de recursos para a organização (sejam eles humanos ou financeiros) é também apontado como uma das dificuldades encontradas no âmbito da gestão de organizações esportivas. O entendimento sobre os diversos desafios e dificuldades da atuação dos sujeitos entrevistados, possibilita um entendimento mais aprofundado sobre a atuação de gestores esportivos e, por conseguinte, sobre algumas de suas necessidades, dificuldades e desafios frente à gestão de organizações esportivas. As implicações dos resultados deste estudo estão associadas à identificação das necessidades que a formação relativa ao gestor esportivo deve atender, buscando contornar os desafios da atuação profissional ao oferecer subsídios teóricos e competências para o enfrentamento de tais situações. Perante esta questão, pode-se ser mencionado que existem dificuldades identificadas na atuação profissional que estão relacionadas ao esquema organizacional das instituições investigadas, outras dificuldades/desafios, porém, estão ligados à formação do gestor. Ao compreender que gestores esportivos enfrentam as dificuldades relacionadas, por exemplo, à falta de determinado conhecimento ou experiência prévia em determinada área organizacional, faz com que seja percebida uma necessidade de a formação/preparação destes gestores contemple tais conhecimentos/conteúdos (estudos que identifiquem quais conhecimentos são importantes aos gestores esportivos podem contribuir sobre esta questão). No mesmo sentido, ao identificar que gestores, pela falta de experiência prévia, passam por dificuldades percebe-se que, assim como menciona Cárdenas (2013), na formação desses profissionais é essencial que exista uma parte prática que possibilite entrar em contato com vivências relacionadas à gestão de organizações esportivas antes que o profissional adentre no mercado de trabalho. Por outro lado, se entende que alguns desafios da atuação de gestores esportivos estão relacionados a fatores que extrapolam a possível preparação formação dos gestores (como o caso do acumulo de funções e o desafio de encontrar pessoas qualificadas) ou, ainda, são inerentes a essa atuação profissional (como a busca de recursos humanos e financeiros para a organização). Desta forma, a atuação profissional do gestor esportivo parece inevitavelmente ligada a desafios. Por fim, acreditando que outros aspectos podem estar associados à atuação de gestores em outros contextos esportivos e que particularidades podem ser encontradas em investigações realizadas em outras regiões, sugere-se que investigações semelhantes a esta sejam empreendidas em outras, variadas organizações esportivas, e de outras regiões. As conclusões de tais estudos podem contribuir para reforçar os achados do presente estudo, acrescentar elementos ou mesmo negar as conclusões aqui apresentadas. Uma profunda compreensão sobre a atuação profissional de gestores esportivos e sobre os diversos Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
12 aspectos dessa atuação, incluindo aqui os desafios e dificuldades da mesma poderá contribuir para o aprimoramento, tanto da qualificação, como da formação de futuros gestores no país e, consequentemente, para o aprimoramento da área gestão do esporte, como um todo, no contexto brasileiro. Referências AZEVEDO, P. H. (2009). O esporte como negócio: Uma visão sobre a gestão do esporte nos dias atuais. Revista Estudos, Goiânia, 36 (9/10), AZEVÊDO, P. H.; BARROS, J.F. (2004). A necessidade de administração profissional do esporte brasileiro e o perfil do gestor público, em nível federal, que atuou de 1995 a Lecturas, Educación Física y Deportes, Revista Digital, Buenos Aires, 10 (74). AZEVÊDO, P.H.; BARROS, J.S.; SUAIDEN, S. (2004). Caracterização do perfil do gestor esportivo dos clubes da primeira divisão de futebol do distrito federal e suas relações com a legislação esportiva brasileira. Revista da Educação Física/UEM. 15(1), BARDIN, L. (2004). Análise de conteúdo. Lisboa: Editora 70. BASTOS, F.C. (2003). Administração Esportiva: área de estudo, pesquisa e perspectivas no Brasil. Motrivivência, São Cristóvão, 15 (20/21), BASTOS, F.C.; BARHUM, R.; ALVES, M.; BASTOS, E; MATTAR, M.; REZENDE, M.; MARDEGAN, M.; BELLANGERO, D. (2006). Perfil do administrador esportivo de clubes de São Paulo/Brasil. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte, São Paulo, 5 (1), BASTOS, F.C.; MAZZEI, L.C. (2012). Gestão do esporte no Brasil: desafios e perspectivas. IN: MAZZEI, L.C.; BASTOS, F.C. (Orgs.). Gestão do esporte no Brasil: desafios e perspectivas. São Paulo: Ícone. CAPINUSSÚ, J. M. (2002). Administração desportiva moderna. São Paulo: Ibrasa. CÁRDENAS, A. R. Atuação de gestores esportivos e a formação, relacionada à gestão, oferecida em cursos de Educação Física. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Administração) Universidade do Estado de Santa Catarina. Florianópolis, COSTA, F. L.; MARINHO, E. (2005). Fome de bola: o futebol no Brasil e os desafios da gestão esportiva. Revista Portuguesa e Brasileira de Gestão, Lisboa, 4 (1). CRESWELL, J.W. (2010). Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto. 3ª Ed. Porto Alegra: Artmed. FERRAZ T. M.; LOPES, P. C.; TEOTÔNIO, A. C.; BORRAGINE, S. O. F. (2010). Gestão esportiva: competências e qualificações do profissional de Educação Física. Lecturas, Educación Física y Deportes, Revista Digital. Buenos Aires, 15 (147), Disponível em: < Acesso em: 20 jun GIL, A.C. (2008). Métodos e técnicas de pesquisa social. 6ª ed. São Paulo: Atlas. HATZIDAKIS, G.S. Prefácio. IN: MAZZEI, L.C.; BASTOS, F.C. (Orgs.). Gestão do esporte no Brasil: desafios e perspectivas. São Paulo: Ícone, HORCH, H.D; SCHÜTTE, N. (2003). Competencies of sport managers in German sport clubs and sport federations. Managing Leisure, London, 8, MACIEL, M. G. (2009). Perfil do gestor de lazer nas empresas. Revista Brasileira de Ciências do. Esporte, Campinas, 31 (1), MARONI, F. C.; MENDES, D. R.; BASTOS F. C. (2010). Gestão do voleibol no Brasil: o caso das equipes participantes da Superliga Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, 24 (2), MAZZEI, L.C.; BASTOS, F.C. (Orgs.). (2012). Gestão do esporte no Brasil: desafios e perspectivas. São Paulo: Ícone. PIRES, G. M. V. S. SARMENTO, J. P. (2001). Conceito de Gestão do Desporto. Novos desafios, diferentes soluções. Revista Portuguesa de Ciências do Desporto, Porto,1 (1), RICHARDSON, R.J; PERES, J.A.S; WANDERLEY, J.C.V; CORREIA, L.M. PERES, M.H.M. (2007). Pesquisa social: métodos e técnicas. 3ª ed. São Paulo: Atlas. Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
13 ROCHA, C.M.; BASTOS, F.C. (2011). Gestão do esporte: definindo a área. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte. 25 (4), SARMENTO, J. P. (2005). Qualidade na gestão de instalações desportivas. Disponível em: < Acesso em: 20 jun VALENTE, R.; SERAFIM, M. (2006). Gestão esportiva: Novos rumos para o futebol brasileiro. Revista de Administração de Empresas, Rio de Janeiro, 46 (3), VIEIRA, T. P.; STUCCHI, S. (2007). Relações preliminares entre a gestão esportiva e o profissional de Educação Física. Revista Conexões, Campinas, 5 (2), p Recebido em: Aceito em: Endereço para correspondência: Alfredo Ribeiro Cárdenas alfredorcardenas@hotmail.com Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons Attribution 3.0 Rev. Intercon. Gest. Desport., Rio de Janeiro, 7 (1): 77-89, jan-abr/
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