TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Sindical
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1 TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Sindical A RETENÇÃO DA GORJETA COMO CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA NA VISÃO DO PROJETO DE LEI DO SENADO FEDERAL (PLS) Nº 471/09 Roberto Lopes Advogado O presente trabalho técnico tem por finalidade informar e esclarecer o empresariado das categorias econômicas que integram o comércio de bens, serviços e turismo sobre a tramitação do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 471/2009, de autoria do Senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), que objetiva tipificar a conduta da retenção, pelo empregador, da gorjeta devida ao empregado como crime de apropriação indébita, a que se refere o art. 168 do Código Penal (CP), inserindo, no art. 457 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), 3 (três) novos parágrafos (numerados de 4º a 6º), a saber: O art. 457 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.542, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos: Art º A apropriação da gorjeta de que trata o 3º sujeita o empregador às penalidades previstas no art. 168 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal). 5º Sem prejuízo das penalidades de disposto no 4º, obriga-se o empregador a devolver a gorjeta em, no máximo, 48 (quarenta e oito) horas, acrescida de 50% (cinquenta por cento) do valor devido. 6º O disposto no 5º aplica-se cumulativamente a cada período de 48 horas. (NR) Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. A gorjeta, espécie do gênero remuneração, é uma retribuição voluntariamente paga por aqueles que utilizam determinados serviços prestados, por exemplo, pelos garçons em restaurantes e estabelecimentos assemelhados. Nesse contexto, o empregado, inobstante às regras pactuadas em seu contrato de trabalho, acordo ou negociação coletiva, terá direito a receber do empregador o salário pactuado e o repasse da gorjeta. A proposição, preocupada com o pronto repasse dessa verba remuneratória, objetiva criminalizar a conduta do empregador que porventura a retiver, equiparando-a ao crime de apropriação indébita capitulada no art. 168 do Decreto-Lei nº 2.848/1940, Código Penal (CP). Dita criminalização, revela-se contraindicada exatamente porque criaria desnecessário conflito entre os atores sociais que, diante dessa situação, já possuem instrumentos válidos e
2 48 eficazes, no âmbito das relações de trabalho e dentro do espírito do amplo entendimento, para regulamentar essa injustificada retenção, inclusive estipulando sanções para esse tipo de comportamento. Em sendo a gorjeta uma liberalidade do consumidor e não um imposto seu pagamento não é obrigatório e, como tal, existe a possibilidade de não haver repasse, fato que desencadearia dúvidas quanto à configuração do ilícito em questão. O que se busca, portanto, é manter um ambiente amigável de cooperação entre empregados e empregadores. Eventuais desavenças devem ser resolvidas no âmbito do contrato coletivo, da conciliação, mediação, arbitragem ou sentença judicial, não na esfera policial. Isto porque no atual estágio da organização sindical brasileira, mormente quando sabemos do grande alcance e representatividade dos sindicatos, valoriza-se a boa-fé e respeito às normas celetistas e aquelas convencionadas em negociação coletiva sob pena de, comprovado o ato lesivo praticado por uma das partes, culminar em sua reversão, amigavelmente ou por sentença judicial. Enfim, repita-se, o tratamento dos desvios de conduta trabalhista pela via da criminalização serve apenas para tornar a relação entre empregados e empregadoras mais tensa, o contrário do que se busca na sociedade moderna na qual a cooperação precisa substituir a confrontação para que as empresas cresçam e mantenham os empregos dos trabalhadores. Apesar da nobre intenção demonstrada pelo ilustre Senador ao apresentar o PLS 471/2009, o fato é que a matéria já se encontra devidamente regulamentada e o empregado já tem a seu favor acordos e normas coletivas que estipulam regras complementares no que pertine ao repasse, a forma de rateio da gorjeta, sanções pelo não pagamento. Confira-se 1 : ACORDO COLETIVO DE TRABALHO 2009/2010 SINDICATO DOS TRAB DO COMÉRCIO HOTELEIRO E SIMILARES DO CE, CNPJ n / , neste ato representado (a) por seu Presidente, Sr (a). LUIZ ONOFRE CHAVES DE BRITO; E RV & JANEBRO CREPERIA LTDA, CNPJ n / , neste ato representado (a) por seu Empresário, Sr (a). JOSE CLAUDIO VIGNOLI; celebram o presente ACORDO COLETIVO DE TRABALHO, estipulando as condições de trabalho previstas nas cláusulas seguintes: CLÁUSULA DÉCIMA SEGUNDA DA FINALIDADE A empresa fará constar no pé da nota de consumo de bebidas e alimentos dos usuários a taxa de serviço ou gorjeta compulsória no valor de 10% (dez por cento) a ser distribuída MENSALMENTE com os funcionários acordantes em assembleia geral. 1 Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Sistema Mediador (Registro de Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho). Disponível em : Acesso em 25 ago Trabalhos Técnicos
3 49 PARÁGRAFO PRIMEIRO: Obriga-se a empresa acordante a fixar no flanelógrafo a discriminação dos valores, com o fito de proporcionar ao trabalhador meio de controle dos valores recebidos e a receber. PARÁGRAFO SEGUNDO: O atraso no repasse da gorjeta ou taxa de serviço por parte da empresa, enseja em multa diária de 1% (um por cento) sobre o valor a ser repassado revertido em favor do funcionário. (grifo nosso) CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO 2009/2010 SINDICATO DOS EMP NO COM HOTELEIRO E SIM DE ARAÇATUBA, CNPJ n / , neste ato representado (a) por seu Membro de Diretoria Colegiada, Sr (a). GERALDO DOS REIS; FEDERACAO EMPREGS COMÉRCIO HOTELEIRO SIMIL EST. S PAULO, CNPJ n / , neste ato representado (a) por seu Procurador, Sr (a). GERALDO DOS REIS; E SINDICATO DE HOTEIS REST BARES E SIMILARES DE ARAÇATUBA, CNPJ n / , neste ato representado (a) por seu Presidente, Sr (a). LIU SHANG SHIEN; FED HOTEIS RESTAURANTES BARES E SIMILARES EST. SAO PAULO, CNPJ n / , neste ato representado (a) por seu Procurador, Sr (a). LIU SHANG SHIEN; CLÁUSULA DÉCIMA QUINTA DAS COMISSÕES E GORJETAS OBRIGATÓRIAS E COMPULSÓRIAS Desde que para distribuição entre os seus empregados, as empresas poderão adotar o sistema de cobrança de gorjetas obrigatórias ou compulsórias 10% (dez por cento), conforme Art.457, 3ª, da CLT. 1º Na modalidade de cobrança de gorjetas obrigatórias ou compulsórias, o resultado obtido com a cobrança destas, poderá ser retido pelas micro e pequenas empresas até 35% (trinta e cinco por cento) e as demais empresas até 40% (quarenta por cento) do valor bruto das mesmas para pagamento dos encargos fiscais e trabalhistas correspondentes, bem como do INSS (parte do empregado), repassando aos empregados das micro e pequenas empresas 65% (sessenta e cinco por cento) e das demais empresas 60% (sessenta por cento) do valor remanescente, que serão inclusos em holerite em campo próprio distinto do salário fixo, que deverá ser quitado diretamente ao empregado, devendo esta situação ser anotada em CTPS. 2º A autorização para a inserção de gorjetas obrigatórias ou compulsórias nas notas dos clientes, bem como os critérios para o rateio e a distribuição e as funções beneficiadas do resultado obtido com a cobrança dessas gorjetas serão, obrigatoriamente estabelecidos em Acordo Coletivo de Trabalho, firmado para esse Trabalhos Técnicos
4 50 fim especifico, entre a empresa e Sindicato dos Empregados, aplicando-se o sistema de Ponto Hoteleiro. 3º O regime de cobrança de gorjetas obrigatórias ou compulsórias, descrito nesta cláusula é opcional, porém, o resultado da cobrança será, sempre, revertido em favor dos empregados, sob pena de ilícito penal. (grifo nosso) Não obstante as penalidades específicas criadas para coibir o atraso no repasse da gorjeta, o fato é que o sindicato representativo da respectiva categoria profissional terá sempre o direito e o dever de fiscalizar o cumprimento integral das demais cláusulas e condições estabelecidas nos instrumentos coletivos, afigurando-se bem mais eficaz do que a criminalização pretendida. Além disso, em função de iterativa jurisprudência Súmula 354 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e disposições legais atinentes, a simples apropriação, pelo empregador, do valor correspondente à gorjeta já autorizaria a instauração de inquérito policial para apuração do fato delituoso, uma vez que se trata de espécie remuneratória pertencente ao empregado, pois o inciso X do art. 7º, da Constituição Federal (CF), expressamente determina a proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa. De igual forma, tem-se como desproporcional a penalidade imposta na proposição ( 5º e 6º), ferindo o princípio da razoabilidade e a CLT que, nos artigos 626 e seguintes, disciplina a sistemática relativa à fiscalização do trabalho, para fins de aplicação e cobrança de multas administrativas, exatamente para que sejam asseguradas a observância dos direitos sociais do trabalhador, inclusive no que pertine ao recebimento da gorjeta. O Projeto de Lei do Senado nº 471/2009 não merece prosperar, uma vez que a conduta do empregador em não repassar a gorjeta viola o acordo ou a norma coletiva sujeitando-o ao pagamento de multa prevista naquele instrumento, além do que, a CLT regulamenta a matéria de forma a criar regra geral de aplicação, de forma a assegurar o direito ao recebimento da gorjeta a todo e qualquer trabalhador, inclusive impondo as penalidades cabíveis, em sede da Justiça do Trabalho, motivo pelo qual não se justificaria criar conduta criminosa, nesse particular. Apesar disso, o PLS em questão foi aprovado (com emendas) terminativamente pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), em , tendo sido remetido à Câmara dos Deputados em , para revisão, nos termos do art. 65 da Constituição Federal. De ressaltar, por oportuno, que existe outro PLS, de nº 472/2009, de autoria do Senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), que pretende regulamentar o pagamento de gorjetas aos garçons, inserindo, no mesmo art. 457 da CLT, 2 (dois) novos parágrafos, numerados de 4º e 5º, que, inclusive, foram objeto de análise pela Divisão Sindical da CNC. Trabalhos Técnicos
5 51 Por último, informamos que existem em andamento, no Senado Federal, proposições similares a ora analisada, como, por exemplo, o PLS nº 725/2007 (analisado pela Divisão Sindical), PLS nº 7.658/2010 e o PLS nº 7.037/2010. Trabalhos Técnicos
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