Trabalho apresentado no III Congresso Ibero-americano de Psicogerontologia, sendo de total responsabilidade de seu(s) autor(es).
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- Theodoro Clementino da Rocha
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1 HISTÓRIAS DE VIDA: A PERCEPÇÃO SOBRE A INFÂNCIA EM GRUPOS DE IDOSOS Dayane Couto, Eduarda Rezende Freitas, Aline Francine Corrêa Vaz, Hortênsia Isabela Santos Vieira, Laíse Navarro Jardim Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil. Resumo No mundo atual, tecnificado e individualista, a comunicação oral tem sido substituída pela informação rápida, veiculada pelos equipamentos digitais. As experiências de vida vêm sendo desvalorizadas, e muitas vezes, descartadas. No entanto, relembrar o passado, reviver tradições e dividir histórias pessoais pode ser uma importante tarefa para aumentar a auto-estima, a inserção social e resignificar o curso de vida na velhice. O objetivo deste trabalho foi verificar os principais temas relatados pelos participantes quando recordam sua infância. A amostra constituiu-se de 11 indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos, participantes do projeto Oficina de História Oral e Inclusão Digital. O projeto tem por objetivo o resgate da história de vida desses idosos através da discussão em grupo e da divulgação em blogs. O tema Infância foi abordado em três encontros de 40 minutos, e posteriormente, os idosos foram solicitados a discorrer sobre ele. Os relatos escritos dos participantes foram analisados por cinco pesquisadores, através da técnica de Análise de Conteúdo. Dos 13 temas encontrados, destacaram-se: brincadeiras (90,9%), onde todos os participantes elucidaram as formas como brincavam; percepção/ sentimento sobre a própria infância (72,7%), em que 87,5% enfatizaram os aspectos positivos dessa fase, e; educação (63,6%), tema o qual 71,4% dos idosos ressaltaram o pouco tempo de estudo e 42,8% a importância dos professores no processo educacional. Embora o pouco tempo de estudo e a rigidez dos pais tenham sido destacados como aspectos negativos na infância, observa-se a predominância de aspectos positivos no relato sobre essa fase da vida. Palavras-chave: narrativa, infância, idosos.
2 No mundo atual, tecnificado e individualista, a comunicação oral tem sido substituída pela informação rápida, veiculada pelos equipamentos digitais. De acordo com Correa e França (2006), a necessidade criada pela cultura de ter que estar bem informado leva o sujeito a uma busca constante por informações, que só têm valor no instante em que são divulgadas. Passado alguns momentos, elas se perdem e se esgotam, dando lugar a outras notícias mais recentes. Nesse ciclo, o individuo é desafiado a estar sempre em busca de informações atuais. Diferentemente dessas, a experiência narrativa permanece no tempo e é polissêmica, ou seja, seus significados não se consomem (Correa & França, 2006). Devido à sua grande experiência de vida, um dos papéis sociais atribuídos ao idoso é o de ser a memória coletiva de seu grupo social, na arte de contar histórias e de transmitir seu legado cultural. A sobrevivência do passado depende das lembranças que emergem da memória e que são traduzidas para outrem. Apropriar-se da memória e transmitir esse legado cultural é reconstruir o passado, dar a ele a possibilidade de ser atualizado e narrado de uma forma diferente. É ter de volta o sentimento de pertencer a uma história ou mesmo à própria sociedade (Correa & França, 2006). De acordo com Santos, Quintino e Santos (2007), a memória é um instrumento constituidor da identidade, da percepção de si e dos outros, e busca assegurar a continuidade do tempo e resistir à alteridade, às rupturas. Da mesma forma que as informações antigas são postergadas pelas recentes, as experiências de vida vêm sendo desvalorizadas e, muitas vezes, descartadas. Na sociedade contemporânea, o passado, seja ele advindo de uma história de vida ou mesmo de acontecimentos do cotidiano, é relativamente privado de expressão no meio social. A experiência narrativa nem sempre encontra interlocutores para dialogar (Correa & França, 2006). No entanto, relembrar o passado, reviver tradições e dividir histórias pessoais pode ser uma importante tarefa para que o idoso se sinta valorizado e possa ter uma maior participação social, facilitando a intergeratividade (Simson & Giglio, 2001). Além disso, a reconstrução da própria história pode ser importante na ressignificação do curso de vida na velhice, contribuindo para o bem estar nessa fase da vida (Papalia & Olds, 2006).
3 De acordo com Santos e Vaz (2004), a cultura assimilada na infância está significativamente correlacionada aos hábitos e comportamentos que o indivíduo acumula durante a vida e que mantém até na velhice. Nesse sentido, conhecer as concepções acerca da infância pode ser importante para a compreensão dos idosos nessa fase da vida. Assim, o objetivo do presente trabalho foi verificar os principais temas que os idosos mencionam ao tratar da própria infância. A amostra foi constituída por 11 indivíduos com idades variando entre 62 e 73 anos ( X = 66,3), participantes do projeto Oficina de História Oral e Inclusão Digital. O projeto tem por objetivo o resgate da história de vida desses idosos através da discussão em grupo e da divulgação em blogs. O tema infância foi abordado em três encontros de 40 minutos e, posteriormente, os idosos foram solicitados a discorrer sobre ele. Os textos produzidos pelos participantes foram analisados por cinco pesquisadores, através da técnica de análise de conteúdo (Bardin, 1977). Foram encontrados 13 temas principais, que foram subdivididos, quando necessário, em categorias. O tema brincadeiras foi ressaltado por 90,9% dos participantes. Nas categorias, verificou-se que todos elucidaram as formas como brincavam e 60% os lugares onde brincavam, como por exemplo, em casa, na rua e no rio. Constata-se, a partir do conteúdo apresentado pelos idosos, o mesmo que foi percebido por Barbosa (2007, p.127), ou seja, as estratégias lúdicas ultrapassam a barreira da idade, caracterizandose como instrumento para prática educativa. É evidente, também, as mudanças sociais ocorridas nos últimos anos, especialmente no que se refere à urbanização e à violência, uma vez que as crianças da atualidade, mesmo em cidades pequenas, cada vez mais brincam em suas casas ou condomínios, sendo privadas, dessa forma, de experiências lúdicas importantes para o desenvolvimento. O tema percepção/ sentimento sobre a própria infância foi citado por 72,7% dos idosos. Nas categorias, os participantes enfatizaram os aspectos positivos dessa fase (87,5%), considerando-a uma fase alegre, saudável; os aspectos negativos (12,5%), caracterizando-a como uma fase de sofrimentos; e a neutralidade (25%), considerando a infância como um período sem maiores preocupações e responsabilidades. Esses resultados aparentam possuir um erro de cálculo, mas, de
4 fato, o que ocorreu foi um discurso ambivalente de alguns participantes que apresentaram tanto sentimentos positivos quanto neutros em relação à infância. Sobre o tema irmãos, ressaltado por 72,7% dos participantes, emergiu a categoria número de irmãos (87,5%), em que os idosos destacaram que em sua infância era comum ter muitos irmãos. De acordo com Goldani (2004), em 1990 as famílias nucleares apresentavam um número médio de filhos de 2,4 e em 2001 a média caiu para 2,1, demonstrado que essa constituição familiar relatada pelos idosos se configura de uma forma diferente na atualidade, uma vez que a média de filhos por família tem sofrido um decréscimo. O tema educação (63,6%) teve como categorias o pouco tempo de estudo (71,4%) e a importância dos professores no processo educacional (42,8%). O difícil acesso às escolas naquela época, bem como as dificuldades financeiras que muitas famílias enfrentavam provavelmente contribuíram para esses dados. No entanto, podese observar a importância que os idosos vêem no aprendizado, já que o tema foi recordado pela maioria deles, e pelo fato de ainda buscarem formas de aumentar o conhecimento. O tema atividades da semana foi citado por 45,5% dos idosos, sendo que a categoria que mais se destacou foi o dia de domingo (60%). Este era visto como o dia em que as pessoas usavam roupas exclusivas, e destinado às atividades de lazer. O tema diferença entre gerações foi citado por 36,4% dos participantes. Apesar de não terem sido criadas categorias para esse tema, verifica-se que as diferenças relatadas estão relacionadas principalmente às formas de educação dos pais, que hoje se configura de uma forma mais liberal e permissiva. Sobre o tema relacionamento com os pais (36,4%), emergiu a categoria características pessoais dos pais (75%), em que os idosos citaram a honestidade, paciência, e falaram sobre sentimento de gratidão em relação a eles. O tema trabalho foi ressaltado por 36,4% dos participantes. Nas categorias, 75% destes afirmaram ter trabalhado em casa, seja cuidando dos irmãos e/ou nas tarefas domésticas. Essa não parece ser uma característica comum da infância atual, pois, embora haja crianças trabalhando, esse grupo constitui-se numa minoria, uma
5 vez que existem leis que proíbem o trabalho infantil e incentivam cada vez mais a educação. O tema condição financeira foi mencionado por 36,4%. Nas categorias, verificou-se que metade dos idosos se considerou pobre na infância, 25% afirmaram ter passado por dificuldades e 25% relataram que pertenciam à classe média. O tema religiosidade (36,4%) teve como categorias as festas religiosas (25%) e a freqüência às missas (25%). O tema moradia foi ressaltado por 27,3% dos participantes. Nas categorias criadas, 66,7% descreveram a casa em que moravam na infância e 33,3% citaram os parentes com quem moravam, sendo que todos moravam com famílias não nucleares. Esse fato parece ser diferente na atualidade, uma vez que é menos freqüente encontrar parentes, como avós e tios, morando na mesma casa. O tema características pessoais foi elucidado por 27,3% dos idosos. Nas categorias criadas 66,7% se descreveram como levados, 33,3% como arteiros e 33,3% como espertos. O tema morte foi citado por 18,2% dos idosos. Nas categorias, há aqueles que se recordaram da morte de parentes (50%) e da morte de conhecidos (50%). Apesar de ser um tema considerado por muitos como um tabu, os idosos ressaltaram que esse acontecimento marcou a infância, mas foi visto de forma natural. As recordações da vida podem aumentar ou reduzir a sensação de bem-estar do indivíduo, de acordo com as características que predominam nessas lembranças (Santos & Vaz, 2004). Embora tenham surgido aspectos negativos na rememoração da infância, como o pouco tempo de estudo, a baixa condição financeira, a participação em tarefas domésticas, houve a predominância de aspectos positivos no relato sobre essa fase da vida. A infância foi lembrada como feliz e saudosa pela maioria dos participantes, havendo destaque na lembrança dos tipos de brincadeiras e lugares onde brincavam, sendo este o tema mais citado pelos participantes. A percepção positiva acerca da infância pode ter contribuição na qualidade de vida e bem-estar dos idosos, mantendo-os ativos e inseridos na comunidade, como é o caso da amostra estudada. Referências
6 Barbosa, N. M. C. (2007) O brincar em diferentes gerações: compartilhando experiências e atividades lúdicas na prática educativa. In: Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, jul./dez. Bardin, L. (1977). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70. Correa, M.R.; França, S. A. M. (2006). Histórias do arco da velha: memória e experiência narrativa com idosos. In: XIX Encontro de Psicologia e VI Encontro de Pós-Graduação, 2006, Assis. XIX Encontro de Psicologia e VI Encontro de Pós- Graduação: Percursos e Perspectivas. Goldani, A. M. (2004) Relações Intergeracionais e Reconstrução do Estado de Bemestar. Por que se deve repensar essa relação para o Brasil? In: Camarano, A. A. (organizadora). Rio de Janeiro-RJ: IPEA ( ). Santos, G. A.; Vaz, C. E. (2004). O significado das experiências culturais da infância no processo de envelhecimento bem-sucedido. In: Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, jan./jun. Santos, K. C., Quintino, V. L. B., Santos, M. A. (2007) Um percurso para a pesquisa com narrativas orais no norte de Minas Gerais. Revista Eletrônica do Instituto de Humanidades, 5 (10), pp Simson, O. R. M.; Giglio, Z. G. (2001) A arte de recriar o passado: historia oral e velhice bem sucedida. In: Neri, A. L. (Org.) Desenvolvimento e Envelhecimento. Campinas- SP: Papirus Editora ( ). Mini currículo Dayane Couto - Discente do curso de Psicologia da UFJF, pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Humano e Envelhecimento, bolsista de programa de extensão da UFJF, daycouto@bol.com.br.
7 Eduarda Rezende Freitas - Discente do curso de Psicologia da UFJF, pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Humano e Envelhecimento, bolsista de iniciação científica/fapemig, duda_2504@hotmail.com. Aline Francine Corrêa Vaz - Discente do curso de Psicologia da UFJF, pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Humano e Envelhecimento, alinefrancinecorrea@hotmail.com. Hortênsia Isabela Santos Vieira - Discente do curso de Psicologia da UFJF, pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Humano e Envelhecimento, bolsista de Treinamento Profissional, hortensia_isabela@hotmail.com. Laíse Navarro Jardim - Discente do curso de Psicologia da UFJF, pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Desenvolvimento Humano e Envelhecimento, lala_jardim@hotmail.com.
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