Revista: CLAUDIA BEBÊ Nº 535B

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1 Revista: CLAUDIA BEBÊ Nº 535B Filho depois dos 40 Há algo de novo no mundo da obstetrícia: um estudo americano mostra que engravidar tardiamente pode ser uma injeção de juventude para a mulher. E as nossas mamães quarentonas confirmam que um bebê nessa fase da vida é uma deliciosa curtição. Cristiane Ballerini AOS 45 DO SEGUNDO TEMPO. A expressão faz parte do mundo do futebol, mas é uma analogia perfeita para mostrar até quando algumas mulheres adiam o sonho da maternidade. O relógio biológico não deixa dúvidas: engravidar na juventude é mais fácil e seguro. Mas cada vez mais mulheres adaptam a natureza ás necessidades pessoais e imposições da vida moderna, empurrando a maternidade para depois dos 40 anos. Segundo o Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos, na cidade de São Paulo, em cinco anos a porcentagem de mães com mais de 40 anos pulou de 1,81% para 2,47%. Pode parecer, pouco, mas é uma mudança que tem se mostrado constante e acontece no mundo inteiro. Entre os 20 e os 30 anos, não faltam motivos para deixar a maternidade para depois. As exigências da carreira, o homem certo que ainda não apareceu, a necessidade de mais anos de estudo, as novas técnicas de reprodução assistidas...tudo conspira para adiar a maternidade ao máximo. Até a melhoria da qualidade de vida favorece as gestações tardias. Os avanços da medicina transformaram em peças de museu os antigos manuais de obstetrícia, que, há três décadas, consideravam idosa a mulher de 28 anos grávida pela primeira vez. A saúde geral da população melhorou. Hoje as mulheres são mais magras, fazem exercícios, alimentam-se bem. Não é de espantar que se sintam e estejam jovens o suficiente para serem mães mais tarde, comenta Tânia Schupp, ginecologista e obstetra do Hospital das Clínicas de São Paulo. Mamãe tem 100 anos O que muda para as mulheres que se tornaram mães em plena maturidade? De acordo com as descobertas de um grupo da Universidade de Boston, elas vão ter tempo de sobra para ver os netos crescerem. O grupo realizou um estudo que ganhou fama entre os médicos: o New England Centenarian Study, destinado a acompanhar mulheres e homens privilegiados, que ultrapassaram a marca dos 100 anos. Uma das conclusões mostra que mulheres que engravidaram depois dos 40 têm quatro vezes mais chances de chegar aos 100 anos. A explicação para a longevidade dessas mulheres estaria na ação dos hormônios associados à gestação. Nessa fase da vida, normalmente as mulheres se aproximam da menopausa e a atividade hormonal entra em declínio. Com a gravidez, o organismo feminino passa por um novo banho de hormônios, liberados não apenas para levar adiante a gestação mas também para favorecer o trabalho de parto e a amamentação. Em tese, esse processo ainda protege o cérebro contra os avanços da idade e leva a uma vida longa. Para vários especialistas brasileiros, é uma conclusão controversa. As possibilidades de engravidar naturalmente a partir dessa idade ficam bastante

2 diminuídas, explica a especialista em reprodução assistida Mariângela Maluf. Para dar uma idéia, as chances de uma gravidez natural até os 35 anos, por exemplo, estão em torno de 30% por ciclo menstrual. Depois dos 40, caem para algo entre 8 e 12%. Será que essas mulheres acompanhadas pela pesquisa já não tinham naturalmente uma saúde excepcional e chegariam aos 100 anos, ficassem grávidas ou não?, questiona ela. Outro especialista, o obstetra Laudelino Ramos de Oliveira, professor da Faculdade de medicina da USP, enfatiza que a ação dos hormônios se faz sentir durante a gravidez, mas que eles não continuam agindo ao longo da vida. Tanto que algumas mulheres sofrem de depressão depois do nascimento da criança, um problema diretamente relacionado à queda dos hormônios no pós-parto. Polêmicas à parte, há algum tempo a ciência vem demonstrando que ter filhos pode ser vantajoso para a saúde das mulheres, mesmo na idade madura. Já no momento do parto, a glândula hipófise secreta ocitocina, hormônio que ativa as contrações uterinas e a liberação do leite. Depois, durante a amamentação, é o bebê quem vai favorecer a produção desse hormônio, pela sucção. Além de liberar o leite, a ocitocina estimula o hipocampo, área do cérebro ligada aos processos da memória e do aprendizado. Ainda com relação ao cérebro, mais recentemente ficou provado também que o órgão tem receptores para o estrógeno, hormônio que é elevado em 100 vezes durante a gestação. Mais do que dar brilho aos cabelos e á pele, o estrógeno atua na manutenção da sensação de bem-estar, favorecendo a produção de serotonina, uma das substâncias cerebrais ligadas ao prazer. Risco Calculado O outro lado da moeda: depois dos 40, a mulher grávida apresenta 30% mais riscos de ter hipertensão e diabetes, doenças que podem afetar perigosamente o desenvolvimento da gestante nessa idade deve ser cuidadoso. A obstetra Tânia Schupp, responsável pelo setor de idade materna avançada do Hospital das Clínicas de São Paulo, acompanhou de perto 281 mulheres para uma tese sobre gravidez depois dos 40 anos: O pré-natal bem feito é fundamental. Se a mulher desenvolver alguma dessas doenças ou outros problemas, é possível controla-los levando a gravidez até o fim com sucesso. Caso esteja bem, a gestante quarentona não precisa ir ao médico mais do que qualquer outra grávida. O recomendado é fazer a curva glicêmica, exame que mede a reação do organismo à presença do açúcar e controlar sistematicamente glicemia e pressão. A obesidade é um fator de risco para gestantes de qualquer idade, aumentando também a probabilidade de pressão alta. Como por volta dos 40 anos geralmente as mulheres já tiveram um aumento de peso, convém controlar a balança com disciplina. Essa, por sinal, é uma qualidade que não parece falta às mamães mais maduras. Profissionais realizadas, independentes e mais livres das obrigações sociais, nessa fase as grávidas costumam seguir à risca as recomendações médicas, mesmo que isso signifique faltar a uma reunião de trabalho ou perder uma festa. Óvulos também envelhecem Quando nascem, as mulheres têm cerca de 2 milhões de óvulos. Ao longo da vida fértil, eles amadurecem e ficam disponíveis para ser fecundados. Diferentemente dos espermatozóides, que são produzidos a cada três dias, os óvulos envelhecem no organismo feminino. A idade do óvulo, portanto, é a mesma da mulher. E á fator

3 determinante na ocorrência de síndrome de Down. Isso porque os mecanismos responsáveis pela divisão celular no óvulo mais velho não são tão eficientes, levando a possíveis alterações cromossômicas durante a fecundação. Para uma mulher de 30 anos, o risco de ter um bebê portador da síndrome de Down é de um a cada mil nascimentos. Aos 40, esse risco sobe para um a cada grupo de 100 crianças. O envelhecimento dos óvulos não é o único problema para quem passou dos 40. Pesquisas da área de reprodução in vitro mostram que mulheres maduras, mesmo quando recebem doação de óvulos jovens, podem ter dificuldades na gestação. Isso porque as artérias do útero já estão menos permeáveis à ação da placenta. Para estabelecer uma ligação direta entre mãe e bebê, a placenta implanta-se no útero e precisa corroer as artérias uterinas. Esse processo pode ser dificultado pela presença de algum grau de arterosclerose e fazer com que o bebê não se desenvolva plenamente. Idade da razão Diante desses riscos e barreiras, vale a pena engravidar depois dos 40? Os especialistas respondem em coro: se você é saudável, a idade em si não é motivo para não realizar o desejo de ser mãe. Muitas mulheres na faixa dos 40 estão até mais prontas para a gestação do que algumas jovens sedentárias, obesas ou fumantes. Além disso, a natureza pode impor certas dificuldades, mas a quarta década da vida é um excelente momento para a maternidade. Em geral, é uma época de plenitude. A mulher já tem uma carreira definida, uma relação estável e, mesmo mais madura, ainda dispõe de energia para queimar com as crianças. Filho depois dos 40 Sempre quis ter filhos, mas meu primeiro marido não tinha o mesmo desejo. Quando me casei pela segunda vez, não perdemos tempo. Fiz um tratamento e, aos 41, engravidei. Estava a par dos riscos, mas sou otimista por natureza e não me concentrei nos problemas. Acho que a idade me ajudou a ser uma mãe descomplicada. O Lucas era bebezinho e já ia comigo para o escritório. Cheguei leva-lo a algumas obras que não ofereciam perigo ou stress. Claro, eu prezava algumas coisas importantes, como a amamentação, os horários de sono. Quando ele tinha 8 meses e ainda mamava no peito, fiquei grávida da Julia. Foi uma loucura! Dois filhos em três anos desgasta... Sinto um certo cansaço, mas não sei se seria diferente se eu tivesse 30. O que cansa, realmente, é o trabalho prático. Do ponto de vista emocional, me sinto renovada e com mais garra. O fato de as crianças serem pequenas faz com que eu queira me manter bem para curtir a vida com eles. E tenho um exemplo em família: a irmã de minha mãe adotou uma criança aos 41 anos e, hoje, aos 71, ainda acompanha a vida do filho, jovem e ativa. Monika de Rezende Ground, 44 anos, arquiteta, mãe de Lucas, de 3 anos, e de Julia, de 2 anos Eu era uma solteira convicta. Trabalhava muito, viajava e nem pensava em casamento e filhos. Sempre que um namoro ia ficando mais sério dava um jeito de desmanchar. Então, meu marido caiu do céu. Nos apaixonamos e, em conseqüência do casamento, veio uma grande vontade de ter filhos. Sabia que não seria fácil.

4 Tentamos engravidar durante um ano e, no final, acabamos recorrendo à fertilização in vitro. Correu tudo muito bem na gravidez. Tão bem que trabalhei até o último dia e saí de uma festa de sábado à noite direto para a sala de parto com batom vermelho,delineador e tudo. A chegada da helena foi maravilhosa e resolvemos ter também o Enzo. Dessa vez, precisei repousar no final da gravidez para que ele nascesse de nove meses. Ter filho dá um trabalho danado. Você fica em prisão domiciliar por dois meses e, depois, passa para semi-aberto por mais um bom tempo. Mas eu já tinha uma carreira como musicista e consegui organizar os horários. Imagine se ele viesse aos meus 20 e poucos anos, quando eu ainda estava estudando! Além disso, aos 40, você já se divertiu bastante. Quando deixo de sair para estar com as crianças, não me sinto perdendo nada. Claro que não posso acompanhar a agenda cultural como gostaria. Mas isso é por um período, e esse convívio é importante para toda a nossa vida. A maternidade não prejudicou meu trabalho. Ao contrário, quando a helena fez 1 ano e meio, fundei uma orquestra e comecei a estudar regência. O Enzo tem só 1 mês, mas já estou fazendo planos. Vou voltar, aos poucos, a dar aulas e logo estarei novamente à frente da orquestra. Silvia Juliani, 44 anos, pianista e regente, mãe de Helena, de 2 anos, e de Enzo, de 1 mês Casei tarde e, desde menina, sempre tive disfunção hormonal. Quando meu marido e eu resolvemos ter filhos, vieram as dificuldades. Cheguei a consultar especialistas em reprodução. Mas, para minha felicidade, engravidei naturalmente. Como minhas ovulações são irregulares, é comum não menstruar. Eu já havia feito tantos testes com resultados negativos que deixei o tempo passar. Fiquei sabendo da gravidez quando já estava com dois meses. Os nove meses foram tranqüilos. O único momento difícil foi encarar a possibilidade de meu filho ter malformação ou alguma síndrome. Sabia que, em mulheres mais velhas, o risco é maior por causa do envelhecimento dos óvulos. Mas também sabia que tinha sido abençoada com uma gravidez inesperada e estava na contramão das estatísticas negativas. O Léo nasceu bem e, uma semana depois do parto, eu já estava trabalhando em casa. A maturidade fez com que eu me dedicasse com mais exclusividade ao meu filho. Participo intensamente de cada momento da vida dele. Debby Kazes Talassi, de 45 anos, corretora de seguros, mãe de Léo, de 3 anos Quando minha primeira filha nasceu, há 20 anos, deixei o trabalho. Queria acompanhar a Carolina de perto. Foram sete anos de dedicação exclusiva. Depois, retomei o trabalho e, apesar de adorar crianças e sempre ter sonhado com uma família maior, perdi a coragem de voltar ao período das fraldas. Até que, no ano passado, levei um susto. Minha menstruação falhou e achei que a menopausa estivesse chegando. Comecei a ter enjôos, mas, como várias pessoas no trabalho estavam doentes, com vômitos por causa de um vírus, não dei importância. Só resolvi fazer o exame quando notei a mudança no meu corpo. Sempre fui muito magra e, de repente, comecei a perder a cintura. Estava grávida aos 47 anos! Chorei muito, fiquei nervosa, com medo de tudo o que a gente ouve por aí. Mas, depois do susto, vibrei de alegria. Minha gravidez está sendo ótima. Os exames mostram que nossa menina é saudável e não vemos a hora de conhecê-la. Mesmo com a barriga grande, trabalho normalmente e não tenho nenhuma estria. A pele já não tem a mesma firmeza, mas outro dia me olhei no espelho e gostei do que vi. Depois de 25 anos de casados, eu e meu marido

5 estamos mais unidos. È uma renovação em todos os sentidos, com a vantagem de que, agora, na maturidade, já não há insegurança em relação à educação da criança. Temos mais consciência sobre nosso comportamento como pais. Posso ainda contar com a ajuda de minha filha, Carolina. Ela está adorando a idéia de ganhar uma irmãzinha. Ana Maria Saraçol Ribeiro, de 47 anos, bancária, mãe de Carolina, de 20 anos, e grávida de oito meses