GENOCÍDIO DA JUVENTUDE NEGRA EM PERNAMBUCO E O DIREITO DE ACESSO À JUSTIÇA
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- Zilda de Barros de Sousa
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1 GENOCÍDIO DA JUVENTUDE NEGRA EM PERNAMBUCO E O DIREITO DE ACESSO À JUSTIÇA Antônio Fernandes Oliveira Matos Junior 37º Promotor de Justiça criminal da capital Membro do GT Racismo/MPPE I SÍNTESE DOGMÁTICA A desproporção detectada, à nível nacional, na evolução das taxas de homicídios nas diferentes categorias de raça/cor utilizadas pelo IBGE, quando se observa no período de 2002 a 2012 uma enorme queda no número de homicídios da população branca (-24,8%) e de aumento no número de vítimas na população negra (38,7%), tem sido replicada no Estado de de forma ainda mais perniciosa. Foi o Estado com menor taxa de homicídios no Brasil em 2012 (5,6), mas quando se impõe o filtro da cor, posiciona-se na 7ª pior marca entre os Estados brasileiros (56,7), acima da taxa brasileira (41,4), sendo a pior marca do Estado de Alagoas (92,6), enquanto a melhor taxa do Estado de Santa Catarina (17,0). No ano de 2013, o percentual de mortes da população negra chega a 92,8% do total, enquanto o de branco ficou em 7%, valores estes que não acompanham o número do Brasil, em que o número de mortes da população negra é de 72,8% do total, enquanto o de branco fica em 26,7%. Já no último ano de 2014, apresentou um aumento de 9,5% no número de homicídios, chegando à taxa de 37,36 mortes violentas a cada 100 mil habitantes, dado preocupante, porque reverte a tendência sucessiva de queda dos índices. Embora possua números consistentes de redução de homicídios, especialmente após a implantação do Programa Pacto pela Vida, não consegue impactar decisivamente as taxas em relação à população negra. A este fenômeno convencionou-se denominar Genocídio da Juventude Negra. Neste contexto se impõe a atuação do Ministério Público de como verdadeiro ombudsman, visando construir, em conjunto com sociedade civil, especialmente o movimento negro, as suas demandas específicas e, por consequência, dialogar com as autoridades federais, estaduais e municipais alternativas para implementá-las, visando cumprir seu papel constitucional de transformar a realidade social da população jovem negra brasileira. Passa não só pela adoção de simples medidas administrativas para obtenção de dados estatísticos com o quesito raça/cor, como também por um posicionamento institucional perante o Comitê Gestor do Pacto Pela Vida, seja para para propor critérios objetivos para distribuição de recursos e estrutura física, tecnológica e de pessoal nas áreas com números díspares, seja para intermediar o restabelecimento do diálogo entre governo e sociedade civil, garantindo a esta mecanismos diretos de participação no monitoramento e na avaliação do projeto, mas principalmente como agente político fomentador das políticas públicas necessárias à ampliação direitos e prevenção da violência que atinge à juventude negra, especialmente através do Plano Juventude Viva. II - EXPOSIÇÃO A idealização deste artigo decorreu da necessidade de instrumentalizar o GT Racismo/MPPE (Grupo de Trabalho de combate ao Racismo Institucional), por ocasião da audiência pública que se realizou em Recife/PE, com o tema GENOCÍDIO DA JUVENTUDE NEGRA E O DIREITO DE ACESSO À JUSTIÇA, consequência do esforço empreendido pelo Ministério Público de em fazer cumprir as deliberações constantes da Audiência Pública sobre As Barreiras de Acesso à Justiça aos Jovens s em Situação de Violência realizada pelo CNMP, em 17 de setembro de Decorre do protocolo de intenções celebrado entre o CNMP e outras instituições de governo, que tem por objetivo conjugar esforços para assegurar o enfrentamento ao racismo e a promoção de igualdade racial da juventude negra, mais especificamente enfrentar o que se convencionou chamar Genocídio da Juventude Negra, termo este utilizado pela própria Presidente da República, Dilma Rousseff, quando abriu a 3ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, no dia 05 de novembro de 2013, ao afirmar que A sociedade brasileira tem que arcar com as consequências do longo período escravocrata e quando disse que o governo apoiará o Plano Juventude Viva no sentido de combater o que vem sendo classificado de genocídio da juventude negra. A audiência pública, que contou com a presença massissa da sociedade civil, especialmente o movimento negro, além de representantes dos órgãos de justiça e segurança, para além de levantar informações a respeito do 5
2 extermínio da população jovem negra em, trouxe luzes quanto aos caminhos que podem ser percorridos para enfrentá-la, que foram analisados à guisa da conclusão, quando se apresenta os possíveis caminhos a serem adotados pelo Ministério Público brasileiro e, em especial, o Ministério Público de. Para tanto, necessário estabelecer como premisssa que, de fato, está em curso na sociedade brasileira e, em especialmente, na sociedade pernambucana, o GENOCÍDIO DA JUVENTUDE NEGRA, o que se efetivará a partir de dados obtidos no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, que traz tais informações com enfoque no quesito cor/raça das vítimas, que foram estruturados nos trabalhos consultados. Algumas informações sobre os dados apresentados são relevantes: a) foram consideradas jovens as pessoas entre 15 e 29 anos de idade, em razão do que prevê o art. 1º, 1º da Lei nº , que institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens; b) o Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde começou a incorporar o quesito raça/cor com a adoção, em 1996, do CID-10, utilizando o mesmo esquema classificatório do IBGE: branca, preta, amarela, parda e indígena. Mas, diante da constatação do subregistro da cor/raça das vítimas nos mapas da violência, foi considerada essa informação a partir do ano de 2002, quando já 92% dos registros tinham a informação de raça/cor; c) as categorias preto e pardo foram somadas para constituir a categoria negro; d) os dados consignados como ignorados foram abarcados, proporcionalmente, pelas demais categorias. III LEVANTAMENTO DOS HOMICÍDIOS NA POPULAÇÃO JOVEM COM ENFOQUE EM PERNAMBUCO O diagnóstico demonstra que os homicídios são hoje a principal causa de morte de jovens de 15 a 29 anos no Brasil, e atingem especialmente jovens negros do sexo masculino, moradores das periferias e áreas metropolitanas dos centros urbanos. Os dados apresentados mostram que mais da metade dos mortos por homicídios, em 2012, no Brasil, eram jovens (30.072, equivalente a 53,37%), dos quais 77,0% negros (pretos e pardos) e 93,30% do sexo masculino. Por essa razão, os homicídios de jovens representam uma questão nacional de saúde pública. Pesquisa Nacional sobre Perfil e Opinião dos Jovens Brasileiros 2013, realizada pela Secretaria Nacional de Juventude aponta que 51% dos jovens ouvidos, em todos os Estados, em cidades de pequeno, médio e grande porte, e em todos os estratos sociais, já perderam uma pessoa próxima de forma violenta. Para fins de análise no presente estudo serão especificados os dados relativos a, sua capital, Recife, além das cidades pernambucanas referidas no Mapa da Violência: Os Jovens do Brasil. Inicialmente, confrontamos os dados relativos aos números de homicídios e taxa de homicídios, seja da população total, seja da população jovem. Número de homicídios na População Total, em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,2-4,4 Nordeste ,5 8,0 Brasil ,4 7,9 Taxas de homicídios (por 100 mil) na População Total, em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,8 55,3 50,7 51,2 52,7 53,1 50,7 44,9 39,3 39,1 37,1-32,3-5,1 22,4 24,0 23,2 25,4 27,9 29,6 32,1 33,4 35,5 36,3 38,9 73,5 7,2 28,5 28,9 27,0 25,8 26,3 25,2 26,4 26,9 27,5 27,1 29,0 2,1 7,0 6
3 Número de homicídios na População Jovem, em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,6-6, ,1 10, ,7 9,5 Taxas de homicídio (por 100 mil) na População Jovem, em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,3 111,4 104,5 106,5 106,2 109,3 105,3 92,2 81,3 79,2 73,8-33,6-6,8 43,2 46,4 45,2 50,4 54,8 57,5 64,6 67,4 72,9 72,2 79,5 84,3 10,1 56,1 57,0 53,3 50,5 50,7 49,7 52,8 53,5 54,5 53,0 57,6 2,7 8,5 Tabela Número e taxas (por 100 mil) de homicídio nos municípios com mais de 10 mil HABITANTES de. População Total. Brasil. 2008/2012. Município Popul Homicídios Taxa 2012 Posição Nac Est. Cabo de Santo Agostinho ,5 29º 1º Itamaracá ,1 32º 2º Itapissuma ,1 55º 3º Xexéu ,6 83º 4º Tabela Número e taxas (por 100 mil) de homicídio nos municípios com mais de 10 mil JOVENS de. População Jovem. Brasil. 2008/2012. Município Popul Homicídios Taxa 2012 Posição Nac Est. Cabo de Santo Agostinho ,2 19º 1º Brejo da Madre de Deus ,6 57º 2º Recife ,2 91º 3º Embora em tenha ocorrido em elevada queda no número de homicídios, tanto na população em geral (em 2002 taxa de 54,8 por 100 mil habitantes, enquanto em 2012 taxa de 37,1), como na população jovem (em 2002 taxa de 111,3 por 100 mil habitantes, enquanto em 2012 taxa de 73,8), redução no período de 32,3 e 33,6 respectivamente, ainda possuímos níveis extremamente pesados de assassinatos de jovens, sendo o 11º pior Estado da Federação, acima da média brasileira, que é de 57,6, sendo a maior taxa em Alagoas com 138,3 e a menor taxa em Santa Catarina com 23,8. IV LEVANTAMENTO DOS HOMICÍDIOS NA POPULAÇÃO JOVEM NEGRA COM ENFOQUE EM PERNAMBUCO A análise dos mesmos dados demonstra entretanto que, embora tenha diminuído o número de homicídios de em 2002 para em 2012, o que representa uma queda de 30,6%,fato é que, entre os negros, as vítimas diminuíram bem menos, de para nessas mesmas datas: queda de 25,9%. As tabelas apresentadas sintetizam a evolução dos homicídios nas diferentes categorias de raça/cor utilizadas pelo IBGE e delas se observa uma enorme queda no número de homicídios da população branca e de aumento no número de vítimas na população negra, tendência que se observa tanto para o conjunto da população quanto para a população jovem. Há que se concluir então da crescente seletividade social dos que vão ser assassinados. As tabelas detalham a evolução dos homicídios na população branca, entre 2002 e Observa-se que os números e as taxas tiveram uma significativa queda no período: em torno de 24%. Lideraram essas quedas nas taxas de homicídio brancos, no Nordeste, (-69,3%). 7
4 No início do período analisado, as taxas de homicídio dos brancos era de 21,7 por 100 mil brancos. A dos negros, de 37,5 por 100 mil negros. Em 2002, o índice de vitimização negra foi de 73: morreram proporcionalmente 73% mais negros que brancos. Em 2012, esse índice sobe para 146,5. A vitimização negra, no período de 2002 a 2012, cresceu significativamente: 100,7%, mais que duplicou. Informa Julio Jacobo Waiselfisz, em Mapa da Violência: Os Jovens do Brasil, que três fatos mostram-se evidentes: 1) Tanto o número quanto as taxas de homicídio brancos caem significativamente; 2) Tanto o número quanto as taxas de homicídio negros aumentam nesse período; 3) Se as quedas das taxas brancas são bem expressivas, os aumentos nas taxas negras são de moderadas para baixas. Entre os jovens, a evolução foi muito semelhante, mas a partir de taxas que duplicam as da população total e com manifestações bem mais intensas. A seguir quadro comparativo no número de homicídios e taxa de homicídio em, no Nordeste e no Brasil, seja para a população negra, seja para a população branca, no período de 2002 a Número de homicídios na População Total em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,1-22, ,9 3, ,8 3, ,8-3, ,9 8, ,7 9,5 Taxas de homicídio (por 100 mil) na População Total em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,4 19,1 15,0 15,2 12,6 9,0 13,6 11,8 8,2 7,3 5,6-69,3-22,5 9,8 10,3 8,7 9,5 9,1 9,0 10,1 9,9 10,0 10,9 11,2 13,5 2,5 21,7 21,5 19,6 17,9 18,0 16,4 16,8 16,9 16,1 15,9 16,5-23,8 3,5 78,6 78,8 73,7 75,1 79,1 81,9 75,6 67,1 58,9 59,2 56,7-27,9-4,2 28,1 30,3 29,8 33,2 37,1 39,7 43,4 45,3 47,5 48,1 51,7 83,7 7,5 38,6 39,3 37,2 37,1 37,8 37,0 38,3 38,7 39,4 38,6 41,4 7,1 7,0 A desproporção já detectada à nível nacional, mais se evidencia no Estado de, que embora possua números consistentes de redução de homicídios, não consegue impactar decisivamente as taxas em relação à população negra. É o Estado com menor taxa de homicídios no Brasil (5,6), mas quando se impõe o filtro da cor, posiciona-se na 7ª pior marca entre os Estados brasileiros (56,7), acima da taxa brasileira (41,4), sendo a pior marca do Estado de Alagoas (92,6), enquanto a melhor taxa do Estado de Santa Catarina (17,0). Repetem-se os dados, ainda que com alguma alteração irrisória, no conjunto da população jovem. 8
5 Número de homicídios na População jovem em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,8-30, ,5 6, ,3 4, ,9-4, ,7 11, ,3 11,1 Taxas de homicídio (por 100 mil) na População jovem em PE, no Nordeste e no Brasil. 2002/ ,0 36,8 27,5 30,3 22,1 16,3 24,5 21,3 16,0 13,4 9,3-71,0-30,5 15,9 18,3 13,4 17,0 15,4 16,6 17,2 18,6 19,1 20,2 21,4 34,4 6,1 41,9 42,1 37,3 33,7 33,5 30,6 30,8 31,1 29,2 28,5 29,9-28,6 4,9 161,6 160,2 154,8 158,8 163,8 171,4 159,7 139,0 119,8 118,4 112,2-30,6-5,2 54,8 58,9 59,4 66,6 74,0 79,5 89,8 92,8 96,3 95,1 105,2 92,1 10,6 77,7 79,3 76,3 75,4 76,1 74,4 78,0 77,6 78,3 75,6 82,3 6,0 8,9 O que mais impressiona, entretanto, é a taxa de vitimização negra na cidade do Recife, que reflete no posicionamento da capital pernambucana entre as capitais brasileiras. No ordenamento das capitais por Taxa Negra - População Total, figura na sexta posição, com taxa de 84,5, superior à brasileira (de 60,1), no ranking liderado por João Pessoa (138,1), tendo São Paulo com melhor taxa (22,5). Já tomando por base a população jovem, estamos na sétima posição (185,0), superior à brasileira (de 126,5), no ranking liderado por Maceió (327,6), tendo São Paulo com melhor taxa(42,8). Número e taxas de homicídio (por 100 mil) brancos e negros e vitimização negra em Recife e no Brasil. População total. 2010/2012. Região Homicídios s Homicídios s Taxas Brancas Taxas Negras Vitim. % Recife ,2 8,5 7,4 93,8 92,5 84, (CAPITAIS) ,9 16,9 16,3 56,5 55,5 60,1 268 Número e taxas de homicídio (por 100 mil) brancos e negros e vitimização negra em Recife e no Brasil. População Jovem. 2010/2012. Região Homicídios s Homicídios s Taxas Brancas Taxas Negras Vitim. % Recife PE ,1 23,3 13,8 209,7 213,5 185, (CAPITAIS) ,5 32,3 32,0 120,1 115,0 126,
6 Entre os 100 (cem) municípios brasileiros com mais de 50 mil habitantes que possuem as maiores taxas de vitimização, o Estado de possui na lista oito municípios. Tabela municípios com mais de 50 mil habitantes com as maiores taxas. Município Número de Homicídios Taxas (por 100 mil) 2012 Cabo de Santo Agostinho Total Total Vitimização ,2 269, Bezerros ,0 194,6 *** Recife ,8 185, Caruaru ,2 173, Paulista ,4 162,1 592 Goiana ,0 154,3 *** Jaboatão Guararapes dos ,5 149, Vitória de Santo Antão ,7 139,2 788 Dessa forma, se os índices de homicídio do país nesse período estagnaram ou mudaram pouco, e em, em especial, reduziram sensivelmente, a violência homicida tem se concentrado na população negra e, de forma muito específica, nos jovens negros, decorrente da associação crescente entre homicídios e cor da pele das vítimas. V LEVANTAMENTO DOS HOMICÍDIOS NA POPULAÇÃO JOVEM NEGRA COM ENFOQUE EM PERNAMBUCO DADOS RECENTES O Estado de, através do Pacto Pela Vida (PPV), programa do Governo do Estado de que tem como finalidade reduzir a criminalidade e controlar a violência, conforme dados estatísticos de 2013, obtidos no Mapa da Violência 2014, ainda mantinha uma trajetória descendente. Tendo por base o número de homicídios, a redução de 6,5% no número de homicídios, enquanto na população negra este decréscimo foi de 8,1%. Curiosamente, embora em números absolutos tenha pouca relevância, em números relativos houve acréscimo de 21% no número de homicídios na população branca. Da mesma forma comportam-se os índices em relação a taxa de homicídio por 100 mil habitantes. Redução de 9,4% no número de homicídios, enquanto na população negra este decréscimo foi de 8,1% e acréscimo de 21% no número de homicídios na população branca. Número de homicídios na População Total em PE e no Brasil. 2011/2012/2013. REGIÃO Δ% 11/12 12/ ,2 21, ,4-3, ,1-8, ,5-3,9 Geral ,4-6,5 Geral ,9-3,7 10
7 Taxas de homicídios (por 100 mil) na População Total em PE e no Brasil. 2011/2012/2013. REGIÃO Δ% 11/12 12/13 7,3 5,6 6,8-22,5 21,0 15,9 16,5 16,0 3,5-3,0 59,2 56,7 52,1-4,2-8,1 38,6 41,4 39,8 7,0-3,9 Geral 39,1 37,1 33,6-5,1-9,4 Geral 27,1 29,0 27,0 7,0-6,9 De qualquer forma, ainda persiste a vitimização da população negra no Estado de, desde quando o percentual de mortes da população negra chega a 92,8% do total, enquanto o de branco fica em 7%, valores estes que não acompanham o número do Brasil, em que o número de mortes da população negra é de 72,8% do total, enquanto o de branco fica em 26,7%. Já em 2014, em relação ao ano anterior, as informações colhidas informam que apresentou um aumento de 9,5% no número de homicídios, chegando à taxa de 37,36 mortes violentas a cada 100 mil habitantes, dado preocupante, porque reverte a tendência sucessiva de queda ocorrida desde o início do Programa Pacto pela Vida. VI CONCLUSÃO Os dados apresentados demonstram que, embora o Estado de tenha conseguido reduzir o número de homicídios no período histórico analisado de 2002 a 2013, fato é que atualmente esta trajetória tomou novo rumo, o que deve ser objeto de preocupação dos gestores do Pacto pela Vida. Por outro lado, esta redução não se deu de maneira uniforme entre as raças, o que exige a adoção de políticas públicas específicas para a população jovem negra, que corresponde a mais de 92% do número de homicídios no Estado. Conclui Julio Jacobo Waiselfisz, em Mapa da Violência: Os Jovens do Brasil, que três fatores devem ser mencionados para a compreensão dessa situação, quais sejam: a) crescente privatização do aparelho de segurança; b) influência partidária e eleitoral nos critérios de priorização da atuação policial; c) racismo institucional pelos órgãos de justiça e segurança. Quanto ao primeiro, declara o autor que como já ocorrido com outros serviços básicos, como a saúde, a educação e, mais recentemente, a previdência social, o Estado vai progressivamente se limitar a oferecer, para o conjunto da população, um mínimo e muitas vezes nem isso de acesso aos serviços e benefícios sociais considerados básicos. Para os setores com melhor condição financeira, emergem serviços privados de melhor qualidade (escolas, planos de saúde, planos previdenciários etc.). Com a segurança vem ocorrendo esse processo de forma acelerada nos últimos anos. Conclui que os setores e áreas mais abastadas, geralmente brancos, têm uma dupla segurança e os menos abastados, das periferias, preferencialmente negros, têm que se contentar com o mínimo de segurança que o Estado oferece. Quanto ao segundo, informa que as ações e a cobertura da segurança pública distribuem-se de forma extremamente desigual nas diversas áreas geográficas, priorizando espaços segundo sua visibilidade política, seu impacto na opinião pública e, principalmente, na mídia, que reage-se de forma bem diferenciada de acordo com o status social das vítimas. Como resultado, as áreas mais abastadas, de população predominantemente branca, ostentam os benefícios de uma dupla segurança, a pública e a privada, enquanto as áreas periféricas, de composição majoritariamente negra, nenhuma das duas. Quanto ao terceiro, um forte esquema de naturalização e aceitação social da violência que opera em vários níveis e mediante diversos mecanismos, mas fundamentalmente pela visão que uma determinada dose de violência, que varia de acordo com a época, o grupo social e o local, deve ser aceito e torna-se até necessário, inclusive por aquelas pessoas e instituições que teriam a obrigação e responsabilidade de proteger a sociedade da violência, ou seja, a prática do racismo institucional pelas instituições de justiça e segurança. Daí porque a audiência pública se constituiu em instrumento para, no âmbito do Estado de, lançar luzes sobre as estratégicas a serem perseguidas, visando garantir que as taxas de redução já obtidas sejam uniformes para toda a população, o que, para além de trazer como consequência retorno da trajetória decrescente do número de homicídios em geral no Estado, que se perdeu no último ano, garantirá a esta substancial parcela 11
8 da população igualdade de direitos às políticas públicas. Ao Ministério Público brasileiro, e em especial o Ministério Público de, móvel idealizador do presente artigo, caberá assumir este papel, de verdadeiro ombudsman, visando construir, em conjunto com sociedade civil, especialmente o movimento negro, as suas demandas específicas e, por consequência, dialogar com as autoridades federais, estaduais e municipais alternativas para implementá-las, visando cumprir seu papel constitucional de transformar a realidade social da população jovem negra brasileira. À título de sugestão, propõe-se: a) realizar audiências públicas, nos moldes já realizados pelo Conselho Nacional do Ministério Público e o Ministério Público de ; b) propor critérios objetivos no Pacto pela Vida para distribuição de recursos e estrutura física, tecnológica e de pessoal nas áreas com números díspares; c) intermediar o restabelecimento do diálogo entre governo e sociedade civil no âmbito do Pacto pela Vida, já que esta última teve participação ativa no momento de formulação do projeto e de disputa valorativa em torno do mesmo, mas no segundo momento foi alijada do processo, sem ter mecanismos diretos de participação no monitoramento e na avaliação do projeto; d) propor aos órgãos de justiça e segurança o combate ao racismo institucional, através da criação de Grupo de Trabalho na matéria, sensibilizando seus quadros; e) priorizar o ingresso dos municípios do Estado de no Plano Juventude Viva Plano de Prevenção à Violência Contra a Juventude Negra, iniciativa que busca ampliar direitos e prevenir a violência que atinge à juventude brasileira. O Plano constitui-se como oportunidade inédita de diálogo e articulação entre ministérios, municípios, estados e sociedade civil no enfrentamento da violência, em especial àquela exercida sobre os jovens negros, e na promoção de sua inclusão social em territórios atingidos pelos mais altos índices de vulnerabilidade; f) criar a obrigatoriedade do quesito raça/cor no sistema de gestão de Autos Arquimedes e propô-la aos demais órgãos de justiça e segurança do Estado de, pelas suas diversas instituições, a saber, Polícia Militar e Civil e Poder Judiciário, a exemplo do que já ocorre no sistema único de saúde, atualmente único mecanismo que permite a obtenção de dados com enfoque na raça/cor; g) propor ao CNMP a mudança da tabela de taxonomia, tal como autoriza o artigo 5º, 2º, da Resolução CNMP nº 63, de 1º de dezembro de 2010, para complementar a tabela unificada de assuntos a partir deste último nível de detalhamento injúria, com o fito de incluir o crime de injúria racial (art. 140, 3º, do Código Penal), diante da necessidade de sua validação com os dados atualmente remetidos pela autoridade policial, que já são encaminhados ao Ministério Público com este nível de detalhamento. VII - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO 1) WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência: Os Jovens do Brasil, disponível em Acesso em 04/05/2015 2) Edição 2014 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, obtido em Acesso em 04/05/2015 3) RATTON, José Luiz, GALVÃO Clarissa e FERNANDEZ Michelle, O Pacto pela Vida e a Redução de Homicídios em, obtido em Acesso em 07/05/
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