Yes, nós temos maçãs

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1 a g r o n e g ó c i o Yes, nós temos maçãs A produção de maçãs no Brasil nas últimas três décadas teve um impressionante aumento de mais de 6.%. De importador o País passou não apenas a abastecer todo o mercado interno, como também a exportar 15% de sua colheita. O investimento em pesquisas teve papel fundamental nesse resultado. Agora, com financiamento da FINEP, o projeto Inovamaçã, coordenado pela Embrapa, promete trazer ainda mais melhorias para o setor. Fotos: Paula Ferreira 43

2 44 Fotos e texto: Paula Ferreira fruta entra na packing house (local de seleção, embalagem e armazenamento das frutas para estocagem ou transporte). Em 29, vamos testar o trajeto a partir da Com uma equipe formada por mais de 3 pesquisadores, o projeto Inovações Tecnológicas para desenvolver uma versão nacional da esfera, hoje impor- colheita em diante, explica Gilmar, que já tem planos de a Modernização do Setor da Maçã Inovamaçã tada dos Estados Unidos. foi iniciado em 27 e atingiu valor total de aproximadamente R$ 741 mil, dos quais R$ 228 mil foram dados pela to de novas técnicas para aumentar em até 15% a eficiência Outro ponto que merece destaque é o desenvolvimen- ABPM Associação Brasileira de Produtores de Maçã. Os do controle e monitoramento de pragas a fim de diminuir recursos da FINEP praticamente quadruplicaram os investimentos da ABPM e viabilizaram o aumento de atividades de limpeza viral, usando principalmente a termoterapia o uso de agrotóxicos. Também estão em curso trabalhos de pesquisa para o desenvolvimento de tecnologias em (choques térmicos), que geraram, até o momento, oito macieira, explica Gilmar Ribeiro Nachtigall, pesquisador cultivares livres de vírus para os viveiristas. Esses vírus não da Embrapa Uva e Vinho - Estação Experimental de Vacaria afetam a saúde humana, mas diminuem a produtividade e coordenador do Inovamaçã. e a longevidade das plantas, explica Gilmar. O projeto está estruturado em três temas, envolvendo 11 atividades: Proteção Vegetal, Inovações Tecnológicas para Pomares de Qualidade, e Fisiologia Vegetal e Tecnologia Pós-Colheita. Um recurso pioneiro no País já disponibilizado pelo Inovamaçã para os produtores é a esfera instrumentada, uma bola de US$ 18 mil com sensores que simulam características de uma maçã. O objetivo é minimizar as perdas causadas por impactos durante o processamento das frutas. Segundo Gilmar, essas perdas podem chegar a até 2% e é muito difícil detectar quando as lesões acontecem: na hora de colher, no transporte ou na embalagem. Com a esfera, o produtor sabe exatamente em que ponto está o problema, já que é colocada junto com as maçãs e filmada durante o percurso. Os sensores indicam por meio de gráficos em que momento a fruta é machucada e a análise das imagens aponta exatamente o problema, que pode ser, por exemplo, um desnível em uma esteira ou uma quina necessitando de material amortecedor. Em 28, começamos os testes com oito grandes produtores analisando O Inovamaçã também servirá para o desenvolvimento de novas variedades adaptadas às condições nacionais. Hoje a produção é quase que exclusivamente dos tipos Gala e Fuji - a última safra foi composta por 58% da primeira e 36% da segunda - e a diversificação é importante para evitar riscos de colapso no setor em caso de doenças específicas que afetem essas variedades. Futuro Como desdobramento do Inovamaçã, já se pensa no Inovamaçã 2 e, em fase final de aprovação na FINEP, no o momento em que a Pesquisador da Embrapa diz que até 2% das frutas se perdem durante o processamento

3 sustentabilidade e a independência tecnológica da pomicultura nacional. O projeto também representa o início de uma linha de pesquisa de longo prazo visando desenvolver e difundir tecnologias para o melhoramento genético da macieira explica Fabrício Brollo, secretário técnico do Fundo Setorial do Agronegócio. Razão e sensibilidade Novas tecnologias aumentam a longevidade das maçãs Appleclim - Estratégias inovadoras no desenvolvimento de cultivares de macieira adaptadas às condições climáticas brasileiras. Esse esforço de pesquisa visa manter a sustentabilidade da cadeia produtiva da maçã num cenário de aquecimento global. Fruteiras de clima temperado, como as macieiras, são estimuladas pelo frio à queda das folhas no final do ciclo e à dormência hibernal. Após o desencadeamento desse processo, as plantas precisam de um determinado acúmulo de frio intenso e regular para que se estabeleça um novo ciclo vegetativo e reprodutivo. Atualmente já se observam problemas de produção e qualidade nas últimas safras de maçã que podem ser atribuídos às mudanças climáticas. Existem diferentes projeções de mudança de temperatura média anual para a Região Sul, sinalizando aumento entre 1, a 2,5 C até 25. Dados levantados pela Embrapa, ainda não publicados, mostram clara tendência à redução do acúmulo de horas de frio nos últimos 25 anos (temperatura inferior a 7,2 º C). O investimento no projeto Appleclim tem conteúdo estratégico, ensejando acelerar o desenvolvimento e a incorporação de inovações tecnológicas ao mesmo tempo nas instituições públicas de pesquisa envolvidas e no setor privado, de maneira a assegurar a Talvez você não saiba, mas a maçã que compramos em dezembro saiu de sua árvore de origem quase um ano antes. A variedade Gala é colhida apenas nos meses de janeiro e fevereiro e a Fuji, nos meses de março e abril. Durante o resto do ano ela é armazenada em câmaras frias de onde sai para ser colocada no mercado aos poucos. Por ser um fruto extremamente delicado, que estraga com muita facilidade se manuseado de forma incorreta, questões ligadas ao transporte, estoque e colheita ganham importância redobrada. Na hora de descarregar as caixas que chegam dos pomares, por exemplo, a maçã cai em tanques de água para minimizar o impacto e depois percorre esteiras especiais para passar por um processo de seleção manual de classificação de qualidade. Além das maçãs do tipo Extra e das categorias 1, 2 e 3, há as destinadas a uso industrial aquelas que não apresentam qualidade suficiente para serem vendidas in natura. A sensibilidade é um dos obstáculos à mecanização da colheita, que precisa ser feita de forma artesanal, o que exige bom treinamento dos trabalhadores, gerando muitos empregos: cada hectare plantado gera 1,5 empregos diretos, o que corresponde a mais de 58 mil vagas. Para toda a cadeia, considerando-se matérias-primas, produção, refrigeração em frigoríficos, beneficiamento, embalagem, distribuição e venda, estima-se em mais de 15 mil o número total de empregos gerados pela cultura da maçã. A produção oferece trabalho temporário de novembro a dezembro para o raleio (redução do número de frutos das macieiras para equilibrar a produtividade das árvores), e de janeiro a abril para a colheita. Depois, com menos trabalhadores, acontece a limpeza dos pomares, poda e preparação de novas áreas de plantio. Nas processadoras o trabalho é contínuo. É necessário um grande investimento em infraestrutura para conseguir fazer os frutos manterem suas boas condi- 45

4 Exportações brasileiras de 1993 a 28 volume (t) e faturamento (1. USD) Volume Faturamento Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior 46 ções durante o ano todo, mas o segmento da maçã é um dos mais avançados do Brasil na observância dos principais protocolos nacionais e internacionais de qualidade. Pedro Bueno, gerente comercial de fruticultura do grupo Lazzeri, observa que, se no Brasil a fiscalização ainda apresenta falhas, para exportação, os padrões são rígidos. As exigências no exterior tanto, na defesa fitossanitária como comercial, são muito altas. O lado positivo é que isso diminui o risco de problemas com nossas maçãs, nos mercados interno e externo, conta Pedro. Cerca de 88% das exportações brasileiras de maçãs têm como destino a Europa. No Brasil, a cadeia produtiva da maçã foi pioneira na implantação do Sistema de Produção Integrada (PI). A PI pressupõe o emprego de tecnologias que permitam o controle efetivo do sistema produtivo agropecuário por meio do monitoramento de todas as etapas, desde a aquisição dos insumos até a oferta ao consumidor, com mecanismos reguladores que assegurem uma produção agrária sustentável. O conceito, criado nos anos 197, teve como precursores na Comunidade Europeia Alemanha, Suíça e Espanha. Em 1998, a ABPM, depois de várias discussões regionais e pesquisas prévias, procurou o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) alegando estar sofrendo pressões comerciais das exportações. Por isso, foi oficializado o Sistema de Produção Integrada no Brasil, pela publicação das Normas de Produção Integrada de Maçã e, anos mais tarde, do Sistema de Produção Integrada de Frutas (PIF), regulamentado em 21. A articulação dos produtores tem papel fundamental nas melhorias legais e tecnológicas que vêm sendo obtidas. A ABPM mantém há mais de 2 anos uma Comissão de Acompanhamento de Pesquisas, formada por engenheiros agrônomos das principais regiões produtoras, que administra o levantamento das demandas no setor e mantém vínculos com diversas instituições, como Embrapa e Epagri Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina. O investimento em pesquisas é uma das linhas prioritárias da ABPM e os convênios com a FINEP têm permitido elevar os recursos direcionados a isso, diz Moisés Lopes de Albuquerque, gerente executivo da ABPM. Produção e exportação Os primeiros investimentos em pomares comerciais brasileiros surgiram na região de Fraiburgo, Santa Catarina, em 1969, atraídos pela Lei de Incentivos Fiscais para Reflorestamento, que incluiu a macieira no programa. Até então, havia apenas pomares domésticos cultivados por imigrantes europeus e toda maçã de qualidade ainda era importada da Argentina. As exportações começaram em 1986 e, em 1999, pela primeira vez fomos superavitários, com exportações superiores às importações, conta Moisés. Segundo ele, a maçã já chegou a ser o segundo item da pauta agrícola de importações, atrás somente do trigo. Nos últimos 3 anos, a produção cresceu mais de 6.%: se na safra de 1977/1978 foram produzidas toneladas de maçã, em 27/28 esse número chegou a toneladas. A maior safra já registrada foi em 26/27, com toneladas. No entanto, 24 foi o ano com o melhor desempenho em volume de exportação, com toneladas de maçã brasileira enviadas para 41 países. Segundo a ABPM, naquele ano, a maçã foi a fruta in natura que mais divisas trouxe ao País. O ano de

5 Produção brasileira de maçã volume (t) e faturamento (1. USD) Volume (t) safra 27/8 Décadas Fonte: IBGE/ABPM/AGAPOMI/FRUTIPAR 28, apesar de não ter repetido o volume de 24, foi a temporada em que se registrou o maior faturamento com exportação, chegando perto dos US$ 88 milhões. No comparativo com as outras frutas frescas nacionais exportadas, a maçã ocupou o 4º lugar em valor e o 2º em volume. Segundo Moisés, porém, o Brasil, se produz muito, exporta pouco. A exportação da fruta fresca é muito pequena perto da produção, apenas 2% do total. No caso da maçã é de cerca de 15%, afirma. É notável que a área plantada não tenha crescido na mesma proporção que a produção, o que indica a otimizade mais qualidade e maior produtividade. Nos primeiros pomares, de baixa densidade, as árvores chegavam a ter três metros de distância umas das outras. Com as pesquisas, chegou-se à distância de 8 cm a um metro, melhor para aumentar a produtividade e a longevidade das plantas. Hoje, cerca de 99% da maçã do Brasil é cultivada abaixo do Trópico de Capricórnio. O estado de Santa Catarina responde por 51% da produção nacional, seguido do Rio Grande do Sul (44%) e do Paraná (5%). Os três grandes polos produtores são Vacaria (RS), São Joaquim (SC) e Fraiburgo (SC). Em 27, estimava-se um total de produtores no País. Comparativo das exportações brasileiras de frutas frescas janeiro a outubro de 28 Frutas 28 Valor (US$FOB) Volume (Kg) Uvas Melões Mangas Maçãs Limões Mamões Bananas Laranjas Fonte: Secex/Datafruta-Ibraf ção obtida pela melhoria das técnicas utilizadas e o papel fundamental do investimento em pesquisas. Nos últimos vinte anos, a área cultivada aumentou em cerca de 75%, passando de hectares em 1988 para hectares em 28. Na década de 198, o setor investiu em mudas Gula Segundo a World Apple Review de 28, a Turquia é o país que mais come maçãs no mundo: 31,68 Kg/ano por pessoa em 27. No mesmo ano, o consumo brasileiro foi de apenas 4,64 Kg. Considerando os 32 principais países produtores de maçãs no mundo, a média de consumo per capita em 27 foi de 1,34 Kg. Segundo essa lista, o consumo nacional só foi superior aos da África do Sul (4,11Kg), Bulgária (4,31Kg) e Argentina (4,4Kg), que, segundo a publicação, tem tido queda contínua no consumo de maçãs desde De acordo com o Instituto Brasileiro de Fruticultura (Ibraf), o consumo per capita de frutas no Brasil é de apenas 57 Kg por ano, bem abaixo de países como Itália (114 Kg/ano) ou Espanha (12 Kg/ano). No entanto, o País é o terceiro maior produtor de frutas no mundo, atrás apenas da China e da Índia. Segundo Pedro Bueno, do grupo Lazzeri, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais são os maiores consumidores de maçãs do País. n 47