IMPACTOS DECORRENTES DE DEPOSIÇÕES IRREGULARES DE RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO MUNICÍPIO DE SANTOS, SÃO PAULO, BRASIL
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- Liliana Amado Brunelli
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1 IMPACTOS DECORRENTES DE DEPOSIÇÕES IRREGULARES DE RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO MUNICÍPIO DE SANTOS, SÃO PAULO, BRASIL Luiz Otávio de Almeida Castro * Consultor Autônomo Engenheiro Civil pela Universidade Santa Cecília. Mestre em Saúde Pública, área de concentração Saúde Ambiental pela Universidade de São Paulo. Wanda Maria Risso Günther Faculdade de Saúde Pública da USP Engenheira civil e sanitarista, Socióloga. Mestre e Doutor em Saúde Pública. Professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública da USP Endereço (*): Rua Januário dos Santos, nº 196 / 44 Aparecida Santos SP Brasil Telefone: (55) castroll@bignet.com.br RESUMO A gestão dos resíduos da construção civil, tecnicamente denominados Resíduos de Construção e Demolição - RCD, preocupação recente dentro da questão dos resíduos sólidos urbanos, devido aos significativos impactos ambientais e sanitários decorrentes de seu grande volume geralmente depositado de forma irregular, da falta de políticas públicas voltadas ao gerenciamento dessa questão e ao desconhecimento da gravidade desse problema por parte da sociedade, atualmente apresenta-se como uma necessidade ambiental e sanitária. Em Santos, SP, Brasil, a questão apresenta-se de modo diferenciado devido às condições geográficas e históricas específicas desse município, preocupando não somente as autoridades municipais encarregadas da limpeza pública, como também as universidades e os técnicos ambientais, no que tange aos impactos ambientais, sociais, econômicos e sanitários que degradam a qualidade de vida da população residente e contribui negativamente para o turismo local. Este trabalho enfoca a questão dos RCD no tocante às quantidades geradas, identificando e caracterizando os pontos de deposição inadequada dos mesmos na área urbana santista; levanta os diferentes impactos decorrentes dessa prática e propõe caminhos para o enfrentamento da questão, seja como subsídios para uma política pública municipal de RCD ou como alternativas operacionais às ações atualmente implantadas. PALAVRAS-CHAVE: resíduos da construção civil, resíduos sólidos urbanos, entulho, gestão ambiental urbana. INTRODUÇÃO Dentro do universo da gestão ambiental urbana, o gerenciamento dos resíduos sólidos apresenta-se como uma questão de difícil equacionamento. No Brasil, tal fato decorre de vários fatores tais como o crescimento da população urbana e o aumento da capacidade produtiva aliados ao aumento e diversificação do consumo, acompanhado da introdução de novos materiais nessa cadeia. A construção civil brasileira também apresenta tais características de introdução de novas tecnologias e materiais, sendo que muitos métodos e materiais arcaicos ainda são utilizados em larga escala. Dessa forma, os resíduos da construção civil configuram-se como um novo problema de saneamento ambiental urbano, o qual mescla volume crescente e grande variedade, constituindo-se desde os resíduos recicláveis como papel, plástico, metal e vidro, até resíduos tóxicos e perigosos, como restos de tintas e solventes. Dentro do município de Santos, tal questão apresenta-se com características próprias, pela condição histórica desse município, o qual pode ser considerado como de urbanização antiga para os padrões brasileiros e, dessa maneira, com grande necessidade de intervenções para manutenção ou demolição de edificações e para a execução de novas obras com modernas tecnologias e materiais, o que leva a uma contínua geração de RCD.
2 Devido à sua condição geográfica, cuja totalidade da área urbana encontra-se inserida em uma ilha, a existência de locais para a disposição adequada de tais resíduos é limitada, causando assim o estigma das deposições clandestinas que corroboram para a redução da qualidade de vida nesse município, bem como para o aumento dos custos da manutenção e limpeza pública. Dentre as várias possibilidades de impactos causados por essas deposições irregulares, os de natureza sanitária e ambiental tornam-se especialmente importantes, como o comprometimento da paisagem, do trafego de pedestres e de veículos e da drenagem urbana, atração de resíduos não inertes, focos de proliferação de vetores de doenças, entre outros (PINTO 2001). O MUNICÍPIO DE SANTOS Município situado no litoral paulista, dentro da Região Metropolitana da Baixada Santista, Santos tem suas áreas urbana e rural nitidamente definidas devido à sua condição geográfica característica, onde a mancha urbana se estabeleceu na ilha de São Vicente, dividindo-a com o município homônimo à ilha e a parte não urbanizada localizada no continente. Na Figura 1, a seguir, observa-se essa divisão do município entre a ilha e o continente. Marcante também é a condição de acesso que separa as duas partes do município, sendo que o mesmo se dá através de municípios vizinhos a Santos, seja por via rodoviária ou marítima (sistema de balsas). Tal condição geográfica contribuiu para a dificuldade de se encontrar locais adequados à disposição final dos resíduos sólidos, uma vez que a área insular apresenta-se densamente ocupada e a área continental apresenta dificuldades de acesso. Figura 1. Mapa indicativo das partes insular e continental do município de Santos, SP, Brasil. Coincidentemente com tais características geográficas, Santos pode ser considerada, para os padrões brasileiros, como uma cidade antiga, tendo sido a segunda vila a ser fundada quando da colonização do Brasil. Soma-se a essas especificidades locais a recente legislação municipal que alterou as limitações construtivas liberando a altura das construções antes limitada a 12 andares. Assim, a exigüidade de espaços urbanos para a implantação de novos edifícios aliada à necessidade de reformas e manutenções periódicas nas edificações antigas tendem a incrementar, dentro da indústria da construção civil, as atividades ligadas às demolições e reformas. Na relação entre a geração e as dificuldades de disposição final dos RCD, a necessidade de maiores conhecimentos sobre os resíduos gerados pela construção civil torna-se importante. Os RCD caracterizam-se por apresentar uma extensa gama de componentes em sua composição, variáveis em suas características, valor agregado e periculosidade. RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO - RCD
3 Segundo a norma CONAMA 307, de 5 de julho de 2002 (BRASIL 2002), os Resíduos de Construção e Demolição RCD são aqueles provenientes de construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil e os resultantes da preparação e da escavação de terrenos, tais como: tijolos, blocos cerâmicos, concreto em geral, solos rochas, metais, etc; e classificados conforme seus potenciais de reutilização, reciclagem e periculosidade. Interessante também a definição dada por D ALMEIDA e VILHENA (2000), que além de conceituá-lo como insumo desperdiçado, também considera sua reaproveitabilidade e potencial toxicidade. Embora refutados em recente pesquisa, os amplamente criticados índices de perdas da construção civil brasileira contribuem para a geração dos RCD. Essas perdas, conforme SOUZA (1998), podem ser classificadas como: diretas, sendo posteriormente removidas da obra (entulho) e indiretas, ficando incorporadas à obra. Uma vez gerado e não reaproveitado na obra, o entulho será removido e disposto em outro local. As alternativas de destino dos RCD incluem a utilização como material para aterro em obra civil; o envio para aterro sanitário ou aterro específico, usualmente denominado de aterro de inertes; segregação e reciclagem para emprego em construção civil; e deposição irregular, geralmente efetuada de forma descontrolada e inadequada. A disposição em aterros sanitários, embora não possa ser considerada uma solução adequada, do ponto de vista econômico-ambiental, pois reduz a vida útil do aterro com a inclusão de materiais que não necessitam de estruturas especiais como os sistemas de drenagem de gases e líquidos percolados, é a alternativa oficial para o município de Santos. Alternativas a esses destinos seria a criação dos aterros de resíduos da construção civil, que de acordo com a resolução CONAMA 307/02 (BRASIL 2002) visam à reservação de materiais segregados de forma a possibilitar seu uso futuro e/ou futura utilização da área, utilizando princípios de engenharia para confiná-los ao menor volume possível, sem causar danos à saúde pública e ao meio ambiente. Tais áreas poderão ser consideradas como jazidas de matéria-prima para a construção civil, barateando custos de movimentação e transporte. Assim a resolução CONAMA 307/02 (BRASIL 2002) altera a condição desse material, transformando-o de um resíduo oriundo nos canteiros de obra, e que necessariamente deve ser descartado, incidindo em custo, em uma fonte de matéria-prima passível de ser re-inserida na cadeia produtiva da construção civil. Tal re-inserção poderá ocorrer com o aproveitamento desse material para a execução de aterros ou na pavimentação de vias públicas e rodoviárias. No entanto, novas tecnologias que empreguem os RCD encontram-se em desenvolvimento. Devido à escassa legislação que regula a questão dos RCD e, principalmente, à quase inexistente fiscalização pelas autoridades competentes, a grande maioria dos municípios brasileiros destinam seus RCD de forma inadequada e, em muitos casos, clandestina e irregular. Dentro da realidade santista, essas deposições irregulares são consideradas um problema grave e caracterizam-se principalmente por constituírem-se de entulho gerado em pequenas reformas. CASTRO (2003) observou que, junto a essas deposições irregulares, era nítida a presença de outros resíduos, tais como orgânicos, restos de poda, pneus e volumosos, dentre outros. IMPACTOS DECORRENTES DAS DEPOSIÇÕES IRREGULARES A conjuntura observada nas áreas onde ocorreram deposições irregulares, conforme descrito no parágrafo anterior, pode servir de atrativo a vetores de interesse sanitário, os quais teriam assim acesso a proteção, alimento e água. Dentre esses vetores, deve ser dada alguma evidência ao mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, que necessita de água parada para se reproduzir e que tal condição foi observada na maioria das deposições irregulares avaliadas em Santos, conforme pode ser avaliado na Figura 2.
4 Figura 2. Detalhe de possível local de procriação de Aedes aegypti BRITO FILHO (1999) e SILVA (2002) consideraram as implicações desses depósitos irregulares com relação ao assoreamento e entupimento de redes de drenagem da águas pluviais, sendo a relação entre elas muito consistente. Em Santos, embora a relação entre essa prática inadequada e os mais graves incidentes de inundações e enchentes não possa ser confirmada, foi notada junto às deposições irregulares de maior monta pequenas áreas de empoçamento (CASTRO 2003). Importante salientar aqui que, na ocorrência de inundações, a possibilidade de contaminação por certas doenças de veiculação hídrica amplia-se na proporção em que se amplia a população atingida pelas condições insalubres determinadas por tal evento. Outra prática percebida quanto a essas deposições irregulares ocorrentes em Santos foi a queima dos materiais inflamáveis presentes nas mesmas, o que, além da inconveniente geração de fumaça e gases tóxicos e de combustão incompleta, também pode danificar os cabeamentos aéreos (energia elétrica e telefonia), além de oferecer risco de incêndio às edificações próximas e, muitas vezes, requerer a presença de efetivo do corpo de bombeiros em detrimento de outras ocorrências. A Figura 3, a seguir, mostra indícios de tal prática através de marcas de fumaça percepitíveis no muro. Figura 3. ponto de deposição irregular com marcas de queima anterior de material.
5 Uma vez inseridas na gestão ambiental urbana, as atividades de limpeza pública tem como parte de sua função evitar que situações de risco sanitário se estabeleçam. Assim sendo, dentro das atividades da limpeza pública santista, a remoção dessas deposições clandestinas e inadequadas de resíduos ocorre com certa freqüência devido à magnitude do problema, o qual embora ocorra usualmente em pequenas quantidades, essas acabam por ser depositadas em locais próximos umas das outras. CONCLUSÕES Assim, concluiu-se que dentre os vários impactos possíveis decorrentes de deposições irregulares de RCD em áreas urbanas, em relação ao município santista os de maior preocupação são os relacionados à questão sanitária, em especial quanto à presença de vetores de interesse sanitário junto a essas deposições, sendo clara a possibilidade de danos à saúde humana, em especial nas populações circunvizinhas a essas deposições. Nítida também é a popularização dos custos da remoção e limpeza dessas deposições, os quais, embora estejam diretamente relacionados ao erário público acabam, em última instância, sendo repassados à população santista como um todo na condição de impostos. Dessa forma, embora em termos sanitários e sócio-ambientais os impactos acabem tornando-se mais restritos às populações que habitam próximo a tais deposições irregulares, em termos financeiros essas deposições acabam por atingir a uma parcela muito maior da população de Santos. Observou-se que, embora fosse esperado que tal problema de deposições irregulares se apresentasse com maior freqüência nas áreas tidas como menos nobres da cidade (zona noroeste), o mesmo ocorre com maior intensidade em áreas muito próximas às mais nobres (zona leste), localizadas mais próximas às praias. Uma possível explicação a tal fato pode decorrer de a maior parte das obras ocorrerem também nessas áreas, o que dificultaria o transporte desse material até a zona noroeste de Santos. Também ficou clara a necessidade de legislações específicas, como citadas na CONAMA 307/02 (BRASIL 2002), que regulamentem a cadeia desses resíduos, visando o controle das deposições irregulares presentes e a prevenção de futuras, bem como o gerenciamento desses resíduos no âmbito municipal. Nesse mesmo sentido, a necessidade clara de planejamento quanto à identificação, transporte, disposição final e, quando necessário, tratamento, também se mostra preemente no que tange à criação de um plano de gerenciamento dos resíduos da construção civil no município de Santos e, provavelmente, em outros municípios brasileiros também. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Brasil (2002) Resolução nº 307, de 5 de julho de Estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil. [CONAMA] Conselho Nacional de Meio Ambiente, Brasília. Brito Filho J.A. (1999) Cidades versus entulho. In: 2º Seminário Desenvolvimento Sustentável e a Reciclagem na Construção Civil. São Paulo: IBRACON. Castro L.O.A. (2003) Destinação dos Resíduos de Construção e Demolição na Área Insular do Município de Santos e seus Impactos Sanitários e Ambientais. Dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. D'Almeida M.L.O., Vilhena A. (2000) Lixo municipal: manual de gerenciamento integrado. 2ª edição. São Paulo: IPT/CEMPRE. Silva G.H.P. (2002) Desenvolvimento urbano: prevenção contra enchentes. DICAS: idéias para a ação municipal [online]. Disponível em <URL: Acessado em 07/nov/2002. Souza U.E.L. (1998) Mitos e verdades sobre o desperdício em obras. Pinto, T.P. (2001) Gestão dos resíduos de construção e demolição em áreas urbanas da ineficácia a um modelo de gestão sustentável. In: Reciclagem de Entulho para a produção. Salvador: Editora da UFBA.
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