PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 fls. 715 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que são apelantes WAGNER RODRIGUES PESTANA e VALÉRIA ANTUNES GLAUSER, é apelado BMX REALIZAÇÕES IMOBILIÁRIAS E PARTICIPAÇÕES S/A. (ODEBRECHT). ACORDAM, em sessão permanente e virtual da do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores FRANCISCO LOUREIRO (Presidente sem voto), CLAUDIO GODOY E AUGUSTO REZENDE. São Paulo, 15 de fevereiro de Christine Santini Relatora Assinatura Eletrônica

2 fls. 716 Apelação Cível nº São Paulo Apelante: Wagner Rodrigues Pestana e Valéria Antunes Glauser Apelado: BMX Realizações Imobiliárias e Participações S.A. (Odebrecht) Juiz Prolator: Inah de Lemos e Silva Machado TJSP (Voto nº ) Apelação Cível. Compromisso de venda e compra Ação de rescisão contratual cumulada com devolução de valores pagos Autores-adquirentes que desistiram da aquisição Sentença de parcial procedência, reconhecida a rescisão do contrato, ordenada a restituição de 70% dos valores pagos e mais a devolução dos valores desembolsados para pagamento de taxa SATI Recurso apenas dos adquirentes para majorar o percentual de devolução e obter o ressarcimento integral da comissão de corretagem Rescisão do contrato corretamente reconhecida Perdimento integral das parcelas que viola o Código de Defesa do Consumidor Recondução das partes ao statu quo ante Devolução de valores pagos com retenção de 10% pela ré em parcela única, com acréscimo de correção monetária e juros de mora Comissão de corretagem Prazo prescricional trienal aplicável à espécie, conforme entendimento fixado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº SP, pelo rito dos recursos repetitivos Inocorrência de prescrição na hipótese Validade da cobrança da comissão de corretagem em face dos adquirentes, na hipótese Adquirentes previamente informados acerca da aludida cobrança em fase pré-contratual Documento anterior ao contrato com menção a propósito da comissão de corretagem Tese fixada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº SP, pelo rito dos recurso repetitivos, aplicável à hipótese. Dá-se provimento em parte ao recurso. 1. Trata-se de ação de rescisão contratual movida por Wagner Rodrigues Pestana e Valéria Antunes Glauser em face de BMX Realizações Imobiliárias e Participações S.A., alegando, em síntese, que firmaram com a ré compromisso de venda e compra da unidade comercial nº 809, Bloco C2 do Condomínio Parque da Cidade, em , pelo 2

3 fls. 717 montante de R$ ,84. Informam que realizaram o pagamento de R$ ,95, bem como o importe de R$ ,23 e R$ 5.016,04, respectivamente a título de comissão de corretagem e taxa SATI. Asseveram não ter mais interesse na continuidade do contrato, tendo sido oferecida a devolução de apenas 40% dos valores pagos. Requerem, assim, seja a ré condenada à devolução de 90% dos valores pagos e a integralidade da comissão de corretagem e taxa SATI. A ação foi julgada procedente em parte para o fim de declarar o contrato rescindido e condenar a ré a devolver 70% do valor efetivamente pago pelos autores quanto ao contrato firmado, além do valor pago a título de taxa SATI, devidamente corrigido desde o desembolso pela Tabela Prática deste Egrégio Tribunal de Justiça e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação. Diante da sucumbência recíproca, cada parte deverá arcar com metade das custas e despesas processuais e com os honorários advocatícios de seus respectivos patronos (fls. 378/384). Os embargos de declaração interpostos pela ré foram rejeitados (fls. 391). Inconformados, apelam os autores sustentando, em síntese, que é devida a devolução integral dos valores indevidamente pagos a título de comissão de corretagem, o que totaliza o valor de R$ ,23. Alegam que fazem jus à devolução de 90% dos valores pagos, a ser realizado em parcela única. Pugna, enfim, pela reforma da R. Sentença (fls. 392/419). Processado regularmente o recurso, foram apresentadas 3

4 fls. 718 contrarrazões (fls. 598/611). termos da certidão de fls Não houve oposição das partes ao julgamento virtual, nos É o relatório. 2. Anote-se que o recurso de apelação interposto em (fls. 392) tem por objeto a sentença proferida em (fls. 383). Assim, face ao princípio do tempus regit actum, devem ser aplicadas à hipótese as disposições do Código de Processo Civil de 1973 (Lei nº 5.869/73), diploma vigente à época em que praticados os referidos atos. Depreende-se dos autos que as partes celebraram em compromisso de venda e compra de unidade autônoma mediante o pagamento de parcelas. Ocorre que os autores-adquirentes desistiram da aquisição, pretendendo, desse modo, a rescisão do contrato. Não há controvérsia quanto à rescisão do contrato reconhecida na R. Sentença. O inconformismo das partes remanesce quanto à proporção dos valores pagos a serem restituídos aos adquirentes. Superada a declaração de rescisão do contrato, é de rigor a recomposição das partes ao statu quo ante. Nesse sentido, entendimento consolidado deste Egrégio Tribunal de Justiça: Súmula 3: Reconhecido que o compromissário comprador 4

5 fls. 719 tem direito à devolução das parcelas pagas por conta do preço, as partes deverão ser repostas ao estado anterior, independentemente de reconvenção.. Inviável o perdimento integral das parcelas pagas pelo autor, não configurada hipótese excepcional a autorizar tal perda sem violação ao Código de Defesa do Consumidor. Ressalte-se que o contrato sob exame é típico contrato de adesão, cabendo ao Poder Judiciário intervir para manutenção do equilíbrio necessário à relação. Dispõe o artigo 53, caput, do Código de Defesa do Consumidor que: Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado. Contudo, sob pena de enriquecimento sem causa dos autores, levando-se em consideração que a rescisão contratual se operou a seu pedido, não se mostra plausível a devolução integral dos valores pagos. Assim, da análise dos autos, tem-se como adequada a retenção de 10% do total dos valores pagos em favor da alienante, 5

6 fls. 720 considerando-se especialmente as despesas administrativas por ela suportadas, considerada abusiva a cláusula contratual que prevê a retenção de 30%, (cláusula 6.1 fls. 61). Os outros 90% deverão ser devolvidos aos autores em parcela única, nos termos da Súmula nº 2 deste Egrégio Tribunal de Justiça, com correção monetária a partir dos respectivos desembolsos pela Tabela Prática deste Egrégio Tribunal de Justiça e juros de mora de 1% ao mês, desde a citação, o que está de acordo com o entendimento desta Colenda Câmara de Direito Privado. Acerca da necessária devolução em parcela única dos valores devidos, confira-se o teor da Súmula nº 2 deste Egrégio Tribunal de Justiça: Súmula 2: A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para aquisição No mais, pretendem os autores a restituição dos valores desembolsados para pagamento da comissão de corretagem. Por primeiro, cumpre observar que não se verifica na hipótese o advento do prazo prescricional trienal, conforme tese fixada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso especial nº SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, quando a pretensão é de ressarcimento dos valores desembolsados para pagamento de taxa SATI e comissão de corretagem: 6

7 fls. 721 Incidência da prescrição trienal sobre a pretensão de restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem ou de serviço de assistência técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere (artigo 206, 3º, IV, CC). Isso porque o contrato foi celebrado em (fls. 85) e a demanda foi proposta em O Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos REsp nºs SP e SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese acerca da responsabilidade dos adquirentes quanto ao pagamento da comissão de corretagem: Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com destaque do valor da comissão de corretagem.(grifos nossos) Melhor examinando o V. Acórdão, reformulo entendimento anterior sobre a matéria. Isto porque o Colendo Superior Tribunal de Justiça destacou a necessidade de ajuste prévio entre as partes quanto ao repasse do ônus do pagamento da comissão de corretagem ao consumidor-adquirente, conforme excerto abaixo transcrito: 7

8 fls. 722 A solução da controvérsia situa-se na fase pré-negocial, englobando as tratativas, a oferta e a aceitação, com ênfase no dever de informação acerca da transferência do dever de pagar a comissão de corretagem ao adquirente antes da celebração do contrato de compra e venda.(grifos nossos) Logo, não é o bastante que esta informação tenha sido prestada no instante da celebração do contrato para que se verifique a comunicação prévia e destacada ao consumidor quanto ao pagamento da comissão de corretagem. No caso dos autos, contudo, observa-se que em fase précontratual foram os adquirentes cientificados da necessidade do pagamento da comissão de corretagem, conforme se verifica da reserva assinada em , na qual constou expressamente que concretizado o negócio os adquirentes teriam que aderir ao contrato de prestação de serviços de corretagem imobiliária (fls. 197). Tal informação, portanto, foi disponibilizada aos adquirentes em fase pré-contratual. Além disso, o documento de fls. 202 indica que os adquirentes autorizaram débito em conta corrente das parcelas da comissão de corretagem, sendo programado o primeiro débito para a data da assinatura do contrato, ou seja, Não há, portanto, na hipótese vertente, abusividade na transferência aos adquirentes da responsabilidade quanto ao pagamento da comissão de corretagem. 8

9 fls. 723 Desse modo, o recurso dos autores merece provimento em parte apenas para condenar a ré à devolução de 90% dos valores pagos, sem acolhimento do pedido de restituição da comissão de corretagem diante da validade da cobrança. O presente julgamento não alterou a caracterização da sucumbência recíproca, nos termos da R. Sentença. Ressalte-se que, no tocante aos honorários advocatícios, o Colendo Superior Tribunal de Justiça fixou entendimento de que o marco temporal a ser adotado para a aplicação do Código de Processo Civil de 2015 é a data da prolação da sentença (REsp nº SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j ) 3. À vista do exposto, pelo meu voto, dou provimento em parte ao recurso, para os fins acima declinados. 9 Christine Santini Relatora