PROCURADORIA-GERAL DO TRABALHO CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO PROCESSO PGT/CCR/ICP/ 3030/2014
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- Milena Affonso Soares
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1 Origem: PRT 17ª Região Membro Oficiante: Dr. Antonio Carlos Lopes Soares Interessado 1: MTE SRTE/ES Interessado 2: CJF de Vigilância Ltda Assunto: Temas gerais APRENDIZAGEM. EMPRESA DE VIGILÂNCIA. O fato de a empresa investigada se inserir no setor econômico de vigilância não a desobriga por si só do cumprimento da cota prevista no art. 429 da CLT. A aprendizagem, como disposto no art. 428 do mesmo diploma legal, tem conteúdo amplo, complexo, desdobrando-se em atividades teóricas e práticas, de forma a conceder ao aprendiz conhecimento sobre a empresa, assim como sobre o setor econômico em que ela se insere. Ademais, tem como fundamento o direito à formação profissional, direito fundamental previsto no art. 227 da Carta Magna, de que é detentor todo adolescente e jovem. Promoção de arquivamento não homologada. I RELATÓRIO Trata-se de inquérito civil instaurado a partir de ofício da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego ES, encaminhado pelo Exmo. Procurador do Trabalho do Município de Colatina, Dr. Marcos Mauro Rodrigues Buzato, informando de irregularidades no cumprimento das cotas para aprendizes por parte da empresa CJF VIGILÂNCIA LTDA. Considerou o Membro oficiante que as empresas de segurança privada não estão compelidas a contratar jovens aprendizes, pois as peculiaridades poderiam prejudicar a formação psíquica do jovem. Registrou, ainda, que a Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente - COORDINFÂNCIA/MPT concluiu na XXV reunião nacional não constituir meta prioritária a implementação da aprendizagem no setor de vigilância, bem como que ficaria a cargo de cada Procurador a decisão pela autuação ou prosseguimento de investigação em curso. 1
2 É o breve relatório. II FUNDAMENTAÇÃO Vê-se gerar bastante controvérsia a imposição legal de contratação de aprendizes por empresa de vigilância, devendo tal tema ser analisado cuidadosamente. Na XXV Reunião Nacional da COORDINFÂNCIA, realizada em outubro de 2013, deliberou-se que: O MTE levantará, no cadastro nacional de aprendizagem, os cursos e entidades formadores, existentes nos setores de transporte e asseio/conservação. Após, repassará à Coordenadoria Nacional, que divulgará a informação na lista e discussão e no dropbox da Coordinfância; B) A coordenação Nacional agendará reunião com o MEC/PRONATEC e CODEFAT a fim de tratar da execução do PRONATEC- APRENDIZ e para que o MPT passe a ser demandante; C) Não constitui meta prioritária da Coordinfância a implementação de aprendizagem nos setores de vigilância, transporte, asseio e conservação, ficando a cargo de cada Procurador nacional decidir pela atuação, ou não, no caso concreto, bem como quanto ao prosseguimento de investigações já em curso. O cerne da celeuma vem calcado em dois argumentos distintos. O primeiro relativo à incompatibilidade do contrato de aprendizagem com o exercício de atividades de vigilância armada ou não; o segundo, relativo à ausência de cursos de aprendizagem ministrados pelas entidades legalmente qualificadas em formação técnicoprofissional-metódica. O art. 428 da CLT conceitua o contrato de aprendizagem, além de estabelecer diretrizes para contratação: Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e 2
3 o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação. O art. 429 da CLT, por sua vez, dispõe acerca do número de aprendizes a serem contratados, em percentual incidente sobre o número de trabalhadores existentes no estabelecimento, cujas funções exijam formação profissional: Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional. Ambos os dispositivos têm como objetivo a garantia do direito à profissionalização do jovem e do adolescente, consubstanciado no art. 227 da Constituição Federal: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocálos a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Nesse contexto, não se pode fazer uma leitura do art. 429 da CLT, que dispõe sobre a base de cálculo do percentual mínimo estipulado para contratação de aprendizes, divorciada da interpretação do próprio direito fundamental à proteção integral e à profissionalização. A formação profissional de jovens amplia as possibilidades de inserção no mercado de trabalho e torna mais promissor o futuro da nova geração. O empresário, por sua vez, além de cumprir sua função social, contribuirá para a formação de um profissional mais capacitado para as atuais exigências do mercado de trabalho. Mais que uma obrigação legal, portanto, a aprendizagem é uma ação de responsabilidade social e um importante fator de promoção da cidadania, redundando, em última 3
4 análise, numa melhor produtividade (Manual de Aprendizagem - MTE, 2011). Do conteúdo teleológico da norma legal infere-se que objetivo precípuo foi permitir uma maior inserção do adolescente e do jovem, de 14 a 24 anos, no mercado de trabalho, sendo que as atividades objeto de aprendizagem são aquelas que exigem formação profissional. O Decreto nº 5.598/2005, em seu art. 10, dispõe que as funções que demandam formação profissional são aquelas previstas na Classificação Brasileira de Ocupações - CBO, elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego - MTE: Para a definição das funções que demandem formação profissional, deverá ser considerada a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. do art. 10: Por outro lado, as funções excetuadas encontram-se previstas no 1º Ficam excluídas da definição do caput deste artigo as funções que demandem, para o seu exercício, habilitação profissional de nível técnico ou superior, ou, ainda, as funções que estejam caracterizadas como cargos de direção, de gerência ou de confiança, nos termos do inciso II e do parágrafo único do art. 62 e do 2o do art. 224 da CLT. Nesse contexto, as únicas funções excetuadas são aquelas que demandam habilitação de nível técnico ou superior, e cargos de direção, confiança ou gerência. Não se vislumbra, do teor da norma legal, limitação quanto às funções ora discutidas, no caso, as relacionadas à vigilância patrimonial. Ao contrário, a exigência legal de inclusão na base de cálculo, inclusive de funções proibidas para menores, é expressa no 2º do art. 10: Deverão ser incluídas na base de cálculo todas as funções que demandem formação profissional, independentemente de serem proibidas para menores de dezoito anos. 4
5 Logo, não é a melhor interpretação da norma a de que a vedação do exercício de atividades proibidas para menores de 18 anos ou mesmo de 21 anos (art. 16, II, da Lei 7.102/83), como no caso, impede a contratação de aprendizes para essas atividades, ou que tais funções não serão computadas na cota de aprendizes e, portanto, ensejarão na contratação de um número menor de jovens. Penso que uma solução correta fundamentada nos direitos individuais é a de que não há redução do número de aprendizes em função da atividade (vigilância) eventualmente exercida na empresa, mas tão somente a limitação de idade do aprendiz contratado. Nesse contexto, a contratação de aprendizes para atividades segurança privada (vigilância patrimonial, segurança de pessoas físicas e transporte de valores e cargas) está limitada aos jovens entre 21 e 24 anos de idade, pois o art. art. 16, II, da Lei 7.102/83, estabelece a idade mínima de 21 anos para o exercício da função de vigilante. Ainda, o art. 11 do Decreto nº 5.598/05 dispõe: A contratação de aprendizes deverá atender, prioritariamente, aos adolescentes entre quatorze e dezoito anos, exceto quando: I - as atividades práticas da aprendizagem ocorrerem no interior do estabelecimento, sujeitando os aprendizes à insalubridade ou à periculosidade, sem que se possa elidir o risco ou realizá-las integralmente em ambiente simulado; II - a lei exigir, para o desempenho das atividades práticas, licença ou autorização vedada para pessoa com idade inferior a dezoito anos; e III - a natureza das atividades práticas for incompatível com o desenvolvimento físico, psicológico e moral dos adolescentes aprendizes. Parágrafo único. A aprendizagem para as atividades relacionadas nos incisos deste artigo deverá ser ministrada para jovens de dezoito a vinte e quatro anos. Essa é, a meu ver, uma leitura da legislação pertinente que procura emprestar a máxima efetividade ao direito fundamental do jovem à profissionalização, por que abre maior espaço para a preparação pré-profissional, com instrução geral e prática, apropriada aos jovens, além de revelar interesses, habilidades profissionais e favorecer a aptidão profissional ulterior (Recomendação nº 117 da OIT). 5
6 É de se ressaltar, ainda, que tal função encontra-se prevista na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO, item 5173), demandando formação profissional, pelo que deve ser computada na base de cálculo para a contratação de aprendizes, nos termos do art. 429 da CLT. Importante assinalar ainda a criação, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego, de Grupo de Trabalho para avaliar, entre outras questões (Portaria MTE n , de 11 de agosto de 2011), a aprendizagem no setor de segurança e transporte de valores, o qual emitiu, em 31 de janeiro de 2012, o seu relatório conclusivo, do qual extraio o seguinte trecho, verbis: Considerando que o GT deverá utilizar como referência a Classificação Brasileira de Ocupações CBO, bem como observar a organização de programas curriculares por eixos tecnológicos utilizados na educação profissional, de forma a propiciar os percursos formativos por áreas de conhecimento. Considerando que a Polícia Federal, instituição responsável pela regulamentação da segurança privada, entende que após o período de formação e a conclusão do curso, o aprendiz está apto ao exercício das atividades práticas inerentes à ocupação, visto que tenha cumprido os requisitos necessários. Considerando que a formação tem o objetivo da promoção e do desenvolvimento de conceitos, habilidades e atitudes exigidos na preparação e organização do trabalho de qualquer natureza, incluindo o domínio das tecnologias de informação, habilidades de comunicação oral e escrita, o raciocínio lógico em matemática, dentre outros temas previstos nas normas que disciplinam a validação dos programas pelo MTE, visando promover a inclusão sustentável e autônoma no mundo do trabalho. Considerando que existe o amparo legal para que as atividades práticas ocorram na própria entidade formadora, evitando-se qualquer risco ao aprendiz ou à sociedade antes que o cidadão conquiste formalmente a certificação. Considerando que a ocupação objeto do trabalho do GT, codificada como , é a única da família 5173, que requer o treinamento obrigatório, em escolas especializadas, onde aprendem a utilizar armas de fogo, e, Considerando que a exigência de habilitação específica para vigilante soma 160 horas, podendo ser perfeitame3nte incluída como parte de aprendizagem, cuja carga horária mínima equivale a 400 horas teóricas e 400 6
7 horas práticas, os programas de aprendizagem ofertados para vigilantes serão assim disciplinados: 1. Máximo de 10 meses, total de 800 horas de programa e contrato de trabalho; 2. As 200 horas iniciais do programa serão desenvolvidas na entidade formadora em que o aprendiz deve ser matriculado; 3. Em seguida, o treinamento obrigatório de 160 horas será realizado em escolas especializadas em segurança, que o certificarão como vigilante; 4. O início das atividades práticas da ocupação de vigilante só serão autorizadas após a certificação do aprendiz; 5. As 200 horas restantes destinadas à teoria, serão distribuídas ao longo do período destinado às práticas da ocupação, garantindo o acompanhamento do aprendiz pela entidade formadora responsável; 6. Nestes termos, registrou-se a imperiosa aprovação com chancela da Coordenação Geral de Segurança Privada da Polícia Federal da possibilidade de inserção de aprendizes no setor de vigilância. O Relatório traz o posicionamento contrário da Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores FENAVIST ao cumprimento da cota legal de aprendizes pelas empresas do setor, entretanto, em contrapartida, consigna que não houve qualquer posicionamento contrário dos técnicos em educação profissional representantes das instituições formadoras presentes às discussões. Lembre-se, ademais, que no caso da vigilância é possível a aprendizagem para os jovens entre 21 e 24 anos, conforme determinação da Polícia Federal. Esta possibilidade, ampliada pela Lei nº /05, vem suprir um vazio até então existente, possibilitando o resgate da cidadania de milhares de jovens sem qualificação profissional, que se sujeitam ao perverso mundo do subemprego. Eventuais entraves na formação e educação do aprendiz não são motivos suficientes para referendar o não cumprimento dos artigos 428 e 433 da CLT, norma esta de ordem pública. A via natural de hipótese como esta é a concertação social e o ajustamento da conduta da empresa, com regras temporais e formais de cumprimento da 7
8 lei. Necessário, portanto, dar continuidade ao procedimento a fim de fazer cumprir a cota de aprendizes nos quadros da empresa investigada, servindo-se o órgão oficiante dos instrumentos disponíveis pelo ordenamento jurídico. Por fim, em precedentes da Câmara de Coordenação e Revisão verificase entendimento no sentido de que a previsão do artigo 428 da CLT é norma de ordem pública que exige atuação do Ministério Público do Trabalho, quando se tratar de aprendizagem em empresa de vigilância, a exemplo do voto exarado no Processo PGT/CCR/4627/2011. III CONCLUSÃO À vista do exposto, voto pela não homologação da promoção de arquivamento e, via de consequência, determino o retorno dos autos à PRT de origem para as providências cabíveis. Brasília, em 21 de março de OTAVIO BRITO LOPES Membro da CCR - Relator 8
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