tradução Lavínia Fávero

Transcrição

1 tradução Lavínia Fávero

2 título original Rain Reign 2014 by Ann M. Martin. Todos os direitos reservados Vergara & Riba Editoras S.A. Direitos de publicação exclusivos para o território brasileiro. Plataforma21 é o selo jovem da V&R Editoras. edição Fabrício Valério e Flavia Lago editora-assistente Thaíse Costa Macêdo preparação Bárbara Borges revisão Vanessa Gonçalves direção de arte Ana Solt capa e projeto gráfico Ana Solt imagem de capa katflare/shutterstock.com, majivecka/shutterstock.com Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Martin, Ann M. Como procurar um cachorro perdido por Rosa Howard / Ann M. Martin ; tradução Lavínia Fávero. São Paulo : V&R Editoras, Título original: Rain Reign ISBN Ficção - Literatura infantojuvenil I. Título CDD Índices para catálogo sistemático: 1. Ficção : Literatura infantojuvenil Ficção : Literatura juvenil Todos os direitos desta edição reservados à VERGARA & RIBA EDITORAS S.A. Rua Cel. Lisboa, 989 Vila Mariana CEP São Paulo SP Tel. Fax: (+55 11) vreditoras.com.br editoras@vreditoras.com.br

3 Em memória da minha querida Sadie. 11 de março de de outubro de 2013

4 I A primeira parte

5 1 Quem sou eu: uma menina chamada Rosa (Roza) Eu me chamo Rosa Howard e meu nome tem três homônimos. Para ser mais precisa, são dois homógrafos (palavras que são escritas da mesma forma, mas que significam coisas diferentes) e um homófono (palavra que se pronuncia do mesmo jeito que outra, mas é escrita de forma diferente). Meu nome homófono é Roza. A maioria das pessoas diz homônimo quando quer dizer especificamente homófono. Minha professora, a senhora Kushel, diz que esse é um erro comum. Qual é a diferença entre cometer um erro e desrespeitar uma regra? perguntei. Cometer erros é acidental. Desrespeitar regras é intencional. Mas e se A senhora Kushel me interrompeu: Não há problema em dizer homônimo quando queremos nos referir a homófono, porque existem os homônimos homófonos e os homônimos homógrafos.

6 As tem três homônimos lembrei. Ás, hás e às. Eu adoro homônimos. E gosto de palavras. De regras e números também. Gosto dessas coisas nesta ordem: 1. Palavras (especialmente homônimos). 2. Regras. 3. Números (especialmente números primos). Vou contar uma história. É uma história verdadeira. Ou seja, de não ficção. É assim que se conta uma história: primeiro, você apresenta o personagem principal. Como estou escrevendo esta história sobre mim, eu sou o personagem principal. Meu nome tem um homônimo homófono. Dei um nome para minha cachorra que também tem um homônimo homófono. Ela se chama Poça. Vou escrever mais sobre ela no segundo capítulo. Essa seção vai se chamar Minha cachorra Poça (Possa). Um fato importante sobre a palavra seção é que ela tem dois homônimos homófonos: cessão e sessão. Esse é um dos poucos grupos de três homófonos que consegui pensar. Se algum dia eu conseguir pensar em outro grupo de três homônimos homófonos, vai ser um dia tão bom que vou marcar no calendário. Moro com meu pai, Wesley Howard. Nem o nome nem o sobrenome dele têm homônimos (daqui para a frente vou usar homônimo para me referir aos homônimos homófonos). 10

7 Da nossa varanda, dá pra ver: nosso quintal, a entrada da nossa garagem e a nossa rua, que se chama rua Sansão. Sansão tem um homônimo: sanção. Do outro lado da rua tem um pequeno bosque e, através das árvores, dá pra ver a rodovia. A palavra ver quase tem um homônimo: vê. Mas viu tem um bem interessante: vil. Estou no quinto ano e estudo na Escola de Ensino Fundamental de Hatford. Só existe uma escola de Ensino Fundamental na cidade de Hatford, que fica no estado de Nova York. E só existe uma classe de quinto ano na escola, a minha. A maioria dos meus colegas tem 10 anos ou quase 11. Eu tenho quase 12 porque ninguém sabe o que fazer comigo lá na escola. Tive de repetir 2 semestres, o que dá um total de 1 ano (½ + ½ = 1). Meus colegas zombam de mim por vários motivos. Entre eles, por gostar de obedecer às regras e falar o tempo todo sobre homônimos. A senhora Leibler é minha acompanhante e senta comigo na sala da senhora Kushel. Ela senta numa cadeira grande, de adulto, ao lado da minha cadeirinha de aluna do quinto ano. Quando dou algum fora no meio da aula de Matemática, a senhora Leibler põe a mão no meu braço. E, quando bato na minha cabeça e começo a chorar, ela diz: Rosa, você precisa ir ao corredor um minutinho? A senhora Leibler diz que existem outros assuntos interessantes para conversar além de homônimos, regras e números primos. Ela me incentiva a pensar em maneiras de 11

8 puxar assunto com as pessoas. Estes são alguns assuntos que têm a ver comigo, mas não com homônimos, regras ou números primos: Moro numa casa virada para nordeste. (Depois que digo isso, pergunto para a pessoa com quem estou tentando conversar: E a sua casa? É virada para que direção?.) Na minha rua, a metros da minha casa fica a Oficina J&R, onde meu pai às vezes trabalha como mecânico. E, 160 metros depois, tem um bar chamado Irlandês Sortudo, aonde meu pai vai quando sai do trabalho. Não existe nada entre a minha casa e a Oficina J&R, a não ser árvores e a rua. ( Conte alguma coisa sobre o seu bairro. ) Tenho um tio chamado Weldon, que é o irmão mais novo do meu pai. ( E a sua família, como é? ) Meu diagnóstico oficial é autismo de alto desempenho, que algumas pessoas chamam de síndrome de Asperger. ( E você? Tem um diagnóstico? ) Vou terminar esta parte da introdução contando que minha mãe não mora comigo e com o meu pai. Ela foi embora quando eu tinha 2 anos. É por isso que, na minha casa, só 12

9 vivem 2 pessoas: eu e o meu pai. A cachorra que mora na nossa casa se chama Poça. O tio Weldon mora do outro lado de Hatford, a uns 6 ou 7 quilômetros de distância. A próxima parte da minha introdução mostra o contexto da minha história. Já contei sobre minha localização geo gráfica: rua Sansão, cidade de Hatford, estado de Nova York. O momento histórico em que esta história começa é o mês de outubro do ano em que curso o quinto ano. Agora vou contar um fato perturbador sobre o quinto ano. Não é tão perturbador quanto o que acontece mais adiante, quando meu pai deixa a Poça sair de casa no meio de um furacão. Mesmo assim, é perturbador. Pela primeira vez na minha vida, volto para casa com relatórios semanais de desempenho que preciso entregar para o meu pai. Os relatórios são escritos pela senhora Leibler e lidos e assinados pela senhora Kushel. Essa é a maneira que minhas professoras encontraram de dizer que têm a mesma opinião sobre meu comportamento. Os relatórios listam todos os meus comportamentos dignos de nota de segunda a sexta-feira. Alguns dos comentários são gentis, como aqueles sobre quando eu participo de maneira apropriada de uma discussão em sala de aula. Mas a maioria dos comentários faz meu pai bater os papéis na mesa e dizer: Rosa, pelo amor de Deus, fique de boca fechada quando você pensar num homônimo. Ou: 13

10 Você vê alguma outra criança batendo nas próprias orelhas e gritando quando ouve o alarme de incêndio? No último relatório, as senhoras Lieber e Kushel pediram para o meu pai comparecer a reuniões mensais com elas. Ele tinha que ir para a Escola de Ensino Fundamental de Hatford toda terceira terça-feira do mês, às 3h45 da tarde, para falar sobre mim. E foi isso que ele disse quando leu o comentário: Não tenho tempo para ir a reuniões. Isso é muita incomodação, Rosa. Por que você faz essas coisas? falou, às 3h48 da tarde de uma sexta-feira, quando não tinha nenhum serviço para ele na Oficina J&R. O tio Weldon ficou sabendo das reuniões mensais no dia 3 de outubro, às 8h10 da noite, quando visitou meu pai, a Poça e eu. Meu pai estava parado na frente da porta, segurando a carta na mão e olhando para as árvores e para a escuridão. Essas reuniões são um saco disse. O tio Weldon, que estava sentado comigo na mesa de fórmica da cozinha, olhou para o meu pai de baixo para cima e falou: Posso ir se você quiser o tio Weldon tem uma voz suave. Meu pai se virou e apontou o dedo para ele: Não! A Rosa é minha responsabilidade. Dou conta do recado. O tio Weldon baixou a cabeça e não respondeu. Mas, quando meu pai se virou e ficou olhando para fora de novo, 14

11 meu tio levantou dois dedos cruzados, que é o sinal que ele faz quando quer dizer que tudo vai dar certo. Levantei os dedos também (dois deles) e fizemos o gesto do coração. Depois disso, a Poça entrou na cozinha e sentou nos meus pés por um tempinho. Aí meu tio foi embora. Depois disso, meu pai amassou a carta da senhora Leibler e da senhora Kushel e jogou no quintal. Para mim, esse é o fim da introdução. 15