O verdadeiro e o falso, como provavelmente falaria Zaratrusta, é matizado e polimorfo. A sabedoria aqui é mais a do Machado de Assis:

Transcrição

1 xix Prefácio O verdadeiro e o falso, como provavelmente falaria Zaratrusta, é matizado e polimorfo. A sabedoria aqui é mais a do Machado de Assis: Um dia, porém, longos anos depois, notou o Diabo que muitos dos seus fiéis, às escondidas, praticavam as antigas virtudes. Não as praticavam todas, nem integralmente, mas algumas, por partes, e, como digo, às ocultas. Certos glutões recolhiam-se a comer frugalmente três ou quatro vezes por ano, justamente em dias de preceito católico; muitos avaros davam esmolas, à noite, ou nas ruas mal povoadas; vários dilapidadores do erário restituíam-lhe pequenas quantias; os fraudulentos falavam, uma ou outra vez, com o coração nas mãos, mas com o mesmo rosto dissimulado, para fazer crer que estavam embaçando os outros. 1 Para quem gosta, como este escrevedor de prefácio, das matizes do film noir, Zaratrusta e o velho Machado são mais interessantes do que as categorias claras e radicalmente diversas do Bem e do Mal. O maniqueísmo, o BigMac e Philip Glass simplificam as coisas, e ajudam a olhar o mundo com a clareza da aritmética: o que deve ser também uma virtude. Claudio Lins de Vasconcelos, porém, é um praticante da outra arte: a dos paradoxos e da complexidade, que dão mais trabalho. Quando chega à conclusão de que a proteção da propriedade intelectual pode e está atrapalhando a criação, ou certos tipos de criações, o caminho é sofrido. Em certos momentos, o leitor percebe que o trajeto é aberto a facão. Na verdade, grande parte dos liames e bromélias que merecem o facão do autor foram postos no caminho por ele mesmo. E isso é o maior mérito deste livro. Claudio não precisava suscitar a história da indústria televisiva, como uma prática de tecnologia e de marketing, inexoravelmente interligados, para chegar a essa conclusão. Mas, ao aprofundar esse contexto, ao dar as consequências dessa falha regulatória na economia dessa indústria em particular, ele escolhe a pertinência sobre a transcendência acadêmica. Para o Brasil, a televisão não é um incidente exógeno, mas possivelmente uma das práticas culturais e sociais mais medulares para a unidade e auto-reconhecimento do País. Pois só esse segmento deste livro justificaria um impacto junto ao público em geral. O cuidado de estilo leve mas denso, sem exibições da erudição que só 1 MACHADO DE ASSIS, José Maria, A Igreja do Diabo, Contos Consagrados Machado de Assis Coleção Prestigio Ediouro s/d.

2 xviii profundidade não se limitam ao universo jurídico. Pesquisadores, gestores e influenciadores das relações políticas, sociais e econômicas que se movimentam em torno da propriedade intelectual também podem se valer dos fatos e argumentos que o autor apresenta nesta obra inovadora. Nelson Savioli Superintendente Executivo da Fundação Roberto Marinho

3 xvii Apresentação Se perguntarmos a um usuário da internet se já infringiu a legislação sobre propriedade intelectual, é provável que ele responda negativamente ou que desconhece do que se está falando. Se indagarmos de um fotógrafo profissional, de um compositor de sucesso ou de um produtor de televisão se está preocupado com o uso que alguém pode fazer do seu trabalho, além de seus clientes e usuários autorizados, certamente ele se interessará sobre o tema. Ortega y Gasset já afirmava que o homem é o homem e mais as suas circunstâncias... A era digital, a internet e os ciclos cada vez menores do avanço tecnológico tornam ainda mais complexas as circunstâncias nas quais o cidadão tenta adaptar-se para não perder o timing das mudanças. Em boa hora chega Mídia e Propriedade Intelectual, que discute o relacionamento entre os que produzem e os que consomem conhecimento, com suas implicações éticas, jurídicas e econômicas. Claudio Lins de Vasconcelos leva o leitor por uma viagem ao mundo da propriedade intelectual, desde o Código de Hammurabi do segundo milênio antes da era cristã, passando pelo Iluminismo e pelos avanços dos séculos dezenove e vinte, até os dias atuais em que os acordos internacionais procuram regular o assunto. A partir desse quadro de referências, o livro analisa as diferentes dimensões da propriedade intelectual na indústria televisiva da atualidade, mostrando com maestria a diferença de comportamento quando as relações são entre empresas e quando visam ao consumidor final. Vasconcelos põe em dúvida o senso comum que acredita que a elevação da proteção legal aos direitos tende a incentivar investimentos criativos, quando se trata de venda ao consumidor. Com argumentos brilhantes, ele expõe a sua teoria do paradoxo da eficácia assimétrica: a certeza em relação aos custos combinada com a incerteza em relação às receitas representa um fator de risco; como riscos representam custos, o aumento dos riscos associados ao negócio televisivo tende a torná-lo menos atraente aos olhos do investidor, gerando o efeito oposto ao que comumente se espera alcançar com o instituto da propriedade intelectual, que é o incentivo aos investimentos em criação, produção e distribuição de bens culturais. É uma colocação instigante, que deve enriquecer as discussões sobre gestão de ativos intangíveis, em geral, e sobre a produção e fruição de conhecimento num mundo em constante mutação. Mídia e Propriedade Intelectual é um texto denso, de leitura agradável, que se origina da tese de doutoramento de Vasconcelos, aprovada com nota máxima na Faculdade Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Sua abrangência e

4 xvi Perspectivas de Longo Prazo: Resgate da Legitimidade Objetiva e Subjetiva do Sistema Conclusão Referências Bibliográficas

5 xv Sumário Apresentação... Prefácio... Introdução... 1 Capítulo 1 A Evolução do Direito Internacional da Propriedade Intelectual Gênese do Direto da Propriedade Intelectual Origens Remotas: A Era do Consenso Origens Recentes: O Surgimento dos Conflitos O Sistema Internacional de Proteção à Propriedade Intelectual O Período Territorial O Período Internacional O Período Global Capítulo 2 A Propriedade Intelectual na Indústria Televisiva Do Analógico ao Digital: a Evolução da Indústria Televisiva A Era Analógica A Era Digital A Eficácia do Marco Normativo da Propriedade Intelectual na Indústria Televisiva Condições de Eficácia no Eixo B2B: o Conteúdo-Insumo Condições de Eficácia no Eixo B2C: o Conteúdo-Produto Capítulo 3 O Paradoxo da Eficácia Assimétrica A Dinâmica da Relação entre a Elevação de Parâmetros Protetivos e o Conteúdo-Insumo Efeito sobre a Capacidade Sancionatória do Estado no Eixo B2B Efeito sobre o Risco PI e a Disposição a Pagar pelo Conteúdo Original no Eixo B2B A Dinâmica da Relação entre a Elevação de Parâmetros Protetivos e o Conteúdo-Produto Efeito sobre a Capacidade Sancionatória do Estado no Eixo B2C Efeito sobre o Risco PI e a Disposição a Pagar pelo Conteúdo Original no Eixo B2C Horizontes para a Superação do Paradoxo da Eficácia Assimétrica Perspectivas de Curto Prazo: Redução dos Custos de Aplicação da Lei e Foco no Eixo B2B xvii xix

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7 xiii UNCTAD UNESCO VHS WBU WCT WELL WIPO WPPT WTO WWW United Nations Conference on Trade and Development Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura Video Home System World Blind Union WIPO Copyright Treaty Whole Earth Lectronic Link World Intellectual Property Organization (mesmo que OMPI) WIPO Performance and Phonograms Treaty World Trade Organization World Wide Web