ESTÁGIO CURRICULAR E FORMAÇÃO DOCENTE: A ESCOLA COMO ESPAÇO PARA PRODUÇÃO DE SENTIDOS SOBRE A RELAÇÃO TEORIA E PRÁTICA

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1 ESTÁGIO CURRICULAR E FORMAÇÃO DOCENTE: A ESCOLA COMO ESPAÇO PARA PRODUÇÃO DE SENTIDOS SOBRE A RELAÇÃO TEORIA E PRÁTICA Camila Marques dos Santos Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGE- UFSCar Jarina Rodrigues Fernandes Docente do Dep. de Teorias e Práticas Pedagógicas/CECH/UFSCar Resumo A literatura enfatiza o estágio curricular na formação inicial de professores como momento de articulação entre o estudado na Universidade e o vivenciado no contexto escolar, bem como espaço privilegiado para a construção da identidade docente. Este artigo analisa sentidos construídos por licenciandas do Curso de Pedagogia, de uma universidade pública federal, a respeito da relação teoria e prática, a partir da vivência do estágio curricular supervisionado de docência nos anos iniciais do ensino fundamental. Estabeleceu como questão de pesquisa: Quais são os sentidos que os licenciandos em Pedagogia atribuem para a relação entre teoria e prática, a partir da vivência de um estágio curricular em docência? Este estudo origina-se de uma pesquisa mais ampla e em andamento, já com resultados parciais e que busca compreender, a partir da escuta das vozes de estudantes, as possibilidades formativas do estágio curricular na licenciatura. Como procedimentos, realizou-se uma roda de conversa junto aos estudantes matriculados nas disciplinas Metodologia do trabalho docente nos anos iniciais do ensino fundamental e Prática de ensino e estágio docente nos anos iniciais do ensino fundamental, do curso de Pedagogia. Os resultados foram analisados qualitativamente, a partir dos fundamentos da análise de conteúdo. Para o presente texto, serão apresentados e analisadas as colaborações de 3 licenciandas.entre os resultados, destaca-se a busca de construção de sentidos pessoais a partir dos significados apresentados pelos professores e daqueles ensinados na Universidade; abertura ao exercício de desformatar o olhar diante das realidades escolares encontradas; valorização de aportes teóricos e das aprendizagens decorrentes da vivência do cotidiano docente, refletindo sobre as experiências promovidas pelo estágio curricular. Palavras- chave: Formação Inicial de Professores. Estágio Curricular. Aprendizagem Profissional. Introdução O presente texto analisa sentidos construídos por licenciandos do curso de Pedagogia, de uma instituição pública de ensino superior, a respeito da relação entre teoria e prática, a partir da experiência de vivência do estágio curricular supervisionado de docência em escolas de ensino fundamental- anos iniciais. Quais são os sentidos que os licenciandos em Pedagogia atribuem para a relação entre teoria e prática, a partir da vivência de um estágio curricular em docência? Este estudo origina-se de uma pesquisa 02855

2 2 mais ampla e em andamento, já com resultados parciais e que busca compreender, a partir da escuta das vozes de estudantes, as possibilidades formativas do estágio curricular na licenciatura. As disciplinas Metodologia do trabalho docente nos anos iniciais do ensino fundamental e Prática de ensino e Estágio docente nos anos iniciais do ensino fundamental regular, de caráter obrigatório, compõem o curso de licenciatura em Pedagogia, de uma universidade federal e foram desenhadas de forma integrada. Especialmente no Estágio Curricular pretendia-se que os licenciandos pudessem, entre outros aspectos: experienciar a docência nos anos iniciais do ensino fundamental e refletir sobre as práticas pedagógicas em escolas públicas, por meio da observação participativa, planejamento e desenvolvimento de uma sequência didática de aula de própria autoria. Importante ressaltar que as professoras dessas disciplinas são as mesmas que orientam e acompanham os estágios curriculares in loco. Pimenta e Lima (2011) apontam que a dicotomia entre teoria e prática no estágio não deveria existir. O estágio deveria ser o momento que o licenciando realiza atividades práticas, num movimento de articulação entre teoria e prática. Para as autoras, o estágio é teoria e prática e não teoria ou prática. As autoras apontam, contudo, a insuficiência de propostas de estágio pautadas na reprodução de modelos, em que a aprendizagem da docência se daria por meio da replicação de atitudes, em uma visão de fazer docente imutável e descontextualizado. As vivências do estágio curricular são um campo promissor para a reflexão, a partir das quais os licenciandos trazem para os encontros de orientação de estágio, seus olhares e suas análises sobre as mesmas, à luz do referencial teórico estudado ao longo da graduação. É uma oportunidade para compreender a escola como espaço de formação e para mobilizar os significados estudados na formação inicial de modo a transformá-los em sentidos, possibilitando que se incorporem às identidades dos licenciandos. Caminho metodológico Trata-se de uma investigação que buscou fundamento metodológico no campo da abordagem qualitativa de pesquisa, de natureza exploratória e descritiva. Realizou-se uma roda de conversa (AFONSO; ABADE, 2008) com os licenciandos de 7º período do curso de Pedagogia, de uma universidade pública federal, matriculados e frequentes nas duas disciplinas já mencionadas. A roda de conversa teve a duração de 1 hora e

3 3 minutos, aconteceu ao final da oferta da disciplina de Prática de ensino e Estágio docente nos anos iniciais do ensino fundamental, com a presença das pesquisadoras. A conversa foi registrada em gravador de voz e transcrita. Para este texto, apresentaremos os resultados da participação de 3 licenciandas, autorizados por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, cujos nomes são fictícios. Os dados foram analisados qualitativamente, a partir dos fundamentos da análise de conteúdo (BARDIN, 1977). Alguns Resultados e Discussão As licenciandas apresentaram em suas falas sentidos (VYGOTSKY, 2004) construídos sobre a relação entre teoria e prática, a partir da vivência do estágio curricular realizado. Para uma licencianda, a vivência deste estágio de docência nos anos iniciais do ensino fundamental oportunizou o repensar de suas crenças e ideias, pois inicialmente pensava que o cotidiano da docência anunciaria um descompasso entre as teorias estudadas na formação inicial e as práticas pedagógicas vividas em sala de aula. Compreendia que os fazeres docentes também estariam marcados por um dissabor com o exercício profissional, falta de inovação e reflexão no e sobre o trabalho docente, concretizado por práticas pedagógicas solidificadas ao longo do tempo e caracterizadas por um fazer da prática pela prática. No meu caso, foi um choque de realidade. Mas acho que ao inverso, porque a gente escuta muito aqui, aí a teoria que a gente vê na faculdade é diferente. Você vai chegar na prática, você vai ver aquele professor amargurado, que tem não sei quantos anos de carreira, sabe?! Que não sai daquilo e tal. E aí, [...] no estágio foi uma surpresa muito boa, porque a gente teve a oportunidade de conviver com uma professora super crítica, [...]eu acho que foi um choque ao contrário, como a teoria aqui pode sim ajudar na pratica lá fora. (Patricia). Esta estudante anuncia que teve uma surpresa boa quando o estágio promoveu o encontro com esta professora de anos iniciais do ensino fundamental, considerada por ela como uma profissional comprometida com a prática pedagógica promovendo, dentre várias aprendizagens profissionais, a percepção de uma articulação entre teoria e prática. A fala de outra licencianda revela o incômodo dela ao perceber que mesmo diante de uma professora com práticas pedagógicas consideradas, por ela, como exitosas, ainda há crianças que não conseguem aprender tudo. A licencianda exercita-se em colocar

4 4 se no lugar da professora, revelando suas inquietações e percepções sobre a complexidade do trabalho docente e os desafios enfrentados no cotidiano de sala de aula, em um bonito movimento de reflexão sobre estas práticas pedagógicas. Concordamos com Nóvoa (1997) quando aponta que os professores precisam ter a oportunidade de compreender a amplitude e contradições do macro contexto educacional, para que atuem no espaço mezzo da escola e no locus micro da sala de aula. Para esta licencianda a análise desta realidade encontrada pode ser melhor compreendida considerando esta dinâmica das esferas apontadas por este autor. A gente fica amarrado. Se vê amarrado e vê ela amarrada, porque o que eu vou fazer quando eu estiver lá na situação dela com uma sala tão heterogênea... Quer dizer, todos os problemas possíveis numa mesma sala de aula e mesmo assim, de uma forma ou de outra, ela ainda consegue atingir eles. Mas, o aprendizado mesmo não são todos que conseguem da mesma forma (Pâmela) Por fim, apresenta-se a fala de uma licencianda formada no Curso Magistério, professora concursada na rede pública municipal de ensino, com experiência docente nos anos iniciais do ensino fundamental. Ela valoriza tanto o aprofundamento teórico quanto a experiência da vivência do estágio: Eu sempre falo que a teoria pra mim foi muito importante na minha profissão [...]. É sempre muito importante conhecer a maneira como os outros professores trabalham [...] nem sempre a gente sabe como lidar, mas já tendo uma experiência boa de docência, é muito legal quando a gente consegue estar participando da sala de outros professores e observando como as crianças agem com os outros professores e como esses professores agem com essas crianças e estar refletindo sobre a minha própria prática. [...] (Dandara). Ao destacar que o estágio estava cumprindo um papel relevante em sua formação, dada à oportunidade de repensar e aprimorar a própria prática, sua fala remete ao papel, como ela diz, essencial do estágio, destacado nos estudos específicos de Pimenta e Lima (2011), Nóvoa, (1997) e Pérez Gómez (1997).O conhecimento teórico se apresenta para a licencianda como um alimento da prática profissional, reconhecendo que os aportes teóricos são fundamentais para o processo de reflexão das suas práticas profissionais cotidianas e, consequentemente, para o aprimoramento de seu fazer pedagógico

5 5 Considerações Considera-se a escola como um espaço privilegiado de formação de professores, lócus esse que possibilitou que o estágio de docência representasse para estas licenciandas uma oportunidade para conhecerem e analisarem o contexto escolar e as diversas práticas pedagógicas dos docentes regentes, em um movimento de reflexão sobre as realidades. Houve uma multiplicidade de sentidos construídos sobre a relação entre teoria e prática, como o exercício de diálogo das aprendizagens teórico-práticas do curso com as realidades da escola e de sala de aula, revelando que o conhecimento teórico é um alimento para a futura prática profissional. O estágio também oportunizou, para estas licenciandas, um encontro consigo próprio quando, por exemplo, propiciou a reflexão sobre crenças, ideias, concepções e práticas profissionais já existentes. Este processo permitiu novos olhares sobre o cotidiano escolar, a docência e as práticas pedagógicas, sendo ainda colaborativo na construção da identidade profissional. A presente pesquisa se mostra colaborativa nas discussões que abordam as possibilidades formativas do estágio curricular nos cursos de licenciatura, da escola como lócus privilegiado de formação de professores e dos licenciandos como protagonistas no processo de aprendizagem da docência. Referências AFONSO, M.L.; ABADE, F.L. Para reinventar as rodas: as rodas de conversa em direitos humanos. Belo Horizonte: RECIMAM, BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, NÓVOA, A. Formação de Professores e Profissão Docente. In:. Os Professores e a sua Formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1997, p PÉREZ GÓMEZ, A. O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In:. Os Professores e a sua Formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1997, p PIMENTA, S. G.; LIMA, M. S. L. Estágio e Docência. São Paulo: Cortez, VYGOTSKY, L. S. Teoria e método em Psicologia. São Paulo: Martins Fontes,