P.º n.º R.P. 224/2010 SJC-CT Prédio não descrito. Aquisição. Declaração a que se refere o artigo 42.º, n.º 6 do Código do Registo Predial.

Transcrição

1 P.º n.º R.P. 224/2010 SJC-CT Prédio não descrito. Aquisição. Declaração a que se refere o artigo 42.º, n.º 6 do Código do Registo Predial. DELIBERAÇÃO 1. No dia 27 de Julho de 2010 foi celebrada perante a Notária recorrida escritura de justificação quanto ao prédio urbano sito na freguesia de..., Concelho de..., identificado como não descrito na Conservatória e como inscrito na matriz urbana sob o artigo... Como circunstância de facto determinante do início da posse foi indicada a compra verbal efectuada no ano de 1987 a e mulher, 1.1. Consta da escritura a menção de arquivo de duas certidões comprovativas da omissão da descrição do prédio, seguida da indicação de que de uma dessas certidões consta cópia da descrição número setecentos e cinquenta e quatro e respectivas inscrições em vigor, que constitui um prédio totalmente distinto e sem qualquer relação com o prédio justificado, à excepção do artigo matricial originário ser o mesmo, pois ambos os prédios, o justificado e o constante da certidão resultaram de divisão do artigo A referida menção de arquivo inclui ainda duas cadernetas prediais, uma rústica e outra urbana, obtidas via Internet em 2010/07/27 (data da escritura) e 2010/07/23, respectivamente. Elementos constantes das cadernetas prediais juntas aos autos, estas obtidas via Internet em 2010/11/11: a) O prédio a que respeita o artigo rústico... inscrito em 1937 e com o Valor Patrimonial actual determinado em 1989 é identificado com a área de 4.426m2, constando em OBSERVAÇÔES que A Área de 414m2 passou ao artigo... urbano ; b) No campo DADOS DE AVALIAÇÂO do artigo urbano... consta que foi inscrito em 1989, que provém de parte do artigo rústico... e que o prédio a que respeita tem a área total de 414m2 ( 85m2 de s.c. e 329m2 de s.d.) A mencionada descrição... foi aberta em 14 de Agosto de na dependência do registo de aquisição, por sucessão por morte, a favor do indicado..., casado com a também indicada..., para o qual foi apresentada escritura de habilitação de herdeiros de... e mulher,... - e respeita a prédio rústico com a área de 4426m2 e inscrito na matriz sob o artigo

2 2. A mesma Notária pediu online o correspondente registo de aquisição a favor dos justificantes... e mulher,..., casados na comunhão geral, pedido que foi anotado no Diário sob a Ap. nº e foi distribuído à Conservatória do Registo Predial de 2.1. Obtida confirmação da omissão pela Conservatória da situação do prédio e frustrado que foi o suprimento das deficiências apontadas no respectivo procedimento 1, a Ajudante levou a cabo, por delegação, a qualificação do pedido de registo nos termos constantes de despacho de 2010/09/20, do teor seguinte: Lavrado provisoriamente por dúvidas nos termos do art.º 70º C.R.P. em virtude de: -Não resultar devidamente comprovado documentalmente ou mediante intervenção/confirmação dos titulares inscritos do prédio descrito sob o nº da freguesia de, que o artigo urbano da mesma freguesia é 1 prédio autónomo e distinto daquele prédio, de cujo artigo matricial provém, e que já o era antes do registo do referido prédio pelo que poderá existir violação do princípio do trato sucessivo consignado no art.º 34º C.R.P. e até eventual duplicação. -Tendo sido o pedido formulado sobre prédio não descrito e, caso assim fosse considerado, faltaria a indicação em declarações complementares do nome, estado e residência dos proprietários ou possuidores imediatamente anteriores aos transmitentes (são estes e não aqueles os indicados na escritura) ou as razões do seu desconhecimento art.º 42º nº 6 C.R.P.. Conforme ainda o art.º 68º C.R.P.. 1 Para lá dos motivos que vieram a ser incluídos no despacho de qualificação, foi ainda apontado nesta procedimento a falta de participação do Imposto de Selo quanto à justificante mulher. A recorrida deixou cair esta deficiência em sede de fundamento de qualificação, eventualmente por efeito do esclarecimento prestado pela recorrida, que invocou o disposto no art. 72º/2 e 3 do C.R.P.. Importa deixar referido que nos parece que a recorrida esteve bem ao ter alterado a sua posição, já que, perante a participação apresentada com o pedido de registo, não pode afirmar-se que esteja em falta o cumprimento das obrigações fiscais. Se assim não fosse, teria a dita falta que constituir motivo de qualificação desfavorável, mesmo não tendo sido invocada na decisão registral, em conformidade com o entendimento que reiteradamente vem sendo defendido por este Conselho Cfr., entre outros, o Pº R.P. 237/2004 DSJ-CT, in B.R.N. nº 1/2005 (Caderno II), o Pº R.P. 107/2004 DSJ-CT e o Pº R.P. 106/2007 DSJ-CT, ambos disponíveis intranet

3 Na dependência do registo de aquisição foi o prédio descrito sob o nº... da dita freguesia de 3. Coerentemente com a atitude tomada no âmbito do procedimento de suprimento de deficiências - em que para lá de não as ter suprido, expressou a opinião no sentido da inexistência de qualquer deficiência -, interpôs a apresentante o presente recurso hierárquico no dia 27 de Outubro de 2010 ( Ap....), cujos termos aqui se dão por integralmente reproduzidos, baseando a impugnação essencialmente no seguinte : a) Que resulta inequivocamente dos documentos que instruíram a escritura que a área do prédio justificado não está incluída no prédio descrito sob o nº e constitui um prédio autónomo; b) Que a falta de indicação de proprietários ou possuidores imediatamente anteriores aos transmitentes não foi apontada como deficiência no respectivo procedimento de suprimento, o que inviabilizou que aí tivessem sido prestados esclarecimentos 2 ; c) Que tendo sido invocada a usucapião, não entende quem sejam os transmitentes e, por conseguinte, desconhece quem deveria ser identificado como antepossuidor ; d) Que, para efeito do disposto no art. 42º/6 do C.R.P., o teor da escritura, conjugado com o teor da descrição e respectiva inscrição em vigor e teor das inscrições matriciais, disponibilizava à conservatória os elementos suficientes, sem necessidade de efectuar quaisquer declarações complementares. 4. Em despacho lavrado ao abrigo do disposto no art. 142º-A/1 do C.R.P., desta feita pela senhora Conservadora e cujos termos aqui se dão por integralmente reproduzidos, foi sustentada a qualificação impugnada, contra-argumentando-se ao que foi alegado pela recorrente basicamente no sentido de que dos documentos apresentados resultam dúvidas sobre se a área referida na descrição predial e no artigo matricial rústico é ou não anterior à desanexação do artigo urbano, ou se o contempla e que a solicitação efectuada no procedimento de suprimento de deficiências se referia aos proprietários ou possuidores imediatamente anteriores ao transmitente, de acordo com o disposto no art. 42º/6 do C.R.P.. 2 Da comunicação efectuada nos termos do art. 73º/2 do C.R.P. fez-se constar a falta de indicação dos antepossuidores ou o seu desconhecimento e motivo, à qual a recorrida respondeu afirmando que Os antepossuidores vêm devidamente identificados na escritura

4 Saneamento. O processo é o próprio, as partes legítimas, o recurso tempestivo, e inexistem questões prévias ou prejudiciais que obstem ao conhecimento do mérito. Pronúncia A posição deste Conselho vai expressa na seguinte Deliberação 1. O artigo de matriz é um dos elementos através dos quais se pode objectivamente manifestar a dúvida acerca da situação de omissão ou descrição do prédio no registo, nomeadamente por o prédio poder fazer parte de prédio já descrito, v.g. no caso em que resulte dos documentos apresentados que o artigo urbano actual proveio de parte do artigo rústico que consta dessa descrição Não deve, porém, para este efeito, ser atribuída qualquer relevância à menção da proveniência do artigo rústico que consta da descrição se, da conjugação do teor das inscrições matriciais com o teor e data de abertura da descrição predial, resultar suficientemente provado que, apesar da conexão entre os dois prédios daquela forma manifestada, existe total autonomia entre os mesmos, não passando de mera aparência a inclusão no prédio rústico da área da parte urbana 4. 3 Quanto à relevância do conhecimento do número de inscrição matricial anterior à actual, no plano da verificação da identidade do prédio especificamente no que respeita ao pedido de emissão de certidão negativa, mas cujo fundamento está presente igualmente no de registo de prédio omisso -, Cfr. Pº C.P. 68 e 69/2010 SJC-CT, disponível intranet, foi no qual se reafirmou entendimento do C.T. que havia ficado expresso nos Pº.s 35/86 e 71/92, respectivamente in BRN de Dezembro de 1986 e nº 6/2002(Caderno II) 4 Parece-nos ser a posição que razoavelmente melhor se ajusta à situação dos autos, já que a coincidência entre o artigo de matriz que consta da descrição... e o artigo rústico de proveniência que consta da matriz urbana não tem tradução no plano material, já que a descrição foi aberta já sem a parte que deu origem ao artigo urbano, porquanto a) da matriz urbana consta que a inscrição teve lugar no ano de 1989, b) da matriz rústica consta que a área actual do prédio é a que restou da passagem de 414m2 para - 4 -

5 3. O facto de o apresentante de pedido registo respeitante a prédio omisso ter omitido a declaração exigida pelo art. 42º/6 do C.R.P. não deve constituir motivo de qualificação desfavorável se, consultando os documentos apresentados ou na disponibilidade do qualificador, for possível obter os elementos não declarados. 4. Enquadra-se na hipótese referida no número anterior o caso em que, tendo sido pedida a aquisição com base em escritura de justificação, conste desta que o início da posse teve lugar por compra verbal, com indicação dos vendedores, a favor dos quais se mostra registada a aquisição do prédio rústico de cujo artigo proveio o actual artigo urbano, por transmissão por morte 5. aquela inscrição matricial urbana que, como vimos, se deu em 1989 e c) a descrição... foi aberta 1990, com aquela área restante. Assim, não se nos afigura razoável pôr em dúvida que a área constante da inscrição matricial rústica já não engloba os 414m2 da inscrição matricial urbana, bem como que a descrição não foi aberta já sem essa mesma área. Não nos parece que o disposto no art. 202º do Código da Contribuição Predial e do Imposto Sobre a Indústria Agrícola, em vigor à data da inscrição na matriz do prédio urbano ( cfr. art. 9º do D.L. nº 442-C/88, de 30 de Novembro, que aprovou o Código de Contribuição Autárquica ) - que corresponde ao actual art. 106º do Código do Imposto Municipal Sobre Imóveis - permita pôr em dúvida que a área do artigo urbano foi já retirada do artigo rústico Dando por suficientemente provada a autonomia do prédio relativamente à dita descrição nº, não faz sentido exigir qualquer declaração complementar ao abrigo do disposto no art. 112º/3 do C.R.P.. 5 A recorrida apontou no procedimento de suprimento de deficiências a falta de indicação dos antepossuidores ou o seu desconhecimento e motivo, ao que a recorrente respondeu esclarecendo que Os antepossuidores vêm devidamente indicados na escritura. No despacho de qualificação o motivo correspondente àquela deficiência foi indicado como falta de indicação do nome, estado e residência dos proprietários ou possuidores imediatamente anteriores aos transmitentes (são estes e não aqueles os indicados na escritura) ou as razões do seu desconhecimento art.º 42º nº 6 do C.R.P... No requerimento do presente recurso a recorrente alega a) que não prestou o devido esclarecimento em sede de procedimento de suprimento de deficiências porque se fez referência à falta dos antepossuidores, que constam da escritura, e não especificamente aos antepossuidores anteriores aos tramsmitentes, b) que não havendo no caso transmitentes, desconhece quem deve ser considerado naquela posição de anterioridade relativamente aos mesmos e c) que, neste âmbito, estava disponível a informação de quem foram os autores da venda verbal do prédio, de que o artigo urbano proveio do artigo rústico que consta descrição... e que este está inscrito a favor daqueles vendedores com indicação dos transmitentes. Como se vê, a interpretação do disposto no referido art. 42º/6 do C.R.P. não é pacífica

6 Em consonância com o exposto propomos a procedência do recurso Deliberação aprovada em sessão do Conselho Técnico de 21 de Setembro de Luís Manuel Nunes Martins, relator. Esta deliberação foi homologada pelo Exmo. Senhor Presidente em Literalmente e desligada do sistema em que se insere, poderia defender-se, como parece ser o caso da recorrente, que só no caso de o facto submetido a registo comportar uma transmissão é que haveria lugar à indicação de possuidores ou proprietários anteriores( aos transmitentes) ou então que, não comportando o facto uma transmissão( v.g. penhora ou aquisição originária), apenas haveria que indicar os possuidores ou proprietários anteriores ao actual. O art. 93º/1/b) do Código de Registo Predial de 1967 determinava que, sempre que possível, fossem indicados no requerimento para actos de registo ou emissão de certidão negativa o nome dos dois últimos proprietários ou possuidores anteriores ao actual. O art. 111º/5 do C.R.P. em vigor determina que no pedido de emissão de certidão negativa se indique o nome, estado e residência do proprietário ou possuidor actual, bem como dos dois imediatamente anteriores salvo, quanto a estes, se o requisitante alegar na requisição as razões justificativas do seu desconhecimento. Quanto à exigência da alegação das referidas razões justificativas do desconhecimento, refere Isabel Mendes, in Código do Registo Predial, 7ª ed., pág. 265, que a sua introdução( que ocorreu em ambos os ditos artigos 42º/6 e 111º/5) teve em vista evitar abusos e inexactidões resultantes do facto de o regime anterior exigir apenas que se alegasse a impossibilidade. Ora, levando em consideração a finalidade do registo predial, donde decorre a razão de ser da indicação de anteriores possuidores ou proprietários, com vista à verificação da identidade do prédio (cfr. artigos 1º e 68º do C.R.P.), não faria sentido, abstraindo mesmo daquele antecedente histórico e do indicado regime expressamente previsto para a requisição de certidões negativas, exigir mais no caso de registo que envolva transmissão do que nos outros casos, quer se entendesse que nada havia a declarar ou que havia que indicar apenas os proprietários ou possuidores anteriores ao actual. Se enquadrarmos a norma em causa não só com a finalidade do registo e respectivos princípios mas também com a exigência prevista para o caso da certidão negativa, parece que a melhor interpretação será a que conduz ao entendimento de que havendo transmissão e porque são conhecidos por essa via os antepossuidores anteriores ao actual, há que declarar os anteriores ao transmitente. Nos outros casos, há que declarar os dois últimos. Apesar de, por se tratar in casu de aquisição originária, terem sido indevidamente referenciados pela recorrida como os proprietários ou possuidores anteriores aos transmitentes, estaria em falta a indicação dos segundos proprietários ou possuidores imediatamente anteriores aos justificantes, não fosse a circunstância de se afigurar razoável considerar como tais os sujeitos passivos da inscrição de aquisição da referida descrição