DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR: TRATAMENTO BASEADO EM EXPERIÊNCIA CLÍNICA OU EM EVIDÊNCIAS?
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1 DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR: TRATAMENTO BASEADO EM EXPERIÊNCIA CLÍNICA OU EM EVIDÊNCIAS? Alessandro Hyczy Lisboa 3 Elcy Pinto de Arruda 1 Leonardo Piazzetta Pellissari 4 Roberley Araújo Assad 2 Sylvio Rafael Gralha 5 RESUMO: Depois da dor dentária, as desordens temporomandibulares (DTM) são as maiores causas de dor e disfunção dos pacientes e precisam de um importante foco de atenção pelo clínico. Muitos clínicos mostram pontos de vista enfáticos na maioria dos tratamentos convenientes dos pacientes com DTMs. A maioria destas filosofias de tratamento é embasada por crenças pessoais, porém por nenhuma evidência científica. O objetivo deste estudo é direcionar o leitor para buscar mais evidências nas literaturas sobre o tema. PALAVRAS-CHAVE: PESQUISA EM ODONTOLOGIA, ATM, OCLUSÃO. DYSFUNCTION OF TMJ: TREATMENT BASED ON CLINICAL EXPERIENCE OR IN EVIDENCES? Abstract: Before tooth pain, temporomandibular joint (TMJ) disorders are a major cause of patient pain and dysfunction and need an important focus of attention by clinician. Many clinicians express emphatic viewpoints on the most appropriate treatment of TMJ patients. Most of these treatment philosophies are substantiated by a personal faith, and scant scientific evidence. The aim this study is to direct the reader toward a more evidence-based approach. KEY-WORDS: DENTAL RESEARCH, TMJ, OCCLUSION. 1-Doutorando em clínica integrada. Mestre em Odontologia, Especialista em estomatologia, Professor de Diagnóstico Bucal e Radiologia do curso de odontologia do CESCAGE Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais. 2-Especialista em Ortodontia, especialista em DTM e DORF, mestre em Odontologia, Professor de Oclusão da Faculdade de odontologia do e Professor da Especialização em Ortodontia na CESCAGE Ponta Grossa, Paraná. 3-Mestre e Especialista em Prótese Dentária, Professor de Oclusão, Prótese Dentária e Clínica Integrada do curso de odontologia do Cescage Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais. 4-Doutor em Ortodontia, Professor de Odontologia do curso de odontologia do Cescage Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais. Professor da Especialização em Ortodontia da Faculdade Cescage 5-Cirurgião-Dentista e Pós-graduando em Ortodontia pela Faculdade Cescage. A Articulação por estruturas ósseas, cartilaginosas, temporomandibular (ATM) é composta ligamentos e musculatura associada, 90
2 sendo considerada a mais complexa das articulações do corpo humano 21. A ocorrência de situações desfavoráveis que afetam a ATM é frequente, pois essa articulação precisa acomodar adaptações oclusais, musculares e cervicais. Assim, condições de desequilíbrio podem resultar em quadros de disfunção da ATM, que corresponde ao termo genérico relacionado a um conjunto clínico de sinais e sintomas envolvendo os músculos mastigatórios, a própria articulação e estruturas associadas, denominado disfunção temporomandibular (DTM) 22. Segundo CARLSSON; MAGNUSSON e GUIMARÃES (01), em 2006, durante os primeiros cinco anos do novo milênio, aproximadamente 1750 artigos sobre Disfunção Temporomandibular (DTM) foram incluídos na Medline/PubMed. Um número expressivo e impossível para uma pessoa seguir essa extensa literatura muitas vezes controversa. O cirurgião dentista, na sua prática clínica, executa seu trabalho conforme recebe informações em cursos e artigos lidos ao longo de sua carreira. Em DTM, as informações nem sempre são convergentes, opiniões conflitantes podem ser vistas com freqüência entre pesquisadores e clínicos dos mais diversos países. Sendo assim o objetivo desse estudo foi direcionar o leitor para buscar mais evidências nas literaturas sobre o tema. Revisão da Literatura DAWSON afirma que a odontologia viveu nos anos de 1920 e 1930 uma forte influência dos conceitos gnatológicos, que foi definida como a ciência que trata da biologia do sistema mastigatório 02. Os gnatologistas disseminaram a informação de que a etiologia das DTMs era sediada nos problemas de oclusão. Em 1934 foi publicado por James B. Costen, numa revista da área médica, um artigo que até hoje é considerado um marco na literatura das disfunções desta articulação. Embora fosse convincentemente demonstrado que as bases anatômicas das teorias gnatológicas e de Costen não eram aceitáveis, por muitos anos a informação que orientava o cirurgião dentista era que o tratamento de portadores de DTM fundamentava-se na reposição de dentes perdidos e no aumento da dimensão vertical 01. Historicamente, a prática clínica foi baseada em opiniões das autoridades reconhecidas, conhecimento adquirido durante o treinamento e percepção subjetiva de experiências passadas pelo próprio clínico 03. E por outro lado as convicções correntes no campo da dor também se mostraram confusas, sem uma clareza em relação à etiologia nem na classificação das DTM. Eram baseadas em interpretações filosóficas de observações clínicas. Até recentemente, muitos autores não separavam mialgia e artralgia, pois acreditavam que tinham uma causa comum 04. E as informações sobre este campo da odontologia se mostravam confusas. Através dos anos, muitos autores estudaram as más oclusões com o desígnio de elucidar a etiologia da DTM 05, 06, 07. Mas o papel da oclusão na etiologia foi respondido com declarações contraditórias. Quanto à etiologia das DTMs, esta é multifatorial, associando-se fatores predisponentes, iniciadores e perpetuantes 01, 22, incluindo distúrbios da oclusão, das bases ósseas maxilar e mandibular, fatores traumáticos, problemas degenerativos, alterações musculares como hiperatividade ou hipoatividade, modificações funcionais e hábitos nocivos que levam à 91
3 sobrecarga persistente na ATM ou na musculatura, estresse e problemas emocionais. De acordo com a literatura, há relação significante entre hábitos orais deletérios de sucção digital, morder as bochechas, onicofagia e bruxismo com a presença de sinais e/ou sintomas de DTM 23. A prevalência de DTM é maior no sexo feminino e na faixa etária entre 21 e 40 anos, tendo sido descrita como uma condição que afeta, principalmente, adultos. Estudos epidemiológicos têm relatado baixa ocorrência de sinais e sintomas de DTM em crianças até os seis anos, aumentando após essa idade até a adolescência, verificando-se índices semelhantes aos dos adultos 24. Na área da saúde, a Medicina baseada em evidência é um movimento que tem ajudado a ampliar a discussão entre as informações que atingem o clínico e a atendimento exercido por ele. Este movimento se traduz pela prática da medicina em um contexto em que a experiência clínica é integrada com a capacidade de analisar criticamente e aplicar de forma racional a informação científica. Sempre visando, obviamente, melhorar a qualidade da assistência médica 08, 20. A evidência para sustentar uma decisão clínica pode vir de diferentes níveis de informações. Estas notícias ao clínico, que vem em forma de artigo, variam em desenho de estudo, e no topo da pirâmide de evidência estão as revisões sistemáticas e metanálises, passando por ensaios clínicos randomizados 09. As publicações na área da dor podem ser escalonadas em relação à importância, e neste grau de importância os trabalhos que mostram opiniões de autoridades descritas em casos clínicos estão numa posição inferior desta escala 04, 10. A preocupação com a qualidade da informação foi pioneiramente defendida pelo epidemiologista escocês Archie Cochrane 09. Entretanto, percebe-se que em DTM o hábito de existir verdades baseadas em estudos anedóticos (estudos sem embasamento científico adequado) sempre existiu. Parece existir uma aderência para conceitos que se mostram conflitar com a evidência, isto ocorre porque tais conceitos são reforçados pelo sucesso clínico relatado 11. Porém, estes casos de sucesso clínico podem ser mal interpretados, há casos que não há necessidade de intervenção clínica e um programa de auto cuidado e educação do paciente são suficientes para controlar o problema 12, 13. Na área da DTM, assim com na Medicina, algumas dores tem seu curso limitado e o paciente responde bem a vários tratamentos, inclusive placebo. Este fato faz com que muitas receitas de cura tornam-se populares por crendices, sendo que o paciente apresentaria remissão espontânea da dor de qualquer maneira 14. A definição de doença relaciona-se com o conceito biológico de adaptação. Adaptação é uma propriedade geral dos seres vivos que se traduz pela capacidade de ser sensível às variações do meio ambiente (irritabilidade) e de produzir respostas capazes de adaptá-las 15, e a ATM é um ambiente totalmente adaptativo 16. A relação custo-benefício também deve ser discutida com o paciente. Muitos tratamentos longos e caros nem sempre resultam na melhora esperada pelo paciente. O ajuste oclusal por desgaste seletivo é um bom exemplo desse problema. Historicamente usado como terapia definitiva para as dores músculo- 92
4 esqueléticas da DTM (e muitas vezes até de maneira indiscriminada para dores neuropáticas e vasculares), sua utilização tem sido questionada por revisões sistemáticas onde comprovase sua ineficácia na melhora dos sintomas 14. Discussão As opiniões sobre DTM`s são confusas e muitas vezes controvertidas, principalmente se o cirurgião dentista buscar informações sem um parâmetro crítico e avaliativo das fontes destas informações. A odontologia tem uma aproximação muito forte com a oclusão, entretanto o clínico tem que ser imparcial quando se dedica a buscar informações sobre as patologias que envolvem a articulação temporomandibular. O conhecimento das Disfunções Temporomandibulares baseado em opiniões e experiências clínicas pessoais resulta em diagnósticos e tratamentos ineficazes, dispendiosas e muitas vezes nocivas. Esta situação não pode mais ser aceita 13. A pesquisa clínica investigando as várias estratégias de tratamento é um requisito para sobrepor estas tendências individuais e ajudar a estabelecer padrões de tratamento. Segundo o CIOMS - Council for International Organizations of Medical Sciences 17, em 1996, os ensaios clínicos randomizados vêm sendo descritos como o padrão-ouro na avaliação de questões terapêuticas em saúde. Este tipo de estudo elimina (ou diminui ao máximo) dados tendenciosos na pesquisa. Trabalhos científicos que trazem suas conclusões apoiadas neste desenho de estudo têm maior valor de evidência. Conclusão Tendo em vista as informações obtidas literatura pode-se concluir que: 1 Os profissionais envolvidos no tratamento da DTM devem ter conhecimento da metodologia de provas clínicas, para poder avaliar a credibilidade da informação que está sendo passada. 2 A adoção de um critério para avaliar as informações contidas nas diversas literaturas terá como resultado leitores e clínicos mais refinados e nossos pacientes serão beneficiados. 3 A transferência de fundamentos científicos para a prática clínica diária pode implicar em mudanças de conceitos, de hábitos e de procedimentos. Referências Bibliográficas CARLSSON GE, MAGNUSSON T, GUIMARÃES AS. Tratamento das Disfunções Temporomandibulares na Clínica Odontológica. 1 a ed. São Paulo: Quintessence, DAWSON EP. Avaliação, Diagnóstico e Tratamento dos Problemas Oclusais. 2 a ed. São Paulo: Artes Médicas, NIEDERMAN R, BADOVINAC R. Tradition-based dental care and evidence-based dental care. J Dent Res.1999; 78: LUND JP, LAVIGNE GJ, DUBNER R, SESSLE BJ. Orofacial Pain From Basic Science to Clinical Management. 1 ed. London: Quintessence, RIOLO ML, BRANDT D, TENHAVE TR. Associations between oclusal characteristics and signs and symptoms of TMJ dysfunction in children and young adults. Am J Orthod Dentofacial Orthop.1987;92(6):
5 HENRIKSSON T, EKBERG EC, NILNER M. Symptoms and signs of temporomandibular disorders TMJ in girls with normal occlusion and class II malocclusion. Acta Odontol Scand.1997;55(4): EGERMARK I, INGERVALL B, CARLSSON GE. The dependence of mandibular dysfunction in children on functional and morphologic malocclusion. Am J Orthod. 1983;83(3): Evidence-Based Medicine Working Group. Evidence-based medicine. A new approach to teaching the practice of medicine. JAMA. 1992; 268: FABER J. Editorial. Rev Dent Press Ortodont Ortop Facial. 2008;14(1): pagpag. SUTHERLAND SE. Evidence-based dentistry: Part IV. Research design and levels of evidence. J Can Dent Assoc Ottawa.2001; 67(0): MOHL ND. The anecdotal tradition and the need for evidence - based care for temporomandibular disorders. J Orofac Pain.1999;13(4): FUREDY JJ. Specific versus placebo effects in biofeedback training: a critical lay perspective. Biofeedback Self Regul. 1987;12(3): RANDOLPPH CS, et. al. Conservative management of temporomandibular disorders: a post reatment comparison between patients from a university clinic and from private practice. Am J Orthod Dentofacial Orthop.1990;98(1): ENTREVISTA PAULO CONTI. R Dental Press Ortodon Ortop Facial, Maringá, 2006;11(2): BRASILEIRO GF. Bogliolo patologia geral. 3 a ed. Rio de Janeiro: Guanabara, SADOWSKY C. The risk of orthodontic treatment for producing temporomandibular disorders: a literature review. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 1992;101:79 83 COUNCIL FOR INTERNATIONAL ORGANIZATIONS OF MEDICAL SCIENCES. International Ethical Guidelines forbiomedical Research Envolving Human Subjects. Washington: OPAS; OKESSON JP. Dor Orofacial Guia de avaliação, diagnóstico e tratamento. 1ª ed. São Paulo: Quintessência,1998. COSTEN JB. A syndrome of ear and sinus symptons dependent upon disturbed function of the temporomandibular joint. Annals of Otology, Rhinologgy and Laryngology.1934;43:1-15. SACKETT DL, et al. Evidence-Based Medicine: how to practice and teach EBM. Churchill Livingstone, DOUGLAS CR. Fisiologia normal e patológica aplicada à odontologia e fonoaudiologia. In: Douglas CR. Patofisiologia oral: fisiologia normal e patológica aplicada à odontologia e fonoaudiologia. São Paulo: Pancast; p MERIGUI LBM et al. Ocorrência de disfunção temporomandibular (DTM) e sua relação com hábitos orais deletérios em crianças do município de Monte Negro RO. Rev. CEFAC vol.9 no.4 São Paulo Oct./Dec
6 SHIAU et al. The effects of masseter muscle pain on biting performance. J Oral Rehabil. 2003; 30(10): BARBOSA et al. Correlação entre aparelho ortodôntico, sexo e presença de desordens temporomandibulares. J Bras Ortodon Ortop Facial. 2002; 7(39):
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