Denunciamos todas as formas de violência contra mulheres e raparigas
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- Kátia Candal Mascarenhas
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1 Denunciamos todas as formas de violência contra mulheres e raparigas Documento de Posicionamento do Fórum das Associações Femininas da Cidade de Nampula No dia 20 de Setembro de 2017, o Fórum das Associações Femininas da Cidade de Nampula realizou, na cidade de Nampula, uma conferência inaugural de mulheres, sob o lema Construindo cidadania activa nas mulheres através do combate à violência baseada no género, com o objectivo de promover o engajamento da mulher para uma cidadania mais activa e participativa. Especificamente, a conferência visava: Promover a articulação entre as organizações da sociedade civil (OSC), o Governo e os partidos políticos no combate à descriminação e violência baseada no género; Contribuir para que, cada vez mais mulheres discutam e estejam preparadas para combater a violência contra a mulher e a rapariga; Contribuir para a multiplicação do debate e para a ampliação da luta das mulheres por uma sociedade livre de violência, opressão e exploração. Incluir na agenda dos partidos políticos e órgãos de poder aspectos que promovam e desenvolvam estratégias para defender os direitos das mulheres e raparigas. Participaram na conferência pouco mais de 50 mulheres, vindas das associações femininas locais, de organizações da sociedade civil, das instituições públicas, que fazem parte do Mecanismo Multissectorial de Atendimento Integrado à Família e Criança Vítima de Violência, entre elas a Procuradoria Provincial e da Cidade de Nampula, o Tribunal Provincial de Nampula, o Comando Provincial da PRM de Nampula, através do Departamento de Atendimento à Família e Menores Vítimas, a Direcção Provincial da Saúde de Nampula, através do Departamento Provincial de Assistência Médica, a Direcção Provincial de Género e Acção Social de Nampula, o Instituto para Patrocínio e Assistência Jurídica - IPAJ, delegação de Nampula, mulheres vindas dos partidos políticos (OMM, liga Feminina do MDM e do PAHUMO), mulheres da comunicação social (Rádio e televisão) e ainda mulheres em representação dos diferentes bairros desta da cidade de Nampula. Estamos a iniciar um ciclo eleitoral que requer que as mulheres debatam os problemas que as afectam, de modo a influenciar a inclusão de uma agenda de género nos manifestos partidários definindo acções estratégicas que conduzam a uma real igualdade entre todos os seres humanos. Na conferência foram debatidos os problemas enfrentados pelas mulheres na Província de Nampula, com destaque para a violência baseada no género, no espaço doméstico bem como no espaço público, os casamentos prematuros e gravidez precoce e a participação das mulheres nos processos de tomada de decisão. Além disso, a conferência também discutiu a questão da discriminação e violencia que 1
2 afecta as mulheres com deficiência, as mulheres viúvas, as mulheres trabalhadoras do sector informal. A adopção da Convenção das Nações Unidas Sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres (CEDAW) i, aprovada pela Assembleia da Nações Unidas, em 1979, e ratificada pela Assembleia da República de Moçambique, através da Resolução 4/1993 (BR, I Série, nº22, de 2/6/1993), que reflecte não só sobre a visibilidade da violência doméstica como atentado aos direitos humanos, mas também a constituição de movimentos sociais e de organizações da sociedade civil que trazem para o espaço público o debate sobre a violência exercitada contra as mulheres. A CEDAW foi concretizada a nível mundial pela Declaração de Beijing ii e a sua Plataforma de Acção. Destaca-se ainda, a Declaração da SADC sobre Género Desenvolvimento iii (1997 e 2008) e o Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos sobre os Direitos Humanos das Mulheres em África iv. Consideramos que na última década ( ), o Governo moçambicano adoptou várias políticas e legislação que visam a protecção e promoção dos direitos na perspectiva de género, tais como: a Constituição da República v, o Plano Nacional para o Avanço da Mulher ( ), Lei da Família, Código Penal, Lei Da Violência Domestica Conta a Mulher, Lei 9/2009, a estratégia nacional para eliminação dos casamentos prematuros, entre outros. Não obstante os avanços alcançados, as mulheres participantes da Conferência da Mulher, constatam que tais medidas legislativas não se mostram suficientes para prevenir e reprimir as situações de violação dos direitos humanos da mulher e da rapariga. A título de exemplo, com a aprovação da Lei da Família (2004), a idade para o casamento da rapariga subiu de 14 para 18 anos. Apesar desta melhoria, a própria legislação continua ineficiente uma vez que abre espaço para que raparigas com menos de 18 anos e mais de 16 contraiam casamento sob consentimento dos pais (art. 30, nº 2). Esta disposição contraria o princípio de maioridade consagrado na Constituição da República e no artigo 3 da Lei nº 7/2008, de 9 de Julho e demais instrumentos legais aprovados pelo Governo e propicia um ambiente favorável para uniões forçadas e consequentemente violação de direitos humanos. Segundo o inquérito demográfico e de saúde (IDS-2011), 41% das adolescentes entre os anos são mães ou estão grávidas do primeiro filho. Segundo a mesma fonte, 52% das adolescentes casam-se antes dos 18 anos e 18% antes dos 15 anos de idade vi. Em números absolutos, mais de meninas, equivalente a 11%, entre os 12 e 14 anos estão casadas ou vivem em união estável, muito antes de completarem a maioridade, comprometendo assim a sua disponibilidade à educação e desenvolvimento pessoal. 2
3 Somos 51% da população da Província de Nampula vii. Os níveis de analfabetismo são maiores no contexto feminino em comparação com o masculino, isto é, 60% das mulheres e 30% dos homens entre anos não sabem ler e escrever 1. Segundo dados da procuradoria da cidade de Nampula, no período de Janeiro a Agosto de 2017, foram registados e atendidos 323 casos, dos quais 222 contra mulheres e crianças, 101 contra homens. E ainda 193 processos/ ou autos foram tramitados, pelo crime de violência física simples ou grave, dos quais 136 contra mulheres e 57 contra homens. 37 Processos/ ou autos foram tramitados pelo crime de violência psicológica, dos quais 37 contra mulheres e 35 contra homens, pelo crime de violência patrimonial, destes 40 contra mulheres e 9 contra homens. Segundo dados da Direcção Provincial da Saúde de Nampula, através do Departamento Provincial de Assistência Médica, só em 2017 deram entrada 372 casos de violência sexual, dos quais 371 contra mulheres e 1 contra menor do sexo masculino e ainda no mesmo período, 2068 casos de violência física. Saudamos a existência de uma Lei especial sobre a violência doméstica, mas é necessário que esta Lei seja conhecida, amplamente divulgada e aplicada. A violência doméstica é um crime público que não pode ser arquivado, como tem acontecido. Existe um volume de ocorrências que não chegam a ser julgadas. É inaceitável e repugnante que continuemos com altos níveis de violência contra a mulher e rapariga. Exigimos que o Estado moçambicano, as corporações económicas, os partidos políticos, as organizações da sociedade civil, as confissões religiosas e a sociedade no geral olhem para nós como seres humanos, sujeitos de direitos; Denunciamos todas a formas de violência praticada contra mulheres e raparigas, como um problema político e social e cobramos de toda sociedades medidas para acabar com este crime; Exigimos que todas as vítimas de violência doméstica sejam protegidas e que não seja obrigada a voltar à sua casa e continuar a sofrer violência cíclica. Nenhuma mulher pode ser obrigada a abandonar a sua casa, colocado em causa a sua integridade física e moral e premiando deste modo o agressor. Exigimos que as estradas sejam mais iluminadas para que nós e as nossas crianças não sejamos sujeitas a abusos e violações sexuais. Queremos sair e voltar seguras para casa. Queremos ter paz em casa, paz na rua e paz no mundo; Exigimos políticas públicas sensíveis aos direitos humanos das mulheres e sua aplicação prática. Por exemplo, que na revisão da Lei da Família e da Lei da sucessão a mulher esteja em prioridade na linha dos sucessíveis para que sejam salvaguardados os direitos da mulheres viúvas e de crianças órfãs em particular; 1 Recenseamento Geral da População e Habitação: Indicadores Sociodemográficos, Província de Nampula 3
4 Exigimos que sejam alocados fundos para desenvolvimento de projectos que facilitem o livre acesso e circulação nos bairros, nas instituições públicas e privadas para pessoas, em especial para as pessoas com deficiência. E que as mulheres e crianças com deficiência sejam retiradas do isolamento e integradas na sociedade; Exigimos que sejam criados mecanismos que facilitem acesso a crédito para mulheres e raparigas, a nível das instituições bancárias e a nível dos fundos do Estado como são os casos do Fundo de Desenvolvimento do Distrito e Fundo para Redução da Pobreza Urbana. Isso iria contribuir para a promoção do empreendedorismo e empoderamento económico das mulheres e raparigas. Exigimos que Nampula tenha um centro de atendimento integrado a vitimas de Violência e que todas as unidades de saúde da Província de Nampula ofereçam o atendimento integrado às vítimas de violência baseada no género. Nós, mulheres que vivemos na província de Nampula, enfrentamos quotidianamente formas de violência que nos impedem de aceder e exercer direitos. Por isso exigimos que sejam tomadas medidas urgentes no sentido de acabar com todas as formas de violência de que somos vítimas pelo simples facto de sermos mulheres. A nossa luta não abrandará enquanto houver uma única mulher que sofra de violência. Nampula, 26 de Setembro de 2017 Associação das Mulheres viúvas, Associação de Mulheres Rurais (AMR), Associação de Mulheres de Mutaunha (AMOKANA), Associação de Mulheres com deficiência (AMD), Associação de Mulher no comércio informal (AEIMO), Associação Moçambicana de Mulheres e Apoio a Rapariga (OPHENTA) e a Associação de mulheres OPHENTANA WA THIANA. i CEDAW. Disponível em ii SADC (1979) Declaração da SADC sobre Género e Desenvolvimento. Disponível em inglês em: https// iii Declaração de Beijing (1999). Disponível em: iv Protocolo da Carta Africana de Direitos Humanos e dos povos relativos aos direitos da mulher em Afric. Disponível em v Republica de Moçambique. Constituição da Republica (2004). vi Inquérito demográfico e de Saúde (IDS- 2011) vii Relatório do Instituto Nacional de Estática sobre os indicadores socio demográficos da Província de
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