Paulo Roberto Rodrigues Teixeira
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- Lara de Caminha Sequeira
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1 Foto: Ricardo Siqueira Paulo Roberto Rodrigues Teixeira Acolonização do Brasil gerou alguns desafios para Portugal. Um deles era o de assegurar a posse da terra descoberta. Era preciso criar uma forte estrutura militar terrestre e naval diante das ameaças dos inimigos europeus e dos selvagens da terra conquistada. A França era adversária das duas coroas ibéricas. Contestava a decisão política de dividir o mundo exterior à Europa entre Portugal e Espanha. Corsários franceses passaram a atuar no litoral brasileiro e a interceptar barcos portugueses que retornavam à metrópole com carregamentos de madeira. A resposta lusitana foi enviar frotas de guardacostas, para atacar as naus francesas. A extensão do litoral, porém, era muita grande e a quantidade de embarcações de guerra não era suficiente para enfrentar os franceses. Face às circunstâncias, buscouse uma solução mais econômica e eficaz: a colonização do Brasil, com a fixação de núcleos populacionais ao longo da costa. Por outro lado, havia os indígenas que lutavam pela manutenção da posse de suas terras para ANO V / Nº 8 65
2 A primeira construção com estrutura de alvenaria, do Forte de Santo Antônio, em não caírem nas malhas da escravidão imposta pelos novos colonizadores, extremamente carentes de mão-de-obra. Em 1526, foi criada uma feitoria em Pernambuco. Em 1530, São Vicente (hoje cidade de Santos) e depois, Piratininga (atual cidade de São Paulo). Pernambuco e São Vicente passaram a ser os dois primeiros núcleos portugueses nas costas do Brasil. O segundo passo para a colonização foi a divisão do Brasil em capitanias hereditárias no ano de O rei concedeu as terras aos membros da nobreza, os quais deveriam povoá-las, colonizá-las e defendê-las. A maioria falhou. Em 1549, o Rei D. João III limitou o poder dos capitães e criou um governo-geral para o Brasil, cuja sede foi a cidade de Salvador. Tomé de Souza, o primeiro governador-geral, quando chegou ao Brasil, tinha uma grande responsabilidade diante do rei de Portugal. A missão era erigir, na colônia, uma fortaleza e uma cidade grande e forte (Carta Régia de 7 de janeiro de 1549). Ela serviria de base do governo-geral das posições lusitanas nas terras de Santa Cruz e permaneceria como capital da colônia por dois séculos. Inicialmente, Tomé de Souza construiu uma cerca muito forte de pau-a-pique para que os trabalhadores e soldados tivessem segurança nas suas atividades. Concluída a obra, foram colocadas várias peças de artilharia, e quase toda a cidade, em pouco tempo, estava protegida. Em seguida, ordenou cercar a cidade de muros de taipa grossa, com dois baluartes ao longo do mar e quatro na banda da terra. Em cada um colocou peças de artilharia, iniciando a organização da estrutura militar no Brasil. A cidade de Salvador estava nascendo e já nascia fortificada. No período em que Portugal estava sob domínio espanhol ( ), a Holanda perdeu 66 ANO V / Nº 8
3 Mapa elaborado no período colonial, destacando-se o Forte de Santo Antônio. vários de seus negócios na América, deixando de lucrar no financiamento de engenhos de açúcar no Brasil, na comercialização do produto na Europa e no transporte de escravos. Os holandeses estavam proibidos de aportar nas terras portuguesas que lhe garantiam o comércio. Decidiram, então, criar uma colônia no Brasil, enviando para Bahia uma esquadra. Em 1624, invadiram o Brasil, em Salvador, na Baía de Todos os Santos. Depois das invasões holandesas, o sistema defensivo baiano foi aperfeiçoado e acabou por possuir 24 fortes de variados tamanhos. Apresentaremos, nesta reportagem, três deles: Forte de Santo Antônio da Barra, de Santa Maria e de São Diogo. O primeiro já estava edificado na invasão, em Após a expulsão, construiram-se os outros dois, com o propósito de impedir o desembarque da tropa inimiga e para solidificar o apoio de fogo mútuo entre eles, reforçando a linha de defesa na Baía de Todos os Santos. Navios holandeses atacando Salvador. ANO V / Nº 8 67
4 O Forte, atualmente, é conhecido como Farol da Barra. Foto: Esmeraldo R. Souza Forte de Santo Antônio da Barra Em 1501, na Baía de Todos os Santos, em Salvador, por ordem do rei de Portugal, construiu-se, precariamente, o Forte de Santo Antônio como marco de posse da terra recém-descoberta, no local chamado, na época, de Ponta do Padrão. Hoje, a região é conhecida como Cabo de Santo Antônio, uma área privilegiada, da qual se vislumbra a belíssima enseada da baía, com suas exuberantes praias, delineadas por edifícios modernos e hotéis de padrão internacional, as quais, juntamente com a riqueza do patrimônio histórico, fazem daquela cidade uma atra- Foto: Ricardo Siqueira Farol de seção cilíndrica de fins do século XIX, em substituição a outro que fora construido em 1696, de forma quadrada. 68 ANO V / Nº 8
5 ção turística com crescimento surpreendente. O forte, atualmente, é conhecido como Farol da Barra. A sua estrutura é de alvenaria, com pedras gnaisse, e a sua primeira construção data de Ao longo do tempo, o seu perímetro foi aumentado, passando a mostrar a forma de um polígono irregular de dez lados e nenhum baluarte, mas tão-somente guaritas nos vértices salientes, com influência arquitetônica italiana. Possui ao centro um farol de seção cilíndrica de fins do século XIX em substituição a outro que fora construído em 1696, de forma quadrada. A missão do forte era impedir a penetração do inimigo na entrada da barra e atuar juntamente com o Forte Monte Serrat contra o desembarque do invasor nas praias vizinhas. A primeira invasão ocorreu em A guarnição resistiu, mas não pôde impedir o desembarque dos holandeses no atual Porto da Barra. Após um ano, os invasores foram expulsos. O Governador Diogo de Oliveira continuou as obras de fortificação de Salvador, na enseada de Vila Velha, onde ocorreu o desembarque holandês. Nas extremidades, foram construídos os fortes de São Diogo e de Santa Maria, em con- Fotos: Esmeraldo R. Souza Na lateral do Forte, observa-se a beleza do céu e do mar na linha do horizonte. Ao fundo, a Ilha de Itaparica, sempre observada pela sentinela da guarita. Canhão colonial em posição de tiro. Forte de Santo de Antônio e Forte de Santa Maria (ao fundo), linha de defesa contra o invasor. ANO V / Nº 8 69
6 Instalação do Forte acoplada à guarita. No céu azul a lua despontando. Nau portuguesa em exposição no Museu de Hidrografia e Navegação. Foto: Ricardo Siqueira Foto: Esmeraldo R. Souza dições de realizar o cruzamento de fogos na baía, reforçando a linha de defesa, cuja fragilidade já tinha sido constatada. Nessa época, o Forte de Santo Antônio dispunha de um canhão de calibre 24, o maior da Bahia, e, mais tarde, em 1801, foi aumentado o seu poder de fogo com peças de 24 e 36 libras. Em 1638, os holandeses voltaram a atacar Salvador. As operações em terra predominaram, uma vez que o litoral era muito extenso e facilitava o desembarque da tropa. A tentativa de ocupação foi frustrada. No período da Independência do Brasil, foi colocado o Brasão do Império na porta de acesso principal, construída em cantaria de arenito e que lá se encontra até hoje. Uma curiosidade: Em 1705, foi incorporado à guarnição do forte o Capitão Santo Antônio de Lisboa, o santo tão popular na Igreja Católica. Foi uma forma que o governo encontrou para contribuir com os religiosos locais, disponibilizando o seu soldo para a Igreja. Santo Antônio chegou ao posto de tenente-coronel. A sua carta patente existe até hoje. O forte foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 24 de maio de Atualmente, é administrado pela Marinha e abriga o Museu de Hidrografia e Navegação. 70 ANO V / Nº 8
7 Forte de Santa Maria vendo-se ao fundo o Forte de Santo Antônio. Foto: Ricardo Siqueira Forte de Santa Maria O Forte de Santa Maria encontra-se na parte sul da cidade de Salvador, em uma das extremidades da pequena enseada de Porto da Barra, conhecida antigamente como Porto de Vila Velha. Trata-se de edificação de belíssima arquitetura, com forma de um polígono irregular com quatro ângulos salientes e três reentrantes, o que lhe caracteriza a influência italiana, como outros fortes baianos construídos no mesmo período, usando o sistema construtivo de pedra e cal. A fachada sul da casa do comando é revestida de telhas, com o mesmo tratamento impermeabilizante encontrado em empenas de sobrados baianos de todo o período colonial. O revestimento primitivo da fachada princi- Foto: Esmeraldo R. Souza Canhão colonial, apontando para o mar. Ao fundo, o Forte de São Diogo. ANO V / Nº 8 71
8 Foto: Ricardo Siqueira 1536, Francisco Pereira Coutinho, donatário da recém-criada Capitania da Bahia. Em 1549, o Governador Geral também desembarcou na mesma praia. Em 1624, serviu de local de desembarque para os invasores holandeses comandados por Albert Shouten. A visão estratégica para construir uma fortaleza naquele local fundamentava-se na interação com Na porta de acesso, no alto, o escudo com as armas do Império. Ao lado, placa encravada na parede, registrando o local de desembarque dos holandeses. pal foi substituído por camada de reboco. Na porta de acesso, no alto, está o escudo com as armas do Império. Em fins do século XVII, sofreu reformas que lhe deram o aspecto atual. Não se sabe exatamente a data da sua construção, porém, na primeira invasão holandesa, em 1625, ela não existia. A praia próxima desse forte foi palco de alguns acontecimentos importantes. Ali desembarcou, em o Forte de São Diogo, implantado na extremidade oposta, e com o Forte de Santo Antônio da Barra, impedindo novas investidas de invasores. A linha de defesa estaria em melhores condições de repelir a ameaça externa vinda pelo mar e impedir o desembarque na praia. O Forte de Santa Maria era considerado uma posição de artilharia tão importante que recebeu os três melhores canhões de bronze existentes na cidade naquela época. Foi reconstruído entre 1694 e 1701, no decurso do governo de D. João de Lencastre, numa época em que o seu armamento era composto por seis 72 ANO V / Nº 8
9 Vista aérea do Forte de Santa Maria, vendo-se também o Forte de Santo Antônio. Nesta praia desembarcaram os holandeses em Foto: Esmeraldo R. Souza peças de ferro e a sua guarnição constituída por um capitão e dois soldados artilheiros. No século XIX, foi ocupado pelos rebeldes da Sabinada, movimento de caráter republicano que defendia maior autonomia das províncias em relação ao poder imperial. Ao abandoná-lo, os sabinos levaram 12 de seus canhões para prosseguirem na luta contra as tropas governistas. Logo após o conflito, o forte foi desarmado. O Forte de Santa Maria foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 24 de maio de ANO V / Nº 8 73
10 O Forte de São Diogo foi construido sobre a rocha, numa posição geográfica superior a do Forte de Santa Maria. Foto: Esmeraldo R. Souza Forte de São Diogo Foto: Ricardo Siqueira Foi edificada provavelmente entre 1626 e 1635, durante o governo de Diogo de Oliveira. Localizado na Baía de Todos os Santos, a sua construção, como também a do Forte de Santa Maria, foi resultado da primeira invasão dos holandeses. O inimigo havia desembarcado em praia completamente desguarnecida. Para impedir que a mesma operação viesse a se repetir, pois permanecia a ameaça externa, o governo providenciou, tão logo os holandeses foram expulsos, a construção do Forte de São Diogo. O forte foi implantado diretamente sobre a rocha, numa posição geográfica superior ao de Santa Maria, na entrada da barra, na extremidade da pequena enseada no Porto da Barra. Nessa época, as suas muralhas eram de taipa, baixas e pouco resistentes, comportando no máximo sete peças de artilharia. As chuvas eram constantes, exigindo que o forte passasse por freqüentes restaurações. Em 1694, o Governador D. João de Lencastre realizou uma reforma na sua construção. Em 1704, O canhão colonial pronto para repelir a ameaça vinda pelo mar 74 ANO V / Nº 8
11 D. Rodrigo determinou uma reforma mais ampla. Apresentou-se, então, um traçado curvilíneo convexo, acompanhado de linhas retas, formando um ângulo reentrante. Foi construído de alvenaria com pedra bruta, tendo os parapeitos em caixões de areia e sem dispor de canhoneiras, num desenvolvimento de 120 palmos de sua linha de fogo. Em 1722, foi reformado pelo Conde de Gáveas, Vice- Rei do Brasil, tendo recebido algumas canhoneiras. Posteriormente, as aberturas na muralha foram desmanchadas e substituídas por um parapeito muito baixo, que facilitava a pontaria do canhão em qualquer direção. Em contrapartida, os artilheiros ficavam desprotegidos contra os tiros e observação do inimigo que Foto: Ricardo Siqueira Visão panorâmica do Forte entrasse pela barra da Baía. O projeto de arquitetura do forte apresenta o estilo colonial-português, conhecido como forte atelhanado, marcado por reentrâncias em suas dependências. Era uma construção vulnerável devido a suas instalações serem muito elevadas em relação ao parapeito. O Forte de São Diogo era dependente do Forte Santo Antônio da Barra, para poder resistir ao ataque do invasor. Apesar da fragilidade, sua existência foi decisiva para que Salvador não fosse ocupada pelos holandeses, tendo em vista que o desembarque da tropa inimiga só poderia ser feita em locais de difícil acesso. Atualmente, o Forte de São Diogo é administrado pelo Exército, e nele funciona a representação da FUNCEB, em Salvador. Está aberto à visitação pública, abrigando um centro de lazer, com programação de shows, exibição de audiovisuais e outras atividades sociais. ANO V / Nº 8 75
12 O mar calmo e sereno desta praia permitiu que as tropas holandesas desembarcassem e conquistassem a cidade de Salvador, em Foto: Esmeraldo R. Souza A carta régia do rei de Portugal definiu a grande responsabilidade de Tomé de Souza, como primeiro governador-geral, na cidade de Salvador, a qual viria a permanecer como capital da colônia por dois séculos. Os três fortes abordados, Santo Antônio, Santa Maria e São Diogo, fizeram parte do sistema de defesa, constituído de 24 fortes construídos em épocas diferentes. O primeiro, o Forte de Santo Antônio da Barra, não teve suporte suficiente para deter a invasão dos holandeses em A tropa invasora desembarcou nas praias vizinhas, conquistando Salvador. Expulsos os invasores, após um ano, edificaram-se os dois outros, aumentando o poder de fogo da linha de defesa e impedindo o desembarque das tropas nas praias; estratégia que deu resultado. Encerramos a nossa reportagem, visualizando deslumbrante cenário da cidade, envolvida pelo mar esverdeado da Baía de Todos os Santos, na qual, o precioso patrimônio existente, registra a marca da importância que teve no passado. Na foto, o local de desembarque das tropas holandesas na primeira invasão, quando então não existiam ainda os fortes de Santa Maria e de São Diogo. Paulo Roberto Rodrigues Teixeira Coronel de Infantaria e Estado-Maior, é natural do Rio de Janeiro. Tem o curso de Estado-Maior e da Escola Superior de Guerra. Atualmente é assessor da FUNCEB e redator-chefe da revista DaCultura. 76 ANO V / Nº 8
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