ASPERGER, OU O AUTISMO LEVE
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- Margarida Castelo Bennert
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1 Texto de apoio ao curso de especialização Atividade física adaptada e saúde Prof. Dr. Luzimar Teixeira ASPERGER, OU O AUTISMO LEVE Especialistas estimam que uma em cada cem crianças possa ter a síndrome, que atinge mais os meninos. O diagnóstico é difícil, mas quanto mais cedo for feito, melhores as chances de adaptação Por Riad Younes Tenho um filho com síndrome de Asperger. Olhei, espantado: O que é isso? Meu filho é autista. Assim começou uma conversa surpreendente com um médico amigo meu. No início, fiquei desconfortável, sentindo um tipo de pena desse amigo. Poxa, afinal está com um filho problemático, retardado talvez. Nada disso. Meu filho é muito esperto, só que diferente dos outros, inclusive de seu irmão. É mais sensível que os colegas. Não entende nem suporta barulhos, me explicou o amigo. Seu filho foi convidado a deixar a escola em duas ocasiões. Os pais, apesar de médicos, bem orientados, sem problemas financeiros, não conseguiram ajuda. Ele tinha alguns problemas de contato social. Tudo começou com uma dificuldade para dormir, um pouco de agitação. Uma certa falta de controle esfincteriano, apesar da idade. Nada que o impedisse de começar a falar e a andar na época normal. Apesar de parecer muito inteligente, tinha essas dificuldades de se relacionar com seus pares e em fazer amiguinhos. Passava muito tempo lendo, vendo figurinhas. Tinha períodos de agitação. Não conseguia se relacionar com os amigos, com os tios, com os pais. A coisa que mais chamava a atenção era sua incapacidade de olhar nos olhos das pessoas, de encará-las. A criança não conseguia se colocar no lugar da outra pessoa, de interpretar os sinais que se originam do interlocutor. Quando sentava em seu colo, tinha-se a impressão de que ele estava sendo carinhoso com você. Na verdade não era isso. Ele vinha e usava seu colo como cadeira. Não estava interessado se você prestava atenção nele ou não, explica o pai.
2 Demorou mais de quatro anos até alguém diagnosticar o problema. Um precioso tempo perdido. Quanto mais cedo diagnosticado e a terapia instalada, maiores são as chances de a criança se adaptar ao mundo ao seu redor. O caso do filho de meu amigo não é tão raro assim. Ao contrário. Especialistas estimam que uma em cada cem crianças pode ser autista. Alguns diagnosticaram autismo em pessoas acima de qualquer suspeita, ou quase: Albert Einstein e Isaac Newton. O longametragem Rain Man, de 1988, introduziu os espectadores no mundo dos autistas. Nele, o ator Dustin Hoffman interpreta Raymond, um autista redescoberto por seu irmão. O autismo é uma disfunção complexa do cérebro, bem mais comum em meninos. Interfere na capacidade da criança de se AMA. Orientação especializada para pais e filhos comunicar, de interagir com outras pessoas. As manifestações variam e vão desde distúrbios leves, quase imperceptíveis, até a incapacidade total de contato, como a criança retardada, sem fala. Na Idade Média, acreditava-se que os autistas não tinham alma. Em 1940, o pediatra austríaco Hans Asperger observou que um grupo especial de autistas se comportava e evoluía de forma diferente. A síndrome foi batizada com seu nome e reconhecida oficialmente como uma disfunção mental somente há dez anos. Pessoas com a síndrome de Asperger fazem parte do grupo mais leve de autistas, com maior grau de funcionalidade. Os cientistas acreditam que exista um distúrbio neurológico na base desse erro de desenvolvimento. Infelizmente, na maior parte dos casos, a causa é desconhecida. As crianças assim afetadas apresentam dificuldade de relacionamento social e do uso da linguagem para se comunicar. Geralmente, os autistas com síndrome de Asperger caracterizam-se por possuir capacidade cognitiva elevada e por ter Q.I. pelo menos normal. A linguagem básica também é normal. Como muitos casos são tão leves que as crianças não são diagnosticadas, familiares e professores acham que elas não passam de pessoas um pouco diferentes. Algumas recebem os diagnósticos errôneos de distúrbio de atenção ou de distúrbios emocionais. Os estudos sugerem que a síndrome de Asperger é comum. Talvez até mais comum do que o autismo clássico. Sua freqüência é tão alta que despertou a atenção de médicos ao redor do mundo. Não é raro encontrá-la também em crianças com tique nervoso, problemas de atenção e até depressão. Os pais de uma criança com autismo devem ficar atentos. A chance de terem outro filho autista é muito grande. O professor Christopher Gillberg, um médico sueco, é considerado atualmente a maior autoridade em síndrome de Asperger do mundo. Ele descreveu e caracterizou as pessoas afetadas. Egocentrismo extremo, interesses limitados, rituais ou rotinas repetitivas, dificuldades de linguagem, uso limitado de gestos e, às vezes, inabilidade motora. A marca mais característica dessas crianças é o interesse peculiar. O mais fascinante e isso os difere dos autistas graves, que se focalizam em objetos específicos é que os portadores da síndrome de Asperger têm interesses mais
3 intelectualizados. Às vezes, apegam-se precocemente a áreas como matemática, leitura, ciência, etc. Tendem a se aprofundar em um tema, querer aprender tudo sobre ele e só falar daquilo. Não é raro que a criança mude seu foco de atenção periodicamente. No entanto, algumas mantêm o interesse em uma área específica até a vida universitária. E chegam a se tornar hiperespecialistas famosos. A dificuldade de convívio social é outra característica. As crianças com a síndrome vivem em seu mundo à parte. Não conseguem detectar as necessidades dos outros ao seu redor. Não conseguem entender uma piada, ou riem na hora errada. Algumas crianças com Asperger podem ter um desenvolvimento praticamente normal no início da vida. Outras demoram um pouco a falar, mas, no começo da idade escolar, voltam a alcançar capacidade adequada de linguagem. Às vezes, nessa época, começam a aparecer sinais de problemas. O dr. Asperger, no seu artigo original, descreveu com precisão a evolução esperada de indivíduos com a síndrome que leva seu nome: Durante seu desenvolvimento, alguns aspectos podem mudar consideravelmente. No entanto, os aspectos essenciais do problema não se alteram. Na infância, os problemas começam no aprendizado de procedimentos básicos e na adaptação social. Na adolescência, com emprego e aptidões em geral. Na vida adulta, em conflitos sociais e matrimoniais. O que acontece com essas crianças quando ficam adultas? Os cientistas têm poucas informações sobre essa fase da vida das pessoas com Asperger. Muitos pesquisadores observam indiretamente os pais dessas crianças, que também podem apresentar a mesma síndrome, mesmo não diagnosticada. Especialistas, até mesmo o dr. Gillberg, acreditam que metade dos adultos portadores da síndrome de Asperger nunca foi avaliada ou diagnosticada corretamente. Essas pessoas são consideradas diferentes, excêntricas. Muitos conseguem atingir um grau elevado de funcionalidade, completam a faculdade e dedicam-se a um assunto de seu interesse. Alguns até se casam, apesar do desafio que representa o relacionamento com o cônjuge. Os problemas matrimoniais são freqüentes e muitos acabam chegando ao psiquiatra. E o portador da síndrome de Asperger pode passar anos sem um diagnóstico exato. Um novo exame de ressonância magnética pode ser a janela para a mente do autista. Ou melhor, para seu cérebro. Pesquisadores da Universidade de Georgetown, liderados pelo dr. Thomas Zeffiro, iniciaram um estudo inovador. Tentam identificar o funcionamento do cérebro através de análise detalhada, realizada durante alguns testes que imitam jogos de vídeo. Com uma sucessão de luzes e movimentos, a criança brinca com botões de um pequeno aparelho. A ressonância funcional mostra a ativação de cada parte do cérebro em resposta a estímulos visuais específicos. Os resultados parecem apontar para a possibilidade de encontrar um padrão ou uma série de padrões de circuitos ativados no cérebro, associados com o desenvolvimento de autismo e com o comportamento dos pacientes. Confirmados esses resultados, provavelmente esta será a arma mais poderosa no diagnóstico precoce de autismo, até na idade pré-escolar.
4 Não há remédio específico para o tratamento de pacientes com autismo. No entanto, algumas crianças apresentam problemas associados, neurológicos ou psiquiátricos, e podem necessitar de tratamento medicamentoso. A maior ajuda está no diagnóstico precoce. Se pais, familiares e professores entenderem a disfunção na comunicação dessas crianças, poderão ajudá-las a se adaptar às atividades diárias. Os especialistas sugerem que as rotinas na classe normal sejam consistentes e previsíveis. Os autistas não gostam de surpresas nem de barulhos altos. Meus ouvidos são como amplificadores ligados no mais alto volume, descreveu a dra. Temple Grandin, autista e professora da Universidade do Colorado (EUA). Como as crianças com síndrome de Asperger apresentam uma área específica de interesse, vale a pena explorá-la. No caso da dra. Temple, sua hipersensibilidade auditiva foi usada para desenvolver modelos de melhora da produtividade bovina. Ela inventou circuitos para o confinamento do gado que acalmavam os animais e aumentavam o rendimento. Muitas vezes as crianças autistas não conseguem se adaptar às classes normais, e classes especiais com educadores treinados fazem-se, então, necessárias. Associações ao redor do mundo, como a Associação dos Amigos do Autista (AMA), tentam ajudar os autistas e os familiares, além de conscientizar os médicos da importância desse distúrbio. O número de autistas deve se elevar drasticamente no futuro, principalmente devido ao diagnóstico mais adequado e precoce. Levar a criança aos vários especialistas, fazer exames, comprar remédios e transferi-la para classes e escolas especiais pode ser muito caro. Caro também ficaria se o sistema de saúde pública cuidasse dessas crianças. Se em torno de 1% de todas as crianças pode ter autismo, isso vai se transformar, do ponto de vista econômico, em um problema de saúde pública. UM CUIDADO ESPECIAL Associação paulistana orienta, estuda e esclarece o autismo A Associação dos Amigos do Autista (AMA), fundada em São Paulo em 1983, presta serviços de educação especial diretamente à pessoa que tem autismo. Além disso, informa, orienta e treina a família desses alunos a respeito do autismo e dá suporte psicológico. A AMA também promove eventos científicos e produz material de divulgação e de aprofundamento do conhecimento acerca do autismo e dialoga com instâncias municipais, estaduais e federais, representando os interesses e defendendo os direitos das pessoas que têm autismo. Conversamos com Mariana Rocha de Mello, engenheira de formação, gerente de recursos da AMA e, sobretudo, profunda estudiosa do autismo. CartaCapital: Quantas pessoas a AMA atende? Mariana Rocha de Mello: Diretamente cerca de 85 pessoas com autismo, de todas as idades, fornecendo desde educação especial até residência estruturada.
5 CC: O que faz exatamente a AMA? MRM: A missão da AMA é proporcionar à pessoa autista uma vida digna, trabalho, saúde, lazer e integração à sociedade. Oferecer à família dela instrumentos para a convivência no lar e em sociedade. Promover e incentivar pesquisas sobre o autismo, difundindo o conhecimento acumulado. Cursos, palestras e congressos realizados por nós atingem anualmente mais de mil profissionais que trabalham direta e indiretamente com autismo em todo o Brasil. CC: Quais são as dificuldades da AMA em atingir esses objetivos? MRM: A falta de informação sobre o autismo, não só na população em geral, mas especialmente por parte de médicos e Mariana. Tudo é individualizado professores, retardando o seu diagnóstico. Em segundo lugar, a falta de recursos. A educação especial para pessoas com autismo é extremamente cara. CC: O que encarece a escola especial do autista? MRM: Enquanto uma escola regular tem classes com 20, 30 e até 40 alunos, as classes para autistas têm em média cinco alunos, com a proporção média de um professor para cada dois alunos. CC: De onde vêm os recursos da AMA? MRM: Temos parcerias com órgãos públicos, mas elas cobrem apenas 20% do orçamento anual da AMA. Dependemos de doações e de mensalidades pagas pelas famílias de maior poder aquisitivo. CC: Qual o impacto da AMA na evolução de crianças com autismo? MRM: A AMA estrutura o ambiente e a situação de aprendizado para apoiar a criança com autismo em suas dificuldades de comunicação, imaginação (comportamento, abstração) e interação social, para que ela possa desenvolver as habilidades que outras crianças desenvolvem naturalmente. Utilizamos recursos técnico-pedagógicos como o sistema desenvolvido no Centro TEACCH ( e o Applied Behavior Analysis (ABA). Os conceitos a ser ensinados são trazidos, tanto quanto possível, para uma representação mais fácil de ser compreendida por quem tem autismo. CC: Quais são os cuidados no estabelecimento desses programas? MRM: Sempre que possível, busca-se a previsibilidade, que é mais confortável para os autistas. Tudo é muito individualizado, o programa de educação, bem como os materiais usados, a forma da linguagem e as metas são adaptados às características individuais de cada aluno.
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