Guia da eficácia dos métodos contraceptivos
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- Dina Cipriano Dreer
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1 Nilson Roberto de Melo e Luciano de Melo Pompei WebMédicos Médico-assistente, Doutor da Clínica Ginecológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Luciano de Melo Pompei Médico Pós-graduado do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Introdução Planejamento familiar significa oferecer aos casais meios que possibilitem planejar o tamanho de suas famílias, decidindo quando e quantos filhos desejam ter, por meio da oferta de orientações e de métodos anticoncepcionais eficazes e seguros, respeitando a liberdade de escolha de cada um, suas particularidades socioculturais, crenças religiosas e assim por diante. Deve ser diferenciado do controle de natalidade, que consiste na imposição, pelas autoridades governamentais, do número máximo de filhos nas famílias, havendo punições aos que ultrapassam tais limites, o que é observado em alguns países com superpopulação. Ao contrário do controle de natalidade, o planejamento familiar livre e "democrático" deve ser estimulado e orientado, não apenas por avanços na área médica, mas, principalmente, por sérias e amplas medidas políticas que atinjam a todas as pessoas sexualmente ativas. Felizmente, os avanços têm ocorrido e, hoje, praticamente todas as pessoas pelo menos já ouviram falar em planejamento familiar, que é considerado um direito humano. Cada vez mais casais procuram orientação no sentido de controlar o número de filhos desejados e cada vez há mais métodos anticoncepcionais eficazes e seguros disponíveis a essa população. Esse planejamento do tamanho das famílias é de enorme importância, pois permite que homens e mulheres se programem de forma a poderem oferecer uma melhor qualidade de vida aos seus filhos e, além disso, permite um maior espaçamento entre cada gestação, o que é bom para a saúde da mulher e para a das crianças, pois há redução da mortalidade infantil. Também há redução da mortalidade materna pela menor exposição às gestações e por serem evitadas com maior segurança em mulheres com alto risco gestacional. Certas doenças também apresentam redução de incidência em virtude do uso de certos métodos anticoncepcionais. Devido à grande importância do assunto, e de tratar-se de motivo freqüente de consultas ao ginecologista, neste fascículo se abordará a eficácia dos métodos anticoncepcionais mais freqüentemente utilizados. Eficácia A eficácia anticoncepcional de um método é medida pela falha do método em prevenir a gestação, sendo obtida pela observação em estudos controlados do número de gestações ocorridas em um determinado período, na vigência do método em questão. O índice de Pearl é um dos métodos para avaliação da eficácia, consistindo na razão entre o número de gestações observadas no período e o número de meses ou de ciclos observados. O resultado é multiplicado por 1.200, se o período foi expresso em meses, ou por 1.300, se foram ciclos. Esse índice indica o número de falhas por 100 mulheres em um ano, ou por 100 mulheres-ano. O índice de Pearl é utilizado para longas observações. Para períodos mais curtos e comparações entre diferentes períodos de observação, prefere-se a life table analysis, que calcula o índice de falha para cada mês de utilização do método e permite o cálculo de uma taxa cumulativa do período desejado a posteriori. Como a eficácia de um método contraceptivo depende não apenas dele, mas também de outras variáveis, destacando-se o uso correto pelo usuário, costuma-se dividir a eficácia em: 1 / 6
2 1. Eficácia no uso comum ou de uso ou típica: Consiste na eficácia normalmente observada na prática, ou seja, incluindo todos os usuários, tanto os que utilizam o método de forma correta quanto incorretamente. 2. Eficácia no uso correto ou do método ou teórica: O cálculo é baseado apenas nos usuários que utilizaram o método corretamente, ou seja, é a menor probabilidade de gravidez com o método. Para alguns métodos, não há necessidade dessa diferenciação, pois dependem pouco ou nada do comportamento do usuário ou do casal, como, por exemplo, os implantes e os injetáveis trimestrais. Anticoncepcional Hormonal Combinado Oral O anticoncepcional hormonal combinado oral (AHCO) é um dos métodos contraceptivos mais utilizados e um dos mais eficazes, se utilizado corretamente. Consiste da associação de um estrogênio, o etinilestradiol, com um progestagênio, como o gestodeno, levonorgestrel, desogestrel, dl-norgestrel, acetato de ciproterona, entre outros. Além da alta eficácia na prevenção da gravidez indesejada, traz outras vantagens, como a regularização das menstruações, redução do sangramento menstrual, alívio da dismenorréia, diminuição da incidência de câncer de ovário e endométrio, diminuição da ocorrência de doenças benignas das mamas, entre outros. A pílula monofásica, ou seja, aquela em que todos os comprimidos apresentam a mesma dose de hormônios, é a mais utilizada, mas existem também a trifásica, a bifásica e a combifásica, nas quais as doses de seus componentes variam ao longo da seqüência de comprimidos. O índice de falhas do método nos diversos estudos tem variado de 0,1 a 0,7 gestações por 100 mulheres-ano, ou índice de Pearl de 0, 1 a 0,7, mesmo com os AHCO de menor dosagem hormonal presentes no mercado, como, por exemplo, a associação de etinilestradiol 20 mcg com gestodeno 75 mcg ou com 150 mcg de desogestrel. Ou seja, a eficácia teórica do método é considerada bastante elevada, mesmo com a redução de dosagem pela qual as pílulas combinadas passaram nos últimos anos. No entanto, na prática, observa-se uma eficácia típica de 3% a 9% ou índice de Pearl de 3,0 a 9,0. Essa taxa de falha mais elevada é habitualmente atribuída a falhas na tomada, com esquecimento de uma ou mais pílulas, ou atrasos constantes no horário das tomadas, uso concomitante de outros medicamentos que possam influenciar na eficácia dos AHCO e distúrbios gastrintestinais que possam prejudicar a absorção dos componentes do anticoncepcional, como náuseas, vômitos e diarréia. Portanto, para assegurar uma eficácia máxima, deve-se orientar muito bem a paciente, prevenindo-a contra os esquecimentos e orientando-a como agir nesses casos e quando houver problemas gastrintestinais. Minipílula A minipílula é composta apenas por progestagênio e deve ser utilizada de forma contínua, sem pausas, e tomada sempre no mesmo horário. Pode ser utilizada durante a amamentação, pois não inibe a lactação pelo fato de não apresentar estrogênio em sua composição. Em nosso meio, encontram-se as compostas por acetato de noretindrona, levonorgestrel e linestrenol. O índice de falhas desse método situa-se entre 1,4 e 4,1 gestações por 100 mulheres-ano, embora alguns estudos concluam uma variação maior, de 1,1 a 9,6. A eficácia típica e a teórica dessas pílulas de progestagênio puro são mais próximas uma da outra, pois, como devem ser tomadas sem pausas, fica mais difícil ocorrer o esquecimento de comprimidos. O uso correto, sem esquecimentos nem atrasos nas tomadas, pode permitir uma redução da falha para algo entre 0,5 e 1. 2 / 6
3 A associação com a amamentação diminui a ocorrência de falhas da minipílula. A amamentação exclusiva no peito, sem utilização de outros métodos contraceptivos, também previne a gestação enquanto a lactante estiver em amenorréia, principalmente nos primeiros seis meses. Se esses três critérios forem satisfeitos, a eficácia é de 98% ou mais. Injetável Mensal O injetável combinado mensal consiste na associação de um estrogênio com um progestagênio, ambos de longa duração, administrados por via intramuscular. Estão disponíveis em nosso meio as associações enantato de noretisterona 50 mg com valerato de estradiol 5 mg e acetato de diidroxiprogesterona 150 mg com enantato de estradiol 10 mg. Uma terceira associação, acetato de medroxiprogesterona 25 mg com cipionato de estradiol 5 mg, ainda não está disponível. Uma das grandes vantagens desse método é de não haver o perigo do esquecimento de tomar, como ocorre com as pílulas. Além disso, apresenta uma eficácia muito elevada, próxima a 100%, com índice de falhas de zero a 0,4 por 100 mulheres-ano. Injetável Trimestral Consiste na aplicação intramuscular, a cada três meses, de 150 mg de acetato de medroxiprogesterona de depósito. As vantagens que se destacam são a possibilidade de uso quando há contra-indicação ou intolerância aos estrogênios, segurança, sem perigo de esquecimento, entre outros. Além da eficácia contraceptiva, oferece ainda proteção contra o câncer de endométrio, diminuição do fluxo menstrual, melhora da anemia ferropriva e da anemia falciforme, entre outros. No entanto, pode acarretar ganho de peso e importantes alterações no padrão menstrual. A eficácia desse método é elevada, próxima a 100%. As eficácias de uso típico e teórica são iguais. O índice de gestação fica ao redor de 0,1 a 0,3 por 100 mulheres-ano, no primeiro ano de uso, e cerca de 0,4, no segundo ano. Atrasos na aplicação de cada injeção podem levar à redução da eficácia. Outro injetável de progestagênio é o enantato de noretindrona, ainda não disponível em nosso meio. Utilizam-se 200 mg por via intramuscular a cada oito semanas e o índice de falhas é ao redor de 0,4 por 100 mulheres-ano. Implantes Os implantes ainda não estão disponíveis em nosso país. Consistem em cápsulas de silicone polimerizado contendo progestagênios. Essas cápsulas são colocadas na subderme e passam a liberar o progestagênio gradualmente. O mais conhecido é o implante de progestagênio, que é um sistema de seis bastões, geralmente inseridos no ante-braço, e que liberam levonorgestrel. A eficácia é bastante elevada, com índice de gravidez de 0,2 por 100 mulheres-ano. Sua durabilidade é de cinco anos. Há também o implante de progestagênio com sistemas de dois bastões, com eficácia comparável e liberando o mesmo hormônio. Outros implantes contêm: acetato de nomegestrol; elcometrina; e 3-ceto-desogestrel. Dispositivo Intra-Uterino O dispositivo intrauterino (DIU) era inicialmente inerte e sem medicamentos, ou seja, feito de material plástico ou aço, como a alça de Lippes. Depois surgiram os dispositivos medicados, com o intuito de aumentar sua eficácia. Atualmente, os mais utilizados são os medicados com cobre, dentre eles se destacam o TCu-38OA, o ML-375, além do TCu-22OC, o sete de cobre e outros. Existem também aqueles medicados com hormônios, como o DIU de progesterona, e o 3 / 6
4 LNG-20, que libera levonorgestrel. Os DIUs de cobre mais utilizados, o TCu-38OA, o ML-375 e o TCu-22OC, apresentam alta eficácia, com taxa de gravidez menor que 1 por 100 mulheres-ano e índice de Pearl ao redor de 0,6 a 0,8. Há relato de taxa cumulativa de gravidez depois de 10 anos de uso do TCu-380A de 2,1 por 100 mulheres-ano e de 5,7 para TCu-22OC. Os DIUs de progestagênio ainda não estão disponíveis no Brasil. O de progesterona apresenta índice de gravidez de 1,3 a 1,6 por 100 mulheres-ano, enquanto o de levonorgestrel apresenta de 0,2 a 0,3. Métodos Cirúrgicos A esterilização cirúrgica feminina e a masculina, ou seja, a ligadura tubária e a vasectomia, são consideradas métodos irreversíveis, pois, apesar da possibilidade de reversão cirúrgica, nem sempre ocorre a gravidez após o procedimento, que é caro, difícil de realizar e com poucos centros habilitados a fazê-lo, ou seja, é difícil conseguir um local em que se possa submeter à reversão. A ligadura tubária apresenta índice de gravidez entre 0,2% e 0,4%, enquanto para vasectomia, o índice de falhas é ao redor de 0,15%. Métodos de Barreira Os métodos de barreira são considerados os mais antigos e persistem até os nossos dias. Nas últimas duas décadas, ganharam mais espaço devido ao aumento na incidência das doenças sexualmente transmissíveis (DST) e ao surgimento da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). O condom apresenta uma taxa de falha na prática ao redor de 12 a 14 por 100 mulheres-ano. No entanto, se for utilizado de forma correta e em todos os relacionamentos sexuais, e não apenas no período considerado fértil, a falha cai para cerca de 2 a 3 por 100 mulheres-ano. Assim, quando esse for o método escolhido, deve haver uma adequada orientação do casal e motivação para obter-se alta eficácia. O condom feminino tem falha de 12 a 21 por 100 mulheres-ano, para o uso típico, e de 3 a 5, para uso correto e consistente. Diferentemente do condom masculino, pode ser colocado antes do relacionamento. Tanto o condom masculino quanto o feminino protegem contra o vírus da imunodeficiência humana (HIV). O diafragma é feito de borracha, recobre o colo do útero e há a necessidade de realizar-se a medida, durante o exame ginecológico, do tamanho adequado à paciente. Requer boa motivação da usuária. O índice de gestações situa-se entre 2 e 6 por 100 mulheres-ano, se utilizado de forma correta e associado ao espermicida, mas a falha típica é da ordem de 18 a 23 por 100 mulheres-ano. Os melhores resultados são obtidos por mulheres casadas com mais de 35 anos, que utilizam o método em todas as relações, de preferência com espermicida. Para melhor eficácia, deve ser inserido um pouco antes do relacionamento sexual, até um máximo de seis horas antes, e ser removido entre seis e oito horas após. A esponja contraceptiva contém o espermicida nonoxinol-9, devendo ser umedecida antes da inserção para ativá-lo. Os índices de falha variam de 9 a 27 por 100 mulheres-ano. Sua eficácia é considerada inferior aos condons e diafragma, mas superior aos espermicidas. Os espermicidas estão disponíveis na forma de gel, creme, supositórios vaginais, tabletes e espumas. O mais conhecido é o nonoxinol-9, mas há outros, como o octocinol e o menfegol. O índice de falhas é muito variável nos diversos estudos, a taxa típica é de cerca de 26%, mas varia de 2% a 29% para espuma e de 4% a 36% para geléias e cremes. Se utilizado de forma correta, as falhas podem cair a 6%. 4 / 6
5 Importante ressaltar, com relação aos métodos de barreira, que todos exigem motivação para seu uso correto para máxima eficácia e alguns deles protegem contra DST e AIDS. Métodos Comportamentais Os métodos comportamentais mais importantes baseiam-se na abstinência periódica, ou seja, evitar as relações sexuais no período considerado fértil. Assim, há necessidade de grande motivação e envolvimento dos casais para um melhor resultado. O método rítmico, de calendário, de Ogino-Knaus ou tabela, consiste em um método de abstinência periódica. Para conhecer-se os dias considerados férteis, observa-se os últimos 6 a 12 ciclos espontâneos e subtrai-se 18 do ciclo mais curto para conhecer-se o início do período fértil, a partir do qual as relações devem ser evitadas, e subtrai-se 11 do ciclo mais longo para conhecer-se o final do período fértil, a partir do qual as relações podem ser reiniciadas. As taxas de falha variam bastante, conforme o estudo, e dependem muito da motivação do casal. O uso correto e consistente leva a uma taxa de falhas da ordem de 9 a 10 gestações por 100 mulheres-ano. O método da temperatura basal consiste na aferição da temperatura oral basal antes de se levantar pela manhã. O relacionamento deve ser evitado desde o início da menstruação até três dias depois da elevação da temperatura da ordem de 0,3 a 0,8 'C. A taxa de falhas para o uso correto e consistente da forma acima descrita é de cerca de 1 a 2 por 100 mulheres-ano. O método do muco cervical, ou de Billings, consiste na observação pela própria paciente das características do muco cervical uterino. O muco deve ser pesquisado diariamente, e assim que se perceba sua presença, as relações devem ser evitadas até três dias depois que o muco atingir seu pico. Dessa forma, o índice de gestações pode ser de 3 por 100 mulheres-ano. Os três métodos acima podem ser associados a fim de se aumentar a eficácia, recebendo a denominação de sintotérmico. Usa-se o muco e o calendário para detecção do início do período fértil e o muco e a temperatura basal para determinar-se o final deste. A utilização correta dessa tríplice associação apresenta falhas de 2 gestações em 100 mulheres-ano. A eficácia prática desses métodos de abstinência periódica é, no entanto, bem menor, com cerca de 20 gestações por 100 mulheres-ano. A ejaculação extravaginal, ou coito interrompido, não é método de abstinência periódica e consiste na retirada do pênis da vagina quando o homem perceber que está na iminência de ejacular. Requer grande motivação e autocontrole. Deve-se levar em conta que muitas vezes antes da ejaculação já ocorre saída de espermatozóides em pequena quantidade, mas suficiente para permitir uma concepção. Com o tempo, podem surgir disfunções sexuais em função da escolha desse método. Sua eficácia é baixa, com índices de falhas com mais de 25 gestações por 100 mulheres-ano. É um método que deve ser evitado e desencorajado, haja vista sua baixa eficácia, riscos de disfunções sexuais e nenhuma proteção contra DST. Conclusão A alta eficácia de um método anticoncepcional certamente é algo desejável, no entanto, a escolha de um método não deve basear-se apenas nesse item, mas, sim, levar em conta outros aspectos, como idade da paciente, paridade, estado marital, doenças que possa apresentar, efeitos indesejáveis dos métodos, necessidade de proteção contra doenças sexualmente transmissíveis, entre tantos outros. Como visto, a eficácia dos métodos anticoncepcionais disponíveis é muito variada. Entre os métodos reversíveis mais eficazes estão os injetáveis mensal e trimestral, o anticoncepcional hormonal combinado oral, o dispositivo intra-uterino e os implantes. É importante ressaltar que, 5 / 6
6 para a maioria dos métodos, a adequada orientação do uso deste é muito importante para que a máxima eficácia seja atingida. 6 / 6
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