Estudos da Literatura Brasileira
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- Giovanni Santarém Caldeira
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3 Estudos da Literatura Brasileira SOMESB Sociedade Mantenedora de Educação Superior da Bahia S/C Ltda. Presidente Vice-Presidente Superintendente Administrativo e Financeiro Superintendente de Ensino, Pesquisa e Extensão Superintendente de Desenvolvimento e>> Planejamento Acadêmico Gervásio Meneses de Oliveira William Oliveira Samuel Soares Germano Tabacof Pedro Daltro Gusmão da Silva FTC - EaD Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância Diretor Geral Diretor Acadêmico Diretor de Tecnologia Gerente Acadêmico Gerente de Ensino Gerente de Suporte Tecnológico Coord. de Softwares e Sistemas Coord. de Telecomunicações e Hardware Coord. de Produção de Material Didático Reinaldo de Oliveira Borba Roberto Frederico Merhy Jean Carlo Nerone Ronaldo Costa Jane Freire Luis Carlos Nogueira Abbehusen Romulo Augusto Merhy Osmane Chaves João Jacomel EQUIPE DE ELABORAÇÃO/PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO: PRODUÇÃO ACADÊMICA Gerente de Ensino Jane Freire Autora Állex Leilla Supervisão Ana Paula Amorim Coordenação de Curso Tatiane de Lucena Lima PRODUÇÃO TÉCNICA Revisão Final Carlos Magno Brito Almeida Santos Coordenação João Jacomel Equipe Alexandre Texugo, Angélica de Fátima, Cefas Gomes, Cláuder Frederico, Delmara Brito, Diego Aragão, Fábio Gonçalves, Francisco França Júnior, Hermínio Filho, Israel Dantas, Lucas do Vale, Márcio Serafin, Mariucha Silveira, Ruberval Fonseca e Tatiana Coutinho. Editoração Yuri Fontes e Angélica de Fátima Ilustração Francisco França e Fábio Gonçalves Imagens Corbis/Image100/Imagemsource copyright FTC EaD Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei de 19/02/98. É proibida a reprodução total ou parcial, por quaisquer meios, sem autorização prévia, por escrito, da FTC EaD - Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância. 2
4 Sumário AS ORIGENS DA NOSSA LITERATURA ERA COLONIAL O Quinhentismo O Barroco O Arcadismo O Pré-Romantismo Atividade Complementar O Romantismo O Realismo ERA NACIONAL O Parnasianismo O Simbolismo Atividade Complementar A DIVERSIDADE DA LITERATURA BRASILEIRA MODERNISTAS E MODERNOS As Vanguardas Européias O Pré-modernismo O Modernismo O Concretismo Atividade Complementar
5 Sumário Estudos da Literatura Brasileira TENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS A Poesia-Práxis e o Poema-Processo A Poesia Social e o Tropicalismo A Poesia Marginal dos anos 70 Outras Vertentes da Literatura Brasileira Atividade Complementar Atividade Orientada 47 Glossário 53 Referências Bibliográficas 54 4
6 Apresentação da Disciplina Prezado(a) aluno(a). A Literatura Brasileira é sua velha conhecida, pois durante toda a vida escolar somos convidados a estudá-la, a refletir sobre ela, seus principais escritores e movimentos literários. Toda a organização da Literatura Brasileira implica numa escolha de seu organizador e, em geral, são essas escolhas que nortearam e formaram um cânone em nossos Estudos Literários Tupiniquins. Conceitos discutíveis e complexos como origem, a verdadeira literatura brasileira, brasilidade, dependência cultural, entre outros, estão sempre pairando sobre essas organizações que são, na verdade, histórias da nossa literatura. Você vai perceber como é fascinante estudar nossos movimentos estéticos e como é produtivo estabelecer relações entre eles. Não se esqueça de que a literatura brasileira é vasta e, portanto, difícil de ser abarcada num único livro. No Bloco 01, estudaremos as origens de nossa literatura, dividindo-a em Era Colonial e Era Nacional. No Bloco 02, veremos toda a complexidade de nossa literatura, tanto no período que chamamos de modernos e modernistas, quanto naquele que denominamos tendências contemporâneas. Essas divisões têm um cunho didático e funcionam como uma síntese de todas as nossas histórias. É impossível abarcarmos todo o conhecimento acerca de tudo o que chamamos de literatura brasileira, porém, esperamos que essa síntese funcione como um pequeno passaporte para a sua grande viagem literária. Seja bem-vindo (a)! Professora Állex Leilla 5
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8 AS ORIGENS DA NOSSA LITERATURA ERA COLONIAL O Quinhentismo A literatura brasileira, como todas as outras literaturas, tem um marco inicial, ou seja, uma data ou período eleito para representar a sua origem. A origem da nossa literatura está num período a que acostumamos chamar de Quinhetismo ou Literatura de Informação. MAS, O QUE VEM A SER ISSO? Antes de mais nada, precisamos entender que Quinhentismo é um nome ligado a um referencial cronológico o séc. XVI e não estético. Esse termo pode ser usado como sinônimo de Classicismo. Implica dizer que as obras produzidas neste primeiro século prendem-se à literatura portuguesa que estava sendo produzida naquela época e, por isso, o que se produziu no Brasil integrou o conjunto da chamada literatura de viagens ultramarinas, uma vez que surgiu como prolongamento e adaptação das tradições poéticas e dramáticas do fim da idade média portuguesa. É, portanto, muito mais uma literatura sobre o Brasil ou produzida no Brasil do que uma literatura essencialmente brasileira. VOCÊ DEVE ESTAR AR SE PERGUNT GUNTANDO O QUE VEM A SER UMA LITERATURA TURA ESSENCIALMENTE BRASILEIRA, CERTO? O? Nos Estudos Literários contemporâneos não se trabalha mais com a noção de essência, de algo intrínseco que diferenciaria uma literatura da outra. Em vez desta noção datada de nacionalidade, trabalha-se, hoje em dia, com a noção de elementos culturais ou lugar da cultura, ou seja, trata-se de mapear todas aquelas particularidades que compõem um modo de vida brasileiro. Dentro dele, estão nossos valores e nossas formas de sobrevivência no mundo ocidental: como dialogamos com a Europa e com as culturas indígenas e africanas que formaram o nosso caldeirão cultural. Essas marcas culturais podem ser percebidas na produção artística e literária de uma nação e ajudam na percepção de uma identidade ou de identidades brasileiras. Assim, podemos dizer que a produção do período quinhentista não possui essas marcas porque veio, principalmente, dos esforços iniciais de conquista e colonização das novas terras. Dessa forma, o que chamamos de literatura quinhentista são manifestações em prosa, em sua maioria tratados, cartas e diários, cuja principal finalidade era descrever 7
9 Estudos da Literatura Brasileira a paisagem e a vida brasileiras, atuando como fonte de informação aos europeus. Além disso, o teatro conheceu algum desenvolvimento sob a forma de autos versificados, ou seja, peças teatrais compostas pelos jesuítas em seu trabalho de catequização do índio. Também houve manifestações poéticas, principalmente de caráter religioso ou ligadas ao esforço catequético. A literatura dessa época é, muitas vezes, chamada de informativa, porque estava presa a finalidades práticas relacionadas com a expansão ultramarina portuguesa e com a posse e colonização do Brasil. Ela é uma literatura essencialmente descritiva, de cunho propagandístico, no sentido de propagar uma ideologia portuguesacristã. MAS,, COMO FICA A QUESTÃO DO VAL ALOR ESTÉTICO DESSA LITERATURA? TURA? Devemos sempre lembrar que o valor literário do Quinhentismo é reduzido, derivando principalmente de certo encanto que a simplicidade expressiva consegue, às vezes, transmitir ou de imagens curiosas resultantes do esforço para descrever aos europeus elementos da realidade americana até então completamente desconhecidos para a Europa. Sua importância maior, para os Estudos Literários, reside no fato de essa produção ter se tornado fonte temática e até mesmo formal para momentos literários posteriores, preocupados com as raízes da nossa nacionalidade, como ocorreu no Romantismo e no Modernismo. FONTE TEMÁTICA? RAÍZES? O QUE ISTO QUER DIZER? Implica dizer que o período inicial de nossa literatura, também chamado período informativo, é uma fonte de consulta rica, documental, para onde, constantemente, os nossos autores e estudiosos da cultura brasileira se voltam, buscando explicação para mitos, cenas, imagens e outras recorrências de nossa literatura. Principais obras da literatura informativa do século XVI Os textos informativos formam um painel de vida dos anos iniciais do Brasil- Colônia, relatando-nos os primeiros contatos entre europeus e a realidade da nova terra. A opulência da flora e da fauna impressionou vivamente o colonizador, enquanto o modo de vida dos indígenas foi motivo de muita curiosidade, bem como de incompreensão, pois os colonizadores nunca abandonaram suas concepções de que possuíam uma cultura superior à dos aborígines. Assim, a terra nova e o índio não demoraram a sentir a violência do sistema colonial, dentro do qual os textos mencionados cumpriam, acima de tudo, uma finalidade prática. Eis as principais obras dessa vertente: A carta de Pero Vaz de Caminha, escrita em 1500; O diário de navegação de Pero Lopes de Sousa, escrito entre os anos 1530 e 1532, durante a expedição de Martim Afonso de Sousa; 8
10 A História da Província de Santa Cruz e O Tratado da terra do Brasil, de Pero de Magalhães Gandavo (ou Gângavo), publicados, respectivamente, em 1576 e 1826; O Tratado descritivo do Brasil em 1587 ou Notícia do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa, publicado em No século XVII, surgem os Diálogos das Grandezas do Brasil (1618), atribuídos a Ambrósio Fernandes Brandão, e a História do Brasil (1627), de Frei Vicente do Salvador. Outro nome que se destaca nessa época é o José de Anchieta, com os seus autos, como o de Na Festa de São Lourenço, representado, pela primeira vez, em Niterói (RJ), em Resumindo: a Literatura de Informação ou Quinhentismo é o conjunto de cartas e impressões de viagens produzido pelos portugueses acerca do Brasil. São textos essencialmente descritivos. Apesar de não podermos falar num estilo estético neste período, essas cartas são importantes pelo seu valor histórico: são os primeiros testemunhos da nossa origem, do nosso país. Filmes importantes para entender esta época: 1. O Nome da Rosa, de Jean-Jacques Annaud (1986); A Conquista do Paraíso, de Ridley Scott (1992); 3. A Missão, de Roland Joffé (1986). O Barroco VOCÊ COM CERTEZA JÁ LEU OU OUVIU FALAR SOBRE O MOVIMENTO ESTÉTICO CHAMADO BARROCO. O termo Barroco denomina genericamente todas as manifestações artísticas dos anos 1600 e início dos anos Além da literatura, esse termo estende-se à música, pintura, escultura e arquitetura da época. Portanto, o Barroco não é apenas um movimento literário, mas um modo estético, cultural e ideológico de fazer arte. Mesmo os estudos literários considerando o Barroco o primeiro estilo de época da literatura brasileira e Gregório de Matos o primeiro poeta efetivamente brasileiro, com sentimento nativista manifesto, na realidade, nesse período ainda não se pode isolar o Brasil de Portugal, ou seja, não se pode falar de uma escrita realmente brasileira. Como afirma o historiador Alfredo Bosi: No Brasil houve ecos do Barroco europeu durante os séculos XVII e XVIII: Gregório de Matos, Botelho de Oliveira, Frei Itaparica e as primeiras academias repetiram motivos e formas do barroquismo ibérico e itálico. [BOSI, 1998:182]. Além disso, os dois principais autores Padre Antônio Vieira e Gregório de Matos tiveram suas vidas divididas entre Portugal e Brasil. O primeiro, porque nasceu em Portugal e veio para cá a serviço da Coroa catequizar os índios; o segundo, porque estudou em Lisboa e viveu no Brasil esperando, sempre, retornar à capital portuguesa. 9
11 Estudos da Literatura Brasileira MAS,, VOCÊ DEVE ESTAR SE PERGUNT GUNTADO DE ONDE VEM O TERMO BARROCO ARROCO,, CERTO? A origem da palavra barroco é controvertida. Alguns etimologistas afirmam que ela está ligada a um processo mnemônico (relativo à memória) que designava um silogismo aristotélico com conclusão falsa. Segundo outros, designaria um tipo de pérola de forma irregular ou mesmo um terreno desigual, assimétrico. Qualquer que seja a hipótese aceita, é possível perceber que há relações com a estética barroca: jogo de idéias, rebuscamento, assimetria. Até hoje, quando nos perdemos diante de uma leitura ou da fala de alguém, costumamos dizer que entramos num terreno barroco, ou seja, complexo, onde é possível se perder facilmente. Isso ocorre, justamente, devido à natureza dessa estética: apresenta, lado a lado, idéias opostas, conflituosas, em que a própria voz poética se reconhece dentro de um abismo. O Barroco também é chamado de Seiscentismo por ser a estética dominante dos anos 1600 (século XVII). No Brasil, o Barroco tem seu marco inicial em 1601 com a publicação do poema épico Prosopopéia, de Bento Teixeira, que introduz definitivamente o modelo da poesia camoniana (do poeta português Luiz Vaz de Camões) em nossa literatura. O Barroco estende-se por todo o século XVII e início do século XVIII. O final do Barroco brasileiro só se concretizou em 1768, com a fundação da Arcádia Ultramarina e com a publicação do livro Obras, de Cláudio Manuel da Costa. No entanto, já a partir de 1724, com a fundação da Academia Brasílica dos Esquecidos, o movimento academicista ganhava corpo, assinalando a decadência dos valores defendidos pelo Barroco e a ascensão do movimento árcade. Características do Barroco O estilo barroco nasceu da crise de valores renascentistas ocasionada pelas lutas religiosas e pela crise econômica vivida em conseqüência da falência do comércio europeu com o Oriente. O homem do Seiscentismo vivia um estado de tensão e desequilíbrio, do qual tentou evadir-se pelo culto exagerado da forma, sobrecarregando a poesia de figuras, como a metáfora, a antítese, a hipérbole e a alegoria. Repare na figura abaixo: Veja que todo o rebuscamento que aflora na arte barroca é refluxo do dilema, do conflito entre o terreno e o celestial, o homem e Deus (antropocentrismo e teocentrismo), o pecado e o perdão, a religiosidade medieval e o paganismo renascentista, o material e o espiritual, que tanto atormenta o homem do século XVII. A arte assume, assim, uma tendência sensualista, caracterizada pela busca do detalhe num exagerado rebuscamento formal. 10
12 Podemos notar dois estilos no barroco literário: o Cultismo e o Conceptismo. Cultismo: é caracterizado pela imagem rebuscada, culta, extravagante; pela valorização do pormenor mediante jogos de palavras, com visível influência do poeta espanhol Luís de Gôngora; daí o estilo ser também conhecido por Gongorismo. Conceptismo: é marcado pelo jogo de idéias, de conceitos, seguindo um raciocínio lógico, racionalista, que utiliza uma retórica aprimorada. Um dos principais cultores do Conceptismo foi o espanhol Quevedo, do qual deriva o termo Quevedismo. Principais representantes no Brasil Padre Antônio Vieira Vieira nasceu em Lisboa em Com sete anos veio para a Bahia; em 1632 entrou para a Companhia de Jesus. Após a Restauração (1640), movimento pelo qual Portugal liberta-se do domínio espanhol, retornou à terra natal, saudando o rei D. João IV, de quem se tornaria confessor. Politicamente, Vieira tinha contra si a pequena burguesia cristã, por defender o capitalismo judaico e os cristãos-novos; os pequenos comerciantes, por defender um monopólio comercial; os administradores e colonos, por defender os índios. Essas posições, principalmente a defesa dos cristãos-novos, custaram a Vieira uma condenação pela Inquisição: ficou preso de 1665 a Faleceu em 1697, no Colégio da Bahia. Gregório de Matos Guerra Nascido na Bahia, provavelmente a 20 de dezembro de 1633, Gregório de Matos firmou-se como o primeiro poeta brasileiro. Após os primeiros estudos no Colégio dos Jesuítas, foi para Coimbra (Portugal), onde se graduou em Direito. Formado, viveu alguns anos em Lisboa, exercendo a profissão; por suas sátiras foi obrigado a retornar à Bahia. Em sua terra natal, foi convidado a trabalhar com os jesuítas no cargo de tesoureiro-mor da Companhia de Jesus. Mas novamente suas sátiras o fizeram abandonar os padres e, mais tarde, foi degredado para Angola. Já bastante doente, retornou ao Brasil, mas sob duas condições: estava proibido de pisar em terras baianas e de apresentar suas sátiras. Leitura recomendada: Os sermões, Padre Antônio Vieira; Sonetos II, III, IV, V e VI, de Gregório de Matos. Resumindo: a essência do movimento barroco é o seu conflito entre céu e terra, o que dá à sua produção uma forte impressão de densidade, devido ao abismo entre o desejo do corpo de gozar a vida e o medo de condenação (sofrimento) da alma. Esse abismo gera uma angústia, constantemente revelada pelos autores barrocos. 11
13 O Arcadismo Estudos da Literatura Brasileira O Arcadismo, Setecentismo (1700) ou Neoclassicismo é o período que caracteriza, principalmente, a segunda metade do século XVIII, tingindo as artes de uma nova tonalidade burguesa. VOCÊ SE LEMBRA QUE ESSA É CONSIDERADA A A ESCOLA DA SIMPLICIDADE, DEVIDO AO CULTO À VIDA NO CAMPO? Vivia-se o Século das Luzes, o Iluminismo burguês que prepara o caminho para a Revolução Francesa. Veremos como isso ocorreu. É importante entender que o Arcadismo tem espírito nitidamente reformista, pretendendo reformular o ensino, os hábitos, as atitudes sociais, uma vez que é a manifestação artística de um novo tempo, de uma nova ideologia e da emancipação política da burguesia. Essa nova classe social, a burguesia, é responsável pelo desenvolvimento do comércio e da indústria e já assistia a algumas vitórias do seu modo de vida sobre os demais na Inglaterra e Estados Unidos. Na França, a partir de 1750, os filósofos atacam o poder real e clerical e denunciam a corrupção dos costumes com grande violência. No Brasil, considera-se como data inicial do Arcadismo o ano de 1768, em que ocorrem dois fatos marcantes: a fundação da Arcádia Ultramarina, em Vila Rica, e a publicação de Obras, de Cláudio Manuel da Costa. Aprendemos com a História Mundial que o surgimento da burguesia implica num novo sistema econômico, político e social. Todavia, é na literatura que mais podemos perceber a ideologia e as marcas culturais burguesas. O Arcadismo inaugura de forma clara e bastante interessante esse diálogo da classe burguesa com a arte. A Escola Setecentista desenvolve-se até 1808, com a chegada da Família Real ao Rio de Janeiro, a qual, com suas medidas político-administrativas, permite a introdução do pensamento pré-romântico no Brasil. Na verdade, o culto à simplicidade árcade já traz em si um valor romântico porque trabalha, embora de modo tímido, com a idéia de junção entre poesia e poeta. Mas, antes de falarmos em Romantismo, vejamos as características do arcadismo. Características do Arcadismo Os modelos seguidos pelos árcades são os clássicos greco-latinos e os renascentistas; a mitologia pagã é retomada como elemento estético. Daí a escola ser conhecida também como Neoclassicismo. 12
14 Repare na figura abaixo como a paisagem fica limpa dos exageros barrocos e como os elementos campestres surgem com naturalidade. MAS, O QUE SIGNIFICA ESSA PREFERÊNCIA? Significa que, inspirados na frase de Horácio (poeta latino clássico) Fugere urbem ( fugir da cidade ) e levados pela teoria de Rosseau (filósofo e poeta francês iluminista) acerca do bom selvagem, os árcades voltaram-se para a natureza em busca de uma vida simples, bucólica, pastoril. É a procura do locus amoenus (lugar ameno), de um refúgio ameno em oposição aos centros urbanos monárquicos, ou seja, a luta do burguês culto contra a aristocracia se manifesta na busca da natureza. Cumpre salientar que esse objetivo configurava apenas um estado de espírito, uma posição política e ideológica, uma vez que todos os árcades viviam nos centros urbanos e, burgueses que eram, lá estavam seus interesses econômicos, isto é, todos os poetas árcades eram comerciantes ou homens de negócio. Isso justifica falar-se em fingimento poético no Arcadismo, fato que transparece no uso dos pseudônimos pastoris. Eles não viviam os valores que pregavam nas poesias, entretanto, tais valores simbolizaram a luta de classes que estava sendo travada no mundo inteiro (aristocracia e clero X burguesia). As características do Arcadismo em Portugal e no Brasil seguem a linha européia: a volta dos padrões clássicos da Antiguidade e do Renascimento; a simplicidade; a poesia bucólica, pastoril; o fingimento poético e o uso de pseudônimos. Quanto ao aspecto formal, temos o soneto, os versos decassílabos, a rima optativa e a tradição da poesia épica. Os principais autores deste período foram Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga, Basílio da Gama e Frei de Santa Rita Durão. Leitura recomendada: Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga; Cantatas, de Cláudio Manuel da Costa. 13
15 Estudos da O Pré-Romantismo Literatura Brasileira VOCÊ SE LEMBRA DE TER ESTUDADO PRÉ- ROMANTISMO? NÃO? POIS NÃO SE PREOCUPE, ELE RARAMENTE É ESTUDADO NAS ESCOLAS! Devemos entender que há muitas fases dentro das fases que a História Oficial chama de colonial. E, dentro delas, a importância da Literatura se destaca, pois é através da pena de Caminha, por exemplo, que os portugueses tomam conhecimento oficial dos índios e dos primeiros contatos travados entre colonizador e colonizado. E é através dela, também, que pudemos delimitar uma origem para as nossas letras. As imagens na produção literária são formadas, registradas e viajam além-mar, dando conta de todo um passado mítico, ao qual só podemos chegar através da palavra. Não aparecem nas crônicas dos nossos primeiros escritores as constantes brigas entre holandeses, franceses e ingleses pelo território brasileiro.não aparecem de forma clara os piratas que saqueavam e contrabandeavam o pau-brasil. Não aparece o pavor que a Coroa possuía de perder o Brasil para outros colonizadores europeus. E nem mesmo a demora de quase 30 anos por que passou a Coroa até se decidir a iniciar um processo real de colonização, comandado, em 1530, por Martin Afonso de Souza. Entretanto, aparecem desde muito cedo a nomeação de elementos locais e a descrição de costumes que se tornaram, séculos depois, brasileiros. No entendimento da formação da Literatura Brasileira, as relações culturais, políticas, lingüísticas e econômicas entre Brasil e Portugal devem ser não apenas de interesse do estudioso, mas, também, consistirem em um link para ampliar as noções de colônia e nação. Assim, existe, embora que breve, uma fase a que chamamos de Pré-Romantismo, que tem como destaque o escritor Gonçalves de Magalhães, com o texto Ensaio sobre a História da Literatura no Brasil, uma espécie de manifesto romântico brasileiro, publicado em Paris, na Niterói, Revista Brasiliense (1836). Gonçalves de Magalhães ( ) se preocupava, já neste período, com a relação entre país colonizado e nação. Segundo ele: Cada povo tem sua literatura, como cada homem tem o seu caráter, cada árvore o seu fruto. Mas esta verdade, que para os primitivos povos é incontestável e absoluta, todavia alguma modificação experimenta entre aqueles, cuja civilização apenas é um reflexo da civilização de outro povo. Podemos perceber como a relação é tensa e como ao escritor cabia não só a reflexão sobre o problema, bem como a busca de uma leitura que viabilizasse a idéia de nação. Ser dependente de Portugal é mais do que um capítulo na nossa história, é uma marca de origem, constitui um motivo de busca incessante de corte, de identidade e independência. Mesmo as viagens ou moradas dos nossos escritores em Portugal não eram feitas de forma automática, sem trocas, sem interferências e somente para profissionalização. 14
16 Portugal era não apenas a influência, mas a ligação com o resto da Europa, espécie de passaporte, para onde os nossos escritores, mesmo depois da independência do país, iam com freqüência buscar as novas teorias poéticas e intelectuais a serem introduzidas no Brasil. É assim, no exílio, longe do Brasil, que nossos autores retomam e reforçam a velha idéia portuguesa do Brasil como paraíso tropical. Transformar esse paraíso em um campo de produção de poesia e arte era o que todos eles almejavam. VAMOS ENTENDER JUNTOS ESTE PROCESSO? Essas viagens constantes para fora do Brasil justificam a imagem de paraíso ressaltada nos poetas da fase colonial e, mais tarde, enfatizada na fase Romântica ou Nacionalista. E é também a partir de tais viagens que poetas como Gonçalves de Magalhães, introdutor do Romantismo no Brasil, autor de Suspiros Poéticos e Saudades, começam a se preocupar com o registro, a documentação da nossa literatura. Preocupação sintomaticamente romântica: busca de origem e de identidade. Desta forma, a noção de pátria começa a realmente se desenvolver à distância, no exílio, em confronto com o europeu e sua tradição. CONFRONTO? COMO ASSIM? Os nossos poetas se sentiam sem chão, sem espelho, sem origem, ao conhecer a Europa e toda a sua tradição cultural e literária. Então começaram a tentar escrever panoramas históricos com a finalidade de apresentar um esboço rápido do passado literário brasileiro. Por isso que o Romantismo, em seguida, irá eleger o índio como nosso heróico ancestral, uma vez que a Europa tinha a Idade Média para pesquisar e inserir em sua identidade, enquanto nós não tínhamos nenhum registro de nada que foi feito ou produzido no Brasil antes da chegada dos portugueses. Vale lembrar que a essa altura os nossos escritores viajavam muito para a França e de lá traziam idéias e costumes, além do gosto pela Literatura Francesa. Nesse processo de autodescoberta do país e suas origens, aparecem traços de lusofobia (aversão pela cultura portuguesa) que marcam o fim do período colonial e início do nacional. Entretanto, essa aversão ao nosso colonizador implicava numa substituição do modelo português pelo francês, só abandonado muito tempo depois, no Modernismo. Resumindo: busca de origem e amor à pátria se confundem no Pré- Romantismo, período que não é ressaltado pela nossa Historiografia Oficial, mas existiu como uma fase de transição entre o fim do Arcadismo e o Romantismo propriamente dito. Gonçalves de Magalhães inicia a linha de historiadores literários brasileiros, que buscam uma identidade para o nosso país e incorporam a produção colonial à literatura brasileira. 15
17 Estudos da Literatura Brasileira Resumindo: O Quinhentismo ou Literatura de Informação, o Barroco ou Seiscentismo e o Arcadismo ou Neoclassicismo são os primeiros movimentos estéticos da nossa literatura brasileira. As diferenças entre eles estão demarcadas nas páginas anteriores, porém, jamais devemos nos esquecer de que esses três períodos, juntos, integram a Era Colonial de nossa literatura, porque mostram como o Brasil era dependente, político e culturalmente, da Metrópole, isto é, de Portugal. O Pré- Romantismo é uma transição que mostra as primeiras tentativas feitas em prol de uma literatura claramente brasileira. Sites interessantes: Atividades Complementares Agora que já estudamos o Quinhentismo, pesquise sobre a Carta de Pero Vaz de Caminha, em: Leia-a e responda: 1. De que forma o índio, sua linguagem e costumes são vistos por Pero Vaz de Caminha? Pesquise sobre Bento Teixeira, poeta barroco. Leia o seu poema Prosopopéia em: Analise e responda se esse poema se enquadra nas características barrocas que acabamos de estudar. Justifique sua resposta. 16
18 2. 2. Tente descobrir porque, apesar de ser considerado o marco do Barroco no Brasil, Bento Teixeira não é considerado tão importante por muitos historiadores da literatura. Pesquise e responda Leia um poema de Gregório de Matos e um de Tomás Antônio Gonzaga. Atente para as principais diferenças entre eles e elabore em cinco linhas o que mais se destaca nessas duas vertentes da nossa literatura. O Romantismo ERA NACIONAL Romantismo. Essa palavra é velha conhecida nossa. Freqüentemente, no nosso dia-a-dia usamos muito a palavra romantismo para falarmos de alguém ou de alguma atitude cuja carga ilusória ou desconexão com a realidade seja latente. DE ONDE VEM ESSE HÁBITO NOSSO? Bem, existe a palavra no seu uso cotidiano, que já foi até banalizada, conforme exemplo acima, e existe o termo que designa um estilo de época, o período Romântico, que está associado à Revolução Francesa, à plena ascensão da burguesia e ao liberalismo econômico. Após a Revolução Francesa, nota-se um acentuado progresso político, social e econômico da burguesia, que, aos poucos, vai assumindo o lugar de classe dominante, lugar anteriormente ocupado pela aristocracia de sangue ou aristocracia real: aqueles que eram filhos, descendentes diretos ou indiretos de reis e rainhas e que nada precisavam fazer para serem reconhecidos no mundo, herdavam a fortuna e título por causa do sangue. Com a ascensão da burguesia, aconteceram muitas alterações em pouco tempo: uma quantidade enorme de inventos acelerou o ritmo de vida, a população da Europa 17
19 Estudos da Literatura Brasileira duplicou-se no século XIX, os novos ideais sociais e políticos multiplicaramse em desconcertante confusão. A doutrina filosófica em que se apóiam os princípios burgueses é o liberalismo, que valoriza a iniciativa individual e a capacidade criadora de cada um. Não podemos esquecer, portanto, que o Arcadismo, anterior a esse período, foi importante porque semeou a ideologia burguesa no mundo. E COMO ISSO OCORREU NO NOSSO PAÍS? Temos diversas formas de entender o Romantismo e sua importância no Brasil. Primeiro, comecemos pela história. A independência política do Brasil aconteceu em 1822; o início oficial do nosso Romantismo é situado pelos estudiosos em Dessa forma, o Romantismo corresponde ao movimento que procurou promover a independência cultural do país, perseguindo a criação de uma arte e de uma literatura marcadamente nacionais, que pudessem constituir nossa forma de expressão mais autêntica. Nesse momento pregava-se a valorização do elemento local e das feições particulares de cada povo como material de elaboração artística; há, portanto, uma forte correspondência entre as propostas românticas e o momento social e político vivido pelo país na primeira metade do século XIX. A produção literária do Romantismo foi muito grande. A poesia costuma ser dividida em três gerações, cada uma delas devidamente caracterizada. A prosa de ficção surgiu e desenvolveu-se nesse período, chegando a produzir trabalhos de mérito. Também o teatro consolidou-se nessa época. Para melhor entender a produtividade romântica, todas as histórias da literatura brasileira dividem esse período em três fases ou gerações. As gerações românticas Primeira Geração geração nacionalista ou indianista. É marcada pela exaltação da natureza, volta ao passado histórico, medievalismo, criação do herói nacional na figura do índio, de onde surgiu a denominação de geração indianista. O sentimentalismo e a religiosidade são outras características presentes. Entre os principais autores podemos destacar Gonçalves Dias, Gonçalves de Magalhães e Araújo Porto-Alegre. Segunda Geração geração do mal do século. Fortemente influenciada pela poesia de Lord Byron e Musset, é também chamada de geração byroniana, essa é a geração ultra-romântica da nossa literatura. MAS,, QUAL A SUA DIFERENÇA EM RELAÇÃO À ANTERIOR? A diferença é muito grande. Devemos entender que a segunda geração estava impregnada de egocentrismo, negativismo boêmio, pessimismo, dúvida, desilusão adolescente e tédio constante, elementos característicos do ultra-romantismo, o chamado 18
20 verdadeiro mal-do-século nome dado à tuberculose, doença que abateu a maioria dos poetas dessa segunda fase, que morreu muito jovem. Todavia, a principal diferença desta geração em relação à outra é que o seu tema preferido é a fuga da realidade, que se manifesta na idealização da infância, nas mulheres virgens sonhadas e na exaltação da morte, distanciando-se da necessidade dos primeiros românticos de estabelecer uma origem e um herói para o Brasil. Os principais poetas dessa geração foram Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Junqueira Freire e Fagundes Varela. Álvares de Azevedo Casimiro de Abreu Terceira Geração - geração condoreira Caracterizada pela poesia social e libertária, essa geração reflete as lutas internas da segunda metade do reinado de D. Pedro II. Sofreu intensamente a influência do poeta francês Victor Hugo e de sua poesia político-social, daí ser conhecida como geração hugoana. Ela rompe com a geração do mal do século, principalmente por trazer uma preocupação com o social e com ideais de liberdade. POR QUE É CHAMADA DE GERAÇÃO CONDOREIRA? O termo condoreirismo é conseqüência do símbolo de liberdade adotado pelos jovens românticos: o condor, águia que habita o alto das cordilheiras dos Andes. Seu principal representante foi Castro Alves, mas tivemos também Tobias Barreto e Sousandrade nesta fase. Há, portanto, nesta terceira geração, um retorno às preocupações sociais e nacionais, que foi interrompida na segunda geração. Leia mais sobre essa terceira fase romântica em: index.cfm?fuseaction=detalhe&cd_verbete=5370 Resumindo: as três fases da poesia romântica no Brasil se diferenciam pela preocupação com as origens e identidade nacionais (primeira geração), pelo pessimismo e fuga da realidade (segunda geração) e pelo teor político e social (terceira geração). 19
21 Estudos da Literatura Brasileira A prosa do Romantismo O estilo O movimento romântico foi responsável pelo surgimento do romance no Brasil. Até então, os textos escritos em prosa estavam muito distantes desse tipo de narrativa. Cronologicamente, o primeiro romance brasileiro foi O Filho do Pescador (1843), de Teixeira e Sousa. Essa obra, no entanto, tem apenas valor histórico, pois não traz uma elaboração literária propriamente dita. O primeiro lugar na prosa romântica cabe ao romance A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo. A partir dessa obra, muitos romances foram publicados, atendendo a um número cada vez maior de leitores O romance romântico apresenta no Brasil quatro tendências: o romance urbano, o indianista, o regionalista e o histórico. Romance urbano Esse gênero de romance, também conhecido como romance de costumes, procura retratar e criticar os costumes da sociedade carioca do século XIX. O criador desse gênero no Brasil foi Joaquim Manuel de Macedo. Destaca-se, também, José de Alencar nos romances Senhora, Cinco minutos, A viuvinha, Lucíola, Diva, A pata da gazela, Senhor d ouro. Romance indianista O romântico brasileiro volta-se para a época do descobrimento, valorizando o indígena, uma vez que não tivemos Idade Média e no mundo inteiro a literatura procura estabelecer uma origem para os povos. Essa busca das nossas raízes conduz ao nacionalismo, uma das principais características românticas. MAS, O QUE VEM A SER O NACIONALISMO? Em linhas gerais, podemos dizer que nacionalismo é a tendência a valorizar os aspectos culturais, históricos, políticos e estéticos de uma nação, aquela a que pertencemos. Devemos diferenciar nacionalismo de ufanismo, pois o primeiro é uma valorização do que é nacional, enquanto o segundo é uma mistura de hipervalorização do nacional com um forte repúdio a qualquer valor estrangeiro. Para sermos nacionalistas, entretanto, não precisamos ser ufanistas, pois o ufanismo concebe que os nossos valores são superiores aos de outros países, enquanto o nacionalismo apenas destaca a importância de se valorizar o que é nosso, sem desmerecer o que é estrangeiro. Nosso grande representante na prosa indianista é José de Alencar, com os romances O guarani, Iracema e Ubirajara. 20
22 Romance regionalista Para alguns escritores, o verdadeiro Brasil era o sertão, que ainda conservava intactos traços de nossa cultura e de nossa natureza. Esses escritores criaram o romance regionalista, que é, de certa forma, o outro lado do nacionalismo literário explorado pelo indianista. Procuraram fixar traços peculiares de determinadas regiões do país. O primeiro desses regionalistas foi Bernardo Guimarães, que retratou o interior de Minas Gerais e de Goiás em suas obras: A Escrava Isaura e O seminarista. Depois temos Visconde de Taunay, que ficou conhecido por sua obra Inocência, em que procurou registrar algumas peculiaridades do falar sertanejo, além de Franklin Távora, autor de O Cabeleira, que é considerado o criador da literatura do Nordeste. Romance histórico Preocupados em enfatizar o nacionalismo em suas obras, alguns de nossos escritores românticos dedicaram-se à reconstituição de fatos da história brasileira. Entre os autores que se dedicaram a esse gênero, destaca-se José de Alencar, com as obras As Minas de Prata e Guerra dos Mascates. Você percebeu que o período romântico é muito extenso e produtivo, isso porque a literatura brasileira, finalmente, encontra sua chamada identidade. Não se pode esquecer que esse momento guarda a chave de várias respostas para questões sobre onde começa o Brasil no nosso imaginário e a idéia de nação que nos foi passada através de hinos e da escola. Leia mais sobre a prosa romântica em: O Realismo Realismo é a denominação genérica de uma reação artística aos ideais românticos. O realismo caracterizou a segunda metade do século XIX. POR QUE HOUVE ESSA REAÇÃO? Devido às profundas transformações vividas pela sociedade européia, que exigiam uma nova postura diante da realidade. Basicamente, não havia mais espaço para as exageradas idealizações românticas. Portanto, o Realismo tem de ser analisado a partir de um novo ponto de referência que surgiu no horizonte da época: a Europa vivia a primeira fase da Revolução Industrial, ao mesmo tempo em que conhecia o desenvolvimento do pensamento científico e das doutrinas filosóficas e sociais. 21
23 Estudos da Literatura Brasileira O QUE VEM A SER ESSE PENSAMENTO CIENTÍFICO? Durante a segunda metade do século XIX, difundem-se o pensamento dialético de Hegel (tese, antítese e síntese), o positivismo de Augusto Comte, o socialismo científico de Marx e Engels, e o evolucionismo de Darwin. No Brasil, o Realismo confunde-se com o fim da escravidão, com a proclamação da República e com o início da economia cafeeira e do trabalho assalariado do imigrante europeu. Vejamos as principais características do Realismo. Características do Realismo As características do Realismo estão intimamente ligadas ao momento histórico em que se insere esse movimento literário, refletindo, dessa forma, a postura do positivismo, do socialismo e do evolucionismo, com todas as suas variantes. Assim é que o objetivismo aparece como negação ao subjetivismo romântico e nos mostra o homem voltado para aquilo que está diante e fora dele, o não-eu; ou seja, o personalismo cede terreno ao universalismo. O materialismo leva à negação do sentimentalismo e da metafísica. O nacionalismo e a volta ao passado histórico são deixados de lado; o Realismo só se preocupa com o presente, com o contemporâneo, isto é, o que estava acontecendo naquele momento. Outra característica forte do Realismo é a crítica ao modo de vida romântico, o que gera, muitas vezes, uma anarquização dos valores burgueses, como ocorre em Madame Bovary, romance do autor francês Gustave Flaubert, em que uma personagem feminina (Ema), leitora de romances românticos, adoece por não conseguir vivenciar a paixão que é descrita nos livros. Nessa mesma linha de crítica à busca exagerada de viver o grande amor e encontrar o par perfeito, idealizados pelos românticos, vem O Primo Basílio, do escritor português Eça de Queirós. Romance realista Cultivado no Brasil por Machado de Assis, é uma narrativa voltada para a análise psicológica e que critica a sociedade a partir do comportamento de determinados personagens. É interessante constatar que os cinco romances da fase realista de Machado apresentam nomes próprios em seus títulos Brás Cubas; Quincas Borba; Dom Casmurro; Esaú e Jacó; Memorial de Aires, revelando inequívoca preocupação com o indivíduo. O romance machadiano analisa a sociedade através de personagens capitalistas, ou seja, pertencentes à classe dominante: Brás Cubas não produz, vive do capital, o mesmo acontecendo com Bentinho (personagem de Dom Casmurro). Já Quincas Borba era louco e mendigo até receber uma herança. O único dos personagens centrais de Machado que trabalhava era Rubião (professor), mas recebe a herança de Quincas Borba, muda-se para o Rio e não trabalha mais, vivendo do capital. Assim, o romance realista é documental, retrato de uma época em que os valores burgueses já estavam sendo questionados e substituídos por outros. Entretanto, não 22
24 podemos nos esquecer de que Machado de Assis imprime uma marca própria a seus romances, sendo, muitas vezes, considerado o menos realista de todos os escritores brasileiros da época, isto porque o retrato que faz de suas personagens ultrapassa a caricatura e a mera descrição, para aprofundar a análise psicológica e social. Romance naturalista Foi cultivado no Brasil por Aluísio Azevedo e por Júlio Ribeiro. Muitos historiadores da literatura brasileira colocam Raul Pompéia como romancista naturalista, entretanto, o seu caso é muito particular, pois seu romance O Ateneu ora apresenta características naturalistas, ora realistas, ora impressionistas. Sendo, assim, classificado como romance naturalista por uma questão de época por ter sido publicado naquele período. Qual a difer erença ença do romance natur turalista para a o realista? A primeira diferença é o universo dos personagens, a narrativa realista, embora critique o modo de vida burguês romântico, traz quase sempre personagens de classe social alta ou caminhando para ficarem ricos, enquanto a narrativa naturalista é marcada pela vigorosa análise social a partir de grupos humanos marginalizados, em que se destaca o coletivo e não o indivíduo. Interessa notar que também os títulos dos romances naturalistas apresentam a mesma preocupação: O Mulato, O cortiço, Casa de pensão, O Ateneu. Ou seja, diferem-se dos títulos individuais do Realismo de Machado, por exemplo. Sobre o romance O cortiço, de Aluísio de Azevedo, há, inclusive, uma tese bem popular de que o principal personagem não é João Romão, nem Bertoleza, nem Rita Baiana, nem Pombinha, mas, sim, o próprio cortiço. Por outro lado, o naturalismo apresenta romances experimentais: a influência de Darwin se faz sentir na máxima naturalista, que enfatiza a natureza animal do homem; isto é, antes de usar a razão, o homem deixa-se levar pelos instintos naturais, não podendo ser reprimido em suas manifestações naturais como o sexo pela moral da classe dominante. A constante repressão leva às taras patológicas, tão ao gosto naturalista; em conseqüência, esses romances, erroneamente tachados por alguns de pornográficos, são mais ousados, apresentando descrições minuciosas de atos sexuais e tocando, inclusive, em temas então proibidos, como a homossexualidade, tanto masculina, como em O Ateneu, quanto feminina, em O cortiço. Resumindo: o realismo foi uma reação aos exageros românticos que trouxe de volta a objetividade ao texto.para entender o Realismo nada melhor do que ler os seus romances, porque a linguagem que eles trazem falam por si só e trazem toda a influência do cientificismo, de forma direta, na construção que o narrador faz de seus personagens. Não deixe de ler: Aluísio de Azevedo, Raul Pompéia e, principalmente, Machado de Assis. Pesquise mais em: 23
25 Estudos da Literatura Brasileira O Parnasianismo O Parnasianismo é uma manifestação poética da época do Realismo, embora ideologicamente não mantenha todos os pontos de contato com os romancistas realistas e naturalistas. É a estética da arte pela arte, ou da arte sobre a arte, com seus poetas à margem das grandes transformações do final do século XIX e início do XX e cultuando, sobretudo, a forma, em detrimento do conteúdo. A nova estética se manifesta a partir do final da década de 1870, prolongando-se até a Semana de Arte Moderna (em alguns casos chegou a ultrapassar o ano de 1922). Sua influência é basicamente francesa, a partir da própria denominação, que não passava de uma alusão às antologias publicadas na França a partir de 1866 com o título Parnasse Contemporain. A poesia parnasiana, numa postura anti-romântica, baseava-se no binômio objetividade temática/culto da forma. A objetividade temática surge com a negação ao sentimento romântico, numa tentativa de atingir a impassibilidade e a impessoalidade. Opunha ao subjetivismo decadente o universalismo daí resultar uma poesia carregada de descrições objetivas e impessoais. Retorna-se à Antiguidade Clássica e ao seu racionalismo e formas perfeitas. Surge a poesia de meditação, filosófica, mas artificial. Entretanto, o traço mais característico da poética parnasiana é o culto da forma: a forma fixa representada pelos sonetos; a métrica dos versos alexandrinos (12 sílabas poéticas) e decassílabos perfeitos; a rima rica, rara e perfeita. Tudo isso contrapondo-se aos versos livres e brancos dos românticos. Em suma, é o endeusamento da forma. Dos poetas parnasianos brasileiros destacam-se três, conhecidos como a tríade parnasiana: Olavo Bilac, Raimundo Correia e Alberto Oliveira. Por ser tão radical em relação ao culto da forma fixa, o parnasianismo foi duramente criticado pelo movimento estético modernista, que veio depois. Leia mais sobre o Parnasianismo em: O Simbolismo O Simbolismo, na literatura brasileira, foi contemporâneo do Parnasianismo, mas isso só ocorre no Brasil, pois, no mundo inteiro, o Simbolismo já trazia um rompimento com o formalismo parnasiano, preparando o terreno para a explosão do modernismo. Essa característica histórica da literatura brasileira fez com que, momentos depois, já no Modernismo, o grande combate se desse entre parnasianos e modernistas, uma vez que a estética parnasiana ainda vigorava, como se o Simbolismo não tivesse existido e rompido com a estética parnasiana. Os primeiros sinais do Simbolismo no Brasil podem ser percebidos já no trabalho de Teófilo Dias, cujas Fanfarras (publicadas em 1882) são consideradas, como sabemos, a primeira obra parnasiana da nossa literatura, entretanto, já trazia elementos simbolistas. Em 1889 são publicadas as Canções da Decadência, Medeiros e Albuquerque ( ); no ano seguinte surgem os Versos, de Venceslau de Queirós ( ), 24
26 livros considerados precursores do Simbolismo. A característica comum a esses três poetas é a forte influência de Charles Baudelaire, poeta francês, cuja obra serviu de modelo a parnasianos e simbolistas. Você percebe, portanto, que há uma mistura entre um movimento e outro, correto? Pois você está certíssimo! É somente a partir de 1891 que o movimento simbolista começa a se definir com clareza: surge um grupo de poetas em torno do jornal carioca Folha Popular, que passa a publicar artigos e textos de figuras como Emiliano Perneta e Cruz e Sousa. Em 1893, a publicação de Missal e de Broqueis, de Cruz e Sousa, consolida a implantação do movimento simbolista na literatura brasileira. Combatidos pelos parnasianos, que desfrutavam grande prestígio na época, os simbolistas não encontraram boa receptividade e acabaram desenvolvendo um trabalho quase marginal, agrupados ao redor de algumas revistas de vida normalmente efêmera. Além do grupo carioca inicial e de outros do Rio de Janeiro, o movimento conheceu seguidores em São Paulo, em Minas Gerais, na Bahia, no Paraná e no Rio Grande do Sul. Seus principais poetas foram Cruz e Sousa, Alphonsus de Guimaraens e Pedro Kilkerry. A prosa do período não alcançou resultados muito satisfatórios, não sendo mencionada em nenhuma história da literatura brasileira. Vejamos as principais características desse movimento Características do Simbolismo O simbolismo começa por repudiar o Realismo e suas manifestações. De fato, a nova estética rejeita o cientificismo, o materialismo, o racionalismo, valorizando, em contrapartida, as manifestações metafísicas e espirituais, o que equivale a dizer que ela corresponde à negação do Naturalismo e do Parnasianismo. A realidade objetiva não interessa mais; o homem volta-se para uma realidade subjetiva, retomando um aspecto abandonado desde o Romantismo. O eu passa a ser o universo, mas não era mais o eu do Romantismo: os simbolistas vão em busca da essência do ser humano, daquilo que ele tem de mais profundo e universal a alma. Daí a sublimação, tão procurada pelos simbolistas: a oposição entre matéria e espírito, a purificação, por meio da qual o espírito atinge as regiões etéreas, o espaço infinito. Em última análise, trata-se de uma oposição entre corpo e alma em que a alma só se liberta quando se rompem as correntes que a aprisionam ao corpo, ou seja, com a morte. Em conseqüência desse subjetivismo, dessa valorização do inconsciente e do subconsciente, dos estados d alma, da busca do vago, do diáfano, do sonho e da loucura, o Simbolismo desenvolve uma linguagem carregada de símbolos (o trópos, isto é, o desvio, a mudança de significado de uma palavra ou expressão), em clara oposição a uma linguagem mais seca e impessoal, parnasiana. No Simbolismo, tudo é sugestão, sugerir, eis o sonho.era a lei do poeta simbolista francês Stéphane Mallarmé ( ). As palavras transcendem o significado, ao mesmo tempo que apelam para a totalidade da nossa percepção, ou seja, para todos os sentidos. Daí a linguagem simbólica e o uso constante de sinestesias (exploração de sensações via os cinco sentidos humanos) e de aliterações (repetição da primeira consoante de uma palavra nas palavras seguintes). A musicalidade é uma das características mais destacadas da estética simbolista. 25
27 Estudos da Literatura Brasileira Leia sobre dois dos principais autores simbolistas em: Resumindo: encerrando o nosso primeiro bloco, no qual estudamos duas eras importantíssimas para a nossa literatura a era colonial e a era nacional podemos perceber as diferenças entre elas: na época colonial, a escrita que se produzia no Brasil estava muito ligada ao modelo europeu e não problematizava as questões de nacionalidade, identidade, liberdade e dependência cultural, que, mais tarde, foram o centro das idéias românticas. Os autores Gonçalves Dias, Castro Alves e José de Alencar são significativos para se entender as noções de brasilidade e interferência no meio social que ocuparam, neste período, a atenção dos nossos escritores. Reflita e discuta com seus colegas sobre esses dois períodos, comparando as contribuições que eles trouxeram para a nossa literatura. Atividades Complementares 1. Releia o conteúdo 01 do Tema 01 e reflita quais são os pontos de conflito entre os colonizadores e os aborígines descritos por Caminha. Resuma-os em cinco linhas Pesquise mais e elabore uma lista com os autores e obras que não poderiam faltar num curso de introdução à literatura brasileira, do período de informação ao simbolismo. Justifique suas escolhas, lembrando-se de que você está fazendo-as baseado numa ideologia, numa visão de mundo que inclui algumas obras e exclui outras. Esteja sempre consciente dessas relações, pois você é mais do que um mero reprodutor de períodos ou movimentos literários.você é um profissional de Letras e suas escolhas interferirão na imagem que seus alunos terão de nossa literatura. 26
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