ASSISTÊNCIA A SAÚDE À MULHER - PRESA: UM DIREITO NEGADO
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- Alfredo Fialho Nobre
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1 1 ASSISTÊNCIA A SAÚDE À MULHER - PRESA: UM DIREITO NEGADO Hilderline Câmara de Oliveira Christianne Medeiros Cavalcante Eduardo Franco Correia Cruz Joseneide Sousa Pessoa dos Santos Universidade Federal do Rio Grande do Norte-UFRN Paulo Sérgio Silva de Souza Universidade Potiguar-UNIP Resumo A assistência a mulher-presa se constitui dever do Estado, objetivando prevenir o crime e proporcionar o seu processo de integração a sociedade, através da efetivação dos direitos da pessoa humana. Este estudo teve como questões centrais: como e em que medida a assistência a saúde, está sendo prestada às apenadas, em regime fechado no Pavilhão Feminino do Complexo Penal Dr. João Chaves - Natal-RN e quais as dificuldades que estas enfrentam no cotidiano da prisão em relação à saúde (direitos sexuais e reprodutivos). A metodologia utilizada foi à revisão bibliográfica, observação e aplicação de questionários. As mulheres-presa reclamaram da falta de tratamento de saúde, que variam desde os atendimentos de baixa complexidade até os que requerem cuidados especializados. Muitos atendimentos são externos ao presídio ocorrendo em postos municipais de saúde e 85% delas afirmam que não tem conhecimento dos serviços de saúde que a instituição oferece. Para elas são destinados apenas remédios paliativos, não havendo acompanhamento para doenças crônicas. A deficiência do acesso aos serviços de saúde na prisão contribui para o surgimento de novos casos de doenças e maior ocorrência de comportamentos de risco para doenças sexualmente transmissíveis. Palavras-chave: Assistência. Saúde. Direito. Mulher Presa. Este trabalho teve como escopo analisar como e em que medida a assistência a saúde, preconizada na legislação brasileira está sendo prestada às mulheres que cumprem pena em regime fechado na unidade prisional pavilhão feminino do Complexo Penal Dr. João Chaves - Natal-RN, que se constituem no público-alvo da pesquisa, bem como identificar as dificuldades que estas enfrentam no cotidiano da prisão em relação à saúde verificando que tipo de assistência à saúde é proporcionado.
2 2 Busca-SE, desta forma, contribuir para uma política de humanização nos presídios de acordo com o que preconiza a Lei de Execuções Penais nº de 11 de julho de 1984 (BRASIL, 2000). Para conhecer melhor o objeto de pesquisa, e ao mesmo tempo alcançar as metas planejadas para a concretização do estudo, foram utilizados como procedimentos metodológicos, o levantamento e revisão bibliográfica com autores tais como Foucault (1999) e Costa (2008); além de observação sistemática e assistemática, foi realizada a aplicação de questionários cuja análise e interpretações dos dados coletados foram de cunho qualitativo e quantitativo. A partir dos resultados apresentados pela pesquisa, foi possível perceber que o acesso aos serviços de saúde, um direito pouco observado nas prisões brasileiras, deve ser efetivado para que os cuidados relacionados à saúde da mulher-presa tenham êxito. Para discutir sobre as questões que envolvem a prisão é preciso considerar todo o cenário socioeconômico que o Brasil enfrenta, levando em consideração os fatores determinantes que aguçam cada vez mais a violência e a criminalidade e, consequentemente, o crescimento da população carcerária, tendo em vista o alto índice de violência, de criminalidade infanto-juvenil e adulta, crimes de natureza como roubos, assaltos, seqüestros, homicídios, guerras entre quadrilhas, gangues, favelas, corrupção policial, morosidade judicial, bem como corrupções em todas as esferas do governo, estes acontecimentos, que outrora freqüentavam somente as páginas policiais dos jornais, infelizmente na atual conjuntura estampam as primeiras páginas de toda a imprensa brasileira. Este caos da segurança pública na realidade brasileira se deve à incúria do governo, que deixou de assumir suas responsabilidades na liderança das políticas públicas que visam à minimização da violência e da criminalidade. Conforme dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada IPEA, a criminalidade custa cerca de 140 bilhões de reais por ano ao Brasil. Os custos totais da criminalidade são estimados em 10% do Produto Interno Bruto brasileiro (PIB).
3 3 Para o Ministério da Justiça, o país tinha presos em janeiro de 2007 e o número de vagas são de , isso representa um déficit de mais de 147 mil presos, tanto que atualmente 13% dos apenados condenados estão cumprindo pena em delegacias. Outro dado aviltante é que a cada dia, entram cerca de 200 presos a mais do que saem das prisões espalhadas no país, onde são necessárias mais 185 mil vagas. Em 2008 a taxa de encarceramento no Brasil era de 225 presos para cada grupo de 100 mil habitantes. Segundo o Ministério da Justiça 2, em 2007 morreram presos dentro de cadeias e presídios brasileiros. Para a CPI do sistema carcerário, o número é maior: mortos no ano passado. A média é de três mortes por dia. Significa que viver na prisão, sob a custódia do Estado, é duas vezes mais perigoso do que morar na cidade mais violenta do país, Coronel Sapucaia em Mato Grosso do Sul. O aumento significativo dessa população carcerária representa consequentemente, o agravamento das condições de vida existente nas prisões brasileiras, que reflete em seu cotidiano prisional em graves problemas dentre eles: a superlotação, práticas de torturas, maus tratos, negação de direitos, motins, corrupções, deficiência dos serviços prisionais, juntamente com a falta de assistência social, material, jurídica e de projetos de natureza laborais e educativas que contribuam para a reinserção do apenado. O Sistema Carcerário Brasileiro é regulamentado pela Lei de Execuções Penais LEP, esta determina como deve ser executada e cumprida a pena de privação de liberdade e restrição de direitos. Ainda contempla os conceitos tradicionais da justa reparação, satisfação pelo crime que foi praticado, o caráter social preventivo da pena e a idéia da reabilitação. Assim, dotando os agentes públicos de elementos para a individualização da execução da pena, aponta deveres e direitos da população carcerária. Em relação a tipificação dos regime de cumprimento da pena privativa de liberdade de acordo com a LEP em seu artigo 110º e o Código Penal Brasileiro artigo 1 Dos quais 30 mil são mulheres. Cada detento custa R$ 1,6 mil por mês aos cofres públicos. Disponível em Acesso 10 de março de 2009, às 12h30min.(BRASIL, 2009) 2 Sistema penitenciário vive um apagão carcerário 27/05/ h17 - Atualizado em 27/05/ h26. Disponível em: Acesso , as 22h00minh.
4 4 33º que define: a pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. [...]. Em seu 1º considera-se: a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. Cabe ressaltar que em consonância com o mesmo artigo no 2º, As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: a) o condenado a pena superior a oito anos deverá começar a cumprir-la em regime fechado; b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a quatro anos e não exceda a oito, poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi.-aberto; c) o condenado não reincidente, cuja a pena seja igual ou inferior a quatro anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. O Brasil, hoje, encarcera mais pessoas do que qualquer outro país na América Latina e infelizmente, os problemas desse imenso sistema requerem proporções de soluções correspondentes. Desrespeitos aos direitos humanos são cometidos constantemente em todas as unidades penais afetando milhares de apenados e suas famílias, com o agravante de que a sociedade mantém uma relativa indiferença a tais desrespeitos, tendo como principal motivo a compreensão de que marginais, não devem ter direito a preservação de suas vidas e à integridade física. Como afirma Torres e Gomes (2002, p.19): o meio prisional é, com efeito, um contexto muito específico. As tendências defensivas ou resistências habitualmente surgem em qualquer situação [...]. A Lei de Execuções Penais - LEP determina como deve ser executada e cumprida a pena de privação de liberdade e restrição de direitos, e em seu artigo 10, dispõe que A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade, estendendo-se esta ao egresso. Conforme, o que preconiza a LEP no art. 11, a assistência será: I material; II à saúde; III jurídica; IV educacional; V social e VI religiosa.
5 5 No entanto, sob a responsabilidade do Estado à população carcerária tem seus direitos humanos desrespeitados sistematicamente, entre eles, o direito a saúde, que está garantido na Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2004) como um direito de todos conforme afirma o art. 196 que: A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Acrescenta ainda a LEP em seu art. 14 A assistência à saúde do preso e do internado, de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, farmacêutico e odontológico. Segundo Torres (2001, p.86-87), freqüentemente, este direito não é observado nas prisões brasileiras, como mostra a autora: Em todo país, a assistência médica aos presos é negligenciada, desde atendimentos mais simples, como moléstias de pele, ocorrências dentárias, pequenos curativos, até problemas complexos, como acidente vascular cerebral, acidente cardiovascular e câncer, para os quais o detento não recebe o atendimento necessário ou mesmo nenhum atendimento. A questão da saúde dentro do sistema penitenciário é a mais dramática, visto não existir uma política instituída para a assistência aos presos. No caso do encarceramento feminino, à situação é ainda mais grave, já que não HA uma política específica para o atendimento da mulher presa que a considere como sujeito de direitos inerentes a sua condição de pessoa humana, e muito particularmente, ás suas especificidades advindas das questões de gênero (COSTA, 2008). Mas, contraditoriamente, o que persiste é uma histórica omissão por parte dos poderes públicos, manifesta na ausência de políticas públicas voltadas para suprir as necessidades relacionadas à saúde que surgem no cotidiano da prisão e que são sempre justificadas pela falta de recursos materiais e humanos. O recorte empírico deste estudo contemplou apenadas que estão em pena privativa de liberdade no pavilhão feminino do Complexo Penal Dr. João Chaves, particularmente em regime fechado. Ressalta-SE que a partir dos questionários
6 6 aplicados identificamos como a assistência à saúde está sendo prestada na instituição. Os critérios usados para seleção foram aleatórios, sendo pesquisadas 50% das apenadas em regime fechado. No primeiro gráfico explicita-se os resultados dos questionamentos sobre delitos praticados pelas apenadas. 15% 54% 8% 8% 15% Art. 157 (Roubo) Art. 121 (Homicídio) Art. 155 (Furto) Art. 12 (Tráfico de Drogas) Outros Gráfico 1: Tipificação dos Delitos Segundo os Artigos De Fonte: acordo Coleta com os de dados, através percebe-se da aplicação que, os dedelitos questionário associados - Maio/2008 ao artigo 12 tráfico de drogas representa, via de regra, mais de 54% dos motivos de encarceramento, mas outros delitos, como o artigo 155 Furto, também são freqüentes. Com relação ao tempo de prisão constatou-se que 46% das apenadas foram condenadas de 6 (seis) a 9 (nove) anos de reclusão; 31% de 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão; 15% acima de 9 (nove) anos de reclusão, e 8% (oito) de 1 (um) a 3 (três) anos de reclusão. 15% Sim Não 85% Gráfico 3: Durante esse período precisou de algum tipo de assistência médica? Fonte: Coleta de dados através da aplicação de questionário - Maio/2008
7 7 Os dados mostram que, 85% responderam positivamente, entretanto, não significou que tenham conseguido atendimento. As apenadas reclamaram que por falta de tratamento de saúde no presídio, que variam desde OS que são considerados relativamente menores até os que requerem cuidado especializado (dentista, ortopedista, ginecologista, clínico geral), muitos atendimentos são marcados fora do presídio através dos postos de saúde, sem contar que, às vezes os familiares conseguem atendimento até particular, mas por falta de viaturas e escolta para conduzi-las, essas mulheres acabam não recebendo os cuidados necessários a saúde. Os serviços de saúde oferecidos pela instituição prisional, não são conhecidos por parte significativa das apenadas, conforme demonstrado no gráfico abaixo. 15% Sim Não 85% Gráfico 4: Tem conhecimento dos serviços de saúde que a instituição oferece? Fonte: Coleta de dados através da aplicação de questionário Maio/2008 Das apenadas pesquisadas, 85% afirmam não terem conhecimento dos serviços de saúde que a instituição oferece, justificando sua inexistência. Há, no entanto, disponibilidade de remédios paliativos, não há acompanhamento para mulheres com hipertensão e diabetes, e exames de rotinas de suma relevância como os preventivos não são realizados. A deficiência do acesso aos serviços de saúde por parte dessa população encarcerada, só contribui para o surgimento de novos casos de doenças e maior ocorrência de comportamentos de risco para DST. Os depoimentos das apenadas abaixo mencionados afirmam esta realidade.
8 8 8% 23% Bom Regular Péssimo 69% Gráfico 5: Como é o atendimento à saúde no presídio. Fonte: Coleta de dados através da aplicação de questionário Maio/2008 Com relação ao atendimento à saúde no presídio, os dados demonstram que 69% das apenadas o classificaram como sendo péssimo. Perguntado O porquê, responderam, por não haver um profissional da área de saúde, um médico, ficando impossível o funcionamento do setor médico. Enfim, não existe nenhum tipo de atendimento a saúde, quando se consegue é externo, persistindo o mesmo problema da falta de viaturas e de escolta. Diante dos dados apresentados, foi possível perceber que a superpopulação carcerária, a falta de assistência médica e as condições estruturais do sistema penitenciário colocam-se como elementos relevantes na consolidação da saúde da população apenada. Estão entre os problemas apontados pela pesquisa, particularmente, o acesso a serviços de saúde como um direito pouco observado nas prisões brasileiras, que precisa ser efetivado para que os cuidados relacionados à saúde da mulher-presa tenham êxito. o estudo mostrou também que as condições precárias de saúde das mulheres encarceradas, bem como, as dificuldades em receber o cuidado necessário à saúde, são justificados pela instituição carcerária, pela falta de recursos humanos, materiais e financeiros. Já vimos que a saúde é direito de todos e dever do Estado, portanto, o reconhecimento dos problemas de saúde dentro do sistema penitenciário, com certeza pode contribuir para o fortalecimento de uma política de saúde capaz de efetivar os direitos e pruduzir resultados eficientes.
9 9 O acesso a serviços de saúde por parte da população encarcerada dentro dos presídios, sem dúvida alguma, é uma questão dramática, e particularmente no caso da mulher-presa, a situação com certeza é ainda mais grave, devido ao fato da ausência de políticas públicas que considerem a mulher encarcerada como sujeito de direitos inerentes à sua condição de pessoa humana, ou seja, não existe uma política instituída para a assistência aos presos. Referências BRASIL. Lei de Execução Penal (LEP): n de 11 de julho de ed. São Paulo: Atlas, Constituição da República Federativa do Brasília: Senado Federal Subsecretaria de Edições Técnicas, Lei de Execução Penal (LEP) nº de 11 de julho de São Paulo: Rideel (série compacta),1998. BRASIL. Código Penal/organização. 5 ed. São Paulo: Rideel, Ministério da Justiça Disponível em Acesso 10 de março de Sistema penitenciário vive um apagão carcerário 27/05/ h17 - Atualizado em 27/05/ h26. Disponível em: Acesso BRASIL. DEPEN - Departamento Penitenciário Nacional. Brasília, Disponível em Acesso em: 15/dez, 2003 e agosto de 2005, e 25 de maio de COSTA, Gislaine Malttez. O Estado é um Agente de Correção Social. Disponível em: http//: Acesso em: 14 Mar DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL/DEPEN. Censo Penitenciário. Brasília, Disponível em< Acesso em: 08 mai.2008.
10 10 FOUCAULT, Michel. Micro física do poder. 17. ed. Rio de Janeiro: Graal, TORRES, A. A. Direitos humanos e sistema penitenciário brasileiro: desafio ético e político do serviço social. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, n.67, p.76-92, 2001.
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