Ricardo Seitenfus : Haiti põe em xeque a ajuda internacional

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1 Ricardo Seitenfus : Haiti põe em xeque a ajuda internacional 07/01/ :15 Editado por Helena Gertz O que você achou desta matéria? Incrível (0) Interessante (3) Informativa (0) Muito longa (0) Muito complicada (0) Tendenciosa (0) Rating: 8.5/10 (2 votes cast) GENEBRA, Suíça Diplomado pelo Instituto de Altos Estudos Internacionais de Genebra, o brasileiro Ricardo Seitenfus tem 62 anos. Desde 2008, ele representa a Organização dos Estados Americanos (OEA) no Haiti. Ele dirige fortes críticas contra a presença internacional do país. Le Temps: Dez mil capacetes azuis [soldados da ONU] no Haiti. Para o senhor, isso é uma presença contraprodutiva... Ricardo Seitenfus : O sistema de prevenção de litígios dentro do sistema da ONU não é adaptado ao contexto haitiano. O Haiti não é uma ameaça internacional. Nós não estamos em situação de guerra civil. O Haiti não é o Iraque nem o Afeganistão. No entanto, o Conselho de Segurança, devido à falta de alternativa, impôs os capacetes azuis a partir de 2004, depois da saída do presidente Aristide. Desde 1990, nós estamos aqui, na nossa 8ª missão da ONU. O Haiti vive desde 1986 e da saída de Jean-Claude Duvalier [ditador haitiano] o que eu chamo de um conflito de baixa intensidade. Nós somos confrontados por lutas de poder entre atores políticos que não respeitam o jogo democrático. Mas me parece que o Haiti, no cenário internacional, paga essencialmente por sua proximidade com os Estados Unidos. O Haiti foi objeto de uma atenção negativa por parte do sistema internacional. Para a ONU, trata-se de congelar o poder e transformar os haitianos em prisioneiros da própria ilha. O medo de refugiados que chegam por barcos explica as decisões internacionais em relação ao Haiti. O que se quer é que os haitianos fiquem no país a qualquer custo. Le Temps : O que impede a normalização do caso haitiano?

2 RS: Durante 200 anos, a presença de tropas estrangeiras se alternou com a de ditadores. É a força que define as relações internacionais com o Haiti e nunca o diálogo. O pecado original do Haiti, na cena mundial, é sua liberação. Os haitianos cometeram o inaceitável em 1804: um crime de lesa-majestade para um mundo inquieto. O Ocidente era, na época, um mundo colonialista, escravagista e racista que tinha sua riqueza baseada na exploração das terras conquistadas. Assim, o modelo revolucionário haitiano assustava as grandes potências. Os Estados Unidos só reconheceram a independência do Haiti em 1865 e a França exigia pagamento para aceitar essa libertação. Desde o início, a independência está comprometida e o desenvolvimento do país está entravado. O mundo nunca soube como tratar o Haiti, então resolveu ignorá-lo. Começaram então, 200 anos de solidão no cenário internacional. Hoje, a ONU aplica cegamente o capítulo 7 de sua carta e implanta suas tropas para impor operações de paz. Não resolvemos nada, só pioramos. Pretende-se fazer do Haiti um país capitalista, uma plataforma de exportação para os Estados-Unidos, é absurdo. O Haiti deve voltar a ser o que ele realmente é: um país essencialmente agrícola ainda fundamentalmente impregnado pelo direito baseado nos costumes da sociedade local. O país nunca deixou de ser visto pelo viés da violência. No entanto, mesmo sem Estado, a violência só atinge uma fração dos níveis de violência dos países latino-americanos. Existem elementos nessa sociedade que podem impedir que a violência se alastre sem limites. Le Temps: Não é decepcionante ver no Haiti uma nação inassimilável, na qual o único horizonte é o retorno a valores tradicionais? RS: Existe uma parte o Haiti que é moderna, urbana e voltada para o exterior. Estima-se que o número de haitianos que vivem em outros países chegue a 4 milhões. É um país aberto para o mundo. Eu não desejo um retrocesso ao século 16, a uma sociedade agrária. Mas o Haiti vive sob influenciado sistema internacional, de ONGs e de caridade. Mais de 90% do sistema educativo e de saúde são privatizados. O país não dispõe de recursos públicos nem para fazer funcionar de maneira mínima um sistema estatal. A ONU fracassa ao não levar em conta os traços culturais. Resumir o Haiti a uma operação de paz piora a situação de um dos principais problemas do país: a economia.. O problema é sócio-econômico. Quando a taxa de desemprego atinge 80%, é impossível implantar uma missão de estabilização. Não há nada a estabilizar, mas sim a construir. Le Temps: O Haiti é um dos países mais ajudados do mundo, mas mesmo assim, a situação só se deteriora há 25 anos. Por quê? RS: A ajuda de urgência é eficaz. Mas quando ela se torna estrutural, quando ela substitui o Estado em todas suas obrigações, se cria uma falta de responsabilidade coletiva. Se existe uma prova da falha da ajuda internacional, esta é o Haiti. O país se tornou a Meca. O terremoto do dia 12 de janeiro e a subsequente epidemia de cólera apenas acentuam este fenômeno. A comunidade internacional tem a sensação de dever de refazer a cada dia aquilo que foi terminado na véspera. O cansaço do Haiti começa a aparecer. Esta pequena nação deve surpreender a consciência universal com catástrofes cada vez maiores. Eu tinha a esperança de que, na angústia do 12 de janeiro, o mundo iria compreender que ele havia estava equivocado em relação ao Haiti. Infelizmente, so foi reforçada a mesma política. Ao invés de fazer um balanço da situação, enviamos mais soldados. É preciso construir estradas, levantar barragens, participar da organização do Estado e do sistema judiciário. A ONU diz que ela não possui mandato para isso. Seu mandato no Haiti é para manter a paz no cemitério. Le Temps: Qual é o papel das ONGs nesse fracasso? RS: Desde o terremoto, o Haiti se tornou uma encruzilhada incontornável. Para as ONGs transnacionais, o Haiti se transformou em um lugar de passagem forçada. Eu diria que é

3 ainda pior: um lugar para a formação profissional. A idade dos colaboradores que chegaram depois do sismo é muito baixa, eles desembarcam no Haiti sem nenhuma experiência. E o Haiti, eu posso afirmar, não convém aos amadores. Depois de 12 de janeiro, devido ao recrutamento massivo, a qualidade profissional baixou muito. Existe uma relação maléfica ou perversa entre as forças das ONGs e a fraqueza do Estado haitiano. Algumas ONGs só existem por causa da desgraça haitiana. Le Temps: Quais erros foram cometidos depois do terremoto? RS: Diante da importação massiva de bens de consumo para alimentar os desabrigados, a situação da agricultura haitiana ficou ainda pior. O país oferece um campo livre a todas as experiências humanitárias. Do ponto de vista moral, é inaceitável considerar o Haiti como um laboratório. A reconstrução do Haiti e a promessa que nos faz sonhar 11 bilhões de dólares atiça o interesse. Parece que muitas pessoas vêm para o Haiti, não pelo Haiti, mas para fazer negócio. Para mim, que sou Americano, é uma vergonha, uma ofensa à nossa consciência. Um exemplo: os médicos haitianos formados em Cuba. Mais de 500 foram instruídos em Havana. Quase a metade deles, que deveriam estar no Haiti, trabalham hoje nos Estados-Unidos, no Canadá ou na França. A revolução cubana financia a formação de recursos humanos para seus vizinhos capitalistas... Le Temps: O Haiti é constantemente descrito como à margem do mundo, o Sr. vê o país como um concentrado de nosso mundo contemporâneo... RS: É um concentrado dos nossos dramas e de falhas da solidariedade internacional. Nós não estamos à altura do desafio. A imprensa mundial vem para o Haiti e descreve o caos. Não se espera reação da opinião pública. Para ela, o Haiti é um dos piores países do mundo. É preciso voltar-se para a cultura haitiana, para o território. Acho que existem muitos médicos na cabeceira de pessoas enfermas e a maioria desses médicos são economistas. Na verdade, no Haiti faltam antropólogos, sociólogos, historiadores, cientistas políticos e até teólogos. O Haiti é muito complexo para pessoas apressadas e os colaboradores internacionais estão com pressa. Ninguém tem tempo nem vontade de compreender o que eu chamaria de alma haitiana. Os haitianos entenderam a situação e nos consideram, nós da comunidade internacional, vacas leiteiras.. Eles também querem tirar proveito dessa presença e conseguem isso com uma maestria extraordinária. Se os haitianos nos consideram apenas pelo dinheiro que trazemos é porque dessa forma que nos apresentamos. Le Temps: Além da constatação da falha, quais soluções o Sr. propõe? RS: Em dois meses, terminarei uma missão de dois anos no Haiti. Para ficar aqui e não me sentir abalado pelo o que vejo, precisei criar uma série de defesas psicológicas. Eu queria continuar sendo uma voz independente apesar do peso da organização que represento e assim foi porque queria expressar minhas dúvidas e dizer ao mundo que basta. Chega de brincar com o Haiti. O 12 de janeiro me mostrou que existe um potencial de solidariedade extraordinária no mundo. Mesmo que não se deva esquecer que, no início, foram os haitianos sozinhos que com suas próprias mãos tentaram salvar seus parentes. A compaixão foi muito importante no momento de urgência. No entanto, a caridade não pode ser o motor das relações internacionais, mas sim a autonomia, a soberania, o comércio justo e o respeito mútuo. Devemos pensar simultaneamente em oferecer oportunidades de exportação para o Haiti, mas também em proteger a agricultura familiar que é essencial para o país. O Haiti é o último paraíso do Caribe, com km de costa virgem, ainda não explorado pelo turismo: nós devemos favorecer o turismo cultural e evitar criar uma rota para um novo eldorado do turismo de massa. As lições que damos são ineficazes há muito tempo. A reconstrução e o acompanhamento de uma sociedade tão rica é uma das últimas grandes aventuras humanas. Há 200 anos, o Haiti iluminou a história da humanidade e dos direitos

4 humanos. É preciso dar uma chance aos haitianos de expressar sua visão. "HAITIANOS: Nem pensem em sair! (Guarda Costeira) - Viu? E você pensava que os americanos tinham nos esquecido." Arnaud Robert Tradução de Helena Gertz Acesse o original aqui Imagem retirada daqui Charge retirada daqui Sobre Helena Gertz Helena Gertz editou 8 artigos no Correio Internacional. Veja todos os artigos de Helena Gertz! Blog Facebook (Visited 69 times, 2 visits today) Tags: Ações humanitárias, Ajuda internacional, Haiti, OEA, ONU, Seitenfus Imprimir artigo Comentários Conectado(a) como Seco Manica Comentar Publicar comentários no meu perfil do Facebook Publicar

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