CENTRO DE MEMÓRIA DO ESPORTE ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL PROJETO GARIMPANDO MEMÓRIAS ALINE PELLEGRINO (4)

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1 CENTRO DE MEMÓRIA DO ESPORTE ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL PROJETO GARIMPANDO MEMÓRIAS ALINE PELLEGRINO (4) (depoimento) 2015 CEME-ESEF-UFRGS

2 FICHA TÉCNICA Projeto: Garimpando Memórias Número da entrevista: E- 568 Entrevistada: Aline Pellegrino Nascimento: 07/06/1982 Local da entrevista: CEME, via ligação telefônica Entrevistadora: Pamela Siqueira Joras Data da entrevista: 23/06/2015 Transcrição: Pamela Siqueira Joras Copidesque: Pamela Siqueira Joras Pesquisa: Pamela Siqueira Joras e Silvana Vilodre Goellner Revisão Final: Silvana Vilodre Goellner Total de gravação: 38 minutos e 18 segundos Páginas Digitadas: 10 páginas Observações: Entrevista produzida para o Programa Futebol e Mulheres desenvolvido pelo Grupo de Estudos sobre Esporte, Cultura e História (GRECCO) O Centro de Memória do Esporte está autorizado a utilizar, divulgar e publicar, para fins culturais, este depoimento de cunho documental e histórico. É permitida a citação no todo ou em parte desde que a fonte seja mencionada.

3 Sumário Convocação pra a seleção brasileira; Participação nos Jogos Olímpicos de Atenas; Transferência para atuar no Japão; Responsabilidades de ser capitã da seleção; Copa do Mundo de Futebol Feminino; Lesão e não participação nos Jogos Olímpicos de Pequim; Atuação no Santos Futebol Clube; Sereias da Vila; Encerramento da trajetória como jogadora; Bom Senso Futebol Clube; Atuação como treinadora; Cenário do futebol feminino no Brasil.

4 1 Porto Alegrem 23 de junho de Entrevista com Aline Pellegrino a cargo da pesquisadora Pamela Siqueira Joras para o Projeto Garimpando Memórias do Centro de Memória do Esporte. P.J. Aline, na última entrevista que realizamos tu falaste sobre a tua trajetória como treinadora e também sobre o Guerreiras Project. Agora gostaria de retomar um pouco sobre a tua trajetória como jogadora. Conversamos até a tua participação na Universíade que foi em A partir daí como foi a tua chegada até a seleção brasileira? A.P. Em 2001 a Universíade foi um momento muito especial e no período de 2001 a 2004 foi quando eu comecei a me aceitar como zagueira. Nós tivemos uma projeção muito grande em um cenário nacional como jogadora de futebol, eu vinha num período muito bom e a seleção brasileira também estava num período da chegada do René Simões 1 que era um técnico super respeitado, renomado, e tudo que falavam para ele: Não, vamos dar uma olhada! Então na época ele só tinha uma jogadora com um metro e oitenta daí chega eu, zagueira com um e oitenta, ele quis olhar. Foi um período de quatro, cinco meses de preparação intensa. E em 2004 a seleção ia para os Estados Unidos fazer vários amistosos com as universidades de lá e o último amistoso seria contra a seleção americana. A Juliana 2 jogava na Suécia e o clube só ia liberar ela pra jogar o último amistoso, foi quando eu tive a oportunidade de mostrar o meu trabalho para o René. Tanto que quando voltamos para o Brasil ele disse: Não, agora mudou tudo porque foi uma oportunidade dele ver outras possibilidades. P.J. Em 2007, tu tiveste uma lesão muito grave, poderia nos contar como foi? [INTERRUPÇÃO DA GRAVAÇÃO] A.P. Oi Pamela, acho que caiu a ligação. Como eu estava te falando, depois você fica meio assim... Eu já tinha visto amigas passarem uma ou duas vezes pelo mesmo processo de fisioterapia e tal e eu: Isso não é pra mim, esquece. Aconteceu comigo eu vou parar de jogar. A gente fica meio na nóia mas aí eu consegui operar muito rápido. Era uma técnica 1 René Rodrigues Simões. 2 Juliana Ribeiro Cabral

5 2 médica não muito usada que acelerava esse processo e aí foi uma fisioterapia insana [RISO] e com quatro meses e quinze dias eu já estava jogando de novo e a grandes conquistas acabaram vindo com o clube, com o Santos 3 : Copa do Brasil, Campeonato Paulista, Libertadores, foi uma coisa assim que me tirou das Olimpíadas mas não afetou em nada na minha carreira e até fez parte de um processo de descanso. Eu brinco que desde que eu tinha começado a jogar eu nunca tinha tido férias, então, foi um período que eu aproveitei para ficar um pouco em casa, para descansar um pouco a cabeça porque na fisioterapia o corpo trabalha mais do que se tivesse jogando, mas foi um período que eu acabei tirando de letra. P.J. Tu comentaste que a Copa de 2007 foi o auge da tua carreira e da seleção brasileira. Como foi participar disso e além de tudo como capitã? A.P. Foi assim: a gente teve uns problemas um pouquinho antes porque na verdade o que aconteceu? O grupo ficou muito tempo junto, a gente emendou o Pan-Americano e a Copa do Mundo, foi muito bom porque a gente estava entrosada porque fez um Pan- Americano de sete jogos, chegamos entrosadas mas vai ficando todo mundo junto e, às vezes, não dá muito certo. Antes de ir pra Copa do Mundo nós tivemos um amistoso contra o Japão, no Japão, que a gente acabou perdendo de 2 a 0, o que gerou uma série de conflitos no grupo que a gente poderia ter quebrado total. Mas aí a gente acabou entrando lá dentro de um quarto quase fechou a porrada, literalmente, foi uma situação ali que eu estava até diretamente envolvida, então, acho que para mim ali com essa questão de ser capitã foi onde as meninas passaram de fato a me respeitarem a me verem como capitã que foi uma situação que eu falei: Não, você vai culpar todo mundo. Foi aquela lavagem de roupa suja, feia, feia e em dois ou três momentos teve aquela que levantou para dar porrada em alguém e: Segura aí, deixa disso. E foi umas duas horas que a gente saiu de lá com um grupo que chegou a final da Copa do Mundo. Acho que se não fosse aquilo a gente não teria ido muito longe. Para mim, particularmente, foi um momento que eu me impus a elas e tenho certeza que elas começaram a me respeitar e me entenderem como capitã da seleção. 3 Santos Futebol Clube.

6 3 P.J. E como foi esse momento de receber a braçadeira de capitã da seleção brasileira, a questão de responsabilidade... A.P. Acabou acontecendo isso um pouco depois de [SILÊNCIO] Acabou aquele ciclo de olimpíada que o René acabou não ficando, começaram a fazer algumas mudanças e, em 2005, eu já fiquei com essa responsabilidade muito em função do papel que tem a capitã dentro da seleção extra campo, extra competição que às vezes era até muito... Na cabeça deles ali, da diretoria, parte da seleção muito importante aí você fica quase como um trabalho de secretária organizando as coisas. Você vê isso, vê aquilo, roupa, horário e tal é uma coisa que te desgasta também, a parte mental que é um pouco isso que eu falo de estar sobrecarregada porque enquanto está todo mundo descansando você está ali vendo alguma coisa, resolvendo alguma coisa. Isso te traz um desgaste, para mim era um peso no sentido de você é capitã, você é titular, você não pode estar abaixo entendeu? Você tem que estar no seu 200% o tempo todo e nem sempre isso necessariamente acontece. Para mim, ter a braçadeira era um peso ainda maior, uma responsabilidade ainda maior com relação a minha parte técnica. Eu não podia falhar em momento nenhum, eu não podia estar abaixo em momento nenhum, era uma responsabilidade, um peso muito grande tanto que em 2006, que foi a minha primeira competição, eu comecei como titular com a braçadeira... Bonitinho e o Jorge 4 acabou chegando com as meninas da seleção e me sacou no terceiro ou quarto jogo. É complicado você tem que manter um discurso de grupo e quando você se vê nessa situação mas acho que foram situações que me engrandeceram muito como jogadora. Tanto que eu 2007 eu fui uma outra Aline, uma outra situação com relação a isso e titular absoluta e: Dona da faixa, a posição é minha e vamos lá fazer o que tiver que fazer. Acho que pra minha vida, particularmente, ter passado por todo esse processo me engrandeceu muito. P.J. A seleção brasileira acabou construindo uma relação de rivalidade com os Estados Unidos e tu participaste de todo esse processo desde o começo. Pode nos contar como se criou essa rivalidade e como eram as competições entre vocês? 4 Jorge Barcellos.

7 4 A.P. Essa rivalidade vem desde a primeira Copa 5... Na verdade, a turma da Sissi 6, da Dani 7 e da Kátia 8 pegaram essa primeira Copa com elas. É uma seleção... A.P. Onde estávamos? [INTERRUPÇÃO DA GRAVAÇÃO] P.J. Na rivalidade entre Brasil e Estados Unidos A.P. Ah é! E eles jogam isso e coisa de americano, em qualquer modalidade, eles têm a convicção de: Eu sou o melhor, você não é nada. E a gente com característica oposta de ter muita emoção, de rapidinho já sair do sério, é uma coisa que elas usaram e usavam contra a gente durante muito tempo. Demoramos para lidar com isso, claro que no momento que acontece a dividida de bola com elas e você leva a pior é tenso e... Em 2004 a gente melhorou também nessa parte física e começou a bater de igual para igual, a turma lá não falava, não arriscava um inglesinho e elas podiam esculhambar com a gente e depois a gente começou a entender e começamos a responder e a rivalidade não tem jeito. Acho que assim, no meu período de oito anos, a equipe da Alemanha é muito melhor tecnicamente, mais forte, mas não adianta o rival mesmo, a pedra no sapato foram as americanas. São as americanas e acho que vão continuar sendo por muito tempo principalmente depois que a gente começou a jogar de igual pra igual e elas sabem que é mais uma adversário à altura delas que até então elas não tinham, que não precisavam se preocupar e foi uma rivalidade que foi criada [RISO] e não adianta vai ser por muito tempo e não vai mudar. P.J. Tu comentaste um pouco do teu período no Santos. Como era participar dessa equipe que era forte, referência no Brasil? Havia equipes competitivas para jogar contra vocês? A.P. Isso foi no começo. Nos dois últimos anos já tinha o São José 9 fazendo frente para gente... Lembrando os jogos, os títulos, ganhamos com certa dificuldade, acho que essa 5 Referência a Copa do Mundo de Futebol Feminino realizada na China em Sisleide do Amor Lima. 7 Daniela Alves. 8 Kátia Cilene Teixeira da Silva. 9 São José Futebol Feminino.

8 5 superioridade que parece que teve no dia a dia não foi tão real assim não, mas era aquilo: Vai jogar o Santos. Tirando a Libertadores que acho que foi a primeira, que tinha Marta 10, Cris 11, que era um time que todo mundo estava 200%, que aquela Libertadores a gente sobrou, acho que foi na medida do possível. Claro que era uma equipe mais estruturada, tinha um número maior de jogadoras, conseguia distribuir melhor, conseguia substituir com a mesma qualidade acho que era nisso que a gente acabava ganhando. P.J. Tu comentou um pouco sobre o Santos, nesse período houve o projeto do Calendário das Sereias da Vila. Tu participaste desse projeto, pode comentar um pouco como foi? A.P. O Santos tinha uma diretoria muito ativa voltada de fato para o feminino. Tinha a nossa salinha do Departamento de Futebol Feminino, as coisas aconteciam e tinha um Departamento de Marketing no fundo que era do masculino mas que se preocupava tanto quanto em buscar patrocínios pra gente e criar estratégias e estava dando tudo muito certo. O projeto estava estabilizado, Sereias da Vila, todo mundo conhecia. Teve o título da Libertadores, veio a Marta e, em 2011, acabou surgindo, em função do centenário do clube... Ia sair o calendário especial do centenário e bateu com o clube estar lançando a coleção moda praia, então, uniram o útil ao agradável e falaram: Vamos colocar as meninas, a gente apresenta a coleção e já divulga as meninas como uma forma de agregar algum patrocínio. E acho que foi bacana a gente recebeu, pelo menos, de uma forma legal. P.J. Como foi o encerramento dessa equipe do Santos? Como vocês receberam essa notícia? A.P. Eu acabei saindo quatro meses antes, quando eu recebi a proposta pra ir para Rússia e só sai quando eu me senti tranquila e pensar que eu já tinha feito tudo, toda minha parte dentro daquele projeto e que era um projeto que estava concretizado que não haveria nenhum tipo de problema. Quando assumiu a diretoria do Laor 12, a gente já ouvia: Vai acabar. Nos bastidores tinha muita coisa rolando mas a diretoria sempre falava o contrário, então, ninguém acreditou que pudesse acontecer e acabou acontecendo, foi um 10 Marta Vieira da Silva 11 Cristiane Rozeira de Souza e Silva.

9 6 choque pra todo mundo, acabaram na mesma época com o futsal. O que eles falam, você tem que se dirigir a um presidente, a um clube e um departamento que não gera receita está no negativo, então, era diferente do Marcelo Teixeira 13 porque estamos na merda, estou devendo tudo e se tiver que tirar do meu bolso pra dar para o feminino eu vou fazer. Acho que tem que ter um equilíbrio nem pra um nem para outro e aí acabou o projeto, tudo. E agora com volta do Roberto 14 que é da turma do Marcelo Teixeira; ali, por trás, reativaram e nessa diretoria eu acho difícil acabar porque ficou uma coisa muito assim: Toda vez que muda o diretor acaba o feminino? Acho que agora é mais complicado disso acontecer. P.J. Tu falaste que saiu do Santos para ir para a Rússia, foi o último clube que tu defendeste? A.P. Foi basicamente sim porque quando eu voltei de lá das Olimpíadas, em 2012, e aí eu joguei aqui no Brasil mais três meses no Juventus São Caetano 15 porque eu precisava de documentação, de alguma coisa para o Bolsa Atleta. Joguei mais três meses mas joguei só Jogos Abertos não tinha mais como jogar o Campeonato Paulista nada porque as inscrições já tinham acabado e no começo do ano eu joguei pelo Novo Mundo 16 a Copa do Brasil, dois joguinhos também. Foi assim dos dois projetos já não tinha...o Juventus no final ainda tinha, treinava e tal agora o Novo Mundo já foi uma coisa meio nas coxas, junta o time e vamos jogar. P.J. E essa decisão de parar de jogar, como foi? A.P. Eu comecei a ficar cansada, você começa a ver as coisas não andarem muito, ao invés das coisas estarem progredindo estão regredindo... Foi um momento que eu fiquei fora e vi uma situação diferente, só você estava vivendo uma situação difícil e quando volta vê que a situação piorou muito. Eu comecei a não ter mais paciência para o mesmo discurso, para as mesmas coisas e vi que era hora de parar porque nem todo mundo estava 12 Luis Álvaro de Oliveira Ribeiro. 13 Marcelo Pirilo Teixeira. 14 Roberto de Andrade. 15 Clube Atlético Juventus. 16 Novo Mundo Futebol Clube.

10 7 naquela mesma vibe que eu. Eu já estava ficando chata e teve também a seleção no final do ano estava tendo aquela mudança de comissão técnica e olhando todo aquele cenário eu comecei a pensar seriamente em parar e, já no final de 2012 mesmo. Joguei aqueles dois joguinhos no começo do ano e parei sem dúvida do que eu estava fazendo, apesar do pessoal não acreditar muito de achar que eu fosse voltar mas eu tomei aquela decisão que era pra valer. P.J. Mesmo tu saindo do futebol tu permaneceste envolvida com a modalidade? A.P. A ideia no começo era dar um tempo, não estar muito envolvida mas eu comecei a fazer a minha pós-graduação e era de treinamento e também futebol. Estar fazendo pósgraduação, aprendendo coisas novas aquilo vai te dando uma empolgação mais para o lado de treinadora mesmo, o que acabou acontecendo, um convite logo na sequencia mas aí quando eu voltei de Pernambuco eu voltei desanimada mesmo com o futebol e não querendo saber muito. Mas quando você menos percebe já está envolvida de novo de alguma forma mas por um novo motivo que é com o Guerreiras Project, de uma outra forma, num outro projeto, uma coisa diferente. Tudo e hoje tenho mais procurado, hoje nem mais tanto por conta da rotina de trabalho tenho ficado um pouco afastada do futebol. P.J. Tu também integra o movimento do Bom Senso Futebol Clube, pode contar um pouco com ocorreu esse envolvimento? A.P. O convite veio por conta da May 17, que tinha uma proximidade com o Paulo André 18 e tudo. E eu fiquei sabendo que na primeira ocasião que eles tentaram falar com as meninas e elas: Não, não vai rolar, e não quiseram fazer parte. Eu acho que é um movimento importante que tem um peso pelos jogadores que tem e quando surgiu essa possibilidade eu falei: Olha, é uma coisa diferente, pode ser isso um primeiro passo para as coisas mudarem na modalidade... Hoje vai ser votada a Medida Provisória, tem até o dia 17 de julho pra votar, ser aprovado e não caducar. Estou ainda meio que de olho em tudo isso. Acho que o Bom Senso vem de encontro a essa crise que está escancarada no 17 Mayara da Fonseca Bordin. 18 Paulo André Cren Benini.

11 8 futebol brasileiro, da CBF 19 coisa que todo mundo sabe, que ainda não se teve como provar mas que todo mundo sabe um pouco do que o Bom Senso tenta mostrar. P.J. Do futebol feminino apenas tu estas envolvida com o Bom Senso? A.P. Diretamente tem eu, a Mayara e a Índia 20. No começo a gente fez um grupo com várias jogadoras mas é difícil quando você ainda está jogando acompanhar e se envolver muito. Mas é ruim também jogadoras que poderiam estar mais envolvidas nesse cenário, o interesse maior é delas mas acho que dependendo de como as coisas acontecerem agora para frente a gente volta com um grupo forte. A gente está sabendo o que está rolando, está acompanhando mas na expectativa d da votação que vai passar pra frente a Medida Provisória. P.J. Tu tiveste algumas participações como comentarista de jogos. Pode contar um pouco como foi essa experiência? A.P. Essa parte aí é a mais gostosa, você fica lá cornetando todo mundo [RISOS]. Estou brincando. Para mim é uma coisa muito fácil, assim eu tenho facilidade em fazer, tenho prazer em fazer, até por conhecer, por viver o dia a dia delas as vezes você acaba trazendo uma entonação mais verdadeira. Às vezes colocam pessoas lá que não tem nada a ver com futebol e vão buscar informação e a informação está errada e então acho importante toda vez que pudesse fossem pessoas comentaristas, uma menina que joga, que joga jogou pra poder levar uma informação mais correta para os espectadores. Fiz algumas vezes, tenho maior prazer em fazer mas muito tranquilo sem nenhuma responsabilidade, quando você é técnica você faz mais ou menos a mesma coisa mas a responsabilidade é gigante a parte gostosa do futebol é ser comentarista. P.J. Falando um pouco da tua visão como técnica, hoje nós temos a Formiga 21 que é uma veterana na modalidade e a Andressinha 22 que é uma das mais jovens, jogando juntas. 19 Confederação Brasileira de Futebol. 20 Carla Santos de Oliveira. 21 Miraildes Maciel Mota. 22 Andressa Cavalari Machry.

12 9 Quando tu jogavas também havia isso de jogadoras mais experientes jogarem com as mais jovens? Como tu vê essa fase de renovação da seleção? A.P. Isso é uma realidade do futebol feminino brasileiro, infelizmente, essa mistura de gerações. Quando eu cheguei com quinze anos no São Paulo 23, a Formiga já jogava, a Tânia 24 já jogava, às vezes com cinco, dez anos a mais que eu e, por não ter estrutura na modalidade, uma categoria de base, um campeonato você acaba colocando todo mundo no mesmo bolo. É bom até a página três e ruim desde a primeira página mas, infelizmente, retrata a realidade do futebol feminino. Você tem hoje a jogadora com mais talento, mais promissora que é a Andressinha já vivendo essa realidade e como você explica que ela jogou muito melhor na seleção principal do que na categoria dela? Na categoria dela as outras meninas não eram tão boas, na seleção nas outras posições ela não conseguia se destacar e numa seleção com Formiga, com Marta fazendo o simplesinho, ela se destacou pra caramba. Então é complicado! Acho que pra mudar um pouco essa cara tem que ter um campeonato de categoria de base, brasileiro, estaduais, senão vai sempre acontecer isso e você acaba pulando etapas, pulando fases e o processo poderia ser muito melhor se fosse diferente. P.J. Nós comentamos um pouco sobre a tua trajetória como jogadora, treinadora e no Guerreiras. Nesse período tem algum fato que foi o que mais te marcou? A.P. Foi em Pernambuco. Eu tive um grupo lá muito bom, talvez tecnicamente não fosse de longe o mais forte que já tinha passado mas as meninas compraram muito a ideia. Tive um trabalho muito bacana eu digo para todo mundo: nos meus dezesseis anos como atleta eu gostei mais dos quatro meses e meio como treinadora. Acho que se eu não tivesse tido essa oportunidade eu teria uma única frustração aí. Foi uma oportunidade sensacional e acho que vivi tudo que tinha que viver, cada coisa no seu tempo e está tudo aí para contar história. P.J. E tem algo que te marcou negativamente? 23 São Paulo Futebol Clube. 24 Tânia Maria pereira Ribeiro - Tânia Maranhão.

13 10 A.P. O que marcou e ainda marca é o fato da modalidade ainda não estar enraizada, o fato da gente ainda não conseguir ver as coisas acontecendo da maneira como deveriam. Eu vivi dezesseis anos e não vi a coisa mudar acho que isso é o fato mais negativo com certeza. P.J. Qual foi tua maior conquista dentro da modalidade? A.P. Foram duas: ter feito parte dessa equipe com o René em 2004 e estar entre as dezoito ali eu falei: Meu, vocês podem me cornetar mas entrei, estou num grupo de jogadoras extremamente qualificadas. Para mim, particularmente, eu faço essa brincadeira e, em 2007, eu acabei sendo indicada para a seleção da Copa do Mundo. No final eles fazem a seleção da Copa, escolhem por posição as 11 jogadoras e eu acabei entrando como uma das melhores defensoras e isso pra mim também foi muito bacana. P.J. Tem mais alguma coisa que eu não perguntei que tu gostaria de falar? A.P. Acho que não, se você ver alguma coisa que estiver faltando é só me ligar. P.J. Muito obrigada. A.P. Beleza, a gente vai se falando. [FINAL DA ENTREVISTA]