A exploração de textos em classes de português

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1 A exploração de textos em classes de português MARIA ZELY DE SOUZA MUNIZ * I - INTRODUÇÃO Em números anteriores de CURRICULUM, publicamos artigos nos quais ressaltamos a importância da escolha dos textos e a necessidade de explorá-los com o intuito de levar os educandos à reflexão e a tirar conclusões próprias, favorecendo, dessa forma, a "mudança de atitude para melhor ajustamento ao meio social e adaptação ao meio físico" - característica da boa aprendizagem. Nesse número trouxemos dois textos apresentados, em aula, com os exercícios que os acompanharam, para exemplificar e complementar o que temos comentado nos artigos precedentes. Escolhemos "O lavrador e seus filhos" e "Um apólogo", explorados numa turma de 1. a série ginasial "O LAVRADOR E SEUS FILHOS" Unidade: "Virtudes cívicas e morais inspiraram escritores célebres". Serei capaz de compreendê-los? Assunto gramatical tratado mais intensamente: Flexionismo. Recomendamos a leitura silenciosa do texto e, em seguida, um exercício para ampliação de vocabulário. É necessá- * MARIA ZELY DE SOUZA MUNIZ - Professôra de Português e Chefe do,departamento de Línguas do Colégio Nova Friburgo.

2 A EXPLORAÇÃO DE TEXTO 59 rio providenciar-se dicionários antes do início da leitura para garantir maior eficiência e evitar tumultos - se posúvel, um para cada aluno. O exercício seguinte, item li, tem por objetivo levar o educando à compreensão do texto pela comparação com outra fábula já estudada e, ao mesmo tempo, obrigá-lo a emitir uma opinião e defender seus pontos de vista na justificativa. Em nossa turma obtivemos respostas magníficas. Um aluno, definindo-se por "O lavrador e seus filhos" explicou: - "Esta fábula relaciona o trabalho com a felicidade, enquanto que a outra com a parte material da vida". Isto, em uma criança de 11 anos é notável! Êste trabalho durou uma aula, sendo que parte do período foi ocupado em sessão de Estudo Dirigido, parte em comentários sôbre as respostas ao item II e discussão dirigida. A aula seguinte foi iniciada com a leitura do texto em voz alta. Em seguida passamos a uma sessão de Estudo Dirigido para resolução de exercícios gramaticais organizados com base no texto. O assunto dessa subunidade - formação do imperativo - foi mais amplamente focalizado nos primeiros exercíci<?s; os outros visaram a recapitular as subunidades anteriores. Um trabalho de redação encerrou o estudo de "O lavrador e seus filhos". li) a - Leia atentamente o texto abaixo. O LAVRADOR E SEUS FILHOS Barão de Paranapiacaba Não vos poupeis ao trabalho, Vivei sempre a labutar; Forma o trabalho a riqueza, Que menos pode falhar.

3 60 CURRICULUM VII/65 Um lavrador abastado Vendo próximo seu fim. Aos filhos, sem testemunhos, Do leito falou assim: "Não vendais o campo herdado De avós a pais transmitido; Pois nêle (não sei o sítio) Jaz um tesouro escondido. Com valor e persistência Conseguireis descobri,.lo; Cavando o chão, revolvendo-o, Lhe arrancareis o sigilo. Não haja um palmo de campo Que escape ao corte da enxada; Fique a paterna courela 1 De fundos sulcos rasgada." Morto o velho, eis, presto, os filhos Procedam à escavação; Crivam de covas o solo, Solapando todo o chão. E tanto a terra mexeram Daqui, d'além, d'acolá, Que, ao cabo de um ano, o campo Maior colheita lhes dá. Tesouro oculto? Nem sombra; Mas o pai mostrar-lhes quis Ser o trabalho o tesouro Que torna a gente feliz. (Fábula de La-Fontaine) 1) courela - propriedade rural.

4 A EXPLORAÇÃO DE TEXTO 61 EXERCÍCIOS I - l.a parte Substitua a palavra grifada por um sinônimo, escrevendo-a na linha pontilhada. Ex.: No campo havia um tesouro escondido (oculto) 1) vivei sempre a labutar 2) Um lavrador abastado chamou os seus filhos. 3) Quase a morrer, do leito lhes falou assim: 4) "Cavando o chão, arrancareis o sigilo e des C"obrireis o tesouro". 5) Morto o velho, os filhos resolvem procurar o tesouro. 6) Ei-Ios, presto, procedendo à escavação. 7) Crivam o chão de covas. 8) Não acham o sítio onde está enterrado o tesouro. 9) Mas haviam cavado tanto que, ao cabo de um ano, a colheita foi maior. 10) Não descobriram o tesouro, mas viram que o trabalho os deixou mais felizes.

5 62 CURRICULUM VIl/65 II - A fábula de La Fontaine "A cigarra e a formiga, já conhecida", também procura ressaltar o valor do trabalho. Comparando as duas fábulas responda: a) Em sua opinião qual delas consegue seu intento com mais felicidade? b) Justifique, em poucas palavras, sua resposta. 2. a parte I - Nas frases abaixo aparece sempre uma forma verbal no imperativo negativo. Escreva, na linha abaixo, o mesmo verbo passando-o para o imperativo afirmativo (conserve a mesma pessoa em que o verbo está na frase precedente). Ex.: Não sejas preguiçoso (tu) Sê aplicado (tu) 1) Não vos poupeis ao trabalho à preguiça. 2) Não vendais o campo herdado. 3) Não caveis a terra. " " " " " 4) Não arranqueis as flôres da courela ervas daninhas. 5) Não vos torneis inconstantes. persistentes. * * *

6 A EXPLORAÇÃO DE TEXTO 63 II - Faça nesta questão o contrário do que você fêz na questão anterior. Os verbos dados estão no imperativo afirmativo. Passe-os para o imperativo negativo, conservando-os na mesma pessoa em que estão na frase dada. 1) Vivei sempre a labutar. Não... a vadiar. 2) Procedei à escavação da terra. Não... agora à escavação. 3) Fiquem todos aqui. Não... lá fora. esperando aqui, mas 4) Dê uma esmola ao pobre. Não... esmola com o dinheiro dos outros. 5) Mostra-me o tewuro oculto. Não... a nqueza encontrada. III - Passe para o plural as palavras grifadas, fazendo a necessária concordância. 1) O personagem principal desta história é um lavrador. 2) O trabalho torna o homem feliz. 3) Não havia tesouro escondido.

7 64 CURRICULUM VII/65 4) Mas o filho deixou o campo cheio de escavação. IV - Complete as seguintes frases: 1) "Maior" é o grau... de "grande". 2) O superlativo absoluto sintético de "feliz" é 3) "Menos" é o grau comparativo do advérbio.... 4) O superlativo absoluto analítico de "oculto" é.... 5) O superlativo relativo de "escondido" é 3. a parte Reproduza numa redação a poesia que você leu. Note que não se trata apenas de passar para a prosa, mas de contar, com suas palavras, o que você entendeu.

8 A EXPLORAÇÃO DE TEXTO "Um apólogo" da unidade "Aspecto do sentimento humano". Assunto gramatical tratado especialmente: Classe de palavras. Após a leitura silenciosa e do exercício de vocabulário, passamos à interpretação de pequenos trechos do texto, obrigando, dessa forma, o aluno a retornar à leitura e facilitar sua compreensão. O exercício IV procura revelar a intenção do autor enquanto que o V busca conduzir a atenção dos educandos para um aspecto educativo. Ê importante ressaltar que não impusemos nossa opinião, muito ao contrário, estimulamos a que todos dessem sua própria - o que evitou omissões, pois opinião todos têm, seja ela qual fôr. Tomamos o cuidado de fazer com que os alunos sentissem que tôdas as opiniões seriam acatadas. A 2. a parte foi precedida de leitura dramatizada do texto. Como no "O lavrador e seus filhos", foi objeto de uma sessão de Estudo Dirigido. LEITURA DRAMATIZADA UM APÓLOGO (Machado de Assis) Era uma vez uma agulha, que disse a um novêlo de linha: - Por que está você com êsse ar, tôda cheia de si, tôda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo? - Deixe-me, senhora. - Que a deixe? Que a deixe, por quê? Por que lhe digo que está com um ar insuportável? Repito que sim, e fa~ larei sempre que me der na cabeça.

9 66 CURRICULUM VII/65 - Que cabeça, senhora? A senhora não é alfinête, é agulha. Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros. ~as você é orgulhosa. Decerto que sou. ~as por quê? É boa. Porque coso. Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu? - Você? Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu, e muito eu? - Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados... - Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás, obedecendo ao que eu faço e mando... Também os batedores vão adiante do imperador. Você, imperador? Não digo isso. ~as a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto... Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sêdas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana - para dar a isto uma côr poética. E dizia a agulha:

10 A EXPLORAÇÃO DE TEXTO 67 - Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco? Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a êles, furando abaixo e acima... A linha não respondia nada; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais do que o plic-plicplic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura, para o dia seguinte; continuou ainda nesse e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile. Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava a um lado ou uutro; arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha, para mofar da agulha, perguntou-lhe: - Ora agora, diga-me quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá. Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinête, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha: - Anda, aprende, tôla. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico. Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeeça: - Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!

11 68 CURRICULUM VII/65 EXERCÍCIOS l.a parte I - Você deve ter notado que, no texto, algumas palavras estão grifadas. Estão com maiúsculas, no início da linha e vêm seguidas de várias outras em minúsculas. Você deve sublinhar, dentre as minúsculas, aquela que é sinônima da primeira, de acôrdo com o sentido do texto. Exemplo: APÓLOGO - diálogo - fábula - apóstolo - resumo. AR - vento - clima - fisionomia - ambiente. FINGIR - aparentar - descobrir - mostrar - encobrir. ORGULHOSA - soberba - modesta - suspeita - ambiciosa. IGNORA - imagina - sabe - desconhece - conhece. SUBAL TERNO - subordinado - superior - principal - conhece. OBSCURO - claro - ignorado - principal raro. ÍNFIMO - supremo - sumo - infinito - inferior. GALGO perdiz. cão de caça - delgado - lebre - DIANA - mulher - divina - deusa da caça. II - Explique a expressão do texto:... "para dar a isto uma côr poética".

12 A EXPLORAÇÃO DE TEXTO 69 lu - Interprete, em poucas palavras, o trecho: "- Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária". IV - Machado de Assis observava as pessoas e analisava profundamente seus caracteres; sua obra é rica de aspectos do sentimento humano e de sátiras aos defeitos e vícios do homem. Neste seu "Apólogo", por exemplo, procurou: (Marque a melhor resposta). ( ) Dizer-nos que não devemos ajudar aos outros. ( ) Contar a história de uma agulha e de um novêlo de linha. ( ) Ironizar os tolos que trabalham pelos espertalhões. ( ) Dizer-nos que não devemos zombar dos outros. V - Escolha, dentre as frases abaixo, a que encerra o melhor ensinamento do texto em sua opinião, ou acrescente uma que traduza o seu pensamento sôbre o assunto. ( ) Não devemos vangloriar-nos, sobretudo, com as pessoas que nos ajudam. ( ) A soberba pode levar-nos a maus resultados.

13 70 CURRICULUM VIIj65 ( ) Todo trabalho resulta de esforços conjugados. Têm valor todos os que executam bem a tarefa que lhes cabe. ( )... " ",'.... VI - Justifique, em poucas palavras, a sua escolha. 2. a parte I - Escreva o infinitivo de cada um dos verbos grifados nas frases abaixo e analise cada um dêles segundo o Modo, Tempo e Pessoa. O primeiro serve de exemplo: a) Anda, aprende, tôla b) Falarei sempre que me der na cabeça c) Cada qual com o ar que Deus lhe deu. d) E dizia a agulha: e) Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Infinitivo Modo Tempo Pessoa Aprende aprender imperativo presente 2. a sing. falarei deu dizia faze..,,,,.,.,...

14 A EXPLORAÇÃO DE TEXTO 71 II - Passe para o plural: a) A agulha faz papel subalterno, obscuro e Ínfimo. b) Anda, aprende, tôla. III - Classifique a palavra sublinhada em cada frase, colocando nos parênteses o número correspondente à classe (categoria gramatical) a que pertence. 1 substantivo 2 adjetivo 3 pronome possessivo 4 artigo 5 pronome pessoal caso reto 6 pronome pessoal caso oblíquo 7 pronome indefinido 8 pronome relativo 9 advérbio 10 preposição ( ) Mas você"é orgulhosa. ( ) Que cabeça, senhora? ( ) Era uma baronesa que tinha a modista ao pé de si. ( ) Era uma vez uma agulha. ( ) Que lhe importa meu ar? ( ) Também eu tenho servido a muita linha ordinária. ( ) Cada qual tem o ar que} Peus lhe deu.

15 72 CURRICULUM VIIj65 ( ) Agulha não tem cabeça. ( ) Onde me espetam, fico. ( ) Você fura o pano, nada mais; eu é que coso. IV - CONCLUSÕES 1 - Para favorecer a "mudança de atitude" dos educandos, melhorando sua maneira de pensar e sentir, é de grande importância a escolha e forma de exploração do texto. 2 - Achamos eficiente seguir-se a seqüência dos textos apresentados: leitura silenciosa, exercícios de vocabulário, exercícios de interpretação, exercícios gramaticais e exercício de redação. 3 - As técnicas usadas devem ser variadas e, sempre que possível, programadas sessões de Estudos Dirigidos. 4 - O ensino de gramática deve ser feito com base nos textos.