PERÓXIDO DE CARBAMIDA: EFEITOS NA MICROMORFOLOGIA E RUGOSIDADE DAS ESTRUTURAS DENTAIS
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- Benedicto Alvarenga Schmidt
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1 PERÓXIDO DE CARBAMIDA: EFEITOS NA MICROMORFOLOGIA E RUGOSIDADE DAS ESTRUTURAS DENTAIS CARBAMIDE PEROXIDE: EFFECTS ON MICROMORPHOLOGY AND ROUGHNESS OF DENTAL STRUCTURES Roberta Tarkany Basting 1 RESUMO Os procedimentos de clareamento com peróxido de carbamida têm se tornado cada vez mais freqüentes nos tratamentos odontológicos por apresentarem simplicidade e efetividade. Entretanto, alterações da micromorfologia superficial e rugosidade do esmalte, dentina e cemento podem ocorrer devido ao íntimo contato dos agentes clareadores com a estrutura dental e/ou à composição química dos produtos. Tais alterações, observáveis através de análises de microscopia eletrônica de varredura e de força atômica, difração de raios X e ensaios de rugosidade superficial, entre outros, podem levar a um aumento da porosidade dental e, conseqüentemente, maior sensibilidade e retenção de pigmentos e placa bacteriana durante o tratamento. Desta forma, o objetivo deste trabalho é discutir o emprego do peróxido de carbamida e seus efeitos na micromorfologia e rugosidade superficial das estruturas dentais. Palavras-chave: clareamento de dente, esmalte dentário, dentina INTRODUÇÃO A busca por dentes brancos e saudáveis fez com que os procedimentos de clareamento dental tenham se tornado cada vez mais freqüentes nos tratamentos odontológicos 1. Freqüentemente, dentes vitais podem apresentar alterações de cor que comprometem substancialmente o sorriso causados por escurecimento fisiológico, traumatismos ou por manchamentos causados devido à fluorose, ao uso de tetraciclina durante a mineralização dos dentes ou consumo de alimentos e bebidas pigmentados. Nestas situações, faz-se a opção por procedimentos que não envolvam o desgaste de estrutura dental 2, 3. Descrito em 1989 por Haywood e Heymann 2, o clareamento dental caseiro com peróxido de carbamida a 10% oferece segurança e efetividade, com a obtenção de resultados esteticamente satisfatórios, preservando-se ao máximo a estrutura dentária íntegra 1, 4. Algumas modificações da técnica original caseira incluíram a associação de agentes espessantes que prolongam o tempo de liberação do ingrediente ativo e aumentam a aderência do produto ao dente 3, 4, 5. A concentração de peróxido de carbamida foi elevada, podendo-se utilizar materiais que variam entre 10% até 22% nas técnicas caseiras 3, 4, 5. Concentrações mais altas são capazes de clarear os dentes em um menor período de tempo, embora a ocorrência de sensibilidade dental seja mais freqüente quanto mais alta for a porcentagem de peróxido de carbamida presente no produto 5. Concentrações entre 35 a 37% são utilizadas nas 1 Professora Adjunta da Faculdade de Odontologia e Centro de Pós Graduação São Leopoldo Mandic Campinas/SP. 021
2 técnicas de clareamento de consultório, devendo haver um controle rigoroso da aplicação a ser realizada pelo cirurgião-dentista 1. Estes produtos podem incluir a utilização de fontes de luz ou calor aparelhos fotopolimerizadores, diodos emissores de luz ou laser - para acelerar a degradação do peróxido de carbamida e liberação do peróxido de hidrogênio. Entretanto, alterações sub-clínicas da micromorfologia superficial e rugosidade do esmalte, dentina e cemento podem ocorrer. Tais alterações, observáveis somente através de análises de microscopia eletrônica de varredura e de força atômica, difração de raios X e ensaios de rugosidade superficial, entre outros, podem levar a um aumento da porosidade dental e, conseqüentemente, maior sensibilidade e retenção de placa bacteriana durante o tratamento. Desta forma, o objetivo deste trabalho é discutir o emprego do peróxido de carbamida nas técnicas de clareamento dental e seus efeitos na micromorfologia e rugosidade superficial das estruturas dentais. REVISÃO DA LITERATURA Antes da sua utilização como um agente clareador, o peróxido de carbamida era utilizado em crianças e adultos no tratamento da gengivite, apresentando-se na forma de soluções anti-sépticas para bochecho 1. O ortodontista Willian Klusmier, em 1960, acidentalmente verificou que os dentes de seus pacientes se tornavam mais claros após o uso desse produto 6. Entretanto, seu emprego nas técnicas de clareamento dental somente foi relatado em , passando a haver preocupações em torno da sua segurança, embora seus produtos de decomposição água, oxigênio, amônia e dióxido de carbono - sejam facilmente encontrados nos processos normais do corpo humano. Nesse sentido, a Food and Drug Administration 7 o classifica como seguro e eficaz, na categoria de antiséptico oral na concentração de 10%. O mecanismo de clareamento dental consiste em uma reação de oxidação em que o peróxido de carbamida a 10% libera peróxido de hidrogênio a 3% e uréia a 7%. A uréia degrada-se em amônia e dióxido de carbono. Já o peróxido de hidrogênio, utilizado em quase todos os sistemas de clareamento, é bastante instável e facilmente se decompõe em água e oxigênio, penetrando pelos poros do esmalte e dentina para promover o clareamento do dente 1. Devido à baixa quantidade deste componente nos sistemas de clareamento dental caseiro, há a necessidade de um aumento do tempo de exposição 022
3 à estrutura a ser clareada para que ocorra a reação de oxidação e que o resultado final esperado seja obtido 1. Portanto, nas técnicas caseiras, sua utilização consiste na aplicação do produto em uma moldeira confeccionada em material flexível que é levada à cavidade bucal pelo período noturno (aproximadamente 8 horas) ou durante algumas horas durante o dia, pelo período de 2 a 6 semanas 2, 8, 9, dependendo da concentração do produto utilizado e do grau de escurecimento da estrutura dental. Durante o emprego do peróxido de carbamida a 35 ou 37% nas técnicas de consultório, uma maior quantidade de peróxido de hidrogênio é liberada, bastando em torno de 3 a 4 sessões de aplicações do produto, com intervalos de 7 dias entre as aplicações 8. Apesar de não estar totalmente esclarecido, o processo de clareamento faz com que anéis de carbono altamente pigmentados presentes no esmalte ou dentina sejam quebrados e convertidos em cadeias menores de coloração mais clara 1. Se os procedimentos de aplicação da técnica se estendem por um prolongado período de tempo, quebras na matriz protéica do dente podem ocorrer, levando a alterações estruturais do esmalte e dentina 1. Apesar do agente clareador ser aplicado externamente à superfície do dente, torna-se evidente que a ação desse produto ocorre quase que exclusivamente no interior do esmalte e dentina, interagindo com os componentes estruturais que os formam 1, 9. Estudos in vitro e in vivo têm demonstrado que a aplicação do peróxido de carbamida a 10% sobre a superfície do esmalte, dentina e cemento leva a alterações micromorfológicas, com o aparecimento de poros, erosões e aumento da rugosidade superficial Neste aspecto, Ben-Amar et al. 10 avaliaram a micromorfologia superficial do esmalte após utilização por 8 horas diárias durante 21 dias de um agente contendo peróxido de carbamida a 10%, mostrando a presença de porosidades, bem como redução da resistência adesiva. O mesmo aspecto foi observado por Josey et al. 14 ao utilizar peróxido de carbamida por apenas 12 horas. McGuckin et al. 15 também observaram alterações superficiais e de rugosidade após o uso de um agente contando peróxido de carbamida a 10% por 8 horas durante 30 dias. Contudo, maiores alterações superficiais foram observadas após a aplicação de agentes que apresentam menores valores de ph 16, 17. Em um estudo in vivo realizado por Bitter 11 em que se utilizou agente clareador contendo peróxido de carbamida, exposições dos prismas do esmalte e 023
4 alterações de superfície foram observadas após o uso por 14 dias. Entretanto, quando se compara a aplicação do peróxido de carbamida e de ácido fosfórico a 37% sobre o esmalte, alterações mais severas são observadas com o procedimento de condicionamento ácido 12. O uso de concentrações de peróxido de carbamida superiores a 10% também tem mostrado maiores alterações superficiais, bem como alterações nas camadas sub-superficiais do esmalte, assemelhado-se a lesões iniciais de cárie 13. Entretanto, as alterações na micromorfologia superficial parecem afetar não somente o esmalte, mas também outros substratos como a dentina e o cemento. Zalkind et al. 18 mostra que as alterações mais severas ocorrem nestes substratos devido ao maior conteúdo orgânico. Análises da estrutura dental utilizando difração de raios-x e espectroscopia infravermelha, realizadas por Oltu e Gurgan 19, mostraram a presença de alterações do esmalte com o uso do peróxido de carbamida a 35%, embora as concentrações de 10% e 16% não terem produzido qualquer modificação com um regime de 8 horas diárias de aplicação durante 6 semanas. Clinicamente, o aumento do diâmetro dos poros permite que o agente clareador penetre com maior facilidade para o interior do esmalte e dentina, podendo surgir os sintomas de sensibilidade transitória durante o uso do produto. Tais alterações da micromorfologia superficial têm levado a um aumento da rugosidade superficial 15, podendo sugerir um aumento da retenção do biofilme bacteriano 20 e elevar o risco ao desenvolvimento de cárie pelo paciente submetido ao tratamento clareador. DISCUSSÃO Devido ao íntimo contato do agente clareador com a estrutura dental, alterações microscópicas da superfície do esmalte, da dentina e do cemento têm sido relatadas. As propriedades ácidas dos agentes clareadores, a composição dos produtos e o tempo de aplicação do agente clareador têm sido relatados como alguns dos fatores causadores das alterações superficiais 10, 12, 17, 18, 21, bem como de alterações da microdureza superficial de esmalte e dentina 17, 21, 22 cuja propriedade apresenta correlação com o conteúdo mineral presente em tais estruturas 23. A presença de erosões e porosidades no esmalte e dentina, além do aumento do diâmetro dos túbulos dentinários durante a aplicação de agentes clareadores 024
5 contendo peróxido de carbamida também têm sido relacionados aos sub-produtos uréia e oxigênio, principalmente - da reação de oxidação do agente clareador 24, 25, 26. A uréia apresenta a propriedade de desnaturar proteínas presentes na porção orgânica da estrutura dental, com o potencial de penetrar pelo esmalte e afetar não somente a superfície, mas também a porção interprismática e intraprismática do esmalte 24, 25. Portanto, a penetração da uréia pode contribuir para o aumento da permeabilidade do esmalte e alterações microestruturais. Além da uréia, Hegedus et al. 26 mostraram que o oxigênio liberado da decomposição do peróxido de carbamida também é capaz de aumentar a porosidade da superfície dental, principalmente da dentina. Os radicais livres de oxigênio não são específicos e podem reagir com as estruturas orgânicas dos tecidos dentais por onde transitam mais livremente que em estruturas mineralizadas. Neste aspecto, é importante lembrar que as manchas dentais são compostos orgânicos que se degradam pela ação do oxigênio. A aderência bacteriana à superfície dental é também dependente das propriedades da superfície em que será adsorvida. Alguns dos fatores que podem facilitar o acúmulo bacteriano na estrutura dental são ocasionados pela presença de rugosidade superficial, interações eletrostáticas e hidrofóbicas, e mecanismo sacarosedependente 20. O peróxido de carbamida pode afetar a estrutura dental, alterando o processo de formação do biofilme dental 20. Apesar de Mc Guckin et al. 15 ter observado um aumento da rugosidade superficial do esmalte após a utilização do peróxido de carbamida a 10%, Gürgan et al. 27 mostraram não haver diferenças entre uma superfície clareada e não clareada. Além disso, os efeitos do peróxido de carbamida a 10% parecem minimizar a aderência de S. mutans, S. sobrinus e A. viscosus 20, apresentar efeito bacteriostático para S. mutans 28, 29, S. mitis, S. sanguis 29 e Lactobacillus 28, 29 in vitro e reduzir níveis salivares de Lactobacillus in vivo 28. Tais resultados indicam que agentes clareadores contendo peróxido de carbamida podem apresentar um efeito benéfico para ser utilizado como um agente anticariogênico. Embora a micromorfologia superficial e rugosidade das estruturas dentais possam ser comprometidas com o uso de agentes clareadores contendo peróxido de carbamida, existe a dificuldade em se determinar se tais alterações são reversíveis microscopicamente, apesar de não serem perceptíveis clinicamente. Considera-se que a saliva, o uso constante de fluoretos e a instituição de 025
6 medidas adequadas de higiene bucal possam melhorar as características micromorfológicas superficiais das estruturas dentais através da deposição de cristais de fluoreto de cálcio, além de manter o equilíbrio entre os fenômenos de desmineralização e remineralização, perpetuar a higidez do dente e evitar alterações visíveis clinicamente que possam prejudicar a estrutura dentária submetida ao clareamento dental 22. CONCLUSÃO Apesar da possibilidade de alterações subclínicas na micromorfologia e rugosidade superficial das estruturas dentais, ainda não se determinou se tais alterações são reversíveis microscopicamente, apesar de não serem perceptíveis clinicamente. Além disso, a supervisão do profissional pode assegurar a correta indicação da técnica e do material para a obtenção de resultados satisfatórios. ABSTRACT Carbamide peroxide at-home dental bleaching procedures are frequently used on account of its simplicity and effectiveness. However, changes in the superficial micromorphology and roughness of enamel, dentin and cement may occur due to direct contact of the bleaching agents with dental structure, and/or due to the products chemical composition. These changes are observed only by scanning electron/atomic force microscopy, X-ray diffraction, or roughness assays, and may increase dental porosity, leading to dental sensitivity and bacterial retention during treatment. Thus, the aim of this paper is to discuss the use of carbamide peroxide and its effects on the micromorphology and surface roughness of dental structures. key words: tooth bleaching, dental enamel, dentin REFERÊNCIAS 1. Goldstein GR, Garber DA. Complete dental bleaching. Chicago: Quintessence Books, Haywood VB, Heymann HO. Nightguard vital bleaching. Quintessence Int 1989; 20: Haywood VB. Considerations and variations of dentist-prescribed, homeapplied vital tooth-bleaching techniques. Compend Suppl 1994; 17: S Haywood VB, Robinson FG. Vital tooth bleaching with Nightguard vital bleaching. Curr Opin Cosmet Dent 1997; 4: Leonard RH, Sharma A, Haywood VB. Use of different concentrations of carbamide peroxide for bleaching teeth: an in vitro study. Quintessence Int 1998; 29: Haywood VB. History, safety, and effectiveness of current bleaching techniques and applications of the nightguard vital bleaching technique. Quintessence Int 1992; 23: Haywood VB. The Food and Drug Administration and its influence on home bleaching. Curr Opin Cosmet Dent 1993; 22:
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