PROFESSORES DE BEBÊS: AFINAL, QUE DOCÊNCIA É EXERCIDA NO COTIDIANO DO BERÇÁRIO?

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1 PROFESSORES DE BEBÊS: AFINAL, QUE DOCÊNCIA É EXERCIDA NO COTIDIANO DO BERÇÁRIO? Andréa Costa Garcia Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP) RESUMO: O presente artigo tem por objetivo analisar a docência exercida junto aos bebês no berçário, tomando como base uma pesquisa de mestrado, em andamento, em um Centro de Educação Infantil (CEI) da rede pública da cidade de São Paulo. Com o intuito de investigar o que motiva educadores a escolherem atuar no berçário I (agrupamento destinado a bebês de zero a um ano) e suas percepções acerca dos saberes necessários à docência com bebês foi realizada uma pesquisa, por meio de entrevistas, da qual participaram seis professores que atuam nos três agrupamentos de berçário I, da instituição pesquisada e observações das ações das professoras no cotidiano do berçário. As estratégias utilizadas foram entrevistas semiestruturadas, observações do cotidiano com registros por meio de diários de campo, filmagens e captação de cenas em vídeo/ foto. Inspirada em abordagens biográficas e com um enfoque qualitativo, este momento da pesquisa teve como foco principal conhecer, descrever e analisar as representações sobre o fazer pedagógico das professoras que atuam na docência junto a bebês que frequentam instituições de educação coletiva. Considerando a natureza e a temática proposta, a investigação teve como pressupostos teóricos as concepções de Nóvoa (1999), Tardif (2005), Tristão (2004) e Barbosa (2010). Pretende-se, assim, ampliar os conhecimentos, sob a ótica da Pedagogia, a respeito da educação de bebês em espaços coletivos e da constituição da profissionalidade dos professores que atuam nesta modalidade de ensino. A grande questão é construir referências para pensar a respeito das dimensões que constituem a especificidade da atuação docente junto aos bebês. Partindo da análise do material coletado foi possível perceber que as representações sobre a docência com bebês estão em grande medida relacionadas com o percurso formativo de cada professor e suas experiências vividas como docente. Palavras chave: docência no berçário, creches, bebês As análises parciais apresentadas, neste artigo, são provenientes de minha pesquisa de mestrado, em andamento, que tem como objetivo conhecer, caracterizar, 5290

2 2 descrever e analisar as práticas educativas desenvolvidas no cotidiano do berçário. A investigação tem como lócus o espaço de uma instituição de educação infantil CEI (centro de educação infantil) da rede pública da cidade de São Paulo. As questões que orientaram esta pesquisa foram as seguintes: O que motiva os professores a desejarem exercer a docência junto ao berçário? Quais possibilidades encontram em seu cotidiano no berçário que potencializam e legitimam sua ação como educadores? Quais são suas dificuldades e percalços na docência com bebês? O que significa ser professor de bebês? O que há de específico nas práticas educativas desenvolvidas junto aos bebês? No contexto atual, em que um número cada vez maior de crianças passa a frequentar instituições de educação coletiva antes do primeiro ano de vida, sob ações de cuidado e educação, torna-se relevante investigar a respeito dos profissionais que atuam junto a elas, suas representações e formas de constituir o fazer educativo. Parte-se do pressuposto que conhecer (a respeito) os educadores de bebês significa visibilizar questões relevantes do ponto de vista educativo que muitas vezes permanecem inviabilizadas no cotidiano do berçário. Por vezes, educadores, sob a égide de frases prontas e na compreensão parcial no que se refere à integralidade do cuidar e educar, desenvolvem suas práticas sem que se explorem as concepções de cada educador com seu processo pessoal e profissional, seus saberes constituídos entre práticas e discursos. que: Analisar a docência exercida pelos professores no berçário significa considerar Os bebês, em seu humano poder de interagir, ou seja, em sua integralidademultidimensional e polissensorial- negam o ofício de aluno e reivindicam ações educativas participativas voltadas para a interseção do lúdico com o cognitivo nas diferentes linguagens (BARBOSA; RICHTER, 20110, p.93) Há que se pensar numa docência que considere as especificidades inerentes à faixa etária, bebês que ainda não desenvolveram a fala, mas que se expressam por uma riqueza de linguagens, enquanto seres ativos, curiosos, criativos e capazes, com desejo de conhecer e explorar o mundo de forma singular e contextualizada, compreendendo a criança como ser competente, em sua inteireza, capaz de sofisticadas formas de comunicação, mesmo quando bebê, estabelecendo trocas sociais com coetâneos e adultos, através de uma rede complexa de vínculos afetivos (Faria, 1994, p ) 5291

3 3 A respeito das especificidades da docência nesta faixa etária, Tristão (2004, p. 170) define nesta modalidade educativa a relação como foco das atenções, uma ação essencialmente relacional, [...] lidamos com pessoas, nosso principal objeto de trabalho é o nosso ser [...]. A autora considera: o cuidar é a dimensão fundamental para qualquer relacionamento humano o que perpassa a cotidianidade da ação docente no berçário. Ao propor a abordagem da docência nos contextos cotidianos de ação, Tardif e Lessard (2007, p. 08) definem a docência como: Uma forma particular de trabalho sobre o humano, ou seja, uma atividade em que o trabalhador se dedica ao seu objeto de trabalho, que é justamente outro ser humano, no modo fundamental da interação humana. O objetivo da pesquisa, nesta perspectiva, consiste em investigar as percepções dos educadores acerca dos saberes necessários à docência com bebês e compreender as especificidades da ação pedagógica no berçário. Ao conhecer, descrever e analisar as representações sobre o fazer pedagógico dos professores que atuam na docência junto a bebês que frequentam instituições de educação coletiva pretende-se ampliar os conhecimentos, sob a ótica da Pedagogia, a respeito da educação de bebês em espaços coletivos e da constituição da profissionalidade dos professores que atuam nesta modalidade de ensino. A grande questão é construir referências para pensar a respeito das dimensões que constituem a especificidade da atuação docente junto aos bebês. A metodologia da pesquisa consistiu em um estudo de campo, por meio de entrevistas, do qual participaram seis professores que atuam nos três agrupamentos de berçário I, da instituição pesquisada e observações das ações destes no cotidiano. Inspiradas em abordagens biográficas e com um enfoque qualitativo, as estratégias utilizadas foram: entrevistas semiestruturadas, observações do cotidiano por meio de diários de campo, filmagens e captação de cenas em vídeo/ foto. Buscando caracterizar as representações das professoras sobre a docência, através dos dados coletados nas entrevistas, foram identificadas diferentes razões para escolha do exercício da docência no berçário. A identificação com as características e demandas da faixa etária foi o principal fator, seguido do interesse em experimentar o trabalho com bebês e a experiência anterior de sucesso, conforme podemos comprovar pelas falas: 5292

4 4 Eu amo o berçário, o toque, o aconchego..., todas as crianças aprendem, mas eles aprendem mais... Eu nunca tinha trabalhado com berçário, daí fui experimentar e adorei, quis repetir. (fala de entrevista de uma professora) Em sua totalidade os professores identificam seu trabalho no berçário como uma tarefa educativa, mas concomitantemente reiteram que também são mães, avós e que isto é importante para um professor de berçário, pois facilita nos momentos de cuidado. Esta forma de conceber a docência indica uma incompreensão da dimensão de profissionalidade docente, em que a profissão de professora não é a continuidade dos fazeres maternos, mas que exige uma competência específica do ponto de vista teórico, metodológico e relacional. Quanto às dificuldades, apontam a angústia de lidar com o tempo da instituição e os tempos dos bebês, Temos que conciliar o tempo da creche com as crianças, isso não é fácil, seguida da dificuldade em administrar um agrupamento de crianças tão diverso e não conseguir, por exemplo, dar colo ou alimentar e trocar a todos ao mesmo tempo. Segundo a fala de uma das professoras: Aqui é diferente da casa, a mãe só tem um, nós temos vários., o que aponta para a diferenciação da tarefa educativa no plano da instituição, fazeres de naturezas diferentes, o contexto institucional e o contexto doméstico, familiar. O período de adaptação foi considerado como momento gerador de maior angústia para os professores quando se referem ao processo de vinculação e a energia física e psíquica despendida: É um trabalho braçal, é preciso se movimentar o tempo todo, os bebês são muito intensos. É um corpo a corpo. É pesado o período de adaptação no início do ano, até eles se acostumarem com a gente. Eles choram e a gente ainda não conhece o jeito de cada um, o que eles gostam, temos que observar e ir adivinhando. (fala de entrevista de uma professora) Ao analisar o conteúdo das falas dos professores é possível perceber que por vezes não identificam seu papel no processo de desenvolvimento das crianças ao que diz uma professora: Eles chegam tão pequenininhos no berçário I, não andam, às vezes nem sentam, não falam e no final do ano estão correndo pela sala, parece mágica! Realizar este estudo em um centro de educação infantil tem possibilitado qualificar o trabalho pedagógico ali realizado, a docência com bebês, permitindo olhar os bebês do ponto de vista da infância, dando visibilidade aos mesmos, observando-os em diferentes situações em que a partir das suas manifestações seja possível conhecer suas formas de aprender, discursos e interações. 5293

5 5 Foi possível identificar, a partir das observações das relações cotidianas entre as concepções explicitadas nas falas das educadoras e os seus fazeres, as formas de organizar os tempos, espaços e materiais à disposição dos bebês e os modos de conceber a docência com esta faixa etária, de modo a contemplar as necessidades do grupo de crianças e de cada uma delas. Quanto às representações sobre a docência com bebês os dados indicam que estão em grande medida relacionadas com suas histórias de vida, o percurso formativo de cada professora e as experiências vividas como docente. Ao investigar representações e percepções acerca dos saberes necessários à docência, a partir da perspectiva dos educadores, relacionando-as com as observações do fazer pedagógico com bebês, destaca-se o conceito de contexto e se conclui que o contexto, em que os professores fazem parte e o apoio que recebem, está relacionado com o apoio que oferecem às crianças. Assim o desenvolvimento do ser humano tem a ver, directa ou indirectamente com seus contextos vivenciais (Formosinho, 2009, p. 258) Referências Bibliográficas BARBOSA, Maria Carmem Silveira; RICHTER, Sandra R. S. Os bebês interrogam o currículo: as múltiplas linguagens na creche. Educação, Universidade Federal de Santa Maria, v.35, p , FARIA, Ana Lúcia G.; ROSEMBERG, Fúlvia; CAMPOS, Maria M.. Creches e préescolas no hemisfério norte. São Paulo: Cortez, NÓVOA, Antonio (Org.). Profissão Professor. Porto: Porto Editora, OLIVEIRA-FORMOSINHO, Júlia. Desenvolvimento Profissional dos Professores. In. FORMOSINHO, João (coord.) Formação de Professores aprendizagem profissional e acção docente. Porto/PT: Porto Editora p TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude. Trabalho Docente: elementos para uma teoria da docência como profissão de interações humanas. Petrópolis, RJ: Vozes, TRISTÃO, Fernanda C.D. Ser professora de bebês: um estudo de caso em uma creche conveniada. Dissertação (Mestrado em Educação) Programa de Pós Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,