PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de Patrocínio Paulista, em que é apelante TIAGO DOS SANTOS OLIVEIRA, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento em parte ao recurso, nos termos do v. acórdão. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), LEME GARCIA E OSNI PEREIRA. São Paulo, 23 de fevereiro de Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação nº Comarca: Patrocínio Paulista Apelante: Tiago dos Santos Oliveira Advogado: Flavio Inocencio Freira VOTO Nº Apelação. Roubo majorado pelo concurso de agentes (dois adolescentes) e emprego de faca. Corrupção de menores. Concurso material. Pedido de absolvição quanto ao delito de corrupção de menores. Impossibilidade. Crime formal, bastando a comprovação da inimputabilidade e da participação de menores na empreitada criminosa. Réu e adolescentes reconhecidos pela vítima. Pleito de desclassificação da conduta para o crime de furto. Tese inconsistente, pois comprovada a grave ameaça e violência despendidas. Condenação. Penas dosadas nos mínimos. Concurso material que deve ser afastado. Concurso formal (heterogêneo) entre as infrações. Readequação das penas. Parcial provimento. O MM. Juiz a quo, Dr. Fernando da Fonseca Gajardoni, da Vara Criminal da Comarca de Patrocínio Paulista, em sentença datada de 16/04/2015 (fl. 171), julgou procedente a ação penal para condenar Tiago dos Santos Oliveira como incurso no artigo 157, 2º, incisos I e II, do Código Penal, c.c. o artigo 244-B, do ECA, na forma do artigo 69, do Código Penal, às penas de 6 anos, 6 meses e 13 dias de reclusão e 13 dias-multa, em regime semiaberto. Irresignada, a defesa interpôs o recurso de apelação, requerendo a absolvição quanto ao delito de corrupção de menores, sob o argumento de estarem os adolescentes corrompidos. Pleiteia, ainda, em relação ao delito Apelação nº

3 de roubo, a desclassificação da conduta para o crime de furto, a redução das penas e a imposição de regime mais favorável. Contrarrazoado o recurso, o órgão acusatório bateu-se pelo acerto do decisum; a Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer, opinou pelo improvimento do apelo. É o relatório. Segundo consta da exordial acusatória, na data de 20 de janeiro de 2014, por volta de 14h50, o denunciado, agindo em concurso de agentes com os adolescentes infratores Antônio Tomé Gonçalves e William Gabriel dos Santos, mediante grave ameaça exercida com emprego de faca, subtraíram, em proveito comum, um cartão do Banco Nossa Caixa e a quantia de R$ 400,00, em dinheiro, pertencentes a José Ferreira de Souza, de 73 anos de idade. A vítima, ouvida em sede judicial, relatou que três indivíduos, na posse de uma faca, ingressaram em sua residência e subtraíram a quantia de R$ 400,00, evadindo-se, em seguida. Reconheceu o réu e os adolescentes como sendo os autores do crime. O dinheiro não foi recuperado. O policial militar Edson Luis Ribeiro, em sede judicial, relatou ter sido comunicado acerca do roubo a partir de um vizinho da vítima e, chegando ao local indicado, ela estava machucada, sendo acionada uma ambulância. A residência tinha um sistema de câmeras de vigilância, a partir da qual foi possível visualizar os agentes e descobrir as suas identidades. A faca utilizada na empreitada criminosa foi Apelação nº

4 encontrada no quintal. A irmã do menor Antônio Tomé Gonçalves, após assistir às filmagens, confirmou se tratar do adolescente. No mesmo sentido, as declarações do policial Laercio Mendes. A testemunha Izabel Cristina Ferreira, perante o juízo a quo, confirmou que um dos indivíduos que aparece na filmagem é o seu irmão Antônio Tomé Gonçalves. O menor infrator Antônio Tomé Gonçalves, em sede judicial, alegou ter praticado o crime sozinho. Contudo, na delegacia, confessou integralmente os fatos, dizendo ter praticado o crime juntamente com o adolescente William Gabriel dos Santos e o réu Tiago. O adolescente William Gabriel dos Santos, em sede judicial, confessou ter praticado o crime de roubo na companhia de Tiago e do adolescente Antônio, mas negou o emprego de faca. Interrogado, o réu Tiago declarou ser parcialmente verdadeira a acusação. Confessou ter praticado o crime na companhia dos adolescentes, mas negou o emprego de faca. A autoria e a materialidade de ambos os crimes restaram devidamente comprovadas durante a instrução processual. A desclassificação para o delito de furto é descabida, tendo sido evidenciadas a grave ameaça e a violência experimentadas pelo ofendido durante a prática do Apelação nº

5 roubo, à medida que, além do emprego de uma faca, sofreu arranhões no pescoço. A insurgência da defesa quanto à condenação pelo crime de corrupção de menores, igualmente, não comporta provimento, visto consistir o delito em crime formal, prescindindo, assim, de prova em relação à influência do imputável. Comprovado serem os comparsas do réu menores de idade, e apurada a participação inequívoca ao crime de roubo, a condenação do denunciado pelo delito previsto no artigo 244-B, da Lei 8.069/90, é medida de rigor, nos termos requeridos pelo órgão acusatório. Malgrado ter entendido, no passado, a corrupção de menores como crime material, em estudo dedicado à obra Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, altero o meu posicionamento, curvando-me à fiel proteção menorista, devendo o delito em apreço ser considerado formal. O objeto jurídico do tipo penal é a formação moral do menor. Essa formação moral e intelectual, à evidência, é permanente e, assim, está sujeita a constantes alterações, tanto para o bem, quanto para o mal. Por não ter ingressado ainda na fase adulta, está em constante desenvolvimento. Enquadrar um menor de 18 anos como indivíduo já corrompido, seria ignorar a sua possibilidade de recuperação pessoal. Por isso, entendo, hoje, ser incorreto Apelação nº

6 exigir-se o resultado naturalístico, ou seja, não estar o menor corrompido. Na verdade, sendo adolescente, jamais pode ser considerado pessoa sem condições de recuperação. In casu, constatada a relevante participação dos menores à empreitada criminosa, o apelante deve ser condenado pelo crime em comento. Portanto, acertada a condenação, devendo ser mantida. As penas, porém, comportam reparos. A priori, insta apontar o equívoco do juiz sentenciante em considerar a formação de concurso material entre os crimes de roubo e de corrupção de menores, sendo que o caso melhor se adequa ao concurso formal de crimes (heterogêneo), na esteira do artigo 70, do Código Penal, visto ter o recorrente praticado dois crimes mediante uma única ação. Dessa forma, através do sistema da exasperação, importa a dosagem do crime com previsão de pena mais grave, aumentada de um sexto até metade, o qual, in casu, é o delito de roubo. Na primeira fase, com esteio no artigo 59, do Código Penal, as penas foram fixadas nos mínimos legais, de 4 anos de reclusão e 10 dias-multa. Na segunda fase, presente a agravante da senilidade e as atenuantes da confissão e da menoridade relativa, as penas permanecem inalteradas nos patamares mínimos. Na terceira fase, o magistrado Apelação nº

7 sentenciante majorou as penas à razão de três oitavos, em atenção às circunstâncias do crime, notadamente a participação de três indivíduos na empreitada criminosa e o emprego de uma arma faca, a justificar a elevação das reprimendas um pouco acima do mínimo permitido, resultando em 5 anos e 6 meses de reclusão e 13 dias-multa. Operado o concurso formal de crimes entre as infrações, exaspero as reprimendas à razão de um sexto, tornando-as definitivas em 6 anos e 5 meses de reclusão e 15 dias-multa. O 3º, do artigo 33, do Código Penal, permite ao julgador valorar as circunstâncias judiciais como norte para se determinar o regime. Sendo assim, as circunstâncias do crime, consistentes no concurso de agentes, contando com a participação dois adolescentes, autorizariam a fixação de regime fechado. Entretanto, em prol da proibição da reformatio in pejus, o regime semiaberto é mantido, não havendo se falar em regime aberto, por ocasião do artigo 33, do Código Penal. Ante o exposto, pelo meu voto, dou parcial provimento ao apelo defensivo, para condenar TIAGO DOS SANTOS OLIVEIRA como incurso nos artigos 157, 2º, incisos I e II, do Código Penal, e 244-B, da Lei 8.069/90, na forma do artigo 70, do Código Penal, às penas de 6 anos e 5 meses de reclusão e 15 dias-multa, em regime semiaberto, Apelação nº

8 mantendo-se, no mais, o decisum a quo. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator Apelação nº