São Paulo, 17 de julho de 2003
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- Ayrton Vilarinho Peixoto
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1 São Paulo, 17 de julho de 2003 CT/026/2003 Excelentíssima Senhora Dra. Dilma Rousseff Ministério de Minas e Energia Brasília DF Senhora Ministra, O Governo tem trabalhado no aprimoramento do Modelo do Setor Elétrico Brasileiro e deve divulgar em breve sua proposta de mudanças no atual Marco Regulatório, base sobre a qual os investidores privados definiram a sua participação no setor. Tais mudanças podem alterar as condições de remuneração justa assumidas pelos investidores, resultando em risco de comprometer a própria vitalidade do Setor e a capacidade de atração de novos investimentos. Por outro lado, podem também representar uma correção de rumo importante, necessária, em busca do tripé "Modicidade Tarifária, Saúde Econômico-Financeira das Empresas e Garantia de Fornecimento de Energia". Com o objetivo de contribuir para o trabalho liderado por esse Ministério, elaboramos uma Carta de Princípios onde caracterizamos conceitualmente os pontos que, no nosso entendimento, deverão estar contemplados no novo Modelo: Respeito às regras de funcionamento do Setor e do Mercado, vigentes à época da realização dos investimentos; Estabilidade jurídica e normativa; Expansão com eficiência econômica; Revisão da estrutura tributária incidente sobre a tarifa do setor elétrico. Ao tornar pública esta Carta de Princípios esperamos adicionar clareza ao debate no que diz respeito ao papel que entendemos ser dos investidores privados. Vimos pois, respeitosamente, encaminhá-la a Vossa Excelência, colocando-nos à disposição desse Ministério. Atenciosamente, Claudio J. D. Sales Diretor Presidente CBIEE - Câmara Brasileira de Investidores em Energia Elétrica 1 Fone (11) claudio.sales@cbiee.com.br 1 A CBIEE congrega os maiores investidores privados, nacionais e estrangeiros, que aportaram mais de US$ 30 bilhões em recursos de Geração e de Distribuição de energia. São membros da CBIEE a AES, Alliant, CMS Energy, Duke Energy, EDF, EDP, El Paso, Endesa, Elektro, Grupo Cataguazes-Leopoldina, Iberdrola, PSEG, Grupo Rede, Tractebel e VBC Energia. 1/7
2 Carta de Princípios a serem observados na revisão do Modelo do Setor Elétrico Brasileiro PRIMEIRO PRINCÍPIO Respeito às regras de funcionamento do Setor e do Mercado, vigentes à época da realização dos investimentos Na época da realização dos investimentos e da entrada dos recursos no país, um determinado conjunto de regras definia o funcionamento do Setor Elétrico Brasileiro. Esse Marco Regulatório, composto basicamente por Leis, Decretos, Resoluções e os Contratos de Concessão, possibilitou aos investidores definir a sua participação no setor. O conceito previa: uma atividade regulada de distribuição de energia elétrica; atividades de geração e comercialização em um ambiente de concorrência isonômica, contemplando ainda as figuras do Produtor Independente de Energia e do Consumidor Livre, com a existência de um mercado de contratos e de um mercado spot para a liquidação de diferenças. O acerto de diferenças entre a energia consumida/gerada e a contratada deve ser feito com racionalidade econômica, com regras transparentes e estáveis, e com base no valor da energia no curto prazo, em sintonia com o que hoje se pratica no Mercado Atacadista de Energia. A existência de um mercado de curto prazo, com regras transparentes para a formação de preços, onde os agentes possam realizar os ajustes necessários para cumprir seus compromissos comerciais (contratos de compra e venda), ao mesmo tempo possibilitando a operação ótima do sistema físico, independentemente dos contratos firmados, é essencial para o Marco Regulatório de um sistema com as características do sistema elétrico brasileiro. Registre-se ainda que na concepção original do modelo previa-se a redução do papel do Estado no setor, contando-se então com o capital privado para viabilizar a expansão da oferta. Para tanto, teríamos concorrência na geração e liberdade para os consumidores escolherem os seus fornecedores. Deste modo, seria imprescindível que as tarifas de energia fossem separadas das tarifas de transporte a fim de que os consumidores fossem cobrados em bases compatíveis com os custos incorridos. Subsídios cruzados, portanto, deveriam desaparecer. Adicionalmente a essas medidas seria necessário haver a desverticalização entre as funções de geração, transmissão, e distribuição, possibilitando que os agentes de geração e consumo fossem tratados isonomicamente e que o livre acesso às redes de transmissão e distribuição fosse efetivamente assegurado a todos. Todos esses atributos, devidamente apoiados em leis e regulamentos, foram considerados como premissas por parte dos investidores do setor, tanto nas aquisições de empresas geradores nos leilões de privatização quanto na construção de novas usinas. Investidores em geração não poderiam considerar que seriam expostos a uma competição desigual com empresas estatais, cujos ativos, em sua maioria, encontram-se economicamente depreciados. A continuidade dessa forma predatória de competição viola condições preestabelecidas e impede o aporte de capital privado para a expansão, devendo ser buscada uma solução que possibilite o convívio entre os capitais privado e estatal, mantendo-se a essência das regras atuais. Isto se faz necessário pois é inquestionável que o Estado brasileiro necessita do capital privado para viabilizar a expansão da oferta. Desta forma, um tratamento adequado que permita uma competição justa entre as concessões onerosas já realizadas (privatizações e leilões de novas usinas) e as concessões não onerosas deve ser considerado como ponto fundamental de qualquer modelo, pois não se pode desprezar todas as ações já tomadas por regulamentações e governos anteriores e que para cá atraíram os investidores existentes no país. 2/7
3 Vale lembrar também que o mercado de contratos e o mercado spot constituem atualmente as fontes de remuneração dos investimentos em geração e, portanto, o valor econômico desses contratos não se compõe somente de suas receitas diretas, mas também da margem obtida pela substituição da sua própria energia pela energia comprada no mercado spot. Este valor econômico é o valor que deve ser respeitado e mantido no caso de uma mudança do modelo de forma a não provocar prejuízos aos investidores. Em essência, o novo modelo não pode prejudicar a base econômica na qual foram firmados os contratos de concessão existentes e nem inviabilizar a permanência no atual regime de concessão dos produtores independentes nas bases e na estrutura de mercado em que foi estabelecido. Para o adequado tratamento isonômico dos agentes, a bem do equilíbrio entre eles, adicionalmente a tarifa de uso das redes de transmissão assume um papel importante. Num ambiente competitivo, a regulação deve tornar esta atividade regulada absolutamente neutra de forma a não prejudicar o processo competitivo entre os agentes de geração. Essa tarifa, se não regulada adequadamente, pode promover uma importante e indesejável transferência de renda de um segmento para outro. A existência de subsídios cruzados entre os consumidores prejudica o processo competitivo. Para agravar ainda mais os efeitos danosos dessa transferência de renda no processo competitivo, recentemente as tarifas de transmissão (TUSD) foram discricionariamente reduzidas de forma a beneficiar os leilões de excedentes de energia de geradoras. A regulação também tem sido omissa ao não incluir na TUSD alguns encargos setoriais e legais. Portanto, a regulação deve criar mecanismos adequados de forma a permitir a justa e equilibrada oportunidade de competição entre os agentes. Deve também alocar corretamente os custos na atividade regulada de forma a não prejudicar o processo competitivo, evitando a indesejada transferência de renda e, consequentemente, beneficiando o consumidor final. Também a competição dentro da atividade de geração está atualmente gravemente desequilibrada, sendo necessária urgente correção antes mesmo de se fazer qualquer alteração no modelo setorial, de forma a respeitar os princípios constitucionais da livre competição e da isonomia e evitar graves conseqüências para os produtores independentes. Este desvio decorre do fato de que a atual regulamentação dá aos geradores estatais direitos mais amplos de venda de energia às distribuidoras, os quais podem vender através de leilões próprios, aditamento de contratos iniciais e nos leilões de compras das distribuidoras, enquanto que os produtores independentes somente podem vender nos leilões de compras promovidos pelas distribuidoras, forçando, assim, as distribuidoras com revisões contratuais até novembro a aditarem os contratos iniciais com os geradores estatais, sem qualquer competição. 3/7
4 SEGUNDO PRINCÍPIO Estabilidade jurídica e normativa Para que haja interesse de um investidor privado no Setor Elétrico Brasileiro e para que os negócios já realizados sejam efetivamente respeitados e remunerados é imprescindível que os fundamentos Jurídicos e Normativos, que formam o ambiente setorial, sejam estáveis. Ao adquirir uma concessão ou ao realizar um novo investimento o investidor avalia o negócio considerando o Marco Regulatório Vigente que define o funcionamento do mercado e de cada negócio em particular. É com base no mesmo Marco Regulatório que planos de negócio que remuneram seus investidores são concebidos. Uma mudança no Marco Regulatório deve ser precedida de uma análise profunda dos impactos econômicos e financeiros para os agentes estabelecidos ou com projetos em curso, propiciando a neutralidade dos eventuais impactos no retorno esperado dos investidores nas regras atuais. A implantação de um novo Marco Regulatório exige: o estabelecimento de uma regra de transição; e compensações aos agentes já instalados caso venha a provocar prejuízos à remuneração de seus investimentos. Para tanto, é fundamental que as regras que nortearam as decisões de contratação e investimentos já realizados sejam respeitadas, evitando regulamentações retroativas que frustram as expectativas dos agentes e maculam a credibilidade nas instituições setoriais. Em particular, é necessário rever os critérios constantes na NT 23/2003 da Aneel, reconhecendo-se de imediato os preços pactuados nos contratos de suprimento de energia, respeitados os limites dos valores normativos vigentes à época em que os contratos foram celebrados. Adicionalmente, é necessário dotar os distribuidores de instrumentos legais que lhes permitam a cobrança pelos serviços ofertados aos consumidores. Se, todavia, ações judiciais venham a garantir a qualquer consumidor o direito de se manter inadimplente, obrigando o distribuidor a manter o fornecimento, a perda de receita do distribuidor deve ser considerada como desequilíbrio econômicofinanceiro do contrato de concessão, passando a fazer juz a uma compensação tarifária. É fundamental que os contratos sejam respeitados e que seja mantido o o equilíbrio econômicofinanceiro do Contrato de Concessão da atividade de distribuição. A Neutralidade da Parcela A e o Nível Adequado da Parcela B são princípios essenciais para tal equilíbrio. Neutralidade da Parcela A: A regulação do setor de distribuição separa a tarifa de energia elétrica em duas parcelas, chamadas de A e B. A parcela A, conforme descrito no Contrato de Concessão, representa os custos não gerenciáveis, e deveria ser repassada totalmente à tarifa por conter itens que fogem ao poder de administração do agente. Porém, atualmente alguns problemas não permitem o perfeito repasse da Parcela A: a substituição dos Contratos Iniciais (energia proveniente de investimentos já amortizados) por outros contratos (preço de mercado), a não-concatenação dos encargos para todas as concessionárias (mesmo que alguns desses itens sejam anualmente contabilizados na CVA) Em relação aos Contratos Iniciais, a data de redução dos montantes de energia contratada é o dia 1º de janeiro de cada ano (2003 a 2006), a partir da qual novos contratos passam a substituí-los. Como o reajuste tarifário aplicado na data de aniversário de cada uma das concessionárias de distribuição 4/7
5 somente captura as variações de custo do ano tarifário que se encerra, as variações nos custos dos contratos ocorridas no mesmo ano em que as novas tarifas estarão em vigência somente começarão a ser reconhecidas no próximo aniversário tarifário. Além disso, no ano tarifário subseqüente esse reconhecimento é ainda parcial, incorrendo o distribuidor em nova perda. Dessa forma, as regras de repasse à tarifa dos custos da parcela A devem ser revistas com o objetivo de assegurar a necessária neutralidade ao distribuidor, conforme estabelecido no Contrato de Concessão. Assim, os seguintes mecanismos de correção da sistemática regulatória vigente deveriam ser considerados: Substituição dos Contratos Iniciais => criação de CVA para a compra de energia; Redução dos montantes da CVA por alteração na forma de aplicação do IRT (DRP = projeção para os 12 meses seguintes). Nível adequado da Parcela B: A parcela B, composta pelos custos gerenciáveis pelas distribuidoras, deve ser suficiente para cobrir os custos de operação e manutenção, depreciação de ativos, e remuneração de capital próprio e de terceiros. O processo de revisão tarifária em andamento tem revelado que tais custos não vêm sendo considerados de forma adequada pelo regulador. Os custos de O&M têm sido calculados com base no conceito de uma Empresa Referência, para a qual não estão sendo levados em conta aspectos específicos e peculiares a cada uma das áreas de concessão. Em alguns casos, a distorção acaba levando à necessidade de achatamento desses custos a níveis incompatíveis com a manutenção dos padrões mínimos de atendimento aos consumidores. Quanto à remuneração de capital, leva-se em conta uma base de remuneração para cálculo da remuneração que também não condiz com os princípios de estabilidade jurídica e normativa. As empresas privatizadas foram avaliadas e tiveram seu valor de venda estabelecido com base no fluxo de caixa descontado, sendo que entendem ser justo que a remuneração do capital próprio seja definida com base nesse valor. A ANEEL, por sua vez, entende que a remuneração deve passar a ser calculada com base no valor dos ativos da empresa. A ANEEL, através da utilização da metodologia de Retorno sobre Ativos, está determinando e limitando o retorno do capital investido, seja próprio ou de terceiros, a um valor que tem como principal referência uma base de ativos para fins tarifários. Apenas essa divergência causa sérias distorções no processo de revisão. Tal disputa encontra-se atualmente no âmbito judicial. No entanto, vale ressaltar que o valor que tem sido considerado pelo regulador, na maior parte dos casos, não permite sequer repor o valor atual dos ativos de forma a permitir a prestação de um serviço adequado e remunerar os investimentos feitos. 5/7
6 TERCEIRO PRINCÍPIO Expansão com eficiência econômica Para que novos projetos de geração sejam implementados os investidores precisam obter uma remuneração adequada para os seus ativos e, para tanto, é necessário um conjunto de regras estáveis e um arcabouço regulatório bem definido que ofereça aos investidores condições propícias para realizarem os investimentos. Nesse contexto, contratos de longo prazo são os instrumentos apropriados para garantir a estabilidade de receita aos patrocinadores dos projetos para que estes honrem os compromissos assumidos com terceiros e remunerem o montante investido. Portanto, é imprescindível que haja estímulo para a contratação que considere um espectro variado de prazos (duração de meses para ajustes e anos para viabilizar a expansão), contudo possibilitando uma competição ampla e eficiente entre as mais variadas fontes de geração. Visando assegurar a expansão em montantes compatíveis com a evolução do mercado consumidor, é imprescindível que os geradores possam efetuar contratos de venda de energia, para usinas existentes e usinas novas, de forma a atender a plenitude da carga acrescida de um certo nível de reserva. Um certo nível de reserva se faz necessário em função das elevadas, e por vezes instáveis, taxas de crescimento do mercado e em função da alta dependência hidrológica do sistema brasileiro. Somente através da contratação de um certo grau de reserva estará assegurado o atendimento ao mercado futuro, cabendo ao consumidor o pagamento de um prêmio constante para se assegurar do suprimento futuro, evitando os custos e conseqüências elevados decorrentes de um eventual racionamento. É evidente que o estabelecimento do nível adequado de contratação e a definição dos agentes responsáveis pela contratação não deve comprometer o equilíbrio econômico-financeiro dos agentes compradores, devendo-se dispor de mecanismos adequados e efetivos para compensação de eventuais riscos de sobre-contratação. Havendo um ambiente propício para o estabelecimento de contratos, qualquer modelo setorial deve ter por princípio básico a capacidade de induzir a expansão da oferta com eficiência econômica nas mais variadas etapas do processo (decisão, projeto, construção e operação), sujeita às diretrizes de política energética do país. Dessa forma, a indução à expansão ótima da oferta tem que passar, necessariamente, por etapas de planejamento estratégico global, planejamento setorial, e regulamentação adequada visando o fornecimento de sinais econômicos com o propósito de viabilizar os objetivos definidos nas etapas anteriores. Portanto, independentemente de tipo de modelo setorial, é imprescindível que os arranjos regulatórios estejam em sintonia com os objetivos pretendidos para o setor, viabilizando a expansão sustentada da oferta. É fundamental um processo de planejamento sistemático, neutro e transparente. O mesmo pode permanecer um Planejamento Indicativo, desde que passe a incorporar um maior comprometimento dos agentes com a concretização das obras concedidas e autorizadas (através, por exemplo, do pagamento de encargo que seria devolvido somente se a obra fosse concluída no prazo proposto). A adoção de um processo de Planejamento Determinativo, todavia, implicaria a necessidade de suficiente flexibilização para não inibir os ganhos sinérgicos dos agentes e deve permitir a desistência do projeto caso questões ambientais ou geológicas inviabilizem a obra. De forma análoga, os investidores também precisam ser remunerados adequadamente quanto aos ativos da atividade de distribuição. O modelo regulatório tem que ser capaz de prover sinais econômicos corretos, principalmente no sentido de exigir do distribuidor o nível de serviço e o cumprimento de outras obrigações que sejam compatíveis com o nível de receita reconhecido na fixação das tarifas. 6/7
7 QUARTO PRINCÍPIO Revisão da estrutura tributária incidente sobre a tarifa do setor elétrico Os tributos incidentes sobre o setor elétrico são elevados e devem ser reduzidos e ajustados, podendo inclusive incentivar usos específicos da energia, ao invés dos subsídios cruzados. Os tributos devem eliminar distorções, tais como: evitar a incidência de impostos em cascata (COFINS); o ICMS deve incidir somente sobre consumidor final. A compra de combustível para geração de energia deve ser isenta, devido à impossibilidade de compensação; os impostos devem incidir somente sobre a receita recebida efetivamente, não sobre o faturamento. 7/7
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