O MP impugnou a contestação, ratificando a inicial em todos os seus

Transcrição

1 fls. 527 Autos Ação Civil Pública Autor(es): Ministerio Publico Estadual Réu(s) Camara Municipal de SENTENÇA O Ministerio Publico Estadual propôs a presente ação civil pública contra a Câmara Municipal de, devidamente qualificados nos autos, pleiteando ao juízo que determine à parte ré a imediata exoneração dos ocupantes de cargos transitórios, criados pelas Leis Complementares Municipais 002/2012 e 080/2013, bem como a condenação da parte ré a homologar, nomear e dar posse a todos os candidatos aprovados no Concurso Público 001/2012. Formulou pedido de liminar. Instada a parte ré a manifestar-se em 72 horas quanto ao pedido de liminar, requereu a suspensão do feito enquanto se firmava um termo de ajustamento de conduta entre as partes. A Câmara Municipal trouxe aos autos o termo de ajustamento de conduta, às fls. 452/466, requerendo a homologação judicial. Após a posse da nova gestão da Câmara, houve apresentação de contestação, às fls. 470/490, ocasião em que são trazidas as seguintes teses: I) ilegitimidade ativa do Ministério Público para o ajuizamento da presente ação; II) ilegitimidade da Mesa Diretora da Câmara para revogar ato de órgão superior Plenário; III) nulidade do TAC por impor a imediata convocação dos aprovados, o que depende de conveniência e oportunidade da administração; IV) ausência de qualquer ilegalidade no ato do Plenário que anulou o concurso público; V) Vedação ao MP em contrair obrigações para si por meio de TAC, o que contraria o art. 33, 1º, da Resolução 015/2007-PGJ. termos. O MP impugnou a contestação, ratificando a inicial em todos os seus Vieram-me os autos conclusos. É o relato. DECIDO. 1

2 fls. 528 I. Preliminares Há preliminares que devem ser analisadas pelo juízo antes de apreciar o mérito da causa. São elas: legitimidade ativa do Ministério Público para a propositura da presente ação; legitimidade da Mesa Diretora da Câmara Municipal de para revogar ato do Plenário, firmando termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público; de ofício, trago à colação a (i)legitimidade passiva da Câmara Municipal para figurar no polo passivo da presente demanda. Passo a apreciar todas elas. 1.1 Legitimidade ativa do Ministério Público: Alega a parte ré que o Ministério Público é parte ilegítima para figurar no polo ativo da presente demanda, já que estaria a tutelar interesses individuais disponíveis. Contudo, não lhe assiste razão. O Órgão do Ministério Público, no presente feito, não objetiva a nomeação de um ou outro candidato a um posto na administração. Ao contrário, pretende ver anulado um ato do Plenário da Câmara, a exoneração de servidores temporários e a nomeação e posse de servidores concursados. Atua, destarte, na tutela de um interesse difuso, ou seja, fazer cumprir o princípio constitucional da obrigatoriedade do concurso público com previsão no artigo 37, II, da Constituição Federal, o que interessa a todos os cidadãos, indistintamente. Portanto, não se trata de tutelar os interesses individuais dos aprovados no concurso público em obter a nomeação, o que é mera consequência, mas, sim, ver cumprida a Constituição Federal quando impõe à Administração a realização de concurso para a ocupação dos cargos públicos. Com tais razões, por entender que o Ministério Público está a agir na tutela de interesses difusos, rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa. 1.2 Legitimidade da Mesa Diretora da Câmara Municipal para firmar o Termo de Ajustamento de Conduta TAC: Alega a parte ré que o Plenário da Câmara Municipal, órgão maior dentro da estrutura do legislativo, determinou a anulação do Concurso Público nº 001/2012, haja vista a existência de supostas irregularidades no procedimento, o 2

3 fls. 529 que resultou na publicação da Portaria 001/2014 (f. 416). Defende que a Mesa da Câmara, órgão administrativo inferior ao Plenário, não poderia editar a Portaria 080/2014 (fls. 462/463), revogando ato do Plenário e celebrando TAC com o Ministério Público. Com razão à requerida. Ora, se o Plenário da Câmara Municipal de deliberou pela anulação do certame, após o devido processo legislativo, somente o próprio Plenário poderia revogar o seu ato, autorizando a presidência da Câmara a celebrar o TAC com o Ministério Público. Nesse caso, o presidente da Câmara atuaria como longa manus do Plenário. Entretanto, ao fazê-lo, à revelia do Plenário, tenho que a presidência da Câmara usurpou competência de outro órgão, carecendo de legitimidade para firmá-lo e trazendo como consequência o não acolhimento do pedido de homologação do termo de ajustamento de conduta por parte deste juízo. 1.3 Da (i)legitimidade passiva da Câmara Municipal Como corolário lógico da não-homologação do TAC é o prosseguimento do feito em seus ulteriores atos rumo ao julgamento do mérito da perlenga. Contudo, de ofício, trago uma questão preliminar intransponível: a ilegitimidade passiva da Câmara Municipal. A Câmara Municipal não possui personalidade jurídica autônoma. Portanto, não pode ela assumir o polo passivo da demanda. Como a Câmara é órgão integrante do município apenas ele possui personalidade jurídica e somente ele poderia figurar no polo passivo. Devo destacar que as câmaras municipais e as assembleias legislativas possuem apenas personalidade judiciária, o que lhes permitem vir a juízo limitadas à defesa de suas prerrogativas institucionais ou para postular direito próprio (ato interna corporis), o que não é o caso dos autos. Nesse sentido, vale transcrever a consolidada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. CÂMARA DE VEREADORES. AUSÊNCIA DE PERSONALIDADE JURÍDICA. PRECEDENTES.1. Nos termos da 3

4 fls. 530 jurisprudência desta Corte, "a despeito de sua capacidade processual para postular direito próprio (atos interna corporis) ou para defesa de suas prerrogativas, a Câmara de Vereadores não possui legitimidade para discutir em juízo a validade da cobrança de contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de pagamento dos exercentes de mandato eletivo, uma vez que desprovida de personalidade jurídica, cabendo ao Município figurar no pólo ativo da referida demanda." (REsp /RN, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 24/10/2005). No mesmo sentido: AgRg no REsp /AL, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe Desse modo, "a Câmara de Vereadores não possui personalidade jurídica autônoma que lhe permita figurar no pólo passivo da obrigação tributária ou ser demandada em razão dessas obrigações.sujeito passivo da contribuição previdenciária incidente sobre remuneração de membros da Câmara Municipal é o Município, pessoa jurídica de direito público." (Precedente: REsp n /PB, DJ de , Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki).3. O princípio da separação dos poderes e o da autonomia financeira e administrativa não podem eximir o Município de responsabilidades assumidas por seus órgãos.agravo regimental improvido.(agrg no REsp /PE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/06/2012, DJe 28/06/2012). ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA. ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO AMAPÁ. CAPACIDADE RECURSAL. INEXISTÊNCIA.LEGITIMIDADE DO ESTADO. PRECEDENTES DO STJ. SÚMULA 83/STJ.1. O Tribunal de origem, ao dar provimento ao recurso do agravado, entendeu pela legitimidade passiva do estado, uma vez que a implementação da aposentadoria compulsória de servidor da Assembleia Legislativa do Estado incumbe exclusivamente ao ente empregador, e não à instituição de previdência.2. As Casas Legislativas - câmaras municipais e assembleias legislativas - não possuem personalidade jurídica. Só podem figurar em juízo na defesa de suas prerrogativas institucionais; não possuem legitimidade para recorrer ou apresentar contrarrazões em lide que envolva direitos estatutários de servidores. Precedentes.3. O Tribunal a quo decidiu de acordo com jurisprudência desta Corte, de modo que se aplica à espécie o enunciado da Súmula 83/STJ.Agravo regimental improvido.(agrg no AREsp /AP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 18/06/2012). PROCESSO CIVIL - CÂMARA MUNICIPAL - PERSONALIDADE JURÍDICA - PERSONALIDADE JUDICIÁRIA - CAPACIDADE PROCESSUAL LEGITIMIDADE AD CAUSAM.- No processo civil brasileiro, a legitimidade ad causam reserva-se, normalmente, as pessoas (físicas ou jurídicas). Na ação em que se argüi nulidade de ato emanado de Câmara de Vereadores, a relação processual trava-se entre o autor e o Município.(REsp /SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/12/2002, DJ 19/12/2002, p. 333). Deveria, portanto, o Ministério Público propor a presente ação contra o Município de, e não contra a Câmara Municipal, que carece de personalidade jurídica. II. Dispositivo Diante do exposto, por reconhecer a ilegitimidade passiva da requerida, julgo extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do artigo 267, VI, do CPC. 4

5 fls. 531 Sem custas e sem honorários. Após o trânsito em julgado, arquive-se. Publique-se. Registre-se. Intimem-se., 10 de março de Fernando Moreira Freitas da Silva Juiz de Direito 5