ACÓRDÃO , da Comarca de São Paulo, em que são. apelantes LEONILDA PAPA AMORIM DOS SANTOS, ADRIANO

Transcrição

1 fls. 1 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que são apelantes LEONILDA PAPA AMORIM DOS SANTOS, ADRIANO AMORIM DOS SANTOS, EDUARDO DO NASCIMENTO JIMENEZ, DANÚBIA RIBEIRO DE OLIVEIRA FONSECA, FRANCISCO LUIZ BARROSO DA FONSECA, VILSON MARTINS ALBERTO, ROBERTA VELCHEV LISA ALBERTO, LUCIANA APARECIDA DOS SANTOS BAETA, FABIO DIAS BAETA, LI RONGYUAN, LILAN JIAN, VALENTIN BALAGUER PORTOLES FILHO e FLAVIA PEREIRA CAPITANI, são apelados TABOR EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA e EVEN CONSTRUTORA E INCORPORADORA S/A. ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores MAIA DA CUNHA (Presidente sem voto), NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA E ENIO ZULIANI.

2 fls. 2 São Paulo, 6 de junho de MILTON CARVALHO RELATOR Assinatura Eletrônica 2/10

3 fls. 3 Voto nº Apelação n Comarca: São Paulo. Apelantes: Leonilda Papa Amorim dos Santos e Outros. Apelados: Tabor Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Outra. Juiz prolator da sentença: Rogério Murillo Pereira Cimino. COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. Cobrança de serviços de assessoria técnico-imobiliária. Solidariedade. Ilegitimidade passiva afastada. Venda casada. Ausência de clara distinção em relação ao serviço de corretagem. Serviço que, de qualquer modo, não foi usufruído. Cobrança indevida. Restituição em dobro de rigor. Incidência do art. 42, parágrafo único, do CDC. Precedentes. Sentença reformada. Sucumbência invertida. Recurso provido. Trata-se de pedido de devolução em dobro de quantias cobradas indevidamente, a título de assessoria em contrato de compromisso de compra e venda, julgado extinto sem resolução do mérito pela respeitável sentença de fls. 502/505, cujo relatório se adota, por ter reconhecido a ilegitimidade passiva das rés. Apelam os autores sustentando, em síntese, que o Código de Defesa do Consumidor impõe a responsabilidade solidária da cadeia de fornecedores e prestadores de serviço. Pugna pela restituição em dobro em razão da abusividade da cobrança dos serviços de assessoria imobiliária. Subsidiariamente, requer seja cada um dos autores condenado ao pagamento dos honorários de sucumbência de acordo com a proporção dos seus pedidos (fls. 510/514). 3/10

4 fls. 4 Houve resposta ao recurso (fls. 520/529). É o que importa ser relatado. O recurso é de ser acolhido. Forçoso reconhecer a legitimidade das apeladas para figurarem no polo passivo da ação. Os apelantes contrataram com as apeladas imóveis na planta. Ao entraram em contato com as vendedoras, lhes foram prestadas as informações necessárias sobre a contratação para formalização do instrumento de compra e venda. Ocorre que a empresa de corretagem LOPES, parceira comercial das apeladas, cobrou dos consumidores quantias referentes à denominada taxa SATI, a título de serviço de assessoria técnica. Contudo, não importa se os valores foram por ela recebidos ou diretamente pela empresa SATI, pois neste caso respondem as apeladas pelos eventuais vícios na prestação dos serviços. A solidariedade imposta pelo Código de Defesa do Consumidor se aplica ao caso. Realmente, não há que se falar em responsabilidade exclusiva da assessoria técnica, em face do princípio da solidariedade imposto à cadeia de fornecedores no estatuto consumerista (artigo 7º, único e artigo 25, 1º), de modo que é patente que os contratos foram firmados na mesma ocasião, como forma de serviço integrado por empresas coligadas, o que importa a condenação conjunta de todas. 4/10

5 fls. 5 Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA. CONTRATO. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL. Pretensão da ré ao reconhecimento da ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda. Afirmou que os danos sofridos pelo autor não foram por ela causados. Decorreram de relação mantida entre os adquirentes de imóvel e a corretora de imóveis. Os autores representam a parte vulnerável na cadeia de consumo em exame. Não podem, portanto, ficar sujeitos às relações obrigacionais mantidas entre os fornecedores. Diante da prova do prejuízo sofrido, devem ser indenizados por qualquer dos fornecedores em virtude da solidariedade existente entre eles no dever de reparar. A busca é pela reparação efetiva e rápida, de modo a proteger o consumidor, hipossuficiente na relação (art. 6º, inc. VI, do Código de Defesa do Consumidor). Assim, nestas circunstâncias, a ré, que escolheu seus fornecedores, é parte legítima para o pedido indenizatório e deve responder objetivamente pelos danos causados ao autor. Preliminar afastada (TJSP, Apelação nº , Rel. Carlos Alberto Garbi, 10ª Câmara de Direito Privado, j. 11/12/2012) (realces não originais). Em caráter eventual, decerto que as apeladas poderão acionar a empresa com a qual firmada a parceria referente ao empreendimento, para que seja ressarcida, de acordo com a forma contratada. Todavia, tal circunstância não pode constituir óbice à reparação dos danos causados aos consumidores. 5/10

6 fls. 6 Afastada a preliminar, passa-se à análise do mérito, por se tratar de causa madura para julgamento (artigo 515, 3º, do Código de Processo Civil). Os apelantes alegaram que a aquisição dos imóveis foi condicionada ao pagamento de serviços de assessoria técnica, sem que, no entanto, tivessem interesse em contratá-lo. Sustentaram que tais serviços não foram prestados, mas impostos a eles sem a necessária informação, importando em venda casada, o que é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor. Nesse contexto, pleitearam a devolução dos valores pagos a título de assessoria técnica, em dobro, com fundamento no artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, era mesmo de ser considerada abusiva a cobrança de assessoria técnico-imobiliária. Restou incontroverso que os apelantes efetuaram o pagamento de R$33.522,25, referente a serviço de assessoria técnicoimobiliária. Eles defendem a abusividade de tal cobrança, uma vez que não desejavam a sua contratação e nenhum serviço adveio dela. Com razão, em vista do quanto alegado, cumpria às apeladas comprovarem a regularidade da cobrança e, sobretudo a prestação do serviço de assessoria. Todavia, elas não se desincumbiram de tal ônus. O contrato de prestação de serviços de assessoria técnico imobiliária traz obrigações semelhantes às funções dos corretores, e os contratos foram firmados na mesma ocasião. A abusividade resta evidenciada, pois a 6/10

7 fls. 7 ausência de comprovação do serviço indica tratar-se realmente de venda casada. Esta Egrégia Câmara em julgamento de ação similar, de relatoria do eminente Desembargador NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA, aprofundou o estudo da questão em tela: Restituição de indébito em dobro. Aquisição de imóvel. Contrato de assessoria técnico-imobiliária. Apelante vinculou o compromisso de compra e venda à prestação de serviços. Inadmissibilidade. Ausência de informação adequada na ocasião. Fato de tratar-se de instrumentos distintos não retira o caráter de operação casada. Abusividade configurada. Devolução dos valores pagos em dobro deve prevalecer. Apelo desprovido. O que fora avençado entre as partes está materializado a fls. 264, vinculando-se à proposta de reserva n.º , deste modo, o fato de encontrar-se em termos instrumentais separados daquilo que configura a relação negocial na essência, ou seja, a aquisição do imóvel, não é suficiente para caracterizar acordo distinto, consequentemente, trata-se de notória operação casada. Segundo o entendimento doutrinário: Venda casada: Tanto o CDC como a Lei Antitruste proíbem que o fornecedor se prevaleça de sua superioridade econômica ou técnica para determinar condições negociais desfavoráveis ao consumidor. Assim, proíbe o art. 39, em seu inciso I, a prática da chamada venda 'casada', que significa condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço. O inciso ainda proíbe condicionar o fornecimento, sem justa causa, a limites quantitativos. (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 2ª Ed., 7/10

8 fls. 8 Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 561). Destarte, no caso em exame as disposições genéricas e superficiais, relativas ao suposto objeto dos serviços, já demonstram que o consumidor está sendo colocado em situação adversa, destacando-se que termos como esclarecimentos, assessoria, análise preliminar, acompanhamento, orientação, constantes a fls. 87, denotam ausência de clareza e precisão, isto é, tem aspecto teleológico obscuro, induzindo o consumidor a erro (TJSP. Apelação nº ª Câmara de Direito Privado. Des. Rel. Natan Zelinschi de Arruda. 09/12/2010) (realces e grifos não originais). Também no mesmo sentido: Repetição de indébito Improcedência Cobrança de serviços de assessoria técnico-imobiliária Ausência de informação clara e precisa sobre o serviço prestado Cobrança indevida Arts. 30 e 31 do Código de Defesa do Consumidor Restituição devida Devolução do valor em dobro Não cabimento Ação que deve ser julgada parcialmente procedente Recurso provido em parte. (TJSP, Apelação nº , 14ª Câmara de Direito Privado, Rel. Thiago de Siqueira, j. 31/08/2011) (realce e grifos não originais) Dessa forma, não é possível distinguir os serviços de assessoria, daquele prestado pelos corretores, caracterizando sua cobrança verdadeiro bis in idem. Com razão, não se pode olvidar que privar os apelantes da opção de não contratar o aludido serviço constitui manobra 8/10

9 fls. 9 abusiva, em clara violação ao artigo 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe que ao fornecedor de produtos ou serviços é vedado condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos. Ainda, incide ao caso vertente o artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor. Realmente, na hipótese dos autos se vislumbram todos os requisitos ensejadores da sanção, conforme aponta o eminente Ministro ANTÔNIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN, ao comentar o referido artigo: A pena do art. 42, parágrafo único, rege-se por três pressupostos objetivos e um subjetivo (=engano justificável). No plano objetivo, a multa civil só é possível nos casos de cobrança de dívida; além disso, a cobrança deve ser extrajudicial; finalmente, deve ela ter por origem uma dívida de consumo. Sem que estejam preenchidos esses três pressupostos, aplica-se, no que couber, o sistema geral do Código Civil (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, Editora Forense Universitária, 9ª edição, 2007, pág. 405). Como se destacou, incabível, no caso, a alegação de engano justificável, tratando-se de prática abusiva que visa repassar os custos administrativos do fornecedor ao consumidor. Frise-se, não há qualquer indicativo de que os apelantes tenham usufruído do serviço cobrado. Desse modo, é de rigor que sejam as apeladas condenadas a ressarcir integralmente, e, em dobro, o valor pago em decorrência da cobrança abusiva referente à assessoria técnica 9/10

10 fls. 10 imobiliária, posto que ausente demonstração do serviço efetivamente prestado, e por se tratar de verdadeira venda casada, o que é vedado pela legislação consumerista. Os valores deverão ser atualizados monetariamente desde o desembolso, com juros de mora a partir da citação. Por consequência, inverte-se o ônus da sucumbência, fixados os honorários de sucumbência, por equidade, em R$2.000,00. Por tais fundamentos, dá-se provimento ao apelo. MILTON PAULO DE CARVALHO FILHO relator 10/10