A sua revista eletrônica A ANÁLISE SEMIOLINGÜISTICA DO DISCURSO DE INFORMAÇÃO MIDIATICO
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- Irene Renata Duarte Santiago
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1 A sua revista eletrônica A ANÁLISE SEMIOLINGÜISTICA DO DISCURSO DE INFORMAÇÃO MIDIATICO Giani David Silva 1 A distinção entre língua e discurso pode ser vista já em Benveniste (1966; p. 35) quando ele distingue a língua, vista sob o ângulo das formas gramaticais (langue), da língua em uso (parole): As condições de emprego da forma não são, em nosso modo de entender, idênticas às condições de emprego da língua. São em realidade dois mundos diferentes, e pode ser útil insistir nesta diferença, a qual implica uma outra maneira de ver as mesmas coisas, uma outra maneira de descrevê-las e de interpretá-las. Benveniste chama a atenção para essa diferença para poder definir enunciação. Enunciação é a língua em funcionamento, é o ato mesmo de produzir um enunciado. Benveniste introduz uma perspectiva que vai definir daí em diante todo e qualquer estudo da enunciação : a alteridade : Toda enunciação é, explicita ou implicitamente, uma alocução, ela postula um alocutário. Dessa forma, analisar uma situação enunciativa é analisar a relação eu-tu estabelecida na enunciação. Benveniste (1966), ainda, vislumbra novas perspectivas de estudo da enunciação que partiriam do quadro formal que ele propõe, mas que iriam, com certeza, bem adiante: Muitos outros desdobramentos deveriam ser estudados no contexto da enunciação. (...). Amplas perspectivas se abrem para análise das formas complexas do discurso Doutora em Estudos Lingüísticos Faculdade de Letras da UFMG e professora do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais - CEFET/MG, em Belo Horizonte.
2 Realmente Benveniste tinha razão, a distinção primeira entre língua-forma e língua em uso permitiu novas perspectivas de estudos lingüísticos, ou estudos discursivos. Essas novas perspectivas de estudos lingüísticos propiciaram a aparição da Análise do Discurso, ou das Análises do Discurso que variam de acordo com os conceitos utilizados, as perspectivas de análise, ou até mesmo, os objetivos de pesquisa. Antes de prosseguirmos, seria interessante esclarecer como vemos o discurso. Primeiramente teceremos algumas considerações que poderão facilitar a compreensão da perspectiva pela qual vislumbramos o discurso baseando-nos em Charaudeau, 1992 : 1- Discurso não deve ser reduzido à manifestação verbal de uma língua. 2- Discurso não deve ser confundido com texto. Esse último representa a materialização do ato de linguagem. Ele é produto de um processo que depende de um sujeito falante particular e de circunstâncias particulares de produção. 3- Discurso não é também uma unidade que ultrapassa a frase. Um conjunto de frases não faz em si um discurso. 4- Discurso não é visto aqui no sentido usado por Benveniste que o opõe à história, como dois planos de enunciação diferentes. O discurso compreende a união do componente enunciativo (discurso) e do componente enuncivo (história). Considerando essas distinções levantadas acima, o termo discurso pode ser utilizado em dois sentidos: Primeiramente, discurso está relacionado à encenação do ato de linguagem. Essa encenação deve ser analisada pela sua inserção em dois circuitos : um externo que representa o espaço do FAZER, espaço psicossocial, também chamado de Situacional, e um espaço interno, que representa o espaço de organização do DIZER. O termo discurso estará reservado para o domínio do Dizer. Será feita, mais adiante, uma distinção entre encenação discursiva e encenação de linguagem. É importante ressaltar que a encenação discursiva não se realiza independentemente da outra, no entanto, possui dispositivos próprios que lhe conferem certa autonomia. Pode-se assim, 2
3 estudar estratégias discursivas do discurso político em outras situações como, por exemplo, a midiática. Em segundo lugar, o discurso pode estar referido a um conjunto de savoirs partagés (saberes partilhados), construído por indivíduos de um grupo social. Esses discursos sociais, ou imaginários sociais, são testemunhos das representações de práticas sociais em um determinado contexto sociocultural. O discurso de informação midiático O papel das mídias de informação poderia ser definido como a difusão de informações relativas aos acontecimentos do espaço público valendo-se para tal de suportes tecnológicos como rádio, imprensa escrita ou televisão.(charaudeau, 1997). A informação transmitida pelas mídias, no entanto, não deve ser vista como a realidade. Fruto da linguagem, a informação constrói um espaço público através dos recortes que estabelece nos fatos do mundo referencial que, de certa forma, passa por um processo de recriação através dos recursos midiáticos específicos de cada tipo de mídia. Assim, a escolha do que deve ser noticiado, a forma como fazê-lo, a escolha de testemunhas, de ângulos, de falas a reportar, de perspectivas a abordar, demonstra o quanto essa visão da realidade é parcial. As mídias de informação funcionam segundo uma dupla lógica de ação, que vai ser fator determinante na transmissão de informações: Econômica- O órgão de informação é uma empresa e como tal tem por finalidade a fabricação de um produto competitivo no mercado. Semiológica- Todo órgão de informação deve ser considerado como uma máquina produtora de signos (formas e sentidos). Essa dupla lógica faz nascer uma série de questionamentos -ou mesmo dúvidas- em relação ao que é transmitido pelas mídias : Em que pode interferir o fator econômico sobre a transmissão de uma informação? Como garantir que a informação não está sendo manipulada por 3
4 interesses de ordem econômica ou ideológica? Os efeitos buscados pelas mídias são os mesmos produzidos no público? A manipulação de informação é eticamente correta? Esses questionamentos e muitos outros que podem ser feitos fornecem objetos de estudos para diversas áreas do conhecimento como a antropologia, a filosofia, a sociologia, a economia, a psicologia, obviamente a comunicação e por que não a lingüística em uma abordagem discursiva. Na tentativa de melhor precisar esse lugar onde se situa a análise discursiva da informação, faremos a seguir uma exposição dos lugares pertinentes à máquina midiática. Lugares pertinentes à máquina midiática Considerando o ato de comunicação como o produto da troca entre uma instância de enunciação e uma de recepção, e que o sentido produzido depende da relação de intencionalidade estabelecida entre elas, podemos determinar três lugares de pertinência: Lugar das condições de produção Lugar das condições de interpretação Lugar das condições de construção o discurso Lugar das condições de produção Esse lugar se compõe de dois espaços: um externo-externo e o outro externo-interno. O primeiro desses espaços compreende as condições socioeconômicas da máquina midiática, como uma empresa, que vai determinar a qualidade de produção das mensagens veiculadas. Nesse espaço os efeitos visados pela instância de produção estão ligados aos efeitos econômicos. 4
5 Nesse lugar todas as preocupações são de ordem socioeconômica, ou seja, o problema é colocar o produto-informação diante do maior número possível de consumidores (leitores, ouvintes, telespectadores). Nesse sentido o importante é seduzir os consumidores, garantindo, assim, o constante consumo do produto ofertado. O segundo desses espaços, o externo-interno, compreende as condições semiológicas de produção da produção, ou seja, nesse espaço é conceitualizado o que vai ser colocado em discurso segundo as condições técnicas disponíveis. Não adianta, por exemplo, querer colocar um ao vivo para retratar a guerra civil no Egito, se não existe um correspondente e condições tecnológicas para tal. A intencionalidade aqui se adapta as condições existentes, e está ligada aos efeitos visados, sem, no entanto, a garantia de que eles serão realmente produzidos no consumidor. A problemática aqui é de ordem sócio-discursiva, e consiste em analisar as práticas de produção da máquina midiática assim como o discurso de justificação dessa prática. O lugar de construção do discurso Nesse lugar o discurso se configura segundo uma formação semio-discursiva. Nesse espaço se instaura a problemática discursiva em si. Seres de linguagem são criados : emissor e destinatário. Nessa instância são vislumbrados os efeitos possíveis, que está em sintonia com os efeitos visados pela instância de enunciação e representam possibilidades interpretativas pela instância de recepção. Uma problemática que nasce desse espaço é a relação da organização semântica das formas com as hipóteses de co-intencionalidade que faz com que a instância produtora tente responder a perguntas sobre a instância-alvo, tais como: O que leva os indivíduos a se interessarem por informação fornecida pela mídia? ; Pode-se determinar a natureza de seu interesse ou desejo? ; Como agradar a públicos-alvos diferentes?. Assim sendo, ao se estudar o discurso midiático, deve-se levar em consideração a estruturação semio-discursiva do produto acabado e os discursos de representação que circulam por um lado na instância de produção, e por outro no contexto socio-cultural no qual está inserida a 5
6 instância de recepção. Esses discursos de representação, ou imaginários socio-discursivos, são fundamentais para o funcionamento da máquina midiática. O lugar das condições de interpretação Esse lugar se constrói em dois espaços: interno- externo e externo-externo. No primeiro se encontra o destinatário ideal, que é imaginado pela instância midiática como suscetível de perceber os efeitos visados por ela. No segundo se encontra o receptor real, ou público. Ë o lugar dos efeitos produzidos. Para estudo desse espaço, são necessários métodos específicos que no caso dos efeitos produzidos, partirão, provavelmente, de estudos de sondagem, enquête, índices de satisfação etc. Já no caso do espaço interno-externo os estudos correspondem a processos psico-socio-cognitivos de percepção, de compreensão, de memorização, de retenção, de avaliação do que é percebido. A Teoria Semiolingüística e o Ato de Linguagem Todo discurso social é produto não da representação transparente do real na linguagem mas da articulação da linguagem com as condições e as relações reais. (HALL,1980). É nessa perspectiva que se situa o quadro teórico-metodológico de Patrick CHARAUDEAU quando postula que todo ato de comunicação é interacional e contratual (CHARAUDEAU, 1983). Dessa forma, o ato de comunicação resulta da articulação entre dois circuitos interativos : um situacional e um linguageiro que pode ser assim representado: Ato de Linguagem Circuito interno (linguageiro) 6
7 Euc...EUe Tud...TUi Circuito externo (situacional) No circuito externo se encontram os parceiros empíricos do ato de linguagem seres psicossociais : o EU -comunicante, instância de emissão-produção do ato e o TU-interpretante, instância de recepção-interpretação do mesmo. No circuito interno esses sujeitos tornam-se protagonistas, seres de fala, criados e encenados de acordo com o projeto de fala do EU - comunicante. É nessa relação de ação e reação entre interlocutores que nasce a significação discursiva. O sentido é fruto tanto da identidade dos parceiros inseridos num espaço social de interação quanto dos papéis de linguagem dos protagonistas encenados no interior da mensagem.(soulages, 1995). Esse modelo teórico permite uma análise mais ampla do espaço comunicacional que se articula a partir de dois contratos: Um contrato situacional (espaço do Fazer) que determina as relações entre os parceiros do ato de comunicação. ( Estamos aqui para fazer o quê? E em que tipo de situação? ). Um contrato comunicacional, que articula os elementos linguageiros ou discursivos do ato de comunicação. ( Como devemos falar? ) Com base nestes contratos que se constrói, segundo Patrick Charaudeau, o projeto de fala que vai se formar através de um dispositivo midiático determinado. O Dispositivo da informação midiática Transposto o quadro anterior para a comunicação midiática pode-se afirmar que essa se realiza de acordo com um duplo dispositivo, no qual há um espaço de transformação do acontecimento ou seja: esse passa de fato (estado bruto) a notícia (construção). Há também um espaço de 7
8 transação no qual as duas instâncias (instância midiática e instância receptora) se relacionam obedecendo a quatro princípios básicos: Princípio de pertinência (o que pode e deve ser dito) Princípio de regulação (como deve ser dito) Princípio de influência (todo ato visa agir sobre o outro) Princípio de alteridade (o Outro é co-construtor do ato de comunicação). Princípio de Pertinência No contrato midiático, o princípio de pertinência vai determinar o que deve ser dito, ser noticiado. Nesse caso específico, a decisão cabe tão somente a um dos parceiros da comunicação, que detém o acesso ao acontecimento. Toda a competência cabe, então à instância produtora. Princípio de Regulação O princípio de regulação permite ao sujeito comunicante usar certas estratégias que venham lembrar o contrato no qual estão inseridos os parceiros do ato de comunicação. No caso da comunicação midiática, a utilização, por exemplo, de estratégias de legitimação da fala através de citação de fontes, vai lembrar ao leitor, ouvinte ou telespectador o seu caráter informativo e sério. Ele procura, também, ajustar o princípio de informação com o princípio do prazer, não permitindo que o objetivo de captar, seduzir o telespectador sobrepuje o objetivo de informar. Princípio de influência Visa fazer com que o parceiro da comunicação entre no universo de discurso do sujeito comunicante. O princípio de influência é à base de todas as práticas de captação do destinatário. Como a comunicação midiática se faz de forma monolocutiva,ou seja, sem troca direta entre os parceiros do ato de comunicação, essa captação se realiza através dos rituais de abordagem, dos fenômenos retóricos, da imagem, entre outros. Princípio de Alteridade 8
9 Como o dispositivo interacional no caso das mídias, não permite contato direto entre os interlocutores, o sujeito comunicante vai tentar atingir o seu parceiro através da postulação de um sujeito alvo (Tud). Essa situação monolocutiva vai permitir às mídias que se consagrem como um espaço público, uma vez que o Eu - enunciador, detentor da informação, fala com um Tud que é todo mundo. O dispositivo midiático pode ser assim representado: Contrato de comunicação midiática instância Notícia instância Acontecimento midiática receptora Acontecimento Bruto interpretado Espaço de Transformação Espaço de Transação Considerando esse dispositivo, as pesquisas discursivas têm duplo enfoque: analisar como se configura o espaço de transação (contratual) da mídia de informação televisiva, as regras e restrições do contrato informativo que coloca todas as emissoras de rádio, de televisão e a imprensa escrita em um mesmo nível: ambos são veículos de informação; e analisar como cada meio transita no espaço de transformação, quais as estratégias discursivas utilizadas por cada um na tentativa de evocar efeitos de credibilidade e captação. Enfim, a pergunta que se procura responder é a seguinte: qual é o grau de semelhança (constantes) e de contraste (variantes), apreendidos através da comparação de configurações discursivas, entre determinados veículos de informação? Um dos primeiros problemas que se coloca ao estudar as mídias de informação é o seguinte: Como reportar os acontecimentos? Para tentar responder a essa pergunta é necessário 9
10 centralizar a atenção no espaço que faz mediação entre o fato acontecido e a sua transformação em notícia. É nesse espaço que são articuladas estratégias que podem fazer com que um mesmo fato dê lugar a diferentes notícias.o discurso informativo midiático vai sempre, independente do suporte utilizado, jogar com estratégias que visam garantir de um lado, a credibilidade (fazer-crer)- fator fundamental em um contrato de comunicação de informação- de outro a captação (provocar o interesse) e conseqüente fidelização do público alvo. Considerando esses dois objetivos, o de credibilidade e o de captação, vê-se que o discurso de informação midiática inscreve-se em um paradoxo, oscilando entre o tornar a informação mais confiável, o que exige um maior grau de objetividade, de neutralidade e o de tornar a informação mais atraente, o que pode comprometer a neutralidade da mesma. Essas estratégias de captação vêm romper com a imagem de um jornalismo fundado sob premissas como a objetividade, a neutralidade, a imparcialidade, abrindo ao mesmo tempo um espaço de emoção e polemização na informação, o que não deve ser visto como algo a ser questionado, mas sim como parte constitutiva do discurso de informação midiática. A pergunta que fica e que cabe a nós, pesquisadores, respondermos, é como que cada meio estabelece seus limites, conciliando captação e credibilidade, e através de quais estratégias discursivas isso é alcançado (e se é alcançado). A análise proposta pela Semiolingüística permite ao pesquisador se desvincular de idéias preconcebidas sobre a mídia e evidencia que, para se chegar a conclusões sobre os pontos positivos e negativos da mídia de informação, é preciso comparar. Comparar o tratamento da informação em diferentes meios, em diferentes épocas, em diferentes contextos sociais para, dessa forma, compreendermos como cada órgão de informação se distingue dos demais e estabelece a sua identidade discursiva. REFERÊNCIAS BENVENISTE, E. Problèmes de Linguistique Générale. Paris:1966. CHARAUDEAU,P. Langage et Discours. Paris : Hachette,
11 . Grammaire du Sens et de l Expression. Paris:Hachette, Le discours d information médiatique. Paris:Natan, HALL, S. Culture, Media, Langage. Hutchinson : London, LANDOWSKI. A sociedade refletida. São Paulo: Educ, LOCHARD, G. e BOYER, H. Notre écran quotidien. Paris: Dunot, MÜNCH, B. Les constructions référentielles dans les actualités télévisées. Berne: Peter Lange,1992. SILVA,G.D. Análise semiolingüística dos efeitos discursivos em telejornais brasileiros (a notícia entre a realidade e a ficção)- dissertação de mestrado-fale:ufmg,
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