PROFESSOR, PESQUISADOR, GESTOR - QUE PEDAGOGO SOU EU?

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1 PROFESSOR, PESQUISADOR, GESTOR - QUE PEDAGOGO SOU EU? Meyre-Ester Barbosa de Oliveira PROPED/UERJ Resumo: O presente trabalho situa-se no âmbito dos estudos sobre as políticas curriculares para a formação de professores da educação básica e é fruto da pesquisa que venho desenvolvendo no doutorado em Educação, a qual tem como objetivo analisar o processo de reformulação curricular do curso de Pedagogia numa instituição de ensino superior norte-rio-grandense. Um dos objetivos da pesquisa é investigar as produções discursivas sobre a formação e o processo de hegemonização de determinados sentidos. Distanciando-me do entendimento de que as políticas são um guia de orientação para a prática, assumo a concepção de política como produção cultural, resultante de processos que envolvem negociações, traduções e disputas de sentidos. Partindo da compreensão do currículo como espaço fronteiriço de enunciação cultural (MACEDO, 2006; FRANGELLA, 2009) e como um discurso que constrói sentidos (LOPES e MACEDO, 2011), problematizo a ampliação da formação do pedagogo e a (in)definição de um perfil profissional, bem como as (im)possiblidades uma proposta curricular plena - que consiga articular a formação do professor/pesquisador/gestor para atuar nos espaços escolares e não-escolares. Na análise focalizo as leituras/sentidos para a formação do pedagogo e os processos de tradução em relação ao novo currículo, em textos produzidos por alunos e professores, particularmente no que concerne a ampliação da formação e ao perfil profissional. Considero que uma formação ampla e multidemensional, identidade hegemônica no processo de construção das Diretrizes Curriculares do curso, impõe desafios pedagógicos e curriculares às instituições, na medida em que o curso se destina a formar o professor, o gestor e o pesquisador. Palavras-chave: Identidade profissional. Formação do Pedagogo. Proposta curricular. À guisa de introdução O curso de Pedagogia tem sido marcado historicamente, por ambiguidades no tocante à finalidade e perfil profissional, tanto nos documentos legais, quanto no próprio meio acadêmico. Isso resulta do fato de que as políticas, em particular, as de formação de professores são marcadas pela incorporação de diversos discursos que resultaram em documentos curriculares híbridos, caracterizados por textos ambivalentes e, algumas vezes, contraditórios. A definição de uma identidade para o curso voltou a ser alvo de intensos debates após a publicação das DCN de Pedagogia Resolução CNE/CP 1, de 15 de maio de 2006, que incorporou algumas das proposições, resultantes das discussões ocorridas na década de 1980, organizadas pelo movimento de educadores, que defendiam a não separação entre o professor e o especialista. Nesse cenário algumas ideias se tornaram 9935

2 2 hegemônicas, como a defesa de que a docência constitui a base da identidade do curso de pedagogia, bem como, a formação baseada em competências. Meu interesse aqui, é analisar as leituras/sentidos para a formação do pedagogo e os processos de tradução em relação ao currículo do curso, em textos produzidos por alunos e professores, particularmente no que concerne a ampliação da formação. Metodologia Para este trabalho, tomo como material empírico, textos produzidos por ocasião do I Seminário de Avaliação da Formação do Pedagogo no Curso de Pedagogia da UERN SEMAPED. Evento, realizado em 2012, teve como foco discutir questões sobre a pedagogia, a identidade e o espaço de atuação do pedagogo, com o intuito de avaliar a implementação da Proposta Curricular do Curso, em vigor desde Participaram do seminário alunos, professores e gestores da educação básica e superior, dentre outros profissionais da educação e de instituições que demandam o trabalho pedagógico. Compõem a análise 12 textos, selecionamos dentre os 97 artigos apresentados no evento. Tomando como referência os descritores Curso de Pedagogia; Formação; Pedagogo; Currículo e Projeto Político Pedagógico, analiso os textos que abordam a reformulação curricular do curso e/ou avaliam a efetivação da proposta. Muito embora se observe diferentes enfoques no que concerne ao objeto de estudo, que grosso modo, é comum a todos o currículo do curso de Pedagogia, os textos podem ser agrupados em: estudos que objetivam analisar/avaliar o currículo do curso e sua implementação; estudos que buscam apreender as percepções dos alunos e professores e suas práticas e, estudos que investigam a produção do curso. A partir da leitura e análise dos textos foram surgindo categorias que podem, por assim dizer, agregar as discussões e, desse modo, auxiliar na investigação dos sentidos e traduções operados no espaço-tempo da formação. São elas: perfil profissional; formação inicial; organização curricular; saberes, competências e habilidades e práticas pedagógicas. Opto, neste momento, por articular a discussão em torno da ampliação do perfil profissional, interrogando as (im)possibilidades da proposta pedagógica do curso em formar o professor/pesquisador/gestor, por considerar mais produtivo do que trabalhar com a análise, em separado, das categorias. Resultados 9936

3 3 Nesta seção apresento uma análise sumária dos textos em apreço, destacando alguns aspectos a partir dos discursos dos sujeitos envolvidos no fazer curricular. Cumpre realçar que os textos analisados são tomados como discursos, compreendidos aqui enquanto produções de sentidos que criam um ser para o currículo, na medida em que esses sentidos passam a ser partilhados e aceitos. A ampliação da formação do pedagogo e a (in)definição de um perfil profissional A quase totalidade dos textos aborda a discussão da ampliação do perfil profissional, justificando-a em função das transformações sociais, que por sua vez suscitam novos espaços de atuação. Nesses termos, o perfil do pedagogo é definido com vistas a atuar na docência e na gestão de processos educativos, em espaços escolares e não escolares, o que supõe que esteja habilitado para lidar com as demandas e desafios postos pela prática educativa em diferentes contextos e pela gestão educacional. De acordo com este perfil o profissional deve estar preparado para lidar com a docência, a pesquisa, a extensão, a gestão escolar e os contextos ainda não consolidados do profissional nos espaços não escolares (T 08). No tocante a ampliação do perfil profissional, há certa ênfase em relação aos espaços não escolares, embora nenhum dos textos apresente uma definição consistente sobre esse campo de atuação. O principal argumento é que o contexto atual permite vislumbrar a atuação do pedagogo para além da escola, tendo em conta que a ação educativa se faz presente em diversos âmbitos sociais. Uma vez que a área de conhecimento da Pedagogia permeia o campo social, cultural, politico, empresarial, hospitalar e escolar, desenvolvendo ações ímpares em cada contexto (T 02). Em outro texto se afirma que a sala de aula, [...] não é o único local de trabalho para um pedagogo (T 05). Nesses termos, a questão da formação é abordada sob o prisma das novas e crescentes demandas sociais, cada vez mais complexas e heterogêneas, em relação à educação e ao papel desempenhado pelos docentes, fato que teria resultado numa reconfiguração da formação inicial nos âmbitos legal e institucional. A formação do pedagogo está em fase de construção, novos campos se abriram e os cursos de Pedagogia necessitam se adaptar a esta transformação (T 08). Não há consenso quanto à necessidade dessa formação ampliada do pedagogo. Alguns textos, inclusive, consideram-na preocupante, na medida em que alarga o conceito de docência, deixando a desejar na verdadeira característica do educador de 9937

4 4 sala de aula, a partir do momento em que o curso propõe a formação para a pesquisa, a gestão e, a produção e difusão do conhecimento pedagógico (T04. Grifo meu). Tal inquietação também é ressaltada em outro texto: Preocupa-nos particularmente a escola. [...] Percebemos a dicotomia posta, o perfil do pedagogo, ao mesmo tempo em que, se ilumina para os espaços não escolares, se emaranha em si, no que tange aos escolares, propriamente ditos (T09). Sobre as (im)possiblidades de uma proposta curricular A ponderação de que a formação não consegue contemplar os objetivos a que se propõe está presente em diversos textos, conforme explicita os excertos a seguir: As exigências para esse profissional se ampliaram, por outro lado, a formação não deu conta do recado de forjar profissionais que realmente realizassem na prática o exercício do fazer boas aulas (T08); essa formação não contempla alguns saberes necessários à profissionalização complexa e ainda indefinida deste profissional, [...] (T08). Para alguns autores o curso proporciona uma formação inicial mínima, em relação aos espaços não escolares e à educação infantil, o que consideram contradizer a exigência das diretrizes curriculares do curso no que concerne a contemplar consistente formação teórica e diversidades de conhecimentos e de práticas, que se articulam ao longo do curso (T 05). Um dos estudos destaca a formação fragmentada e pulverizada entre docência, gestão, pesquisa e espaços não escolares; [...] (T 09), o que consideram resultar da própria amplitude da formação e de certa indefinição da identidade profissional. No decorrer dos textos os autores vão explicitando o que consideram lacunas da formação e, por conseguinte, da proposta curricular do curso. Um dos trabalhos aponta que há poucas disciplinas que abordem a educação infantil, além do que sua distribuição nos períodos não estaria adequada. Em outro estudo, os autores afirmam que a base do curso, ainda, é a relação pedagogo-escola. Conforme os autores Um número expressivo de concluintes considera o currículo do curso com lacunas que afetam de forma direta a prática do Pedagogo no espaço não escolar [..], o que para eles poderia ser superado com a oferta de disciplinas relacionadas à temática [...] (T06). A partir de uma perspectiva que concebe a possibilidade de coerência entre proposta e implementação, o texto 10 destaca que: embora o Curso de Pedagogia adote o principio da contextualização como alvo de reflexão, como o que orienta a organização do currículo na devida adequação dos conteúdos as características regionais e 9938

5 5 locais dos educandos que chegam a universidade, percebeu-se que na prática não está se fazendo presente esse ato ( T10). A busca dessa coerência também é enfatizada na problematização apresentada no texto 11: de que forma a nova estrutura curricular do curso de Pedagogia da UERN promove a formação do pedagogo-pesquisador? [...] Na prática, a pesquisa está realmente sendo incentivada? (T11) Essas reflexões apontam para a dispersão disciplinar em função da amplitude do perfil profissional a ser formado, suscitando a complexidade que reside em qualquer tentativa de organização curricular. Além disso, permitem inferir que as exigências legais criaram tensões difíceis de serem equacionadas pelos cursos. Isso nos permite compreender que os sentidos para a formação são provisoriamente estabilizados no momento de elaboração da proposta, mas o processo de significação não cessa, pois são múltiplas as possibilidades de leituras/traduções. Considerações finais A análise aqui sumariada não esgota todas as possibilidades de leitura/tradução, dada a extensão do material empírico, o que por sua vez, requer um olhar cuidadoso do pesquisador. De outro modo, não há como abarcar a totalidade de sentidos produzidos, tampouco se pretendeu isso. Portanto, o que se apresenta, aqui, são resultados parciais de um estudo que orientado por uma perspectiva que compreende o currículo como produção de sentidos e, consequentemente, tradução das políticas de formação de professores, foi possível evidenciar algumas produções discursivas sobre a reformulação curricular nos cursos de Pedagogia da instituição em foco, bem como, problematizar, a partir da ideia de tradução, a pretensa correspondência entre proposta e implementação. Referências FACULDADE DE EDUCAÇÃO. I Seminário de Avaliação do Curso de Pedagogia SEMAPED. UERN/FE: Mossoró, FRANGELLA, Rita de Cássia. Currículo como local de cultura: enunciando outras perspectivas em diálogo com Homi Babba. GT 12 Currículo. 32ª Reunião Anual da ANPED: Caxambu, LOPES, Alice C.; MACEDO, Elizabeth. Teorias de Currículo. São Paulo: Cortez, MACEDO, Elizabeth. Currículo como espaço-tempo de fronteira cultural. Revista Brasileira de Educação. v. 11 n. 32 maio/agosto,